sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Amor do principio ao fim



Sentado, naquele banco, no calçadão, Luiz Claudio contemplava a paisagem, sem se fixar em ponto determinado. Aqui, aproveitando os últimos de sol, alguns rapazes jogam bola. Mais adiante, pessoas anônimas andavam à beira mar. Cadeiras e barracas eram recolhidas, marcando o fim de mais um dia de verão. Imagens voláteis que não conseguiam reter qualquer alegria. Ele sempre fora animal do mar e do seu entorno. Nascera e fora criado na Farme de Amoedo e seu mundo situava-se entre a subida da Niemeyer e a Pedra do Arpoador. Daquele espaço sabia tudo e, fora dali, era um estrangeiro, desses que precisam de mapa para se localizarem. Por culpa de parentes, vindos do interior, estivera uma ou duas vezes, se tanto, no Cristo Redentor e no Corcovado. Foi ali, bem defronte ao ‘’Sol Ipanema’’, que conhecera Maria Clara. Ela saía do mar, gotas de água enfeitando seus quase nenhuns pelos dourados. Seus olhos embarraram-se para sempre, como se se amassem desde encarnações passadas. Nunca uma briga, por mais leve que fosse e aquele balé mágico de corpos, quase todo dia. Quando ela foi fazer estágio em São Paulo, dois dias depois, ele, sufocado de saudade, embarcou na ponte-aérea e a trouxe de volta. Ela foi despedida. Melhor para ambos. Podiam passar mais tempo juntos. Não tinham amigos, nem precisavam deles. Bastavam-se a si mesmos, sem espaços para mais ninguém. Um dia, ela perguntou: - ‘’Vamos ter um filho?’’ E ele, sem precisar refletir disse: ‘’Não, não quero dividir você com uma criança que, primeiro, vai deformar seu corpo e, depois, vai lhe exigir, fisicamente, tirando o que me pertence.’’ Ela riu, ele riu e se lembrava de que se atiravam, ali mesmo, no sofá da sala e se amaram com o ardor de sempre. Naquele dia, tinham ido à praia, andaram, mergulharam nas ondas e se beijaram longamente, como no dia em que saíram pela primeira vez. De volta para casa, ainda no elevador, ela sugou-lhe o membro, até a última gota, e, depois, amaram-se no chão da sala. Enquanto ela tomava banho, ele desceu pra comprar comida. Quando voltou, sentiu um aperto no coração, estranha, mas concreta sensação que algo se desfocara. Entrou no apartamento, coração acelerado, pernas bambas. No quarto, as coxas de Maria Clara, só de calcinha, pendiam da cama. De seu braço esquerdo escorria um rio de sangue. Ao lado, um bilhete, poucas palavras, escritas naquela letra bordada: ‘’amor, tive medo que este sonho acabasse e resolvi ir embora.’’ Luiz Claudio, como se estivesse anestesiado, limpou o sangue, ajeitou o corpo inerte de Maria Clara, no lugar da cama que era dela e, ali, naquele banco do calçadão, com a visão opaca, pensava o que fazer da vida.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

O herói de Rosana

Leio, sem surpresa ou indignação, que vereador e presidente da Câmara da cidade paulista de Rosana foi afastado do cargo, porque teria utilizado verba daquele município, em orgia com mulheres, outrora chamadas ‘’de vida fácil’’. Abro parêntesis para contestar a expressão ‘’vida fácil’’.  Alguém, em sã consciência, pode considerar ‘’fácil’’ a tarefa-ingente tarefa – de uma garota de seus 20 e poucos anos, ir para cama com um velho babão, gordo, tendo que fazê-lo ‘’produzir resultado’’? Mas volto ao vereador que, cheio de juventude, ‘’de quinta para sexta foi dez muié’’, como declarou o próprio, para inveja de todos. A notícia não diz quanto o vereador gastou, mas, tomando por base o cambio da ‘’casa de massagem’’, aqui ao lado, (500 reais per capita, all included), deve o nobre edil ter desembolsado uns 5 mil reais. A meu juízo – eu que abomino ser juiz de qualquer coisa – trata-se de ínfima importância, verdadeira gorjeta de manobrista, em época em que os desvios já deixaram os milhões e ingressaram na casa dos bilhões. Outra coisa: o ínclito vereador, ao invés de punido, merece ser homenageado, pois realçou o vigor – e põe vigor nisto – do homem de Rosana. ‘’Dez muié, de quinta para sexta’’, não é para qualquer um. Deveria ser recebido com foguetório e banda de música. Sugiro placa com os dizeres: ‘’ao garanhão de Rosana, o povo reconhecido’’. Afinal, o notável vereador não usou a verba do município para comprar apoio político ou para subornar miseráveis agentes públicos. (Sim, porque somente funcionário de ultimo escalão se submete a tão miserável propina). Não, a verba foi despendida em ‘’alegre noitada’’ e circulou entre ‘’10 muié’’, que a utilizaram, por certo, comprando produtos essenciais a sua mantença. O invejável vereador gastou suas energias – e que energias – promovendo forma de distribuição de renda. Agora, causa-me estranheza e indignação, que a nobre conduta do nobilíssimo vereador tenha sido descoberta porque sua conversa, com um amigo, narrando sua proeza, fora ‘’grampeada’’, pela polícia civil. Fica a pergunta: quem mandou grampear S. Excia.? Por certo, um oponente e impotente adversário político, porque, como ensina o pára-choque de caminhão, ‘’a inveja é uma merda!’’ Ao hercúleo vereador, honra e gloria de Rosana, meus aplausos e meus respeitos. Só me resta suspirar, como o poeta: ‘’feliz o tempo que passou, tempo tão cheio de recordações...’’

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

O “conselhão” da Dilma

A Presidente Dilma, mais perdida que cego em tiroteio, cria ‘’conselhão’’, integrado por cerca de 90 membros, que, juntamente com ela, procurará encontrar saída para a crise econômica, que nos assola. Convivi com um Ministro, de notável saber e raro bom senso, que dizia que, quando não queria resolver questão, sobre a qual estava sendo pressionado, nomeava comissão integrada por cinco ou mais membros ‘’para estudar o assunto e dar parecer.’’ Como a comissão não conseguia chegar a um consenso, o ‘’assunto’’ acabava por cair no vazio. O ‘’Conselhão’’ da Presidente tem de tudo: desde representantes dos bancos, passando por empregada doméstica e chegando ao inefável ‘’Capitão Nascimento’’, vulgo Wagner Moura. Marcelo Odebrecht, que representaria o setor da construção civil (tema do primeiro ‘’encontrão’’), por circunstancias alheias a sua vontade, não poderá comparecer. Tanto a composição do ‘’Conselhão’’, quanto os resultados esperados são discutíveis. Os bancos já estiveram representados, no Governo, pelo ex - Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que saiu, frustrado, por não concordar com a política econômica, ditada pela Presidente. E, pergunto, que contribuição para as nossas agruras poderá dar a ‘’líder das empregadas domésticas’’? Só se for para ensinar os ‘’macetes’’ para economizar na cozinha, ou no material de limpeza. Quanto à escolha do ‘’Capitão Nascimento’’, esta achei certíssima. É fundamental a presença de homem de pulso forte, para comandar 90 pessoas de formação tão dispare. E, já que está por lá mesmo, o Capitão, e sua tropa de elite poderão ‘’dar uma geral’’ e ampliar os resultados das operações ‘’lava jato’’ e ‘’zelotes’’. Até o cachorro, que cochila a meu lado, sabe que a crise é essencialmente política, gerada pela definitiva falta de confiança, neste (des) governo que, dentre tantas mazelas, fatia a Petrobrás, vendendo suas partes, a quem interessar possa. Collor, querendo se safar, nomeou um ‘’Ministério de Notáveis’’. Não se livrou do Impeachment. Dilma, agora, cria este heterogêneo ‘’Conselhão’’. Está cheirando à repeteco ou, para os mais velhos, o ‘’baile da Ilha Fiscal’’.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

