terça-feira, 18 de julho de 2017

Por causa de uma paixão



Desafiando o quase frio de ontem, à noite, convidei Nara e Rodolfo a rápido passeio no parque, até para apascentar o nervosismo, porque o Botafogo jogava, logo mais. Rodolfo, sabedor da causa de minha ansiedade, antes que adentrássemos ao portão, foi logo questionando: “não entendo você,  na sua idade, com essa pose de intelectual, ainda ficar nervoso porque seu time – aqui pra nós, bem medíocre, ein? – vai jogar? Se perder ou ganhar, o que muda em sua vida?”. Olho para Rodolfo, com um pouco de irritação, mas não podia permitir que à ansiedade se acrescentasse o mau-humor, por isso resolvi afrontá-lo: “você jamais poderia entender, porque nunca  viveu uma paixão. Chegou aqui com 03 meses, manteve excelente relação com a Nara, que sempre o tratou como irmão mais novo, e ficou nisto. Para começar, vamos tratar de conceituar “paixão”. Como sou jejuno em psicologismos, entendo a paixão como emoção, que se exacerba, digamos, uma febre alta. Conhecemos uma pessoa e, antes que aflorem seus defeitos, sentimo-nos apaixonados. Queremo-la, sempre, a nosso lado, pensamos nela, em situações as mais inusitadas, como, por exemplo, quando estamos “no trono”. Com o tempo e a convivência, a febre cede, a temperatura do corpo volta ao normal, vale dizer, equilibramos nossa emoção. Podemos continuar gostando daquela pessoa, sentir prazer em sua companhia, mas aquele vulcão recolheu suas larvas. Pessoas, que imaginávamos imprescindíveis, desaparecem de nossas vidas e seus vestígios vão sumindo, até que nem mais nos lembremos delas. Costumo dizer que a saudade pelo morto querido, vai até a missa de sétimo dia, talvez, com exceção de pais que perdem filhos. O ser humano é muito instável, em relação a sentimentos, hoje gosta, amanhã desgosta. Agora, em relação ao Botafogo, foi paixão, que se perenizou em mim, mantendo o vulcão, em erupção, permanentemente. Cada jogo, sofro, esbravejo, o time pode estar medíocre, mas eu estou firme, lamentando a má fase, mas presente. Outro dia, um amigo disse-me que esta paixão pelo Botafogo, era espécie de fuga para a juventude. Ri dele que, ou não sabia o que é paixão, ou não sabe o que é ser Botafogo. Tenho amigos queridíssimos, torcedores de outros clubes, pelos quais nutrem semelhante paixão, como Oswaldo Jurema, hoje, morando na Paraíba. Tenho o maior respeito e carinho por ele, Fluminense até a raiz do cabelo. Ou meu querido Ruy Mello, que seguiu seu Corintians até Tóquio. Isto se chama paixão. Coloco dúvida no caráter  de quem se diz torcedor de um  time, mas, se ganhar ou perder, não faz diferença. É pessoa morna e, como está no “Apocalipse”, “porque és morno, eu te vomitarei de minha boca”. A maior idiotice, meu caro Rodolfo, foi esta onda do “politicamente correto”, onda que, infelizmente, vai passando, porque era a “mornidão”. O mundo, desde sua criação, é politicamente incorreto e é essencial que seja assim, para que mantenhamos nossas diferenças. Temos apenas de aceitar conviver com essas diferenças, por mais mal-estar que elas nos tragam. Acho absurdo alguém não torcer pelo Botafogo, mas aceito conviver com ele e, até, gostar muito dele, como é o caso do Waldo. Tenho desprezo por verdura, mas, nem por isso, tripudio em cima dos vegetarianos. Apenas  acho que eles desconhecem o prazer da comida, de uma picanha ao ponto, de um lombo de porco com farofa, optando por aquela coisa sem gosto, como alface, agrião, a que se precisa acrescentar azeite ou molho, para ter algum sabor”.
De repente, Rodolfo deu um tranco na coleira, quase me jogando ao chão: “você deve estar perturbado  mesmo, com o jogo de logo mais. Desandou a falar de assuntos variados, sem nexo, a Nara até me perguntou se você tinha bebido. Melhor voltarmos, você toma banho, refresca a cabeça, vai assistir a seu jogo e, depois, muito depois, me conte o resultado.”
O Botafogo ganhou e eu levei para Rodolfo e Nara algumas costelas-de-porco ao molho “barbecue”, sobras do jantar.
Apesar de não ser supersticioso, a partir de agora, sempre que houver jogo do Botafogo, antes, vou levá-los ao parque.

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