quarta-feira, 22 de junho de 2016

Das imperfeições do sistema jurídico



Depois de longo tempo, voltei, ontem, ao Tribunal do Júri, em pobre cidade da periferia da Capital. A jovem Promotora, extremamente dedicada, pela sua tenra idade, deu-me a impressão de que debatia com minha neta. O Juiz, também jovem, de forma didática, explicava aos jurados, pessoas simples, de pouca formação cultural como deveriam exercer sua função. Tratava-se de caso de duplo homicídio, mas as investigações, realizadas por uma Polícia, precária de estrutura para trabalhar, não chegou, com precisão, à autoria, o que levou à absolvição dos acusados. Portanto, a absolvição foi menos mérito meu e muito mais demérito da prova. Todavia, do que queria falar, ao constatar a sobre-humana carga de trabalho dos jovens Juiz e Promotora e o baixo nível intelectual do corpo de jurados, é que firmei, como nunca, minha convicção sobre dois temas, bastante polêmicos entre os chamados ‘’operadores do direito’’. O primeiro, diz respeito à manutenção do Tribunal do Júri, integrado por pessoas leigas, incumbidas de julgar o crime de homicídio. Trata-se, a meu juízo, de instituição desusada, a merecer extinção, exatamente por estar em julgamento a valoração do maior bem, que é a vida humana. Aprendi, com o saudoso e brilhante Promotor, meu primeiro ‘’adversário’’, Hermínio Alberto Marques Porto, que Júri não é exibição teatral, mas profundo exame da prova, o que só pode ser, adequadamente, feito pelo Juiz togado, técnica e psicologicamente preparado para isto. Ao jurado, via de regra, pessoa de mediana escolaridade, expressões como ‘’excludente penal’’, ‘’instrumento pérfuro-cortante’’, soam estranhas. Ontem, quando recebi a lista nominal dos jurados com suas respectivas profissões, preocupei-me em ser o mais didático possível, abandonando termos grandiloqüentes e terminologia técnica. Confesso que me sentiria mais seguro, tendo, como julgador, um magistrado mais preparado para tal mister. A segunda questão diz respeito à obrigação constitucional de os Tribunais serem integrados, em 1/5, por advogado, indicado por Ordem. Ontem, ao ver aquele jovem Juiz trabalhando, consciente de sua responsabilidade, imaginei as agruras de seu cotidiano. Se reside na Comarca, deve ser em local isolado, vez que a larga região central é paupérrima e a cidade está nas estatísticas oficiais, como uma das mais violentas do Estado. Onde estudarão seus filhos e onde disporá de assistência médica de emergência? Se reside fora da Comarca, com certeza, sufoca-se no trânsito, nas piores horas do dia. Pois esse Juiz, como tantos outros, após completar seu périplo e ter condições de ascender ao Tribunal, com toda a bagagem acumulada na longa estrada, poderá ser obstada sua trajetória, porque a vaga disponível pertence ao malfadado quinto constitucional e será ocupada por advogado que não se preparou para isso. Esse é o momento em que o legal e o justo se divorciam.

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