A luz no fundo do túnel

Conta a historia (ou a lenda) que Diógenes percorria as ruas de Atenas, com uma lanterna na mão, a procura de um homem, que fosse honrado. Se vivesse nos dias atuais, passaria pelo mesmo drama. Com efeito, se o Tribunal Superior Eleitoral entender que as eleições presidenciais de 2014 estão, definitivamente, contaminadas, porque os recursos para a campanha advieram do esquema fraudulento da Petrobrás, Dilma e Temer serão apeados de seus cargos e, no prazo de 90 dias, teremos nova eleição para presidente e vice-presidente da república. É aí que entra o Diógenes. O cenário político nacional se nos apresenta como um deserto de homens, de estatura moral e intelectual que, com indispensável apoio da classe empresarial e dos trabalhadores, estanque a crise econômica, que nos assola, e reconduza o país ao caminho do desenvolvimento. Todos estamos de acordo que o ajuste fiscal é necessário, todavia não depositamos confiança para que este (des) governo o faça. Por outro lado, temos o menos confiável Congresso de nossa história. Hoje, vivemos a reboque da operação ‘’lava jato’’ que, se por um lado abriu perspectiva de minimizar os efeitos da corrupção, por outro lado, mesmo indiretamente, dinamitou a Petrobrás, reduzindo seu valor a ¼ do que valia, antes de deflagrada a operação. Lá na frente, quando a historia narrar os dias atuais, além dos elogios a Sergio Moro e seus companheiros, terá que contabilizar os prejuízos trazidos, os milhares de operários das construtoras envolvidas, que perderam seus empregos, com a paralisação das obras e a colaboração pela paralisia econômica do País. Vivemos, hoje, o que um amigo denomina ‘’a ditadura da toga’’. É claro que é bom termos um Poder Judiciário atuante. É nossa segurança, enquanto cidadãos. Todavia, é muito perigoso que esse mesmo Poder, desviando-se de suas funções constitucionais, que é de aplicar e interpretar a lei, passe a legislar ou dar à norma interpretação diversa, daquela estabelecida pelo legislador. Neste sentido, o ‘’manifesto dos advogados’’ pode ter sido inoportuno, mas contém muitas verdades, que precisavam ser ditas e precisam ser meditadas. O Brasil, neste momento, em qualquer momento, não precisa de herói – e querem transformar Sergio Moro em herói, como antes quiseram fazer com o ex-ministro, Joaquim Barbosa. O Brasil precisa de um líder, acima de qualquer suspeita e que possa merecer a confiança e respeito da população. Imito Diógenes e acendo a lanterna, a procura de um. Quando esta, de tão gasta, ameaça apagar, identifico, a um canto, discretamente postado, o Senador Cristovam Buarque, com sua bagagem de ex-reitor da Universidade de Brasília e ex-governador do Distrito Federal. Emergiu, para a vida pública, através do PT e, quando esse se desviou de sua rota ética, abandonou-o, ou melhor, sofreu a humilhação de ser demitido do Ministério, que ocupava no Governo Lula, por telefone. Era sério demais para viver entre pulhas. O Senador Cristovam Buarque passa desapercebido da mídia, porque não é homem de bravatas, nem se envolve em escândalos, mas tem a experiência administrativa e o estofo moral para conduzir o Brasil a um porto seguro.

Diógenes, eis o homem! 

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

O moribundo volta à cena

O ex-presidente Lula saiu do estado de mudez, em que se encontrava e deitou falação: ‘’não tem neste País viva alma mais honesta que eu.’’ E, com exaltação, afirmou que ‘’aprendi honestidade com minha mãe, que era analfabeta’’. Uai (perdoem-me o ‘’mineirês’’) qual a correlação entre o analfabetismo e honestidade? Quis dizer o ilustre mancebo que sua mãe era honesta porque era analfabeta ou que só os analfabetos são honestos? Dúvidas interpretativas à parte, melhor teria sido Lula explicar o triplex do Guarujá; o sítio de Atibaia; porque Bumlai tinha a entrada franqueada, a qualquer hora, em seu gabinete; sua relação com a OAS; suas palestras pagas, a peso de Kissinger e Al Gore, pela Odebrecht; porque e como seu filho, de porteiro de zoológico passou a dono de empresa e o outro, de assistente de Luxemburgo a também empresário de sucesso, na área de marketing esportivo; porque seu homem de confiança, José Dirceu, foi duas vezes preso e ele continua por aí; idem o tesoureiro de seu partido; A segunda pérola de nosso alfabetizado ex-presidente foi afirmar ‘’que está na hora da sociedade brasileira acordar e exigir mais democracia, mais direitos humanos’’. Uai, que trem mais doido, gente! A Presidente é cria do homem. O partido, que domina o Poder, é o partido do homem e ele diz que falta ‘’democracia’’ e ‘’direitos humanos’’? Se falta, então de quem é a culpa? Ou será que, no elevado conceito do nosso intelectual ex-presidente, a democracia confere ao governante o direito de se apropriar da coisa pública? E seria ‘’desumanidade’’ trancafiar os larápios que destruíram a maior e mais importante empresa brasileira? Numa coisa Lula está certo: está mais do que na hora da sociedade brasileira acordar. Está na hora da depauperada indústria acordar. Dos 20 milhões de desempregados acordarem. Dos aposentados acordarem. Dos professores, com seus pífios salários, acordarem. Dos que são achacados, pagando juros de 10 ou mais por cento ao mês, acordarem. Dos humilhados, a esperarem por uma saúde pública decente, acordarem. E, despertos, mostrarmos, pela palavra ou pela força, que queremos ser, não uma Bolívia, não uma Venezuela, mas um País digno e próspero, a merecer o respeito do mundo civilizado.


quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

A obrigação cumprida

Era seu amigo de longa data. Desses amigos com quem se dividem intimidades, risos e lágrimas. Seus últimos anos foram de decadência física e moral. O corpo padecia de vários males e a alma se despedaçara, desde que ela se fora, deixando duas linhas escritas em papel amassado, que ele carregava consigo, exibindo-o, como troféu, após a quinta dose de uísque, proibido que estava de beber. Deixou de tomar remédios e, quando questionado, dizia que perdera o sentido da vida. Dos amigos sobrara-lhe apenas ele, Luiz Claudio, que o ouvia, sem condená-lo, em eloqüente silencio. Um dia, ele ligou. Precisava falar com urgência. Luiz Claudio estranhou o lúgubre local do encontro: a porta do velório do cemitério do Araçá, mas, seguindo seu hábito, nada perguntou. Encontrou-o, cigarro na mão, andando de um lado para outro. Quem passasse, por certo, imaginaria que ali estava um homem triste, prestes a enterrar ente querido. Sem dizer nada, tomou Luiz Claudio pelo braço, entraram pela porta lateral, que dava acesso ao cemitério e foram caminhando pela alameda, ladeada de túmulos, que terminava lá na Cardoso de Almeida. Luiz Claudio sempre achou incongruência o cemitério ficar defronte à Faculdade de Medicina e ao Hospital. Como se o primeiro dissesse: - ‘’não adianta, eu acabo sempre vencendo’’. Como o amigo continuava mudo, Luiz Claudio passou a reparar na beleza dos túmulos e comparar a idade dos mortos com a sua. Imaginou um placar de 20 e, satisfeito, concluiu que vencera de 14 a 6. Após passarem pela pequena Igreja, que dava para o portão central, o amigo puxou-o pelo braço e entraram numa viela, à direita. Alguns túmulos depois, pararam diante de uma capela, que era o jazigo da família do amigo. Sem anjos, Cristos ou Madalenas, mas bem cuidada, com fotos de mortos, que passaram por ali. Só então o amigo quebrou o silêncio: ‘’se você levantar esta tampa de mármore, sob nossos pés, vai encontrar uma espécie de treliche, um de cada lado, onde os caixões são colocados. Quero que o meu seja colocado no espaço do meio, à esquerda. Conto com você que é a única pessoa em que confio.’’ Ontem, toca o telefone. Era a esposa avisando que o amigo morrera, o velório seria no Araçá e o enterro, amanhã, (hoje) às 11 horas. Tudo muito rápido, filhos e esposas sem lágrimas, quase aliviados. Desconhecidos conversavam, alegremente, na varanda que dava para o estádio do Pacaembu. Quando o féretro saiu, Luiz Claudio apressou-se, à frente. Tinha uma missão a cumprir. No local do sepultamento, dois coveiros removiam as placas de mármore. Luiz Claudio colocou uma nota de 50 reais nas mãos de cada um deles, indicando o local onde o caixão deveria ser colocado. Depois, esperou o cortejo chegar e o corpo do amigo repousou, exatamente onde planejara. Luiz Claudio não esperou pelo fim do ritual. Caminhou, vagarosamente, em direção da saída, imaginando que aquele cemitério poderia ser transformado em magnífico condomínio de prédios. 

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Mensagem ao Rio



Pois não é que hoje é aniversário da cidade do Rio de Janeiro? Em tempos idos e vividos, quando lá morei, era dia de grande festança, que começava com procissão em homenagem ao padroeiro, São Sebastião e culminava com as bandas, de todos os bairros, a cantarem a alegria de morar naquela cidade. A minha era a ‘’Banda do Leme’’, que descia pela Rua Gustavo Sampaio, retornava pela Avenida Atlântica, estacionava na ‘’Praça Ari Barroso’’ e tocava até tarde da noite. E lá esteve eu, sempre, esposa ao lado e filhos às costas. A ‘’nossa’’ banda era, eminentemente familiar, sem  bêbados, brigas e drogas. A alegria emergia sem estímulos outros que não a própria alegria de estar ali, a homenagear o bairro e a cidade. Mantive presas, no Leme, as raízes desse passado festivo e, até hoje, quando vou ao Rio, hospedo-me, naquele bairro, freqüento aquela praia, onde ainda identifico os passos vacilantes de meus filhos, crianças imberbes e percorro, vagarosamente, as ruas do bairro, buscando  encontrar pedaços do passado e puxá-los para o presente. Paro defronte ao prédio, onde morei e posso ver, lá no quarto andar, meus filhos acenando, vendo-me chegar. É verão, o sol se põe tarde e ainda dá tempo de jogar bola na praia e, depois, dar um mergulho para tirar a areia. Volto ao presente e vou sentar em um banco, defronte ao mar, esperando as luzes da orla se acenderem, quando, então, caminho, sem pressa, de volta ao hotel. Tantas foram as alegrias que, em diferentes épocas da minha vida, o Rio me proporcionou que me obrigo a render-lhe homenagens, pedindo a São Sebastião que ilumine corações e mentes de seus governantes para que não permitam que as mazelas empanem a beleza da cidade. É muito bom sediar as Olimpíadas, mas é muito melhor dar eficiente assistência à saúde, não permitindo que pessoas humildes morram à porta dos hospitais. Ficou linda a ciclovia, que vai do Leme à Barra da Tijuca, mas é fundamental que, ao percorrê-la, ninguém seja vítima de bala perdida.

Rio, dos meus amores, das praias coloridas por coxas torneadas, eu lhe desejo vida eterna, eu que já o elegi minha ‘’última morada’’, quando minhas cinzas serão atiradas ao mar, lá da pedra do Leme. Rio, obrigado por tudo!

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

O ridículo nosso de cada dia

Em tempos idos e vividos, os ônibus ostentavam, em cima do para-brisa dianteiro, uma placa com os seguintes dizeres: ‘’é proibido falar com o motorista.’’ Provavelmente, inspirado em tal aviso, mas invertendo o seu sentido, o inoperante Prefeito Fernando Haddad acaba de publicar Portaria, proibindo os motoristas de taxi de falarem com passageiros. A insana portaria contém, ainda, outras pérolas, que oscilam entre o absurdo e o ridículo; o motorista tem que se apresentar bem vestido, de banho tomado, cabelo cortado, barba feita, sapatos reluzentes, não usar perfume forte e, como salientado, evitar conversar com o passageiro, principalmente assuntos polêmicos, como futebol, política e religião. Agentes municipais fiscalizarão o cumprimento da portaria e a multa prevista é da ordem de 35 reais. Considerando que um taxi faz, em média, 20 corridas por dia, de se concluir que a multa poderá atingir 700 reais. Prevejo o seguinte diálogo entre o passageiro e o taxista:
- passageiro: ‘’o senhor tomou banho, hoje?’’
- taxista: ‘’ainda não tive tempo, doutor, porque estou rodando desde ontem, à noite. O senhor sabe, com esta crise a gente tem que trabalhar mais, senão não dá para botar comida na mesa.’’
- passageiro: ‘’anoto que o senhor acaba de cometer duas infrações ao mesmo tempo: não tomou banho e quer discutir a crise econômica, assunto pra lá de polêmico’’.

