Não tenho o privilégio de conhecer, pessoalmente, o Dr.
Drauzio Varella, visitando-o, regularmente, em seus artigos de jornal e
esporádicas aparições televisivas, sempre promovendo campanhas, em favor da
saúde pública. Fala, com a simplicidade de um amigo, com quem se bate papo
descontraído, na sala de estar. Sem ser contestatório, declara-se despido de religiosidade
e ideologia, apenas para ser livre para
pensar e dizer, sem amarras, o que pensa. Acabei de ler – e o fiz quase sem
tomar fôlego – sua última obra, “Prisioneiras”,
onde narra sua experiência, tirada do convívio com presidiárias, depois de
longo curso, convivendo com presos masculinos. São quase 30 anos de trabalho
voluntário, ouvindo histórias de variados crimes, passadas ao leitor, sem
emitir juízo de valor. Como ele mesmo declara, não é juiz nem Deus, para julgar
o ser humano. Apenas procura entender a motivação do crime, para melhor se
relacionar com o criminoso. Muita coisa, que ele narra, no livro, eu já conhecia,
até por dever de ofício, apesar do desconforto, da quase angústia, que sinto,
quando vou visitar cliente preso. A prisão degrada o ser humano e, em muitos
casos, poderia ser substituída por penas alternativas, com o que Drauzio
concorda. Os casos relatados confirmam ser pura falácia o preceito constitucional, segundo o
qual a pena não pode passar da pessoa do preso. Passa sempre, porque desagrega
a família, deixando ao desamparo filhos e esposa. E é, neste vácuo social, que
entram organizações criminosas, como o “Comando
Vermelho” e o “PCC”, protegendo o
preso, a ele e sua família, em troca de colaboração e fidelidade. Segundo dados
coletados junto às detentas, o PCC tem, só no Estado de São Paulo, mais de 60
mil integrantes diretos e mais de 100 mil indiretos, com estrutura organizacional de fazer inveja às
grandes empresas. Qual empresa, fundada
em 1992, possui, 25 anos depois, tantos funcionários e fatura, só em nosso
Estado, cerca de 01 bilhão, por ano, livre de tributos e encargos sociais?
Drauzio confirma o que eu imaginava: a destruição da Casa de Detenção foi
irresponsável demagogia do Poder Público, vez que provocou, ainda mais, a superpopulação dos
CDPs – “Centro de Detenção Provisória”
(que de provisória não tem nada!) - e dos presídios do interior. Drauzio
informa, com base em dados consistentes, que, para resolver o problema da
superpopulação carcerária, o Estado de São Paulo deveria construir, de imediato, 140 presídios e mais
um a cada ano, vez que o fluxo de entrada de presos é muito maior do que o da
saída. Pela leitura do livro, fácil concluir que, se todas as facções criminosas se unissem, formariam
uma “central”, com poderes, até mesmo
para eleger o Presidente da República. “Prisioneiras”
demonstram o efetivo papel da mulher – a presa e a, em liberdade – no mundo do
crime, seja introduzindo a droga nos presídios, seja transmitindo ordens do “Comando”. Destaco parágrafo do livro, a
nos levar à reflexão sobre a não legalização do uso da droga:
“os ganhos proporcionados pelo tráfico são tão grandes que é impossível
separá-los da violência urbana e da criminalidade. De uma forma ou de outra,
por trás dos roubos, assaltos, contrabando, sequestros, assassinatos e
chacinas, estão o uso e o comercio de drogas ilícitas”. (pag. 265)
Com base em “estudos
conduzidos com metodologia científica”, Drauzio nos apresenta os fatores de
risco da violência urbana que, infelizmente, transformaram-se em realidade
objetiva: infância negligenciada; falta de orientação, que imponham limites ao
adolescente; e convivência com marginais.
A leitura de “Prisioneiras” deixa-nos a sensação que
perdemos a guerra contra a marginalidade e, se o Estado quiser reverter esta
derrota, Drauzio Varella deve ser o comandante supremo dessa batalha.
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