Não o conhecia, fora-me recomendado por colega tributarista
que nunca viajou nas turbulentas águas do direito de família, cheio de desvios,
a nos enveredar pela psicologia. De qualquer maneira, aquele caso misturava o
trágico e o cômico. Paulo (chamêmo-lo assim) era empresário bem sucedido,
passando dos 60, casado há 30 com Beatriz (chamêmo-la, assim). Rigoroso em sua
empresa e na sua vida particular, razão pela qual os filhos – um casal – tão logo
puderam, abandonaram o ninho. O filho foi fazer um curso na Alemanha e por lá
ficou. A filha, aos 23 anos, engravidou-se do namorado, filho de rico
fazendeiro goiano, o casamento foi apressado e ela foi com ele para o interior
de Goiás. Tinha notícia de ambos pela esposa, que se comunicavam por ‘’skype’’.
Paulo orgulhava-se de nunca ter tirado férias, viagens, só a trabalho. Seu
lazer com Beatriz, resumia a jantares, sempre aos sábados e sempre no mesmo
restaurante. Segurança, acima de tudo. Até que veio o infausto acontecimento:
eis que adentra a sua sala Helena, sua secretária de 10 ou mais anos. Helena
(chamêmo-la, assim) ainda não chegara aos 40 e estava com ‘’tudo em cima’’,
principalmente as coxas torneadas, cobiça de todos os diretores da empresa. A relação
entre Paulo e Helena era, como sempre foi: de senhor e senhora, sem qualquer
intimidade. Naquele fatídico dia, Helena entrou na sala de Paulo, levando-lhe o
primeiro café do dia e a agenda de compromissos: ‘’Doutor Paulo, não se esqueça de que hoje é seu aniversário de
casamento. Se o senhor quiser, posso providenciar o presente.’’ Paulo não quis, mas solicitou ajuda da secretária
para comprar alguma coisa significativa. Afinal fariam 30 anos de casados.
Tendo Helena ao lado, na hora do almoço foram ao Shopping Iguatemi e, em uma
joalheria, padrão internacional, optou por um conjunto de colar e brincos.
Helena, entre constrangida e amedrontada, sugeriu-lhe, além das joias, ‘’alguma coisa mais intima, afinal o senhor e
Dª Beatriz ainda são jovens’’ – ‘’Alguma
coisa, como o que?’’, pergunta ele. ‘’Uma
lingerie, por exemplo’’, respondeu Helena, com um sorriso safado nos
lábios. Paulo restou mudo. Ao longo de toda a vida de casado, jamais comprara
uma única peça de roupa para a esposa, quanto mais um lingerie. Todavia, talvez
pelo sorriso de Helena, talvez pela data, a evocar recordações, concordou com a
proposta, desde que Helena escolhesse a peça. Dirigiram-se a uma loja
especializada e, após várias escolhas, Helena dirigiu-se ao provador, de lá
saindo com uma lingerie azul, exibindo seios pontiagudos, por cima e coxas
torneadas, por baixo. Anestesiado, Paulo não conseguia responder à pergunta: ‘’e
aí, gostou?’’ Antes que pudesse recuperar o fôlego, sentiu alguém tocar-lhe o
braço e, em voz baixa, como convém às pessoas de classe, dizer-lhe ‘’então, esta putinha é sua amante?’’
Era Beatriz.
Hoje, após explicações inúteis, Paulo cabeça baixa,
constrangido, veio tratar da separação. Quanto a Helena... talvez!
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