A portaria é de ridículo atroz, não só pelo seu conteúdo, mas também, pelo menos por enquanto, porque vivemos em uma democracia, onde não se reprime o direito de manifestação do pensamento. Habitamos uma cidade de 11 milhões de habitantes, cujos problemas essenciais – saúde, educação, moradia, segurança – restam insolúveis. O índice de aprovação da ‘’administração Haddad’’é o mais baixo de nossa historia, suplantando, inclusive o do ex-prefeito Celso Pitta, em seu pior momento, apesar da arrecadação municipal ser a terceira maior do País, superada, apenas, pela arrecadação da União e do Estado de São Paulo. As obras mais importantes desta administração foram às ciclovias e ciclo faixas, construídas a peso de ouro e absurdamente subutilizadas. O pior é que as eleições estão próximas e não vislumbramos, até agora, nenhum candidato à altura de nossa metrópole. Pobre São Paulo! 

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Rápidas considerações sobre o novo orçamento para 2016

Peço desculpas a alguns poucos amigos – três, na verdade - , que ainda defendem o (des) governo Dilma, mas não dá para passar batido. Este orçamento para 2016, sancionado, sem vetos, pela Presidente, é muito mais do que peça de ficção. Chega a ser um ‘’tapa na cara’’, no País, que navega na maior recessão de sua história, com o índice de desemprego batendo em 10%. O mesmo orçamento que corta verba da Educação, Saúde e até da Polícia Federal, aumenta em 168% o ‘’fundo partidário’’, que é o dinheiro doado aos partidos políticos, para que esses se mantenham. Serão mais de 800 milhões distribuídos, desigualmente aos 39 partidos políticos que formam o mais deslustrado e corrupto Parlamento de nossa historia. E não é só: inclui-se, no orçamento, cerca de 10 bilhões que o governo espera arrecadar com a CPMF... que ainda nem mesmo foi aprovada pelo Congresso. É mais ou menos como alguém incluir, em seu ‘’recebível’’ o prêmio da mega cena... cujo sorteio ainda vai ser realizado. Todavia, nem tudo são más notícias. Leio que os Professores da rede pública de ensino – a tal ‘’Pátria Educadora’’ – tiveram seus salários reajustados e passarão a ganhar a astronômica quantia de R$2.135,64. Que maravilha! Já os antevejo desfilando de BMW e, aproveitando o inverno norte-americano, indo esquiar no Colorado, onde, por certo, encontrar-se-ão com os beneficiados pelo polpudo aumento do salário mínimo para 880 reais. Grande Brasil!  

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Santo Agostinho: exemplo e caminho

Apesar de concordar que o dom da fé não passa, necessariamente, pelo dom da razão, busco através da leitura, principalmente dos chamados ‘’doutores da Igreja’’, explicações para as dúvidas, que me perseguem, sem todavia, trazer tormentos. Confesso, com certo pudor, que não nutro simpatia pelo apóstolo Paulo, feito Santo. Tenho a idéia amalucada que pretendeu ele dar um ‘’golpe de estado’’ e assumir a liderança da Igreja, outorgada a Pedro pelo próprio Cristo. Daí inventou aquela historia da ‘’estrada de Damasco’’ e, levado pelas mãos de Barnabé – que depois repudiou – introduziu-se entre os apóstolos originais, intitulou-se a si mesmo apóstolo e bateu de frente com Pedro, homem humilde e inculto, ao contrário dele, Paulo, judeu educado em Roma e egresso da nobreza. Por óbvio, não tiro seu valor, já que, com visão cosmopolita, procurou levar o cristianismo para o mundo de então. Mas, volto aos ‘’doutores’’ e, tardiamente, percorro Santo Agostinho e me impressiono com sua trajetória de vida, seus deslizes, a busca incessante da verdade interior, até abraçar Deus e a nossa Religião. De origem africana, filho de pai ateu e mão católica, Aurélio Agostinho, marcado por temperamento passional, enveredou por vários caminhos, sempre em busca da verdade. Sua teologia não nasceu em gabinetes, mas foi sofrida e amadurecida na odisséia de sua vida. Apesar de sua mãe, Mônica, ser profundamente católica e ter a ele transmitido tal religiosidade, seu batismo só se deu em idade mais madura, (mais ou menos, 33 anos). Agostinho cobraria da mãe esse batismo tardio que seria a causa de suas ‘’concessões ao pecado’’, cometidos, principalmente, na adolescência. Esse é o período mais conturbado de sua vida, marcado, inclusive, pelos conflitos com a mãe, que não aceita seu comportamento, privilegiando a sexualidade. Com cerca de 20 anos, Agostinho sai de sua cidade natal e se muda para Cartago, a cidade mais rica e poderosa da África, sob dominação romana. O fascínio do novo e do proibido o arrasta para ‘’as chamas crepitantes dos amores impuros’’, como, mais tarde, ele e o declararia em suas ‘’Confissões’’. Estabelece ‘’união de fato’’ com uma mulher, de condição humilde e, com ela, tem um filho, Adeodato, fundamental em relação ao amadurecimento de Agostinho. Profundamente estudioso, mergulha ele nas obras, principalmente de filosofia, com destaque para Cícero, orador, filósofo e senador romano (106 a 31 a.C). Com crescente intensidade, Agostinho concentra seu esforço em compreender a si mesmo e a própria vocação. Conflita-se com as Escrituras, cuja chave interpretativa não consegue encontrar, não penetrando em seu conteúdo, razão pela qual se agarra nas sedutoras promessas dos manequeus, seguidores de uma nova religião missionária e universal, cujo fundamento era o dualismo radical entre o ‘’Reino do bem’’ (Deus) e o ‘’Reino das trevas’’ (Satanás). Sobre um jovem desiludido como Agostinho, que busca dar fundamento à própria vida, o maniqueísmo exerce notável fascínio. Aquela que mais tarde definirá ‘’uma abominável e sacrílega heresia’’ o mantém ligado por quase 10 anos e que provoca a ruptura de suas relações com a mãe, firme em sua fé cristã. As numerosas leituras filosóficas, a que se dedica, os debates, dos quais participa, fazem esmaecer a crença no maniqueísmo. De Cartago, Agostinho parte para Roma, onde sua vida transcorre ‘’na solidão de uma alma inquieta e perturbada’’, sempre em busca da verdade límpida, que acabou não encontrando entre os macabeus. Todo o sistema filosófico que tenta experimentar, como possível itinerário para a sabedoria o deixa, porém, insatisfeito, porque lhe traz mais duvidas que certezas, sobretudo, porque nenhum deles deixa traços daquele ‘’Cristo Salvador’’ que permanece como o referencial imprescindível para a conquista da verdade plena. Desiludido pela experiência romana, Agostinho parte para Milão, que abrirá novos horizontes para ele, primordialmente, a partir de sua aproximação com o Bispo Ambrosio, realizador de consolidada ação pastoral e de incontestável prestigio cultural e que teria decisiva influencia na formação teológica de Agostinho. A partir daí, tem diante dos olhos também o exemplo de uma Igreja viva, um povo unido na celebração eucarística, atento à pregação, ativo nos cuidados pastorais. O exemplo das comunidades monásticas que nascem e se multiplicam tem uma força de fascínio que o atrai. Agostinho começa a promover um definitivo corte em seu passado. Muitas foram as dificuldades enfrentadas, as vacilações, como ele próprio declara em suas ‘’Confissões’’: ‘’Repetia de mim para mim: vamos, avante! Estava quase para agir e, no entanto, ainda não conseguia. Depois tentava novamente, a meta estava perto, cada vez mais perto, ainda um pouco e finalmente seria tocado e seria minha. E, no entanto, não, a meta estava mais além, não a tocava e não era minha, porque ainda hesitava em morrer para a morte e em ressurgir para a vida...’’ Até que enfim a vontade boa vence e as vozes do passado ensurdecem. E, a partir daí, a vida de Agostinho é inteiramente voltada à Igreja de Deus e a serviço do próximo.
Vejo a trajetória da vida de Santo Agostinho, os ‘’monstros’’ com os quais lutou, quase como lenitivo. Para todos nós, ainda vacilantes na fé, que chegamos ao final da jornada sem compreender o real sentido da vida, que não fomos capazes de ‘’extirpar o mal enraizado’’ e amargamos esta incapacidade.  Ler, refletir e orar é o caminho que Santo Agostinho nos indica.

