quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Ao alcance de todos!


1.      A manifestação das mulheres contra Bolsonaro, no último sábado, reverteu-se de dupla vantagem para ele: no domingo, em todo o país, milhares de pessoas, de todas as idades e diferentes níveis sócio-econômico, foram às ruas, em apoio ao candidato. E, nas pesquisas Ibope, Datafolha¸ divulgadas, anteontem e ontem, Bolsonaro subiu cinco pontos percentuais, no eleitorado feminino que, pouco a pouco, vai descobrindo não ser ele nenhum “bicho papão” como apregoam algumas mal amadas. Vai ele consolidando sua passagem para o 2º turno, graças às redes sociais e sua exposição, na mídia, principalmente graças a  seus algozes.
2.      José Dirceu, condenado a mais de 30 anos, divide palanque, em Maceió, com Renan Calheiros. Os dois se merecem, mas o Brasil não.
3.      A decadente “Veja” do falido “Grupo Abril”, querendo impulsionar o desidratado Alckmin, desenterrou matéria de 10 anos ou mais, para prejudicar Bolsonaro. Tiro no pé: segundo meu jornaleiro, foi o maior encalhe da “revistinha”, desde que montou ele a banca, ali na pracinha.
4.      Haddad correu a Curitiba, para prestar contas a Lula que manda na campanha petista, afinal, é ele Lula, quem tem votos. Este é o país que, queremos?
5.     Se Haddad vencer, o movimento “Lula Livre”, que exigirá o indulto para o “barba”, vai enfrentar barreira duríssima no Supremo Tribunal Federal. Parece – por enquanto, só parece – que Toffoli, presidente da Corte, está assumindo o papel de Magistrado, apagando sua imagem petista. Quem viver, verá!
6.      Haddad afirmou que, se eleito, acabará com o cartel dos bancos e vai obrigá-los a reduzir os juros. Alckmin garante que trará bancos internacionais, para o Brasil e Ciro garante transformar em “ficha limpa” os anotados pelo SPC e pelo Serasa. Rodolfo ouviu e repetiu Shakespeare! “que formosa aparência tem a falsidade”. Eu respondi, invocando Millor Fernandes:  Há! Há! Há!”
7.      Debate, sem Bolsonaro, é troca de figurinhas, entre falsos adversários. Prefiro a “escolinha do Professor Raimundo
8.      A radicalização Bolsonaro/Haddad, em detrimento do “centrão”, repetiu o apocalipse: “porque és morno, eu te vomitarei de minha boca


quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Uma defesa desnecessária


Escrevi algumas linhas sobre a sectária escolha a ser feita, caso se confirme Bolsonaro e Haddad, no segundo turno. Recebi alguns elogios, inclusive de quem não conheço e algumas críticas, até de conhecidos. Uma, em especial, bateu no estômago, por ter me acusado de radical de direita e “padrinho da intolerância”. Posso até ser de direita, se tal epíteto significa estado mínimo, administração pública enxuta, gastos públicos controlados e transparentes, incentivo à entrada do capital estrangeiro restrito à área de investimentos, racionalização das políticas públicas, com o fim do assistencialismo e reformas, principalmente a tributária e política. Todavia, “radical” é adjetivo que não se coaduna com quem está na batalha há mais de meio século e, até por força da profissão, exerce a arte de conciliar. Ao tempo do endurecimento do regime de 1968, convivi – e bem – com “subversivos” e, até, defendi alguns. Posso, até, não concordar com a diversidade sexual, todavia isto não me impede de aceitar, conviver e ter clientes homossexuais e entender que a homofobia deva ser objeto de repulsa e punição. Quanto ao extremismo político, o “nós” contra “eles”, que se instalou no país, repito, é fenômeno que vem de longe e que se agravou, por culpa do petismo, envolvido em tudo o que de pior aconteceu, entre nós. Não podemos nos esquecer de que o próprio Temer, tão execrado, foi instalado no poder pelo PT e suas espúrias alianças. Particularmente, pelos dados divulgados, acho que a vitória pende para o lado de Haddad, jovem, boa formação técnica e cultural, pode surpreender, fazendo bom governo – (pior que está, não fica, como ensina o filósofo Tiririca) -, desde que consiga se desprender da banda podre do partido, aí incluso Lula. Vivi meu tempo, tive em Carlos Lacerda meu líder maior, mas este tempo acabou e fica, para as novas gerações, guiar o País. Na mão ou na contra-mão, pois democracia é veículo difícil de conduzir.

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

“A escolha de Sofia”


No dia, 28 de agosto, neste mesmo espaço, vaticinei possível segundo turno, entre Bolsonaro e Haddad. Essa previsão – que era quase óbvia – vai se tornando realidade concreta, pela divulgação das últimas pesquisas, Bolsonaro, subindo gradativamente e Haddad, ancorado em Lula, alçando múltiplos voos. Arrisco outro palpite para o final do primeiro turno: Bolsonaro 34%, Haddad 26%. O raciocínio é simples: nestes últimos dias para a eleição, predominará o voto útil: votos de Alckmin e companhia migrarão para Bolsonaro e votos de Ciro e Marina, especialmente no Nordeste, deslocar-se-ão para Haddad. Como consequência, assistiremos à acirrada batalha entre o petismo – e tudo de execrável sucedido na recente história do país – e o anti petismo, representado pela Ideia de um Brasil passado a limpo. Os que temem Bolsonaro,  por verem nele um radical de direita, esquecem-se de que, se eleito, terá ele suas ações, boas ou más, tuteladas pelo  Congresso Nacional, sem cuja harmônica colaboração a governabilidade vai para o espaço, como aconteceu, anteontem, com Collor e, ontem, com Dilma. Nosso regime é presidencialista, mas a Constituição possui regramento parlamentarista. Um pouco de olhar para a história, ajuda-nos a fazer, se não digo a melhor, mas, pelo menos, a menos  pior escolha. É como votarei.

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Pequena história de amor


Ela era linda, assim, quase um metro e oitenta de formosura, olhos verdes, espiando dentro do corpo dele, longos cabelos pretos que se agitavam quando ela ria aquele sorriso largo e solto que calava o gorjeio do pássaro, postado no muro defronte. Era muito para ele, inaugurando 50 anos, olhos embaçados, pele manchada pela desenfreada corrida do tempo. Mas ela quis, aceitou emprestar-lhe um pouco de juventude, estendeu-lhe a mão, como a um naufrago e ele a reteve – quisera, para sempre -, afagara-lhe os dedos  longos, encaixou-os nos seus e apenas disse “fica comigo” e ela, sem apagar o sorriso, respondeu-lhe “eu quero” e eles seguiram em direção à pedra do Arpoador, ele, próximo e distante, sentindo o hálito de hortelã, que ela exalava, ouvindo sua voz, mas apenas vendo-a, assim, absurdamente linda, mostrando as coxas, maravilhosas coxas, pela fenda da saia. Sentaram-se, num banco da praia e ele extasiou-se com os seios, rígidos seios, apontados para o norte e que teimavam em fugir  da blusa. De repente ele quis sair dali, da multidão, que passava e olhava para ele, uns com inveja, outros, por certo, com piedade, pois sabiam – ou, julgavam saber – que, em pouco tempo, ela diria “cansei, vou embora ao encontro de outra juventude”. Ele contou isto para ela, que lhe apertou a mão, beijou-lhe o rosto e, em sussurro, apenas disse “bobo, eu quero você” e ele abraçou-a e a beijou, em público, porque ali, naquele momento, todos foram desaparecidos, ficando apenas a magia do mar batendo. Aí veio tempo de loucura, loucura de amor, todos os dias, em qualquer lugar, como aquela vez, no banheiro do supermercado. E quando ela telefonava, dizendo “eu quero” e ele largava tudo, cliente, reunião e dirigia loucamente, ela o  esperando na porta do prédio e o amor, frenético amor, subia de elevador e  continuava, na sala, no quarto, dois bêbados, embriagados de suor e desejo.
Um dia, passados dois verões, uma noite úmida de outono, o inverno espreitando para encolher as pessoas e apagar a paisagem, ele chegou, o apartamento grávido de silêncio, e, sobre o travesseiro, rescendendo a perfume dela, apenas um bilhete: “cansei vou em busca de outra juventude!”. Calmamente, como quem cumpre um ritual antigo, ele percorreu os quartos, querendo acreditar que era mais uma brincadeira dela. Os minutos se eternizaram na procura inútil. O que restou dela foi a minúscula calcinha, ainda molhada, pendurada no box do banheiro. Apanhou-a, vestiu-a e, com tresloucada gargalhada, braços abertos em hipotético   abraço, saltou para a noite escura.

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

A lição dos Jovens


O que mais me chama atenção, na pesquisa IBOPE, de ontem, além de Bolsonaro predominar em todas as regiões do Brasil, a exceção do Nordeste, é o fato de abrir ampla vantagem entre os jovens, até 25 anos. Eles, os jovens, são as principais vítimas de um País desarticulado, onde o ensino é deficiente e não há emprego para os que chegam ao mercado de trabalho, onde a violência faz mais vítimas do que a guerra da Síria. Os jovens, com mais amplitude, capturaram a necessidade de mudança e desprezaram as velhas e carcomidas lideranças, que passaram por cargos executivos, “andando de lado”. Se não se houveram bem, como governadores, por que a eles confiar a Presidência da República? O “sistema”, representado pelos grandes conglomerados empresariais e financeiros, não foi suficiente para impulsionar a candidatura Alckmin, que patina em um único digito. Os “analistas” de plantão estão tontos e, tirando coelho da cartola, tentam explicar o fenômeno Bolsonaro. A explicação, a meu modesto juízo, está na força das redes sociais, exatamente onde os jovens gritam sua revolta, pelo bandidismo, que o PT instalou no País e agitam suas esperanças de um novo Brasil, onde haja “ordem”, sem a qual não há “progresso”. Bolsonaro pode não ser o melhor, dentro do desejável, mas, como diz o vulgo, é o que temos, para este momento de descrença e incerteza. Os jovens souberam captar esta circunstância, sem se preocuparem com a anacrônica dicotomia esquerda/direita, até porque restaurar a confiança é preciso.

