terça-feira, 4 de julho de 2017

Por uma leitura obrigatória



Não tenho o privilégio de conhecer, pessoalmente, o Dr. Drauzio Varella, visitando-o, regularmente, em seus artigos de jornal e esporádicas aparições televisivas, sempre promovendo campanhas, em favor da saúde pública. Fala, com a simplicidade de um amigo, com quem se bate papo descontraído, na sala de estar. Sem ser contestatório, declara-se despido de religiosidade e ideologia, apenas para  ser livre para pensar e dizer, sem amarras, o que pensa. Acabei de ler – e o fiz quase sem tomar fôlego – sua última obra, “Prisioneiras”, onde narra sua experiência, tirada do convívio com presidiárias, depois de longo curso, convivendo com presos masculinos. São quase 30 anos de trabalho voluntário, ouvindo histórias de variados crimes, passadas ao leitor, sem emitir juízo de valor. Como ele mesmo declara, não é juiz nem Deus, para julgar o ser humano. Apenas procura entender a motivação do crime, para melhor se relacionar com o criminoso. Muita coisa, que ele narra, no livro, eu já conhecia, até por dever de ofício, apesar do desconforto, da quase angústia, que sinto, quando vou visitar cliente preso. A prisão degrada o ser humano e, em muitos casos, poderia ser substituída por penas alternativas, com o que Drauzio concorda. Os casos relatados confirmam ser pura  falácia o preceito constitucional, segundo o qual a pena não pode passar da pessoa do preso. Passa sempre, porque desagrega a família, deixando ao desamparo filhos e esposa. E é, neste vácuo social, que entram organizações criminosas, como o “Comando Vermelho” e o “PCC”, protegendo o preso, a ele e sua família, em troca de colaboração e fidelidade. Segundo dados coletados junto às detentas, o PCC tem, só no Estado de São Paulo, mais de 60 mil integrantes diretos e mais de 100 mil indiretos,  com  estrutura organizacional de fazer inveja às grandes empresas.  Qual empresa, fundada em 1992, possui, 25 anos depois, tantos funcionários e fatura, só em nosso Estado, cerca de 01 bilhão, por ano, livre de tributos e encargos sociais? Drauzio confirma o que eu imaginava: a destruição da Casa de Detenção foi irresponsável demagogia do Poder Público, vez que  provocou, ainda mais, a superpopulação dos CDPs – “Centro de Detenção Provisória” (que de provisória não tem nada!) - e dos presídios do interior. Drauzio informa, com base em dados consistentes, que, para resolver o problema da superpopulação carcerária, o Estado de São Paulo deveria  construir, de imediato, 140 presídios e mais um a cada ano, vez que o fluxo de entrada de presos é muito maior do que o da saída. Pela leitura do livro, fácil concluir que, se todas  as facções criminosas se unissem, formariam uma “central”, com poderes, até mesmo para eleger o Presidente da República. “Prisioneiras” demonstram o efetivo papel da mulher – a presa e a, em liberdade – no mundo do crime, seja introduzindo a droga nos presídios, seja transmitindo ordens do “Comando”. Destaco parágrafo do livro, a nos levar à reflexão sobre a não legalização do uso da droga:
os  ganhos proporcionados  pelo tráfico são tão grandes que é impossível separá-los da violência urbana e da criminalidade. De uma forma ou de outra, por trás dos roubos, assaltos, contrabando, sequestros, assassinatos e chacinas, estão o uso e o comercio de drogas ilícitas”. (pag. 265)
Com base em “estudos conduzidos com metodologia científica”, Drauzio nos apresenta os fatores de risco da violência urbana que, infelizmente, transformaram-se em realidade objetiva: infância negligenciada; falta de orientação, que imponham limites ao adolescente; e convivência com marginais.
 A leitura de “Prisioneiras” deixa-nos a sensação que perdemos a guerra contra a marginalidade e, se o Estado quiser reverter esta derrota, Drauzio Varella deve ser o comandante supremo dessa batalha.

Nenhum comentário:

Postar um comentário