Obs: os trechos transcritos foram extraídos das obras: ‘’Confissões’’ – Santo Agostinho – Ed. Martin Claret, 2002 e ‘’Santo Agostinho – a aventura da graça e da caridade’’ – Giuliano Vigini – Ed. Paulinas, 2015.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

O passado abraça o presente

Viver muito nos faz testemunhas oculares da historia, o que é bom, mas também ruim, principalmente, quando a historia se repete, em velocidade fantástica, como acontece, aqui, no ‘’bananal’’. Primeira eleição direta, após o círculo militar. Collor e Lula travam verdadeiro ‘’vale tudo’’, inclusive xingar a mãe. Collor vence, mas, dois anos depois é apeado do Poder, graças à força do lulopetismo que, à época, seduzia todas as camadas sociais. Collor mergulha em prolongado ostracismo, mas como somos um povo sem memória moral, volta à cena como Senador por Alagoas, seu Estado natal. Seria lógico imaginar que se tornaria ele o mais figadal inimigo de Lula e do PT, afinal, 10 anos é ontem à noite, em termos de historia. Mas qual o que: agora, quando jorram delações premiadas pelos canos da ‘’lava-jato’’, descobre-se que tanto Lula, como seu poste, Dilma, entregaram, nas mãos de Collor a ‘’Br - Distribuidora’’, a jóia da coroa da Petrobrás. Através de seu preposto e amigo de infância, Pedro Paulo Leoni, teceu-se, naquela subsidiária, magnífica rede de corrupção, por onde escoaram milhões de dólares, em propina. Segundo a Procuradoria Geral da República, a ‘’concessão’’ da BR – Distribuidora à Collor deu-se como contrapartida ao apoio do PTB alagoano – partido ao qual Collor é filiado – aos governos Lula/Dilma. Teria sido só isto? Afinal, o PTB alagoano não é tão representativo assim. Leoni ‘’operava’’ só para o Senador, ou não seria, também, mais um integrante da máfia lulopetista? O delator Cerveró, aciona sua metralhadora giratória e acerta em Renan Calheiros (o novo protetor de Dilma) e em várias figuras coroadas do PT, inclusive Dilma e Lula. A pergunta que fica, no ar, é: quem será responsável por apagar as luzes do Palácio do Planalto e dos prédios do Congresso Nacional? E a reflexão, que faço: em 1989, no segundo turno, votei no Collor, para Presidente. Se imaginasse que fossem ele e Lula tão iguais, teria votado nos dois. 

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

A inútil proibição

Nenhuma publicidade é mais eficiente do que a proibição. Nunca se bebeu tanto nos Estados Unidos como à época da ‘’lei seca’’. No meu tempo de pré-adolescente, as revistinhas de sacanagem – simplórios desenhos de Zéfiro – circulavam, ‘’intramuros’’, com a velocidade de foguete. Basta falar: ‘’é proibido’’ para todo mundo querer, ver ou ter. É da natureza humana. Estou tecer tão óbvias considerações, a respeito das manifestações de Israel contra a (Re) publicação do livro ‘’Mein Kampf’’ (Minha Luta), escrito por Hitler em 1925, durante o período em que esteve preso. Extinto o nazismo, em 1945, o livro passou a ser considerado ‘’maldito’’ e a proibição de reeditá-lo durou até 1975, quando voltou a circular. Bastou Israel protestar, para seguirem várias reedições e, agora, ‘’Minha Luta’’ está ‘’bombando’’ em Portugal. O livro, se tanto, vale tão somente como documento histórico, porque seu conteúdo é desprovido de qualquer valor político-filosófico. Hitler, pintor fracassado, não conseguiu ingressar na Escola de Belas Artes de Viena. Participou da Primeira Guerra Mundial como mensageiro, no exercito alemão, tendo sido reformado como cabo. Era inculto e não perseguia o hábito da leitura. Os conceitos, contidos no livro, reprovariam até os candidatos ao ENEM. Transcrevo um trecho, à guisa de exemplo: ‘’o êxito na conquista da alma popular se logra quando, ao mesmo tempo que travamos a batalha política em prol de nossos próprios fins, destruímos os nossos opositores. O que as multidões querem é contemplar a vitoria do mais forte e a destruição do mais débil.’’ Besteirol puro, a lembrar os discursos de Dª Dilma. Na verdade, o nazismo teve dois ideólogos: Dietrich Eckart, jornalista e escritor, ‘’guru’’ intelectual de Hitler, a quem, inclusive, emprestava livros e dava conselhos literários e Alfred Rosenberg, considerado ‘’a voz filosófica do partido” e que elaborou o seu primeiro programa, que tinha, como fundamentos, a doutrina da pureza étnica, obrigatória para todos os nacionais – socialistas e a conquista do ‘’espaço vital” para a Alemanha. Quanto à ‘’Minha Luta’’, nunca teve repercussão nem dentro da Alemanha, não havendo qualquer razão para que, 70 anos após o sepultamento do nazismo, Israel queira promovê-lo a ‘’best seller’’

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Historia: contada como vivida