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Porque amada é a pátria!

Lembro-me, com grande emoção, de que, amanhã, comemora-se o “dia da pátria”.  Para mim, quase adolescente, a festa começava em agosto, quando ensaiávamos para o grande desfile  que percorria as principais ruas da cidade, apinhada de público, para nos ver passar, impecáveis, vestidos de branco, ar solene e compenetrado, dando nossa decisiva contribuição para a independência do Brasil. Do desfile, participavam todas as escolas da cidade, mas o ponto alto era o “Tiro de Guerra” e seus rapazes, portando fuzis e comandado por exigente sargento, - creio que Anésio era seu nome – a exigir firmeza no passo e cabeça erguida, pois a pátria espera que cada um cumpra seu dever. De outro 07 de setembro, lembro-me de como me senti diminuído, ao assistir ao desfile ao lado do General Murgel, ele Secretário e eu Diretor da Secretaria de Segurança do Rio. Ao passar os pavilhões nacionais – o do Império e o da República – o austero General não impediu que duas grossas lágrimas escorrecem-lhe pelo rosto. Emoção incontida pela qual eu, filho ingrato, não fui atingido. Apesar das críticas de sempre (de não se poder falar em independência, em um país com povo tão dependente), gosto da data e o que ela representa. E não se diga que nossa independência foi conquistada “no grito”, dado às margens do Ipiranga. Na verdade, para chegar a ela muito sangue foi derramado, a começar pelo dos Inconfidentes, em Vila Rica, em 1789. E houve a Revolução Pernambucana, em 1817 e a Revolução Farroupilha, no Rio Grande do Sul, comandada por Bento Gonçalves. Ensina a história que, se D. Pedro I não tivesse se antecipado, teria sido engolido pelo movimento libertário, semeado pela revolução Francesa de 1789 e pela Independência dos Estados Unidos, em 1776.
Mas não carece viajar no tempo, até porque não é a para isto que gravo estas “mal traçadas”. Registro o espírito aberto à conciliação e à esperança que devemos abraçar, neste dia. Nada se resolverá, afirmando que o Brasil não tem mais solução. Claro que tem, bastando que “o filho teu não fuja à luta”. Este é o País que, mal ou bem, construímos para filhos e netos e, só por isto, nele temos que acreditar. É claro que o aeroporto não é a saída, porque não há de contente em ser eterno estrangeiro. Amanhã, acordarei cedo para ver a desfile, sentir o peito urfando, , respirar o ar da liberdade e pisar firme, porque este solo é meu. Pátria amada, salve, salve!

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Para gostar de ler


Como já alardeei, estou sempre, através de livros, a buscar emoções novas, por isso dedico, geralmente, a tarde de sexta-feira, para garimpá-los nas livrarias preferidas. Conto, também, com a colaboração de amigos, leitores compulsivos, como eu, que me indicam livros a ler. Pois foi de um deles, magistrado de alto saber, muito além do jurídico, que cheguei a “Os loucos da Rua Mazur”. Seu autor, João Pinto Coelho, depois de várias andanças, aportou em Lisboa. A informação é relevante, porque “Os loucos” foi escrito em castiço português de Portugal, o que me obrigou,  recorrer ao dicionário, a buscar o significado de palavras, para mim, até então inusitadas. A leitura começa difícil, até porque a trama se passa em épocas e locais diferentes, com 03 personagens centrais e vários coadjuvantes, mas essenciais ao enredo. Vencidas as primeiras páginas e em se familiarizando com a linguagem e o estilo do autor, o livro alça voo e fica difícil estancar a leitura: amor, ódio, sofrimento, perdas,  reencontros e brutal traição fazem dos “loucos” leitura obrigatória. E, acrescente-se um pouco da história – principalmente dos judeus, na Polônia ocupada pelos russos. Mais, não conto.
Os loucos da Rua Mazur”, João Pinto Coelho, editora Leya.

terça-feira, 4 de setembro de 2018

O Candidato da mentira


Alckmin, o candidato do sistema, começou sua propaganda, atacando Bolsonaro e apresentando suas estatísticas que, sabemos, são vergonhosamente falsas. Falar, por exemplo, que o índice de criminalidade caiu, é rotunda balela. O Estado de São Paulo, nestes anos de governo Alckmin, foi o que apresentou o maior número de latrocínio (roubo seguido de morte), de assaltos a caixas eletrônicos, de roubo de cargas. Basta ir a um Distrito Policial, para identificar a falta de estrutura para o trabalho, a gerar desmotivação entre policiais, que ficaram sem reajuste salarial, durante quase toda a administração Alckmin. As escolas públicas estaduais restaram ao abandono, o mesmo acontecendo com os hospitais. Todavia, os desatinos de Alckmin não ficaram, apenas na administração pública. Seu governo está marcado por obcenas histórias de corrupção, nas obras do Metrô, do Rodoanel, da CPTM, para ficar apenas nestas. Não adianta Alckmin, com seu ar professoral, citar dados inexistentes, contar histórias de realizações que não houve. Por que será que, em nosso Estado, Alckmin não alcança mais de 15% das intenções de voto? A resposta é óbvia: porque, nós, que aqui estamos, sabemos da verdade, do fracasso que foram as administrações do ex-governador. Como, para ele, os fins justificam os meios, tratou de construir aliança espúria, com o que há de pior na política brasileira, para conseguir tempo mais dilatado na televisão. Alckmin, se fosse eleito (seu desempenho pífio indica que não o será) teria de dividir o governo, por exemplo, com Roberto Jefferson e Valdemar da Costa Neto, seus aliados. Seria o retorno do Brasil a seu pior momento. Este é o candidato que, por não conseguir alçar voo, cuja insinceridade sai pelos óculos, em estado de desespero, atira em outros candidatos, para os ter embaixo, a seu lado,

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

O elo desfeito


Era uma vez um amigo, queridíssimo amigo. Conheci-o, quando cheguei, povoado de medos, no Liceu Pasteur, para fazer o curso clássico. Como eu, vinha ele do interior e trombou com aquele casarão imponente, que cobria o quarteirão e de onde saíam jovens adolescentes, recheados de arrogância da cidade grande. Aproximou-nos a timidez dos que julgam pouco ou nada saber perto dos que aparentam notória sabença. Por conta de muita dedicação, passamos a contar entre os melhores. Quando chegou o vestibular, esquecemos  do bom viver, porque estudar e (quase) só estudar, era preciso. E colhemos o fruto, pois, de primeira, estávamos na faculdade e no topo da lista. Como era aluno interno, vivia em minha casa e eu, por vezes várias, corri ao interior, a conviver com a família, a ouvir, atento, a sabedoria do pai, que só não tornou meu amigo, porque era muito desejar para mim. Posso dizer que amadurecemos juntos, marido e esposa irmanados, a viajarem viagens de folguedos, aquém e além mar. Ele, do alto de sua classe, degustava o fino camarão e o acarajé de beira de calçada. Assim, sem frescura, alma lavada e pronta para o bom viver. Éramos irmãos que se queriam até não poder mais. Certo aniversário meu, ele recuperado de insidiosa doença, passei-o com ele, pois tê-lo, de volta, era o maior presente. Até que um dia, talvez pelos uísques bebidos, ele agrediu, não a mim, mas a fé, que eu tinha sem medidas. Poderia ter deixado passar, que palavras não são para embrutecer. Mas, embrutecido, disse-lhe palavras duras e as disse por escrito, que era para marcar, com tinta indelével, a ruptura de amizade, que tínhamos, como definitiva. Mas o tempo – quase nenhum tempo – passou e eu me arrependi, não desses arrependimentos que, histéricos, correm a se desculparem, mas arrependimento sem força, até porque o cristal se trincara. Deixei-me ficar com a memória dos momentos de folguedos e, principalmente, das tristezas e dificuldades que, juntos, transpusemos, porque tínhamos corações e mentes unidas.
Amanhã, 04, ele comemora vários anos, dois a menos do que eu, o que já é “barbaridade”, palavra que ele costumava usar. Como posso pouco, rezarei por ele, pedindo a Deus proteção para a família, que construiu e, também que não deixe morrer em mim esta amizade que,  mesma rompida e distante foi um dos melhores momentos que vivi.
Fabius, morituri te salutant

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Misteriosa estória da infância


A casa, onde nasci e morei, até os 15 anos, era sobrado, debruçado sobre a rua e, ao fundo, dois quintais que terminavam no morro. O primeiro quintal era adornado por árvores frutíferas, das quais me recordo da figueira e da mangueira, onde improvisávamos balanço e imitávamos o “Tarzan” da época. O segundo quintal era meio inóspito e, em seu capim alto eu me escondia do pai, tão logo vinha a público o famigerado boletim. Para meu desalento, tinha, como professora, a tia, que morava conosco e “entregava” os malfeitos. Aí o chinelo “cantava” e as únicas  marcas deixadas foi a saudade da vida risonha e inocente. Não deve ter sido fácil, para minha mãe, criar, ao mesmo tempo, 08 filhos e 04 sobrinhos, mas foi ela, até morrer, guerreira indômita, além de fazer doce de goiaba e empadão de galinha de comer, em êxtase. Até hoje, quando vou visitá-la no Cemitério do Araçá, sigo nas expectativa de encontrar esses dois pratos. Sem ser carola, era assídua devota e frequentadora da Igreja e me lembro de alguns padres, almoçando conosco. Pois certa feita, viveu ela estranha experiência: meu pai tinha saúde frágil, tanto assim que morreu aos 56 anos. Em uma de suas doenças, entrou literalmente em coma e não havia médico ou remédio que o fizesse despertar. Em estado de desespero, minha mãe foi bater, lá para as bandas do “Veneta”, bairro pobre da cidade, onde, segundo constava, morava uma “mãe de santo”, dotada de super poderes. E lá foi dona “Neném”, preconceitos deixados de lado, porque o marido era muito mais importante. A tal mãe de santo nem mesmo sabia de nossa existência, mas deu preciso e contundente diagnóstico, que reproduzo, sem fidelidade, mas verdadeiro, na essência: “minha senhora, no quintal de sua casa, há uma figueira. Cave ao pé dela e encontrará, enterrado, um chumaço de cabelo de seu marido. Queime-o, que ele ficará bom”. Assim minha mãe o fez e, antes que as cinzas se espalhassem pelo ar, meu pai abriu os olhos e pediu mingau de fubá, uma de suas comilanças preferidas. Não explico e não busco explicação, apenas conto como vi e vivi.

