“Antigamente, na Borgonha, os lobos viviam às soltas. Rondavam
pelas florestas e, em tempo de escassez, erravam pelas ruas de cidades e
aldeias. Consta que, no século X, suas alcateias eram tão grandes e selvagens
que forçaram os duques da Borgonha a trocar Auxerre, sua capital fustigada pelo
vento, pelo clima mais resguardado de Dijon. Era a maldição dos lobos,
declararam os duques; o infortúnio se emboscava onde quer que as feras fossem
encontradas.
Hoje em dia, muitos
zombam dessas histórias, mas os velhos juram que são verdadeiras. Monsieur Le
Brun, que viveu em Auxerre pouco antes da Segunda Guerra Mundial, contou: “Os
lobos costumavam nos importunar um
bocado. Sempre foi assim nas regiões de vinicultura. Como os animais selvagens
aprendem a comer tudo que encontram, tínhamos de vigiar as uvas.”
Isso era especialmente
verdadeiro em tempos de escassez. Ao longo dos séculos, as regiões pedregosas
em que a uva é cultivada na França, cujo solo é impróprio para outros tipos de
cultura, foram com frequência assoladas pela fome e tornaram-se uma atração
irresistível para lobos esfaimados que sobreviviam comendo uvas. Mas as pessoas
notavam algo de estranho. Segundo Monsieur Le Brun, as uvas tinham um efeito
euforizante sobre os lobos. “suspeito que o estômago do lobo é formado de tal
modo que a fermentação dos sucos da
fruta tem lugar rapidamente depois que o animal come as uvas. Seja como for, o
resultado é frequentemente a embriaguez.”
Cenas como essas são
raramente vistas hoje, já qu e a maior parte dos lobos foi exterminada, mas
Monsieur Le Brun conta que se lembra de ter visto uma alcateia bêbada correndo
junto à sua casa. “Entraram exatamente por esta rua”, disse ele, apontando a
ruela calçada de pedras que corria pelo meio da cidade. “Poucos dos que viram a
cena irão esquecê-la.”
“Os lobos estavam todos
embriagados. Era isso, para começar, que os fazia entrar na cidade, e era
também o que salvava os moradores depois que entravam. Estavam bêbados demais
para lembrar que eram lobos.”
Os moradores,
encolhidos em suas cabanas, espreitavam aparvalhados os animais que corriam
pelas ruas, uivando e babando, antes de cair em letargia.
“Eles simplesmente se
deitavam na rua, estuporados de bêbados”, disse Monsieur Le Brun.
Obs:
extraído do Livro “Vinho & Guerra”
de “Don e Petie Klasdtrup”
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