Vinte e quatro horas após deflagrada o Movimento Cívico-Militar de 1964, o Presidente João Goulart deixa Brasília, com destino ao Uruguai, fazendo escala em Porto Alegre. Governava, à época, o Rio Grande do Sul Leonel Brizola, que, com a insensatez que sempre o caracterizou, tenta convencer Jango a resistir, utilizando-se do pífio apoio militar que dispunha. Vale dizer, Brizola prega uma guerra civil, que Jango repudia, porque seria inútil derramamento de sangue dos brasileiros. Brizola, exilado no Uruguai, recebe, de Fidel Castro, vultosa importância, em dólares, para promover guerrilha, no Brasil. Em 1980, assume o Governo do Estado do Rio de Janeiro Chagas Freitas, da ala moderada do então MDB. À época, os Secretários Estaduais de Segurança Pública eram indicados pelo Alto Comando das Forças Armadas que, para aquele Estado, escolheu o General Edmundo Murgel que me honrou, convidando-me para ocupar uma Diretoria. Realizamos um minudente estudo dos principais pontos de criminalidade e partimos para acirrado enfrentamento da delinqüência, principalmente combatendo os crimes contra o patrimônio e o uso e trafico de entorpecentes. Nosso trabalho trouxe excelentes resultados e os índices de criminalidade equipararam-se aos dos países desenvolvidos. Em 1984, graças à açodada ‘’abertura’’, que permitiu aos exilados voltarem à vida pública, Brizola elegeu-se Governador do Estado do Rio de Janeiro. Para conseguir seu intento, celebrou acordo com os ‘’chefes do tráfico’’, pelo qual a policia não realizaria incursões nas favelas, onde se situavam as ‘’fortalezas’’ e as centrais de distribuição de drogas. Foi, exatamente, a partir do Governo Brizola que a criminalidade ascendeu, naquele Estado, transformando o Rio em uma das cidades mais violentas do mundo. Pois, agora, esse mesmo Brizola, que quis promover uma guerra fratricida; que recebeu recursos financeiros para promover guerrilha. Que se aliou à delinqüência para se eleger Governador, promovendo a crescente escalada da violência, na mais bela cidade do Brasil, esse mesmo Brizola, agora, pelas mãos da ex-guerrilheira Dilma Roussef, é elevado à condição de ‘’herói da pátria’’. Não há dúvidas que caminhamos, a passos largos, para nos transformamos numa Bolívia, de Morales ou numa Venezuela, De Maduro.

Visito um verso de célebre poema de Castro Alves: ‘’Andrada, arranca este pendão do mastro, Colombo, fecha a porta de seus mares’’

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Considerações fúteis sobre a Unificação da Língua Portuguesa




Parece que agora sai a famigerada reforma ortográfica, que unificará o idioma, em todos os países de língua portuguesa (Brasil, Portugal, Moçambique, Cabo Verde). A novela da unificação do idioma arrasta-se desde o começo dos anos 90, resultado de trabalho realizado por filólogos dos países interessados. Confesso que, a não ser em pontos esparsos, desconheço tal trabalho e, não só desconheço, mas também não tenho qualquer interesse em fazê-lo. E mais, continuarei a escrever, seguindo as regras atuais, sem me preocupar com a acentuação acrescida ou suprimida. Aliás, durante cerca de 10 anos que lecionei Português, não dava relevância aos erros cometidos pela ausência ou presença indevida dos acentos. Os chamados ‘’diferenciais’’, então, são de total imbecilidade. Dizia-se, por exemplo, que para (do verbo ‘’parar’’) deveria ser acentuado (pára), a fim de distingui-lo de para (preposição que indica movimento). Ora, nem mesmo o mais energúmeno aluno é capaz de se confundir, no uso de um e outro. Minha tesão sempre foram as virgulas que ditam o ritmo das frases, principalmente nos períodos longos. E ritmo é tudo, é o ‘’molho’’ da frase, fazendo-a oscilar, realçando a beleza da palavra ou expressão. Mas acento, pelo amor de Deus, parece cicatriz. Como não conheço a extensão da reforma ortográfica, não sei se também pretendem uniformizar o significado das palavras. Se for, aí a coisa complica. Lembremos, por exemplo, que, em Portugal, ‘’fila’’ recebe o nome de bicha. – ‘’Você já viu o tamanho da bicha para entrar no cinema?’’, pergunta o namorado à namorada que, desconhecendo a unificação, introduzida pela reforma, olhará para ele, de forma suspeita. Também, em terras lusitanas, ‘’trolha’’ significa pedreiro, enquanto por aqui a tal palavra é, vulgarmente, utilizada como sinônimo de ‘’grande problema’’. Confuso, não? Temos todos, os de cá e os de além-mar, graves problemas, sem solução. Portugal, que cabe dentro do Estado de São Paulo, ainda se salva, com bons serviços públicos, mas o Brasil e a chamada ‘’África Portuguesa’’ ainda estão mergulhados em humilhante terceiro-mundismo, para perderem tempo com essas inúteis reformas. Além do mais, esse ‘’conselho de notáveis’’, cuja idade media deve bater nos 90 anos, ainda não percebeu que a internet já construiu um idioma novo, onde se fala por abreviaturas, sinais e neologismos, ainda não registrados nos melhores dicionários. 