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Lula e outra estória


Ousei falar do direito de Lula disputar a eleição, pra que, levei bala, por todos os lados. Amiga queridíssima, em mensagem tresloucada, afirmou que deixaria de ler meus escritos. Melhor prá ela. Amigo importante, nome conhecido e respeitado na praça, puxou-me as orelhas, dizendo que não ficava bem, eu, “lacerdista e udenista, membro da direita progressista”, defender ideia tão estapafúrdia. Outro, cujo nome não ligo à pessoa, recomendou-me restringir às pálidas estórias de ficção, “porque da realidade atual você está esclerosado”. Claro que estou, afinal sai da primeira metade do século passado, mas ainda perduro na “libertas quae será tamen”, vale dizer, por mais que abomine Lula e o petismo, abomino mais o arbítrio.
Por falar em estórias, devo falar de Laura, nossa empregada, entrante eu na puberdade. Era muito feia, mas bem servida de seios e bunda. Seus admiradores, em esmagadora maioria, situavam-se entre as forças armadas, no caso, os valorosos  integrantes da então força pública de Minas Gerais. Tão logo encerradas as tarefas noturnas – isto lá pelas 8 da noite -, Laura enfeitava-se, salpicava estonteante perfume e descia à rua, ao encontro de seu amor de momento. Rua escura, andavam pela calçada, mãos dadas, beijinho só no rosto, que era moça direita, e não dada a esfregações. 10 horas, cumprindo o horário, imposto a todas pelo meu pai, Laura subia as escadas e se recolhia a seu quarto,  atrás da cozinha. Foi em um sábado, à noite, que o furduncio aconteceu: Laura soubera que seu amado andava de bolinação com outra e se preparara para tirar satisfações. Não era porque ele era sargento da polícia que podia fazê-la de boba. Ela, que largara comerciante, com banca no mercado e tudo mais, para ficar com ele. Como fui ao cinema ou jogar conversa fora com os amigos, não vi o entrevero, mas, ao voltar, fiquei sabendo que Laura tirara o cinturão do policial e dera-lhe contundente surra. Fora presa por desacato à autoridade e meu pai tinha ido à delegacia para liberá-la. No maior alvoroço esperamos pelo retorno de ambos, o que aconteceu madrugada chegando. Laura, altiva, certa de que lavara a sua honra e de toas as mulheres traídas. Quanto ao sargento surrado, pediu transferência para outra cidade.

terça-feira, 28 de agosto de 2018

Decifra-me ou devoro-te


A corrida presidencial vai se assemelhando a intricado jogo de xadrez, digno de campeões russos. Mesmo sem Lula, mas contando com o apoio dele, Fernando Haddad deverá estar no 2º turno. Mas, quem será seu adversário? Por mais que a  grande mídia tente desconstruir sua imagem, Jair Bolsonaro segue em ascendência, gradual e segura, enquanto Alckmin, o candidato do “Sistema” (leia-se, conglomerado empresarial e financeiro) patina, em míseros 5%. Vaticina-se que, com o horário eleitoral gratuito, muda o panorama. Não creio, vez que, segundo o Ibope, o programa eleitoral gratuito nunca manteve média de audiência superior a 10% e, como é de notória sabença, televisão ligada, não significa programa assistido. Partindo dessa tímida análise, é lícito projetar um segundo turno, tendo, como protagonistas, Bolsonaro e Haddad. É aí que a  porca vai torcer o rabo, como diria minha falecida mãe: quem vai apoiar quem? Por tendência natural, os partidos, ditos de esquerda, inclinam-se a apoiar Haddad. Todavia, apoiá-lo, significaria dar os braços ao petismo e sua pujante história de corrupção. E, como ficaria, MDB, PTB e, principalmente, PSDB neste “imbróglio”?  A análise de tal fato hipotético não é para amadores e eu, como o sou, quedo-me a meu canto, confortável em meu voto facultativo.

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Quem tem medo de Lula?


Pesquisa Ibope deu Lula na cabeça, com 37% das intenções de voto, seguido de Bolsonaro com 18% e, depois, a raia miúda com oito ou menos por cento. A leitura óbvia é que, se deixassem, Lula venceria, fácil, as eleições. E, por que não deixam? Na verdade, afastados falsos pruridos, o “impedimento” de Lula já estava tramado, de larga data. A lava jato dizia que Lula, além de várias propriedades, aqui e além-mar, possuía centenas de milhões depositados alhures. Como não identificaram esse alhures e muito menos aqueles magníficos e hipotéticos imóveis, sobraram um mequetrefe apto., situado numa praia idem e um sítio, com propriedade e registro em nome de terceiras pessoas. Era muito pouco, quase nada para quem tinha tanto poder, mas, no caso, como pretexto, dava pro gasto. Assim, lastreado em indigente prova – depoimento de delator – questões técnicas foram postas de lado e Lula foi condenado, com velocidade processual de fazer inveja a nós outros, advogados de longo curso, a esperarmos 05 ou mais anos que os processos cheguem ao final. Em qualquer país, minimamente sério, Lula nem mesmo seria processado e, se o fosse, impossível sua condenação. O pequeno Supremo Tribunal Federal, rasgando texto expresso da Constituição, admitiu a prisão em segunda instância; e o Tribunal Regional Federal de Porto Alegre, furando a fila, passou o processo de Lula na frente e confirmou Sergio Moro, esse paladino da moralidade que, com frequência, dá uma volta pelo Estados Unidos, que ninguém é de ferro. Reunidos os dois tribunais, estava montado o Jogo para impedir a candidatura de Lula. Aí vem esta pesquisa, a demonstrar que ele foi o que sobrou de liderança neste melancólico País, cujos líderes, tão distantes, perderam-se, na poeira do tempo. Eu, cá de mim, tenho a convicção formada de que a condenação de Lula foi pura armação do poder político, tendo, como “mão-do-gato” o poder judiciário. Quem tem medo de Lula? Jamais nutri qualquer simpatia por ele, mas medo, mesmo, tenho do arbítrio, principalmente quando este vem institucionalizado, guiado por interesses inconfessáveis. O prestígio popular é fato incontestável. E, a propósito, extraio de livro, que estou a ler, o seguinte registro, atribuído a John Adams: “fatos são coisas teimosas; e quaisquer que sejam nossos desejos, nossas inclinações, ou os ditames de nossa paixão, eles não vão alterar o estado dos fatos e das evidências” (in “Como os Advogados salvaram o mundo”, José Roberto de Castro Neves, editora “Nova Fronteira”).

terça-feira, 21 de agosto de 2018

A coisa


Ela se chamava Zuleika, assim com “K”, que o pai era chegado a estrangeirismos. Fora mulher atraente, corpo cheio, no limite de gorda e assim se casou com Olavo, quase 20 anos atrás. Optaram por não ter filhos, aliás, Olavo optou, que não tinha paciência com crianças, correndo pela sala e, alem do mais, era responsabilidade para a qual não se julgava preparado. Casaram-se na Igreja do bairro, com direito a bolo e champanhe nacional, servidos na sacristia e foram passar a lua de mel na Praia Grande, apartamento emprestado pelo primo dele. Zuleika era recepcionista em consultório médico e Olavo era funcionário público. Grana curta, mas vida regrada: uma vez por mês, cineminha e, depois, pizza, em cantina do Bixiga. Transavam, às quartas feiras, se o Corintians ganhasse e aos sábados, se não tivesse muito frio.  Uma vez por ano, fazendo coincidir as férias, iam com o primo e família (marido, mulher e dois filhos) passar uns dias na Praia Grande, desfrutar os prazeres do   verão e comer o “pastel da Sônia”, o melhor do litoral, apesar da fila de uma hora. A vida de casado seguiu, naquele mesmismo, Zuleika engordando e Olavo rareando os cabelos. As transas passaram a ser mensais, aquele “papai-mamãe”, rápido e sem variação, apenas para cumprir o “debitum conjugale” e que foi cada vez mais se espaçando, até chegar apenas como decorrência de datas comemorativas: aniversário, dele ou dela, dia do casamento e réveillon, a depender do teor etílico dele.
Num final de dia, ônibus lotado, Zuleika, de pé, notou que alguma “coisa” comprimia sua bunda. Identificou a “coisa”, pensou em gritar, armar um barraco, botar o safado prá fora, arrastá-lo à uma Delegacia.  Mas ela era tímida demais para qualquer iniciativa. Consumiu-se em indignação, sem espaço, no ônibus para se livrar da “coisa”, cada vez mais incomodantemente presente. Em ânsias, chegou a seu ponto de descida, praticamente atirando-se do ônibus, buscando ar. Mas não contava que o dono da “coisa” a seguiria. Chegou-se,  gentil, convidando-a para aperitivo, ali, no bar da esquina. Ela, irritada, fulminou-o com o olhar,  que era casada, fiel ao marido, que iria gritar, chamar a polícia. Calmamente, ele se desculpou, não queria incomodar, era do bem. Antes de se retirar, entregou-lhe um cartão de visita, em gesto mecânico, atirado dentro da bolsa. Chegou em casa esbaforida, sorte Olavo não estar. Debaixo do chuveiro, ainda remoendo o acontecido, acalmou-se e foi, então, que concebeu o plano. No dia seguinte, antes do almoço, ligou para o dono da “coisa”, Robério era seu nome. Voz trêmula, falou que tinha simpatizado com ele, que se o convite para o aperitivo ainda estivesse de pé, ela topava. Como ele também trabalhava na região da Paulista,  encontraram-se no ponto de ônibus, ao final do dia. Robério, cheio de “milongas” foi logo dando beijinhos no rosto, que melhor ficar por ali mesmo, no bar da esquina da Joaquim Eugenio de Lima, chopp tirado na hora. Cadeiras coladas, Robério conversava, lábios colados ao pescoço de Zuleika, balbuciava pequenas sacanagens, enquanto percorria-lhe as coxas com as mãos espalmadas. Ela, naquele momento, apertava os lábios e fechava os olhos, como se, assim, pudesse apagar a cena vivida. Robério insistia que ela pegasse na “coisa” e ela refugava, a dizer que mal se conheciam. Para acalmá-lo – e até como parte do plano – concordou em irem, no dia seguinte, ao hotel, lá pelos lados da Liberdade, que, segundo ele, recebia casais para encontros rápidos. E foram. Zuleika avisou que faria hora extra no consultório, chegaria tarde e Olavo, com a apatia de sempre, apenas resmungou um tudo bem. E lá estavam eles, Robério e Zuleika, naquele motel, camuflado em hotel, prédio de 3 andares, com corredores escuros, casais se  cruzando, cabeças baixas, querendo esconder suas identidades. Mal entraram no quarto, Robério abraçou-a, arrastando-a para a cama, ela pedindo calma, que pedisse bebida, para relaxar, ainda era cedo  e outras enrolações. Robério pediu vinho branco gelado, de nome estranho e excessivamente doce. Enquanto ele foi ao banheiro, ela misturou na taça, por ele usada, 06 comprimidos esmagados de “dormonid”, que retirara da gaveta de amostra grátis de seu chefe. Robério, retornou, já nu e pronto para a “batalha”, dando profundo gole na taça “batizada”. Foi a vez dela pedir um tempo para ir o banheiro, a pretexto de tomar uma chuveirada.Demorou tempo suficiente para que a droga fizesse efeito. De volta ao quarto, Robério, membro flácido, dormia, profundamente. Era hora de executar o plano. Tirou da bolsa um bisturi e, com calma e precisão, decepou a “coisa”. Encerrada a missão, lavou as mãos, encheu a taça de vinho e brindou “todas as mulheres molestadas”.
Tarde da noite, Olavo estranhou que Zuleika, corpo em brasa, chamava para o amor... o mais intenso dos últimos tempos.

