sexta-feira, 8 de junho de 2018

Pequena e boa história


Antigamente, na  Borgonha, os lobos viviam às soltas. Rondavam pelas florestas e, em tempo de escassez, erravam pelas ruas de cidades e aldeias. Consta que, no século X, suas alcateias eram tão grandes e selvagens que forçaram os duques da Borgonha a trocar Auxerre, sua capital fustigada pelo vento, pelo clima mais resguardado de Dijon. Era a maldição dos lobos, declararam os duques; o infortúnio se emboscava onde quer que as feras fossem encontradas.
Hoje em dia, muitos zombam dessas histórias, mas os velhos juram que são verdadeiras. Monsieur Le Brun, que viveu em Auxerre pouco antes da Segunda Guerra Mundial, contou: “Os lobos  costumavam nos importunar um bocado. Sempre foi assim nas regiões de vinicultura. Como os animais selvagens aprendem a comer tudo que encontram, tínhamos de vigiar as uvas.”
Isso era especialmente verdadeiro em tempos de escassez. Ao longo dos séculos, as regiões pedregosas em que a uva é cultivada na França, cujo solo é impróprio para outros tipos de cultura, foram com frequência assoladas pela fome e tornaram-se uma atração irresistível para lobos esfaimados que sobreviviam comendo uvas. Mas as pessoas notavam algo de estranho. Segundo Monsieur Le Brun, as uvas tinham um efeito euforizante sobre os lobos. “suspeito que o estômago do lobo é formado de tal modo que a fermentação  dos sucos da fruta tem lugar rapidamente depois que o animal come as uvas. Seja como for, o resultado é frequentemente a embriaguez.”
Cenas como essas são raramente vistas hoje, já qu e a maior parte dos lobos foi exterminada, mas Monsieur Le Brun conta que se lembra de ter visto uma alcateia bêbada correndo junto à sua casa. “Entraram exatamente por esta rua”, disse ele, apontando a ruela calçada de pedras que corria pelo meio da cidade. “Poucos dos que viram a cena irão esquecê-la.”
“Os lobos estavam todos embriagados. Era isso, para começar, que os fazia entrar na cidade, e era também o que salvava os moradores depois que entravam. Estavam bêbados demais para lembrar que eram lobos.”
Os moradores, encolhidos em suas cabanas, espreitavam aparvalhados os animais que corriam pelas ruas, uivando e babando, antes de cair em letargia.
“Eles simplesmente se deitavam na rua, estuporados de bêbados”, disse Monsieur Le Brun.
Obs: extraído do Livro “Vinho & Guerra” de “Don e Petie Klasdtrup

Nenhum comentário:

Postar um comentário