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Pela virada do ano

Na contra-mão dos que se dirigiam à Praia de Copacabana, para assistirem à magnífica queima de fogos da meia-noite, Luiz Claudio caminhava pela ‘’Francisco Otaviano’’, em direção ao Arpoador. Trazia consigo um isopor, contendo pedras de gelo, copo, e, na outra mão, uma garrafa de uísque, sempre da mesma marca, ‘’Old Parr’’. Era a sua maneira de homenagear o falecido pai, que só consumia aquela marca de uísque. Não sabia bem porque assim agia. Afinal seu pai se fora, quando ele, Luiz Carlos, era ainda jovem e a relação entre ambos não guardava tanta intimidade para conversas profanas, como bebida. Mas ele conservava a lembrança do pai, bebericando, suavemente, ‘’Old Parr’’. Passou a tomar desse uísque, apenas em ocasiões especiais e, aquela virada de ano, era pra lá de especial. Estava definitivamente velho para acreditar que tudo pudesse renascer, apenas porque virara a página do calendário. Não tinha projetos para o novo ano e sabia que os fatos a estes se superpõem. Maria Clara se fora, do mesmo modo que os filhos, de repente, não mais suportando suas alternâncias de humor, sua maneira irresponsável de levar a vida. Não que se sentisse irresponsável: tinha seu trabalho, que lhe supria as necessidades básicas; procurava respeitar o próximo, mesmo mantendo com ele confortável distancia e não se lembrava de ter prejudicado qualquer pessoa. Se não era homem de grandes virtudes, também não se sentia atormentado pelos chamados ‘’pecados mortais’’. Enfim: julgava-se preparado para o juízo final. Mas, naqueles últimos minutos de 31 de dezembro, o que queria mesmo é estar ali, sentado na pedra do Arpoador, brindando, ele com ele, o exuberante brilho das estrelas e o quebrar suave das ondas. O mar estava calmo e, aqui e ali, podia-se ver alguns surfistas, à espera de ondas que não viriam. Solitários? Por certo, não! Apenas optaram por passarem a virada no ambiente que os acolheu, por todo o ano. Como ele, intimo daquela pedra, de suas escarpas e ranhuras, a quem procurava para ouvi-la, em suas grandes decisões. Fora ali, numa ventania de setembro, que decidira deixar livre o caminho de Maria Clara. A verdade é que, de tanto usar, gastaram o casamento, passando a viver de migalhas de carinho. Pouco tempo depois, surgiu Carolina, com o alvoroço próprio da juventude, todas as coisas ao mesmo tempo. Era linda, espiando-o, com ardor, envolvendo-o com suas longilíneas coxas torneadas. Mas ele queria mais, ou melhor, nada queria, porque o cheiro de Maria Clara, o gosto de Maria Clara ainda exalava-lhe pelos poros. Todavia, não foi por ela ou por qualquer outro motivo que, apenas acompanhado do velho ‘’Parr’’, refugiou-se na pedra do Arpoador, esperando o surgir de um novo ano. Queria, apenas, estar consigo mesmo, alheio ao barulho, deixando que seus pensamentos alçassem vôo para o destino que bem lhes aprouvesse. Porisso, sentiu-se visivelmente incomodado quando aquele senhor, vestindo branco, rosto ornamentado por espessa barba branca, sentou-se a seu lado.
‘’Incomodo?“, perguntou ele.
‘’Muito’’, respondeu Luiz Claudio.
’Mas, mesmo assim, vou ficar, afinal a pedra é de todos’’.
Luiz Claudio olhou-o de soslaio, com certo olhar de desprezo e despejou mais uísque, no copo.
- ‘’Não me oferece?’’, perguntou o velho.
- ‘’Por que o faria? Não o conheço e sua presença quebra a paz que vim buscar aqui. Afinal, quem é o senhor e o que realmente quer?’’
- ‘’Vou revelar minha secreta identidade: eu sou o ano que termina, a quem costumam chamar ‘’ano velho’’. Sou o responsável pelo fracasso de quem não conquistou o sucesso; sou o desamor dos abandonados pela paixão; sou o desespero dos acometidos por doenças definitivas; sou, enfim, o renegado que todos querem que se vá, contando os segundos para a partida, porque esperam que meu substituto, o novo, traga o amor, a paz, a saúde e o dinheiro. Você também crê que o novo sempre vence?’’
Luiz Claudio deu um longo e estudado gole no uísque, que enchia o copo, voltou a enchê-lo, ofereceu ao velho e só então falou:
- ‘’Os meus sonhos e ilusões foram sendo enterrados com o tempo, que nada muda, obsoleta lanterna de popa que, inutilmente, apenas ilumina para trás. O novo, o futuro é, sempre, a escuridão, que nos reserva incertezas, cujo rumo não conseguimos alterar: virá, do jeito que tiver que vir e a nós, impotentes, só nos resta esperar para vivê-lo. Porisso prefiro comemorar o passado: posso escolher os bons momentos vividos e deletar os maus, é apenas saber separá-los. É exatamente isto que faço sentado nesta pedra, onde vivi um grande amor. Se ele, o amor, desapareceu, isto não importa, porque o que existiu, sempre continuara existindo, como essas estrelas que, mesmo encobertas pelas nuvens, continuam brilhando, mesmo que não as possamos ver.’’

Erguendo o copo, que trazia às mãos, o desconhecido sorriu para Luiz Claudio e apenas murmurou: ‘’então, feliz ano velho’’, enquanto fogos de artifício enfeitavam os céus, anunciando... 

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Que se não me perca o amigo

Amigo queridíssimo, companheiro da mesma missa dominical, afirma apreciar meus escritos... menos quando falo mal de Dª Dilma e seu (des) governo, circunstancia que o faz deletar a matéria, já na primeira linha. É claro que se trata de beligerância especifica, que não entendo, mas que respeito. Gostaria, até por mim mesmo, poder, pelo menos, passar a largo de Dª Dilma e sua ‘’entourage’’, mas tantos são os desatinos cometidos que me sinto, digamos, perseguido por essa criatura nociva, que cresceu nociva, assaltando bancos e permanece nociva, em sua obstinação de destruir o País. Os empresários querem-na fora do governo; 90% da população querem-na fora do governo; os economistas, de modo uníssono, informam que, com ela, no Governo, a recessão caminha, a passos rápidos, para a maior depressão de nossa história. Em um primeiro momento, ele deu as mãos – e que mãos – a Eduardo Cunha. Execrado este, agora ela se prende aos dedos, não menos fétidos, de Renan Calheiros, desde que esse foi guinado a senhor e possuidor do processo de impeachment, obra e graça do ‘’puxadinho do Planalto’’ (expressão do historiador Marco Antonio Villa), vulgarmente conhecido como Supremo Tribunal Federal. Na apresentação de sua obra ‘’Nova Constituição Brasileira – anotada’’, o professor Gilberto Caldas transcreve o seguinte pensamento de Rui Barbosa, o príncipe dos advogados: ‘’num País de liberdade e ordem, quem sobre todos manda é a lei, a rainha dos reis, a superiora dos superiores, a verdadeira soberana dos povos.’’ Soberbo pensamento, mas inaplicável ao Brasil de hoje, cuja Corte Suprema, guiada pelo voto do Ministro Barroso – com aquele ar de quem ainda não se acomodou, confortavelmente, na ponta da espada da deusa Themis – estupra a Constituição, viola o principio da soberania dos poderes e age como simples mandatária da madame presidente. Assim, perco o privilégio de ter meu dileto amigo Marcelo, seguindo estas ‘’mal traçadas’’. Mas, que culpa tenho eu, mero espectador dos fatos? 

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Considerações sobre o novo salário mínimo

Leio, com o peito estufado de orgulho, que a Presidente Dilma assinou decreto, fixando em 880 reais o salário mínimo, a vigorar a partir de 1° de janeiro entrante. Diz o decreto que ‘’o governo federal dá continuidade a sua política de valorização do salário mínimo, com impacto direto sobre cerca de 40 milhões de trabalhadores e aposentados, que atualmente recebem o piso nacional.’’ O aumento (11,6%) foi de 92 reais. Como implicante, que reconheço ser, vou até a Constituição Federal para ver o que diz nossa Lei Maior sobre o dito salário e, no inciso IV do artigo 7º está gravado que o ‘’salário mínimo (deve ser) capaz de atender às necessidades vitais (do trabalhador) e às de sua família, com moradia, alimentação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social...’’ A conta, rigorosamente elaborada pela equipe econômica, para fixar o salário mínimo, dentro das exigências contidas no texto constitucional, acima transcrito, antes que as maledicentes de plantão deitem suas infâmias, é de incontestável precisão. Senão vejamos: a) aluguel de um barraco na favela do ‘’risca faca’’: 200 reais; b) 2 cestas básicas por mês: 120 reais; c) vestuário comprado na feira, lembrando que a roupa do filho mais velho é herdada pelo mais novo: 200 reais; d) sabão de côco, que serve, tanto para higiene pessoal, quanto para lavar a roupa: 5 unidades = 20 reais; e) saúde: 0 (zero) vez que o SUS proporciona excelente e rápida assistência médica e fornece, gratuitamente, medicamento; f) idem para educação, aí incluído material escolar, já que, como sabemos, a ‘’pátria educadora’’ fornece o melhor ensino publico do mundo, ao lado da Suécia e da Coréia do Sul. Assim, somados os itens acima, forçoso concluir que o trabalhador e sua família (mulher e dois filhos) tem um gasto mensal da ordem de 540 reais, sobrando-lhe, ainda 362 reais para levar a patroa ao cinema ou tomar sorvete com as crianças. Do meu ponto de vista, acho exagerado 40 milhões de pessoas esbanjando tanto dinheiro, enquanto os Ministros, esses abnegados e desinteressados servidores da pátria, estão sendo obrigados a viajar de classe econômica, chegando estressados a seus destinos. Sugiro a nossa benevolente presidente que reduza em 10 reais esse nababesco salário mínimo, dividindo o produto total de tal redução (10x40 milhões = 400 milhões), entre seus auxiliares, como forma de compensar-lhes o hercúleo esforço que vêm fazendo, para nos tirar a todos desta crise a que nos mergulhou, com certeza, o regime militar e o cenário internacional, sempre culpados por todas as nossas mazelas.  