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Época da Ditadura


Na época da ditadura, podíamos  namorar dentro do carro, até meia noite, sem perigo de sermos mortos por bandidos... mas não podíamos falar mal do Presidente.
Podíamos ter o INPS como único plano de saúde, sem morrer, à míngua nos corredores dos hospitais... mas não podíamos falar mal do Presidente.
Podíamos comprar armas e munições, pois o governo sabia quem era o cidadão de bem e o bandido... mas não podíamos falar mal do Presidente.
Podíamos ir a qualquer balada, de ônibus ou de carro, em qualquer bairro, sem correr o risco de sermos assaltados ou assassinados... mas não podíamos falar mal do Presidente.
Hoje, a única coisa que podemos fazer  é falar mal do Presidente.”
(Recebido por whatsapp)

terça-feira, 14 de agosto de 2018

Rápidas Constatações


1.     A Argentina demonstrou ao Brasil a verdadeira independência dos Poderes: a descriminalização do aborto foi decidida – e negada – pelo Congresso Nacional, de lá.
2.      Estranho! Todas as revistas semanais “bateram” em Bolsonaro. Como não se chuta cachorro morto, é de se concluir que a candidatura do dito cujo segue firme e forte.
3.      Esta demonização do Supremo, por conta do aumento concedido ao Poder Judiciário é mais uma demonstração de hipocrisia, por parte da mídia. Jornalistas, que ganham 100 mil ou mais, apenas para ler notícias, não têm moral para criticarem quem tem a árdua e difícil missão de julgar. Mesmo com o aumento de 16%, o salário dos Magistrados ainda é inferior ao de gerente jurídico de multinacional, cuja carga de trabalho e responsabilidade são infinitamente menores. Ontem, fui fazer audiência criminal e a Juíza, correndo de uma sala para outra, respondia por duas Varas presidindo dez audiências, na mesma tarde e decidindo sobre o bem mais valioso: a liberdade.

terça-feira, 7 de agosto de 2018

O Supremo Tribunal Federal e o Aborto


Por ocasião da “audiência pública”, promovida pelo Supremo Tribunal Federal, para debater sobre a descriminalização do aborto, relevante questão restou sem adequada resposta: tem nossa Corte Suprema legitimidade para decidir não ser o aborto crime, se praticado até 12 semanas de gestação? A matéria – aborto, como crime – encontra-se disciplinada pelos artigos 125 a 128 do Código Penal vigente. Os artigos 124, 125, 126 e 127, descrevem as hipóteses em que a prática do aborto constitui crime e o artigo 128 estabelece as hipóteses em que o aborto não é punido: “se não há meio de salvar a vida da gestante”, ou “se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante, ou, quando incapaz, de seu representante legal.” Todavia, em qualquer das hipóteses, só se admite aborto realizado por médico.
Segundo pacífico entendimento doutrinário, as hipóteses, elencadas no artigo 128 são restritivas, não admitindo interpretação extensiva, vale dizer que a propria interrupção da gravidez, no caso de ser o feto portador de anomalia física – o chamado aborto eugênico ou eugenésico – caracteriza crime. Todavia, o Supremo Tribunal Federal, em “ação de descumprimento de preceito fundamental”, admitiu, como não crime, quando o aborto é praticado, sendo o feto portador de anacefalia ou outras deformidades análogas.
A partir de tal decisão, estavam abertas as portas para que a Corte abdicasse das hipóteses, especificadas no artigo 128 e passasse a “criar” outras, segundo conveniências de momento. Por óbvio, a lei não pode permanecer estática, alheia às modificações sociais e econômicas. O que se questiona é se estas necessárias mudanças não seriam – e o são – atribuições exclusivas do Poder Legislativo, ocupado, exatamente, pelos representantes do povo, de onde emana “toda a vontade e poder” de criar e modificar as leis, adequando-as à nova realidade. Já de larga data, assistimos ao Congresso, por leniência ou falta de altivez, abrir mão de suas atribuições, permitindo, passivamente, que o Supremo “legisle”. A competência daquela Corte está, exaustivamente, descrita no art. 102 da Constituição Federal e, em nenhuma de suas alíneas, insere-se o poder de modificar lei ordinária. O Código Penal foi criado por lei infraconstitucional, tendo sofrido, ao longo do tempo, centenas de modificações, sempre através de leis ordinárias. Nos períodos de exceção, legislou-se através de decretos lei, mas, em nenhum momento deparou-se com modificações emanadas do Poder Judiciário.
Sou, radicalmente, contra o aborto, principalmente em uma época em que preservativos são de uso comum e, até, distribuídos, gratuitamente. Todavia, deixando de lado opinião pessoal, o que questiono é a competência do Supremo Tribunal Federal para, utilizando filigranas jurídicas, chamar para si o debate sobre o tema, debate este, insisto, a ser travado no sítio próprio, no caso, o Congresso Nacional. Conferir à Corte Suprema poder para “fazer e modificar leis” é implantar a insegurança jurídica, colocando em risco os direitos e garantias individuais.


sexta-feira, 3 de agosto de 2018

Rodolfo e Bolsonaro


Desde terça-feira, Rodolfo, meu politizado pastor alemão, cerca-me, a pretexto de assunto urgente. Como sei do que se trata, evito-o, quanto posso. Por óbvio, Rodolfo quer saber da entrevista de Jair Bolsonaro, na última segunda-feira, ao ¨Roda Viva” da Tv Cultura. Debate pífio, pela baixa qualidade dos entrevistadores, que, ao invés de extraírem as ideias do presidenciável, injetaram sangue petista nos olhos e pressionaram Bolsonaro a expor conceitos preconceituosos. E ficar, por todo um bloco, a falar da morte de Vladimir Herzog, ocorrida há quarenta longínquos anos, é sair do debate essencial, e apenas se pretender colocar casca de banana à frente do candidato. Entre enojado e entediado, mudei de canal, ao final do segundo bloco. Ontem, mal chegante em casa, Rodolfo me abordou. Que era falta de consideração eu evitá-lo, ele, sempre atento às minhas necessidades, etc  etc. Envergonhado, prometi-lhe toda a atenção, após o jantar. Encerrado este, como estava muito frio, pedi permissão a quem manda  para que ele entrasse e se acomodasse, a meu lado, no sofá da sala, Jobim “rodando na vitrola, sem parar”. O assunto era mesmo o debate, mas, antes que eu iniciasse a exposição acima, Rodolfo, cheio de entusiasmo, foi logo dizendo: “você viu que sucesso? “Roda Viva” alcançou inusitado índice de audiência e, pesquisa realizada após o debate, indica que nosso candidato “subiu 02 pontos percentuais nas intenções de votos””. Retruquei: “espera aí, Rodolfo”, “nosso candidato”? Eu, cá de mim, ainda não decidi. Confesso minha simpatia por Bolsonaro, mas gostaria de conhecer suas ideias sobre temas, como redução do déficit público, reforma previdenciária, tributária, administrativa e tantas outras, a clamarem por urgência.¨Bobagem, - rebateu Rodolfo – o homem é nosso “Trump brasileiro”. Nunca esteve envolvido em qualquer ato de corrupção e, por não querer enganar o eleitor, afirma nada entender de economia, mas que se assessorará por quem entende. Afinal, Getúlio, Juscelino, os presidentes militares entendiam de economia? Bolsonaro, meu caro, tal qual Trump o foi, é apoiado pela “maioria silenciosa”, que sofre com a falta de emprego, com salários aviltados, com juros inimagináveis ao mais inescrupuloso  agiota. Trump, atacado pela grande mídia, que apoia o sistema – até por       que vive dele – está fazendo os Estados Unidos crescerem a uma taxa de 4%. Bolsonaro, aqui, é o anti-sistema,  atacado por “Veja”, “Isto é”, “Globonews”, que sempre estiveram a serviço dos grandes conglomerados, por isso é o candidato da maioria, feita silenciosa.”
Como a noite avançava e o frio idem, despedi-me de Rodolfo, todavia levando seu discurso comigo. Será que meu amado pastor alemão está certo?

