sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Misteriosa estória da infância


A casa, onde nasci e morei, até os 15 anos, era sobrado, debruçado sobre a rua e, ao fundo, dois quintais que terminavam no morro. O primeiro quintal era adornado por árvores frutíferas, das quais me recordo da figueira e da mangueira, onde improvisávamos balanço e imitávamos o “Tarzan” da época. O segundo quintal era meio inóspito e, em seu capim alto eu me escondia do pai, tão logo vinha a público o famigerado boletim. Para meu desalento, tinha, como professora, a tia, que morava conosco e “entregava” os malfeitos. Aí o chinelo “cantava” e as únicas  marcas deixadas foi a saudade da vida risonha e inocente. Não deve ter sido fácil, para minha mãe, criar, ao mesmo tempo, 08 filhos e 04 sobrinhos, mas foi ela, até morrer, guerreira indômita, além de fazer doce de goiaba e empadão de galinha de comer, em êxtase. Até hoje, quando vou visitá-la no Cemitério do Araçá, sigo nas expectativa de encontrar esses dois pratos. Sem ser carola, era assídua devota e frequentadora da Igreja e me lembro de alguns padres, almoçando conosco. Pois certa feita, viveu ela estranha experiência: meu pai tinha saúde frágil, tanto assim que morreu aos 56 anos. Em uma de suas doenças, entrou literalmente em coma e não havia médico ou remédio que o fizesse despertar. Em estado de desespero, minha mãe foi bater, lá para as bandas do “Veneta”, bairro pobre da cidade, onde, segundo constava, morava uma “mãe de santo”, dotada de super poderes. E lá foi dona “Neném”, preconceitos deixados de lado, porque o marido era muito mais importante. A tal mãe de santo nem mesmo sabia de nossa existência, mas deu preciso e contundente diagnóstico, que reproduzo, sem fidelidade, mas verdadeiro, na essência: “minha senhora, no quintal de sua casa, há uma figueira. Cave ao pé dela e encontrará, enterrado, um chumaço de cabelo de seu marido. Queime-o, que ele ficará bom”. Assim minha mãe o fez e, antes que as cinzas se espalhassem pelo ar, meu pai abriu os olhos e pediu mingau de fubá, uma de suas comilanças preferidas. Não explico e não busco explicação, apenas conto como vi e vivi.

Nenhum comentário:

Postar um comentário