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Por causa de cachorros próprios e alheios



Se eu percorrer o ponto mais distante de minha memória, lá encontrarei um cachorro, tantos os tive, vida afora e a todos dediquei – e dedico – carinho e cuidados. Felizmente, minha esposa pensa e sente igual e talvez tenha sido este amor pelos cães, um dos motivos que tem feito nosso casamento perdurar por tanto tempo. Com a chegada de ‘’Clovis’’, vira lata preto, de focinho branco, completamos oito cachorros. O que gastamos com ração, tapete higiênico, banho e tosa, sem falar veterinário, daria para pagarmos a prestação de um carro ‘’top’’ de linha. E daí? Nada substitui a alegria de nos ver chegar, de rolar com eles no chão, de nos deixar morder, sem raiva. Na frente da casa, ficam um pastor alemão, Rodolfo, e um vira lata de grande porte, Nara. Quando saio para o trabalho, devidamente paramentado, eles apenas me saúdam com o abanar das orelhas. Todavia, à noite, quando retorno, mesmo antes de sair do carro, eles estão a pular na grade. Querem demonstrar o afeto, pulando em mim, mordendo-me, gentilmente, as mãos, como se dissessem: - ‘’que bom que você chegou!’’ Ao entrar em casa, ouço o uivar dos três, que protegem o fundo da casa e que exigem minha presença. Olavo, o mais jovem dos três, a convidar-me para o jogo de bola. Alías, sobre Rodolfo há uma peculiaridade, que merece ser contada: todas as noites, mesmo com chuva, não importa que a madrugada já tenha se instalado, ele só se recolhe depois de eu desejar-lhe, com palavras e afagos, ‘’boa noite’’. Estabelecemos, eu e ele, um ritual que só terminará quando um de nós se for. Mas, por que estou eu a falar de meus cachorros? Porque, do outro lado da rua, uma casa foi transformada em ‘’hotel/creche’’ para cachorros. Comenta-se que a construção é irregular, porque ocupa quase duas vezes a área do terreno, quando deveria ocupar, no máximo, 2/3. Comenta-se que não tem alvará de funcionamento, já que, pelas posturas municipais, tal tipo de estabelecimento não poderia funcionar em local, estritamente residencial. Comenta-se que não possui alvará do Conselho Regional de Medicina Veterinária. Como não sou fiscal da lei e abomino delação (premiada ou não), essas irregularidades – mesmo em sendo verdadeiras – não são problema meu. O que realmente me incomoda são os donos dos cachorros, que são deixados lá das oito da manhã às oito da noite e, muita vez, por todo o fim-de-semana. Como a casa não tem um mísero metro quadrado de área livre, são dezenas de animais, confinados na área interna, a latir e a chorar, latidos e choros que me atormentam, porque, como sei interpretá-los, são lamentos de tristeza, solidão e angustia. Fico, então, a me perguntar: o que motiva esse tipo de gente a ter cachorro. Para abandoná-lo, em uma creche, buscá-lo, à noite e, provavelmente, em casa, isolá-lo, na área de serviço? Com certeza, fazem a mesma coisa com os filhos, se é que os têm. É claro que ninguém é obrigado a ter animais, mas, se os tem, exigem-se-lhes tratá-los com dignidade. Tenho orgulho das marcas que carrego nos braços e nas pernas, deixadas pelos meus cachorros: são como beijos que se perenizaram, lembranças que morrerão comigo. Morrerão? E, se houver ‘’vida além da morte’’ e eu me reencontrar com todos os cachorros que alegraram meus dias? Vejo-me rolando no chão, sendo lambido e mordido por todos eles e eu me farei de todas as idades, chamando cada um pelo nome e esticando meus braços para delicioso e interminável abraço. Esperem-me, todos vocês, Tupã, Pink, Babuska, Rufus, Bernardo, Ariela, Queen, Gringa, Tati, Judith, Kate, Dandara, Freud, Tulio, Beja, Janete e tantos outros, suprimidos pela gasta memória, porque estou chegando! Quanto a vocês, do outro lado da rua, órfãos de pais vivos, entendo e sofro com seus ganidos. Lamento que vocês tenham sido escolhidos por quem os imagina como simples adorno. Na verdade, são eles verdadeiros animais, no pior sentido do termo. 

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Mensagem para o novo ano



Já que 2016 promete ser cheio de feras, a serem combatidas, nada melhor do que começa-lo, rogando a proteção do Pai Nosso, para que nos forneça a força necessária para superar tais vicissitudes:

‘’Pai nosso,
que estás nas flores, no canto dos
pássaros no coração a pulsar;
que estás na compaixão, na paciência
e no gesto de perdão.
Pai nosso, que estás em mim, que estás
naquele que eu amo,
naquele que me fere,
naquele que busca a verdade.
Santificado seja o Teu nome por tudo que é belo,
bom justo e gracioso.
Venha a nós Teu reino de paz e justiça,
fé caridade luz e amor.
Seja feita a Tua vontade, ainda que minhas rogativas
prezem mais o meu orgulho do que as minhas
reais necessidades
Perdoa minhas ofensas, os meus erros, as minhas faltas.
Perdoa quando se torna frio meu coração;
Perdoa-me, assim como eu possa perdoar
Àqueles que me ofenderam,
Mesmo quando meu coração esteja ferido.
Não me deixeis cair nas tentações dos erros,
Vícios e egoísmo.
E livra-me de todo o mal, de toda a violência,
De todo infortúnio, de toda enfermidade.
Livra-me de toda a dor, de toda magoa
E de toda desilusão.
Mas, ainda assim, quando tais dificuldades
Se fizerem necessárias,
Que eu tenha força e coragem de dizer:
Obrigado, Pai, por mais esta lição!

Que assim seja!!’’