quarta-feira, 25 de julho de 2018

Para falar em eleições


Agora o quadro eleitoral começa a tomar corpo: à esquerda Ciro (ou Lula ou seu poste), ao centro Alkmin e seus indefectíveis aliados e, à direita, Jair Bolsonaro.  A eleição presidencial deste ano, pela sua incontestável relevância, remete-nos à de 1989, a primeira direta, após o final do período militar. É claro que as lideranças políticas não são as mesmas, com as atuais chamuscadas pela “lava jato”. Todavia 2018 encerra o conturbado período petista e a minúscula administração Temer que, com extrema dificuldade respiratória, chega a seus  estertores. O Brasil, para sobreviver, precisará de muito empenho e arte do novo Presidente, que deve retomar o desenvolvimento, controlar a inflação e realizar reformas estruturais, o que não é tarefa para qualquer um. Ciro Gomes é o destemperado de sempre, o não confiável de sempre que, dentre outras sandices, propõe o retorno do imposto sindical obrigatório e a revisão da reforma trabalhista, o que, por si só, demonstra seu descompasso em relação às necessidades atuais do país. Sua eleição seria lançar o Brasil em buraco negro, cujo fundo não se pode visualizar. Alckmin, para dar fôlego a sua candidatura, foi obrigado a se aliar ao “centrão”, conhecido bloco dos fisiologistas, que negociam, até, cargo de porteiro do Palácio do Planalto. Se eleito, teremos quatro anos de coisa nenhuma, mera continuidade do desastrado governo Temer. Sobra, assim, para pura análise, o nome de Jair Bolsonaro que, apesar de alguns destemperos verbais, representa o novo, a possibilidade de se dar uma “sacudida” nas instituições, repondo-se sua credibilidade; A grande imprensa, que sempre se colocou ao lado do “sistema” – leia-se, grandes conglomerados financeiros e industriais – pretende demonizar Bolsonaro, acusando-o de não ter preparo para assumir a Presidência da República. Mas, Alckmin e Ciro o têm, o primeiro, eterno derrotado, absurdamente comprometido com o “centrão”, e, o segundo, com irrealizável plano de governo? Não afirmo que Bolsonaro seja o ideal, todavia, dentro das possibilidades, que emergem da realidade objetiva, é nome que merece reflexão dos eleitores que sabem que a eleição de outubro representa, em definitivo, a esperança de rompermos este estado de letargia, que corrói as forças econômicas e sociais do Brasil.
P.S.: estas “mal traçadas” já estavam prontas, quando, na 2ª feira, o programa “Roda Viva” da TV Cultura recebeu o presidente Alckmin que, citando estatísticas nada confiáveis, prometeu o céu na terra. Como o time de entrevistadores, de segunda linha do jornalismo, era “chapa branca”, Alckmin “deitou e rolou”. A TV Cultura, se pretende, com seu “Roda Viva”, prestar serviço à democracia, deve escolher melhor independentes debatedores, que a “Casa” os possui, como Airton Soares, Gaudêncio Torquato, Luiz Felipe Pondé, dentre outros. A não ser assim, o programa se transforma em palanque eleitoral.

sexta-feira, 20 de julho de 2018

O descobrimento


YANAI impressionava, desde a primeira vista: pele morena e olhos pretos, a identificarem sua origem indígena, tinha pernas longas e coxas torneadas (o que para ele era fatal), que apoiavam quadril longo, bunda levantada (como o “alpha romeo” de sua juventude) e seios fartos, porém empinados. E, como moldura de marfim, dentes absolutamente brancos e perfeitos, que se abriram para ele, à porta da pousada. Viera para descansar, trazendo bagagem pouca – dez peças de roupa, se tanto – e três livros que pretendia preencherem seu tempo, quando não estivesse em caminhada. Naquele novembro, pós finados, ele era o único hóspede daquela pousada, encravada em uma praia: “Pousada do Adeus”. Achou que havia algo de emblemático no nome. Sua vida, nos últimos anos, tinha sido sucessão de “adeuses”: adeus, para amigos que se foram; adeus, para amigos que ficaram e com quem perdera o prazer de conviver; adeus, para a profissão, pela qual nada mais sentia; adeus para os filhos que, agora casados, só o procuravam nas datas oficiais; e, por último, como perda maior, adeus para a mulher, companheira de toda a vida, que se cansou dele e de suas manias. Sempre se enganou na etimologia da palavra “adeus”. Se o “a”, aposto à essência do termo, significa “sem” (como amoral significa sem moral) adeus só pode significar “sem Deus”. E era assim que ele sentia, quando chegou naquele lugar: perdera, pela negligência da fé, a companhia de Deus que, por certo, tinha mais a fazer, do que se envolver com a crise existencial daquele homem insosso e amargo. Sem Deus, viera buscar na “Pousada do Adeus” resposta para algumas perguntas. Depois de se instalar (quarto simples, mas acolhedor, com pequena varanda virada para o mar), saíra para conhecer o local. Uma enseada de não mais de um quilometro, onde, além da pousada, havia, se tanto, uma dúzia de casas – todas de alto padrão -, fechadas, naquela encravada semana de novembro. Entre duas traves mambembes, alguns nativos idem jogavam bola. Caminhou ao longo da praia e, em uma das extremidades, descobriu  trilha entre as pedras, que o conduziu a uma mais alta, pequeno pico, que se projetava ao mar. Sentou ali e, perdido em pensamento nenhum, viu o sol ir, lentamente, mergulhando no mar. Seu recolhimento foi, abruptamente, interrompido por  voz doce que, quase sussurrando, disse-lhe ser perigoso fazer o caminho de volta, na escuridão da noite. Era Yanai. Sem nada dizer, ele se levantou e seguiu-a. Ela usava o mesmo short desbotado e a mesma blusa branca, amarrada à altura do umbigo. Enquanto caminhavam, ela fazia algumas recomendações e sugestões sobre o lugar, que ele nada ouvia, pois seus pensamentos acompanhavam o ritmo do andar de Yanai, o balançar de sua bunda e o jeito gracioso de chapear a água das ondas, que vinha lamber-lhe os pés. O seu sotaque e a capacidade de concordar o sujeito com o predicado, indicavam que ela não era nativa. De onde viera? Por que vivia ali? Pensou em fazer-lhe perguntas, mas não quis quebrar o encanto daquele momento. No jantar, descobriu não ser o único hóspede: um casal idoso, com sotaque que não identificou, sentou-se à mesa ao lado e dirigiu-lhe um meigo, mas distante sorriso. Além de Yanai, a pousada tinha, pelo menos naquela semana, mais dois funcionários: um gerente, que ficava em sala separada e um cozinheiro. Yanai era um “faz tudo”: recebia os hóspedes, servia a comida, punha e tirava a mesa e, nas muitas horas vagas, ficava lendo na exígua portaria. Ao buscar a chave de seu quarto, ele, de soslaio, procurou identificar o livro que ela estava lendo: “Ficções do Interlúdio”, de Fernando Pessoa. Ele tinha décadas de Fernando Pessoa, mas não pôde deixar de se surpreender que mulher jovem, talvez não chegada aos trinta, pudesse se interessar por poesia e por um poeta que ressuscitara o “spleen” do começo do século XIX. Já na trigésima página do livro, que começara a ler, percebera estar totalmente desconcentrado: seus pensamentos teimavam em se fixar em Yanai, em seu jeito quase juvenil de gesticular, no seu alvo sorriso largo e... nas suas coxas. Apesar do negrume da noite, resolveu dar uma volta na praia, iluminada, aqui e ali, por vagalumes e cujo silêncio só era quebrado pelo barulho das ondas. De repente, teve a impressão, quase certeza, de que passos se aproximavam. Um frio de medo percorreu-lhe a espinha. Já fora assaltado várias vezes e não suportava a sensação de impotência que, nessas ocasiões, deixava um gosto amargo em sua boca. Ali, naquele lugar ermo, poderia ser morto e ficar até o dia seguinte, para o corpo, já cheirando a decomposição, ser encontrado. A ideia de morrer não o incomodava. Mas que fosse com estilo: de terno e gravata, infarto fulminante, em sua mesa de trabalho. Ou, suprema glória, de beca, no Tribunal, a meio de sustentação oral. Mas ali, naquele lugar afastado, vestindo uma bermuda velha, tênis gasto e sem meias, sem qualquer documento de identidade, seria considerado indigente e enterrado num caixão de madeira pobre. Ele, que sonhava com velório, regado aos uísques, que guardara para a ocasião; um conjunto tocando suas músicas preferidas. Pensou em correr, mas o medo grudava-lhe os pés no chão. Preferiu diminuir os passos, sem olhar para trás: o que tivesse de acontecer, que acontecesse logo. Súbito, uma voz doce, como gorjeio do pássaro amarelo que, rotineiramente passava em sua varanda, tirou-lhe do medo e devolveu-lhe à vida. “O que faz você, andando pela praia, a estas horas?”. Era Yanai, cheirando a banho e vestindo um vestido, cuja cor não podia precisar, mas livre e solto o suficiente para mostrar o começo dos seios e das coxas. Ele falou de seu medo, agora dissipado e ela riu, aquele sorriso largo, que ele já conhecia. Caminharam juntos até o riacho que margeava a montanha e depois voltaram, lentamente, em direção à pousada, conversando banalidades, sobre o possível sol do dia seguinte e a tranquilidade do lugar. Ao subir a escada, que dava acesso ao interior da casa, ela tropeçou, ele amparou-a pelas mãos. Riram e, por alguns segundos, ficaram de mãos dadas. Ele sentiu que estava vivendo um grande perigo. O mesmo perigo de quando, no Arpoador, olhou para V. puxando o biquíni. Seus olhos se cruzaram e, por dois anos, viveram entre o amor intenso e o ódio passional. Mas, ali, naquela noite e naquela escada só importava o calor da mão de Yanai. Convidou-a para conversar mais um pouco e sentaram no sofá de vime da varanda, com o frescor da brisa, que vinha do mar, batendo em seus rostos. Às vezes, os cabelos de Yanai teimavam em cobrir o rosto e ela, meigamente, os afastava, sem interromper a conversa. Fora por cinco anos, professora de história, em colégios particulares de classe média alta, até que um dia, já cansada do quase nenhum interesse dos alunos, resolvera abandonar a carreira. Seus pais morreram em um acidente aéreo, cerda de dois anos, e com o dinheiro do seguro montara aquela pousada, naquele lugar que conhecera nos tempos de “mochileira”. Uma vez por mês ia à São Paulo, fazer compras e o barulho da cidade, o trânsito, a neurose das pessoas, faziam-na voltar correndo para o “Adeus”. O nome era homenagem à definitiva despedida que dera à vida da cidade grande e à imensa tristeza, que se apossou dela com a morte de seus pais. Preferiu receber a indenização que a Companhia Aérea lhe oferecera, a transformar perda tão dolorosa em um medíocre jogo de interesses. Naquele momento da conversa os olhos de Yanai foram tomados por lágrimas e ele se aproximou dela e, com ternura, abraçou-a, enquanto ela pousava a cabeça em seus ombros. Quanto tempo ficaram assim? O suficiente para que o calor do corpo de Yanai passasse para seu corpo. Não era calor que tivesse sexo, mas calor que transmitia um carinho por alguém, que não se via, há séculos. De repente, ela se ergueu num gesto quase brusco, passou as mãos pelos olhos úmidos, deu-lhe boa noite e se retirou, apressadamente, para seu quarto. E ele, por um tempo infinito, ficou ali, sentado, olhando as estrelas e deixando seu pensamento voar, sem pressa e sem rumo, até que os primeiros clarões da aurora avisaram que era hora de dormir. Acordou com um sol forte atravessando a janela. Deixou que o jato do chuveiro o despertasse e de vez; fez a barba, vestiu o calção de banho, a camiseta com o logotipo da “pulma”, enfiou o chinelão de dedo, apanhou a sacola com o livro da véspera e o óleo de praia, e saiu em busca de algum café da manhã. Yanai o esperava com farta mesa de pão e frutas, mas sem sorriso. Seu semblante demonstrava que ela tivera noite atormentada por recordações, das quais preferia ter se esquecido. Os mortos, ao contrário do que diz o poeta, não os conseguimos enterrar. Restam insepultos e aparecem nos momentos mais inesperados. Respeitou o silêncio de Yanai, limitando-se a um bom dia. Ela estava linda, apesar dos olhos apagados: vestia blusa curta, que cobria o biquíni, deixando pedaço de bunda à mostra. Suas coxas roçavam em seus joelho, quando se curvou para servir-lhe o café. Ele teve de fazer um esforço sobre humano para que suas mãos não deslizassem sobre aquele corpo, cheirando à lavanda. Nada se disseram: ela se retirou para a parte interior do restaurante, e ele se levantou e se dirigiu à praia, notando que seu membro ia à frente, como a lhe indicar o caminho. Como no dia anterior, a praia estava vazia. Ao longe, próximo às pedras, onde subira, o casal de velhos, sentados em cadeiras, parecia trocar inocentes afagos. No lado oposto, perto da montanha, uns poucos nativos jogavam bola, enquanto um homem, solitário, brincava nas tímidas ondas. Acomodou-se na cadeira e, após untar seu corpo com bronzeador, retomou, melhor, recomeçou a leitura de véspera. Desta vez concentrou-se nos personagens e na trama, interrompidos quando o calor fez escorrer grossas gotas de suor pelo seu corpo. Entrou, lentamente, no mar, saltando sobre as ondas, ritual que repetia há décadas: o mar era seu elemento natural, corpo de mulher que descobre aos poucos, sorvendo cada pedaço, num ritual mágico. A água morna abraçou-o e o chamou para um mergulho bom e demorado, como permitia o pouco fôlego, de onde emergiu para contemplar toda a paisagem. A água salgada escorreu-lhe pela pele ardida e se lembrou de M., apaixonada pelo mar, como ele, a dizer-lhe que a água escorrendo sobre a pele, dava-lhe a mesma extasiante sensação de esperma, percorrendo-lhe o corpo. Mas ali, naquela praia solitária, mergulhado nas águas de um mar até então desconhecido, M. era fugaz lembrança, que não demorara a ficar. Como um balé que se finda, ele, com a mesma calma da vinda, saiu do mar, de volta à areia. Ao levantar a cabeça, viu alguém sentado, ao lado de sua cadeira. Seu coração bateu forte: seria ela? Apressou o passo, quase correu: era ela, Yanai, cabeça mergulhada entre os braços cruzados. “Oi, tudo bem?” disse ele, quase sussurrando, como se não quisesse interrompê-la de seu refúgio. Yanai ergueu a cabeça e apenas sorriu, um sorriso doce e calmo. “Oh, desculpe-me por ontem, à noite, não quis aborrecê-lo com minhas tristezas”. E se levantou, como quem vai partir, sem nada mais dizer. Ele, no silêncio daquele quase nada, abraçou-a com força, roçou seus lábios nos cabelos de Yanai e depois, docemente, beijou-lhe o rosto. Sentiu seu membro, desobediente a seu comando, enrijecer-se e se encostar nas coxas de Yanai que, ao invés de se afastar, colou seu corpo ao dele. Foi então que os lábios se buscaram freneticamente, e se beijaram e se morderam como, em nova versão do Paraíso, estivessem sozinhos no mundo. Sabiam que estava nascendo uma paixão e, de mãos entrelaçadas, correram para o mar, para comemorarem aquela descoberta do outro.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Uma leitura necessária


