sexta-feira, 8 de maio de 2015

O Ventre aberto da Avenida Paulista


Já falei do especial carinho, que tenho, pela Avenida Paulista, que, como mulher bem cuidada, conserva seus encantos e seu charme, apesar da idade avançada. Muita coisa se perdeu, desde quando a percorria, de bonde, lá pelo começo dos anos 60, vindo da Vila Mariana e indo em direção ao ‘’Fasano’’, lá nas proximidades da Augusta, e onde se comia uma coxinha, recheada de catupiry, a arrancar suspiros de prazer. Em nome do progresso, as grandes mansões, como a dos ‘’Matarazzo’’, foram derrubadas para, em seu lugar, erguerem-se imponentes edifícios. Para lá, em um primeiro momento, transferiu-se o centro financeiro da Capital, banido pelo irrecuperavelmente decaído ‘’Cento Velho’’. Mudou a avenida, mas não mudou sua elegância. Hoje, todavia, fui encontrar um amigo, de cujo Escritório, no 11° andar, têm-se ampla visão da avenida. Ei-la, rasgada ao meio, mulher, ventre aberto, parto inacabado, mostrando estranhas entranhas, pernas abertas, útero rasgado, sob forma de imundos tapumes, produto da incúria administrativa dos que, movidos, exclusivamente pela ganância de poder, não guardavam qualquer identidade, com nossa desventurada cidade. No ventre aberto, pretende-se construir, a preço de ouro (o velho e suspeito interesse pessoal), ciclovia que, como tantas espalhadas pela cidade, restará ociosa, à exceção dos domingos. Enquanto isto, ventre estaticamente exposto, a avenida se ensurdece e se asfixia com os congestionamentos, rotina de todos os dias e horas. Sinto vergonha e pena da avenida, como, de resto, de outros lugares abandonados: a Praça da Sé, ocupada por vagabundos, punguistas e fumadores de crack. O Pátio do Colégio, cercado pelo Tribunal de Justiça, de um lado e pela Casa de Anchieta, do outro e transformado em pista de skate. A Praça João Mendes, ornamentada por ‘’jovens putas da tarde’’.
Em vão, procuro estrada, que me conduzirá a Pasárgada. Informam-me que foi interditada por falta de manutenção.

‘’Resistir, quem há de?’’

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