sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Os novos tempos e o novo pensar

Tenho observado como a evolução dos tempos e das coisas, neles contidas, modifica o entendimento das pessoas em relação à vida. Até poucas décadas atrás – 04, se tanto – chegar aos 60 anos era quase ato de proeza e provecto era considerado quem tanto durasse. Meu pai morreu aos 58 anos e a fotografia, na parede ao lado, tirada em seu último natal entre nós, mostra-me um senhor, cabeça branca, curvado por tantos anos acumulados. Quando me bate uma angústia, além da justificável, aquele choro contido, que arde o peito, procuro o silencio dos cemitérios e percorro as alamedas, calculando o tempo de vida dos definitivos habitantes do lugar, como a me certificar ter Deus me concedido mais tempo de vida do que o habitual. Da última vez, que lá estive, comparei e constatei que 70% das pessoas, que nasceram ao final do século XIX e até a primeira década do século XX não passaram dos 40 anos; os que nasceram, entre 1910 e 1930, viveram até os 60 e os que vieram ao mundo, após os anos 40, muitos – como este que vos fala – ainda estão por aqui e os que partiram contavam, em sua grande maioria, com 70 ou mais anos. Esta longevidade, essencialmente produto dos avanços da medicina, obriga-nos a rever valores, tidos como definitivos, sob pena de vivermos atrelados ao passado, enquanto o que nos resta de vida corre solto. Minha geração, bastante chegada a uma falsa cultura ou a uma cultura inútil, teve a pretensão de mudar o mundo, daí gerando brutal sectarismo: a esquerda responsabilizava os Estados Unidos por todos os males do universo e a direita via o ‘’ouro de Moscou’’ vitaminando todas as democracias, que tentassem viabilizar qualquer política pública, que privilegiasse os oprimidos. A direita derramou copiosas lágrimas pela derrocada norte-americana, no Vietnã. A esquerda sentiu no próprio corpo as marteladas, que derrubaram o muro de Berlim. A medida que nossos cabelos embranqueceram e o mundo tornou-se menor e mais próximo, pela internet, ambos, esquerda e direita, foram se aproximando e encontrando pontos comuns de sobrevivência. A solidariedade passou a ser este elo, a nos fazer enxergar, com melhores olhos, uns aos outros, cada lado dando sua colaboração para que vivamos em um mundo menos injusto. Se sou contra o Estado-empresário, por outro lado, o Governo, como expressão da vontade da maioria, não pode deixar de intervir, quando a balança ameaça se desequilibrar, prejudicando os menos favorecidos. Nós, que pertencemos, no passado, a uma geração, marcada pelo ódio e pelo ressentimento, temos a obrigação de mostrar aos jovens de hoje que somos capazes de dar as mãos, em busca do entendimento. Importa – e só importa – a prevalência do justo, que se exterioriza no direito de cada qual viver vida digna, comendo, morando, vestindo, sem que tenha, para isto, vilipendiar seu semelhante. Grotius chamava a atenção para o risco de o cidadão, ao alienar sua liberdade e tornar-se escravo do patrão, admitir a possibilidade de um povo alienar a sua e tornar-se súdito de um déspota. Rousseau buscava no ‘’contrato social’’ forma de associação que proteja e defenda, com toda força, a pessoa e os bens de cada associado e pela qual cada um, unindo-se a todos, não se submeta senão a si mesmo, para que possa permanecer livre. Pode até ser uma utopia, mas é exatamente a busca da utopia que nos mantém vivos e socialmente úteis. Saímos às ruas, para despejar um Governo que entendíamos prejudicial ao País e conseguimos nosso intento. Não queiramos, agora, trucidar seus membros, julgá-los e condená-los, sem que lhes seja assegurado amplo direito de defesa. O arbítrio, qualquer arbítrio, ao atentar contra a dignidade de um, atinge, indistintamente, a todos e é fundamental, para a preservação deste bem maior, que é a liberdade, que respeitemos, muito mais do que isto, que lutemos para que a justiça, a mais intensa justiça, sobreponha-se a nossas antipatias pessoais. Afinal, ‘’fora, Dilma’’, não pode significar ‘’morra, Dilma’’

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