Por puro preconceito religioso, chego atrasado à leitura de “Sapiens”. Seu autor, Yuval Noah Harari, é evolucionista, acredita que tudo aconteceu a partir do “big bang” e daí foram milhões de anos de seguidas mutações, de seres inanimados e animados, inclusive nós, homens e mulheres. Eu, cá de mim, ainda creio, como narrado e sacramentado no “Livro do Genesis”, o bom Deus onipotente, criando o céu, a terra, inclusive Adão e Eva. Aí amiga, pra lá de querida, que se diz agnóstica, presenteia-me com “Sapiens”, um pouco para desafiar minhas convicções religiosas. Não as abalou, mas colocou um bocado de bom saber em meu pouco saber, pois  o livro é reunião de antropologia, filosofia, história completa da evolução humana, inclusive com suas contradições. Tudo dito com clareza e consistência. Nunca imaginaria o capitalismo e o comunismo como religião, mas está lá, muito bem posto. E uma sociedade, onde  todas as mulheres transam com todos os homens, de modo que todos podem ser pai de qualquer filho, daí o cuidado não ter identidade. Sociedade primitiva ou sociedade ideal?
Sapiens” é leitura obrigatória, para jovens, que precisam pensar o mundo e para velhos, ainda abertos ao conhecimento.

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Melhor falar que calar


Deu-se, então, que foi morar em nossa rua aquela mulher, de estranho nome, se chamava: Umbertina. Acabara de casar o filho e enterrar o marido, fatos que pareciam lhe trazer grande alegria. Vivia só, mas não em solidão, pois a todos se prendia, seja para “um dedo de prosa”, seja para visita inesperada, a se arrastar até que o dono da casa cochilasse no sofá, ela a falar e ele ou ela a escutar. Comentava tudo que se passava a sua volta e, o que não passava, ela inventava, pois a imaginação foi colocada dentro da cabeça pra isto mesmo. No cinema, preferia filmes de cobois, -  ou cowboys, como dizem os mais sabidos -, a quem, quase aos gritos, prevenia dos perigos, desatenta aos reclamos dos vizinhos de poltrona. Voltava para casa aliviada, certa que a vitória final deveu-se a ela, sempre alerta em defesa dos justos, que índio é bicho traiçoeiro, só ataca pelas costas. Ainda mais índio americano, sempre parrudo, com quem sonhava, à noite, esfregando sua vergonha, na  secura desde que o traste do marido morrera, ele que não prestava para nada, beberrão, vagabundo, mas que era danado de bom nas coisas de sem-vergonhice. Uma vez por ano, dona Umbertina sumia por uns quinze dias. Contava que entrava numa excursão de terceira idade e batia perna pelas estradas. Quando voltava, vinha cheia de histórias e falava, até ficar sem voz e o ouvinte sem ouvido. Quantos anos davam para Umbertina? Talvez sessenta, talvez quase setenta, mas, pela bunda ainda empinada e pelos seios fartos, despertava interesses vadios, principalmente do jornaleiro, onde comprava revistas de fofocas noveleiras. Todavia, para respeitar a verdade, é preciso que se diga que nunca esteve envolvida em safadeza. Falava da vida de todo mundo, menos da dela, que devia ser segredos sepultados. Um dia, foi a minha casa, olhos inchados de quem chorara muito. Arrastou minha tia, que morava conosco, e foi para o quarto. Inútil escutar pela porta, que elas falavam baixinho, aliás, só ela falava e, de vez em quando, desandava a soluçar e só se ouvia mesmo o soluço e o gemido doído de alguma coisa que doía muito. Saiu de mansinho, mal chegava ao portão e nós cercando a tia para saber porque dona Umbertina, sempre tão cheia de risada e falação, chorava como, em final de novela, quando  a preterida vê seu amor casar com sua melhor amiga. A tia, depois de muito não falo, preparado  só para fazer suspense, como nos filmes de terror, acabou contando que o médico descobriu dona Umbertina ser portadora de câncer nas cordas vocais e que, em pouco tempo, ela ficaria muda. Ninguém podia imaginar dona Umbertina mergulhada em definitivo silêncio. Passamos a olhá-la com compaixão, ela cada vez mais abatida, não aparecia mais para a novela das oito, trancada em casa com sua infelicidade. Aí sucedeu que passou o fim-de-semana sem ninguém ver dona Umbertina, nem à missa foi. Esqueci de contar que ela possuía um cachorro, vira-lata, chamado Sultão que, logo no amanhecer da segunda feira, começou a latir, latido que se tornou uivo,  que chamou nossa atenção e dos outros vizinhos. Alguém pulou o muro da casa de dona Umbertina e, da porta da frente, saía cheiro nauseabundo. Logo, várias pessoas se juntaram, dando palpites sobre o que fazer, até que seu Germano, com a autoridade de sargento aposentado, deu a decisão:- “vou entrar pelo fundos e não quero  ninguém atrás de mim”. Como autoridade é autoridade, todos obedeceram, apesar dos resmungos de dona Matilde, que era a melhor amiga de Umbertina, que tinha prioridade, que Germano mal falava com a dita cuja. Passados poucos minutos, o ilustre representante das forças armadas saiu pela porta da frente. Estava lívido, com um pedaço de papel na mão. Encontrara dona Umbertina morta, um copo de formicida ao lado. No pedaço de papel, deixara sua despedida: “sem poder falar, melhor morrer.”

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Nosso idioma, ontem e hoje


De tempos longevos, vem-me à memória o purismo do professor Soares Amora, a pretender afastar de nosso idioma todas as palavras usurpadas de idiomas estrangeiros. Luta, bravamente, contra  os galicismos e anglicismos, luta perdida, pois o idioma, qualquer idioma, em sua evolução dinâmica, sofre a influência de culturas mais sedimentadas. O Português, que se fala e se escreve por aqui, até o final da segunda grande guerra, assimilou palavras e expressões francesas, até porque Paris era o destino dos fazendeiros de café que, até então, dominavam a economia brasileira. Com o passar do tempo, palavras como “chauffer”, “abât-jour” foram “traduzidas” e incorporadas a nosso vernáculo, como chofer e abajur. Após 1945, principalmente pelo massacre a que nos impôs Hollywood, os Estados Unidos passaram a ser nossa Meca cultural e as novas gerações, na música, no vestir e até no comportamento passaram a gravitar em torno daquele País. Hoje, qualquer garoto de 10 anos, pelo menos, arranha o Inglês, até porque, se não o fizer, fica fora do mundo dos “games”, o que é fatal. A diferença é que nem se dão ao trabalho de traduzir palavras cibernéticas.  Usam-nas, no original e vida que segue... menos para analfabetos, como eu. Conto, sem pudor, que certa feita, uma de minhas noras enviou-me mensagem, convidando-me a participar de seu “linkedin”. Não respondi, porque não tinha a menor ideia do significado daquela palavra, com jeito de  mineirês”, nós que falamos “docim”, “brinquedim” e até tempos  cidade chamada “Betim”. Continuo desconhecendo o sentido desse palavreado, que faz com que chame computador de Vossa Excelência. Não navego na internet, ando de canoa, o que já está pra lá de bom.
Considero absolutamente normal estas incorporações a nosso idioma, de palavras e expressões estrangeiras, a ponto de a geração, que nasceu com a informática, ter criado vocabulário próprio, repleto de catacreses, palavra que emprego só para me exibir. O que,  realmente, me provoca arrepios é o uso de expressões que, de tempo em tempo, são usadas até por gente metida a intelectual. Houve uma época em que a moda  era empregar a expressão “via de regra”, que abria e fechava qualquer diálogo. Caiu em desuso ( o que foi oportuno, porque, ao pé da letra, significa o trajeto do fluxo menstrual), sendo substituída por outra, mais tenebrosa:  a nível de” que, rigorosamente, nada significa a não ser que quem a usa é pernóstico e ignorante. De uns tempos prá cá, está todo mundo “colocando opinião”, ao invés de, simplesmente opinar. Ontem, mesmo, no jornal da “Globonews”, o  jornalista Camarote ‘colocou”, à vontade, sobre o encontro de Trump com o norte-coreano. O saudoso Otto Lara Rezende, em uma de suas crônicas, chamava de bestialógicas essas expressões, sem conexão com a realidade semântica e que, de repente, incorporam-se ao linguajar cotidiano.
Quando tiver um “tempim”, vou pesquisar para descobrir como essas cretinices entraram no vocabulário, contaminando, inclusive, ilustres jornalistas, como o acima citado.

sexta-feira, 8 de junho de 2018

Pequena e boa história


Antigamente, na  Borgonha, os lobos viviam às soltas. Rondavam pelas florestas e, em tempo de escassez, erravam pelas ruas de cidades e aldeias. Consta que, no século X, suas alcateias eram tão grandes e selvagens que forçaram os duques da Borgonha a trocar Auxerre, sua capital fustigada pelo vento, pelo clima mais resguardado de Dijon. Era a maldição dos lobos, declararam os duques; o infortúnio se emboscava onde quer que as feras fossem encontradas.
Hoje em dia, muitos zombam dessas histórias, mas os velhos juram que são verdadeiras. Monsieur Le Brun, que viveu em Auxerre pouco antes da Segunda Guerra Mundial, contou: “Os lobos  costumavam nos importunar um bocado. Sempre foi assim nas regiões de vinicultura. Como os animais selvagens aprendem a comer tudo que encontram, tínhamos de vigiar as uvas.”
Isso era especialmente verdadeiro em tempos de escassez. Ao longo dos séculos, as regiões pedregosas em que a uva é cultivada na França, cujo solo é impróprio para outros tipos de cultura, foram com frequência assoladas pela fome e tornaram-se uma atração irresistível para lobos esfaimados que sobreviviam comendo uvas. Mas as pessoas notavam algo de estranho. Segundo Monsieur Le Brun, as uvas tinham um efeito euforizante sobre os lobos. “suspeito que o estômago do lobo é formado de tal modo que a fermentação  dos sucos da fruta tem lugar rapidamente depois que o animal come as uvas. Seja como for, o resultado é frequentemente a embriaguez.”
Cenas como essas são raramente vistas hoje, já qu e a maior parte dos lobos foi exterminada, mas Monsieur Le Brun conta que se lembra de ter visto uma alcateia bêbada correndo junto à sua casa. “Entraram exatamente por esta rua”, disse ele, apontando a ruela calçada de pedras que corria pelo meio da cidade. “Poucos dos que viram a cena irão esquecê-la.”
“Os lobos estavam todos embriagados. Era isso, para começar, que os fazia entrar na cidade, e era também o que salvava os moradores depois que entravam. Estavam bêbados demais para lembrar que eram lobos.”
Os moradores, encolhidos em suas cabanas, espreitavam aparvalhados os animais que corriam pelas ruas, uivando e babando, antes de cair em letargia.
“Eles simplesmente se deitavam na rua, estuporados de bêbados”, disse Monsieur Le Brun.
Obs: extraído do Livro “Vinho & Guerra” de “Don e Petie Klasdtrup

quarta-feira, 30 de maio de 2018

E agora, Petrobrás?


Felizmente, terminou a crise gerada pela paralisação dos caminhoneiros, deixando salgada conta a pagar e a certeza de que o governo Temer arrasta-se, para chegar a melancólico final. A equipe econômica esfacelou-se com a saída de Meirelles e o ilustre desconhecido, que assumiu a Pasta da Fazenda, enrolou-se na hora de explicar de onde tirar recursos para tapar o rombo com o subsídio ao diesel. Parece que, como nos filmes, em que o mordomo é sempre o culpado, vai sobrar para os “frentistas” dos postos de gasolina, já que, dentre as propostas, está a de incentivar bombas de auto-atendimento.  Aliás, pensando bem, concordo que se punam esses privilegiados trabalhadores que, ao longo da semana, ficaram a nos repetir: “não tem gasolina”. Com toda certeza, desviaram eles combustível para suas “Ferrari” ou jatos particulares. Mas a crise passou e, apesar dos decretos e medidas provisórias, não está ela, pelo menos, equacionada, com o presidente da Petrobrás afirmando que nada muda no critério de aumento dos combustíveis: subiu o dólar ou o preço do petróleo, no mercado internacional, tome-lhe aumento. Some-se aos prejuízos da semana o caráter (ou a falta dele) dos que especularam com as ações da Petrobras e os donos de postos que chegaram a vender gasolina a 10 reais. Êta povinho mal acabado! Afinal, depois de quase 03 décadas, se somos quase autossuficientes em petróleo, por que tanta dependência do mercado externo? Alguém aí, em linguagem simples, poderia explicar por que não refinamos todo o petróleo produzido, por aqui? Outro dia, Rodolfo, meu politizado pastor alemão, perguntou-me se era verdade que o Brasil exportava petróleo bruto e importava seus derivados. Tive vergonha de responder e, até ontem, ele me cobrava a resposta. Hoje, ao sair, ele me “fechou”, exigindo esclarecimento lógico. Respondi-lhe que não reunia elementos para tanto e o mundo da economia, com suas abstrações, cálculos de probabilidades, linguagem indecifrável, estava muito além de meu raquítico saber. Cliente, que se tornou amigo querido – Norberto de Camargo Engelender é seu nome -, emérito Professor universitário, presenteou-me com livro de sua autoria, “Dicionário Básico de Economia e Finanças”, que, nestes dias conturbados, consulto, como recorro ao “Aurélio”. Aprendi, por exemplo, que além de cambio de automóvel, tem-se “cambio cooperativo”, “cambio flutuante” e alguns outros que, na primeira oportunidade, vou citar, só para me gabar. Estou na letra “c” do dicionário do Norberto e, se alcançado os 90 anos, chegarei, pelo menos, à letra “p”, onde identifiquei expressão para deixar todo mundo de queixo caído: “paradoxo de parcimônia”. Ainda não tenho a mínima ideia do que seja, mas, pelo jeitão, parece coisa de Platão. Aliás, a meu canhestro juízo, o grande equivoco que comentem muitos economistas, inclusive o senhor Paulo Parente, é esquecer que a ciência, que os rege, chama-se “economia política” e, sendo também política, o êxito de seu funcionamento depende das condições políticas de momento. Ora, tais condições “de momento” não permitem que os caminhoneiros e a população, , em geral, assimilem aumento de combustível toda vez que o dólar oscilar para cima, ou aumentar o preço do barril de petróleo, no mercado internacional. Nossa realidade política é do desemprego, atingindo 12 milhões de trabalhadores; é dos salários achatados; é da absurda concentração de renda; é da preponderância das atividades especulativas como, por exemplo, ignominioso cartel formado pelos bancos e seus lucros estratosféricos. Como a Petrobrás vai equilibrar as finanças, este é o problema para ela e seus “cientistas” resolverem. O que me parece – ignorante que sou – incompreensível é empresa, que tem o monopólio da exploração e distribuição do petróleo e seus derivados, esteja graduada abaixo daquela que produz e vende cerveja e refrigerante. Acho que preciso consultar meu caro Norberto.

terça-feira, 29 de maio de 2018

Ciro Gomes, o retorno


O programa “Roda Vida” de ontem, 28, brindou-nos com a presença de Ciro Gomes, o destemperado que, depois de várias  lambanças partidárias, sentou praça no PDT, de onde se lançou candidato à presidência da República. Em duas horas de programa,  redescobriu e equacionou todos os agudos problemas do País. Implantará rede ferroviária capaz de minimizar nossa dependência do transporte rodoviário. Reduzirá a população carcerária e criará “Polícia de Fronteira”, munida de drones, barcos possantes, helicópteros e outros equipamentos modernos, o que impedirá o contrabando e o tráfico internacional de drogas. Dará nova dinâmica à segurança pública, principalmente na apuração de delitos graves, como o homicídio. Na educação, encontra-se com as ideias de seu guru, Mangabeira Unger, que propõe um “ensino de confronto”, de modo que o aluno, recebendo mensagens antagônicas, possa melhor formar juízo de valor. Para resolver o rombo da previdência, Ciro, o indomável, propõe remover da Constituição Federal a cláusula pétrea que protege o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Perguntado como conseguiria recursos para viabilizar tantos projetos, Ciro, o magnânimo, propõe aumentar impostos existentes e criar novos. Perguntado como interveriria na segurança pública, cuja competência, nos termos da Constituição, é das unidades federativas, propõe mudar a Carta Magna. Ciro, o venturoso, apregoa sua competência, a partir de sua “exitosa” passagem pelo governo do Ceará, a seu juízo, o quinto Estado da Federação, mas, na verdade, como dizem os números, está lá pelo 10º lugar, sendo sua Capital, Fortaleza, uma das mais violentas do País. Ciro, o sempre efêmero, projeta que seu partido fará 60 deputados e 05 senadores e com essa pífia bancada julga que modifica a Constituição, altera e cria novos tributos. Não desdenha a possibilidade de formar alianças, menos com o MDB, a seu sentir, partido político formado por marginais, de todo o gênero. Ciro, o verborrágico, chamou Pedro Parente, presidente da Petrobrás de entreguista, a serviço das multinacionais do petróleo; atirou em Temer, a quem apelidou de escroque e, mesmo asseverando não ter provas, afirmou que as instituições paulistas selaram acordo com o PCC, facilitando o comércio de drogas.
O tempo passou, o corpo ganhou forma mais volumosa, os cabelos rarearam e embranqueceram, mas Ciro continua tresloucado, confundindo altivez com valentia pessoal.
Ciro Gomes, pelas ideias expostas, ontem, não é candidato a presidente, mas a ditador do Brasil.

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Rodolfo, eu e a Venezuela


Rodolfo, meu politizado pastor alemão, desde domingo à noite, insiste em conversar comigo. O frio, este inimigo de sempre, suspendeu nossos passeios noturnos, rápidos passeios, mas que serviam para comentarmos os assuntos do dia. Ontem, após o jantar, todos recolhidos, procurei-o, até porque amigo está acima das oscilações da temperatura. Refugiamo-nos no fundo da garagem. Rodolfo não é chegado a conflitos existenciais, por isso o assunto só podia ser... política. E era! Rodolfo queria minha opinião sobre a vitória de Nicolás Maduro, na Venezuela. Para sua irritação, respondi-lhe que tinha sido contundente, pois Maduro tivera o triplo dos votos de seu opositor. Fez-se, assim, a vontade da esmagadora maioria do povo. Rodolfo não se conteve: “mas os mais importantes países do mundo, inclusive o Brasil, não reconheceram a eleição de Maduro, sob alegação de fraude”. Respondi-lhe que: “ é sempre assim, quando o eleito não é o “nosso”  candidato, a eleição foi fraudada. E outra coisa: o Brasil, a França e outros não reconhecerem Maduro, como presidente eleito, nada, rigorosamente, nada significa, é mero ato político. A Venezuela se sustenta com a alta produção de petróleo, vendido, em maior parte, para a China, que, diga-se de passagem, reconheceu a  legalidade da eleição. Eu, cá de mim, espero que a elevação do preço do barril de petróleo, no mercado internacional, promova melhor condição de vida da população venezuelana”. Rodolfo, que anda lendo o “Estadão” e assistindo ao noticiário da “Globonews”, não se deu por vencido: “mas como, com o povo a viver com  inflação de 50.000%, sem ter o que e onde comprar até papel higiênico, fugindo do País, não seria o caso de intervenção militar externa, para depor Maduro?” – “Devagar com o andor, Rodolfo! O Brasil, no governo Sarney, já conviveu com inflação elevada e desabastecimento de gêneros alimentícios, alguns, como a carne, encontrados apenas no mercado negro. Ultrapassamos esses obstáculos e vida que seguiu, inflação controlada, abastecimento pleno. Quanto ao problema da imigração de venezuelanos, este é dominante entre povos não desenvolvidos que buscam outros países, como alternativa de melhores condições de vida. Agora mesmo, muitos brasileiros estão se transferindo, principalmente para Portugal e Estados Unidos, seja em virtude do achatamento de nosso mercado de trabalho, seja por motivos de segurança pessoal. Aliás, o Brasil, desde final do século 19 recebeu italianos, árabes, japoneses, alemães que foram fundamentais ao desenvolvimento nacional. E ainda tivemos, como fator importante do crescimento paulista, as correntes migratórias, vindas, principalmente do nordeste, quando do surgimento da indústria automobilística. Portanto, meu caro Rodolfo, imigração, desde que controlada, não é nenhum bicho papão. Não tenho qualquer simpatia pelo Maduro, com aquele jeitão de psicopata, mas tenho certeza que, com a nova alta do petróleo, a economia da Venezuela voltará a se recuperar.” Já subindo a escada, Rodolfo continuou: “mas o Trump ameaça retaliar. Isto não pode resultar naquela intervenção, a que me referi?” – “Bobagem, Rodolfo,  Trump está preocupado é com o Oriente Médio. A América Latina tem pouca, para não  dizer nenhuma, importância geopolítica, não oferecendo qualquer risco para os Estados Unidos. Os países que contam – Brasil, Argentina e Chile – são aliados dos norte americanos, até por dependência econômica”.
Não sei se convenci Rodolfo, que desceu a escada, balançando a cabeça, com aquele ar de “não sei, não!”

sexta-feira, 18 de maio de 2018

Uma história para ser esclarecida


Reapareço, confesso, com profunda má vontade, mas, torna-se necessário reaparecer para apontar fato que passou desapercebido de muitos e foi, intencionalmente, omitidos por outros, estes coniventes ou interessados que esse fato fique escondido, debaixo do tapete. Não quero acusar ninguém, mas tão somente apontar o fato, para que se possam tirar dele as devidas conclusões. Então, vamos lá: a LIDE, empresa do senhor João Doria, tem por escopo aproximar empresários de importantes agentes públicos para realização de negócios ou satisfação de interesses. Com frequência, promove esses encontros ou na paradisíaca Ilha de Comandatuba, ou em algum hotel de finíssimo trato, em Nova York. Poderíamos concluir seja a LIDE poderosa lobista que proporcionou a Doria fortuna de cerca de 01 bilhão de reais. Sorte e competência dele, apesar de achar, pelo menos desconfortável, Prefeito e  candidato a governador de São Paulo no movediço ramo de intermediação de negócios. Acontece, porém, que, esta semana, destacado personagem, regiamente remunerado, compareceu, como palestrante, em evento internacional, promovido pela LIDE, em Nova York. Essa augusta personalidade é Sergio Moro, o heroico caçador de corruptos de todo o gênero que,  sorridente, como convém a bom aliado, deixou-se fotografar e filmar ao lado do fugidio ex-prefeito. Alguma dúvida que eles, os filmes e fotos, serão exibidos, como troféus raros, na campanha de Doria, para Governador? Não vou indagar se existem interesses velados nessa exibição pública, até porque, como diria o Conselheiro Acácio, se são velados é para que ninguém deles tome conhecimento. Indago, isto sim, se Moro não deveria se sentir constrangido em servir de cabo eleitoral a um político, que vai construindo melancólica história. Se não agride sua respeitabilidade, que se tornou símbolo, neste amargurado País, se não mancha sua nigérrima toga, ir saracotear em Nova York, “all included”, por conta de um empresário sem empresa, que acumulou riqueza promovendo encontros, onde e para que, não se sabe. O que se sabe é que o heroico paladino de Curitiba mandou trancafiar dezenas de intermediários de negócios escusos, no trágico episódio do “petrolão”. Longe de mim, até mesmo, insinuar que Doria e sua LIDE se envolveram em negócios escusos. Cá do meu humilde canto, longe da luz dos refletores, só sei o que conta a mídia e alguns amigos, instalados nas primeiras filas. Entretanto o que sei é que Sergio Moro, sempre de lança em riste (epa!), deveria explicar a seus admiradores (dentre os quais não me incluo) o que foi fazer em Nova York, quem pagou a conta e se sua relação com Doria, o fugitivo,  é “namoro ou amizade”. Este é o fundo da questão. O resto são encenações políticas, contribuições personalíssimas, vaidades e ambições que não se coadunam com a imagem de Magistrado, qualquer Magistrado, mas principalmente,  a de quem foi ungido a salvador da pátria.