quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Lula e show de ontem




Ainda 4° ano da Faculdade, com a irresponsabilidade propria da juventude, fiz o meu primeiro júri. Do outro lado, na tribuna do Ministério Público, estava o Promotor, Hermínio Alberto Marques Porto, a meu juízo, o mais brilhante membro daquela Instituição e que, ao longo da vida, privilegiou-me com sua amizade. Foi, antes de tudo, um mestre que me ensinou que, condenar ou absolver, deve ser, ter que ser, exclusivamente, resultado da prova, regra que tomei para mim, nestes 40 ou mais anos que milito na advocacia criminal, esmiuçando o processo, em busca de sustação fática para a tese de defesa, a ser sustentada. O apreço pelo sempre elegante Hermínio, sedimentou em mim admiração e respeito pelo Ministério Público Paulista, onde tenho antigas e novas amizades, sempre dentro dos limites da legalidade, até porque entendo que a ‘’justiça não pode ser ação entre amigos’’, como ensinava antigo Desembargador. A lembrança de Hermínio Marques Porto, a falar da prova e a presença do Ministério Público, como Instituição, subiram-me a mim, ontem, ao assistir, com constrangimento, ao show de pirotecnia proporcionado por Procuradores da República, na denúncia oferecida contra Lula. Todos os que gastam seu tempo, acompanhando-me nestas ‘’mal traçadas’’, sabem quanto eu abomino Lula e o petismo. Todavia, se os repudio, com todo o ardor, que me concede minha raquítica pena, com muito mais ardor, curvo-me, no respeito ao Direito, sem o qual o ser humano retorna a seu estado mais primitivo. Também acho que Lula seja o ‘’maestro’’, o ‘’general’’ da tropa que assaltou a Petrobrás, mas, como indagaria meu saudoso Marques Porto, onde está a prova material, objetiva, certa de tal envolvimento? É quase inimaginável que, com dezenas de pessoas envolvidas em um desvio que, até agora, suplantou a astronômica cifra de 50 bilhões de reais, não tenha emergido um único mísero documento, a comprometer o ex-presidente. E que não se invoque, como prova, delações feitas por presos, submetidos à coação irresistível. Ou não seria ‘’coação irresistível’’ condicionar a libertação do preso à delação de alguém? O Ministro Gilmar Mendes, que não esconde sua antipatia pelo petismo, já questionou o valor da delação, onde o delator é induzido a declarar o que a autoridade quer que ele declare. Também acho que Lula seja proprietário do triplex do Guarujá e do sítio de Atibaia. Entretanto, sem prova real, retemo-nos no terreno do ‘’achômetro’’ que, em um estado de direito, não serve para condenar. Até leigo sabe que a propriedade de bem imóvel se adquire pela transcrição do respectivo título no cartório imobiliário competente. Assim está gravado em nosso Código Civil, traduzido, pelo jargão popular, na expressão ‘’quem não registra não é dono’’. E o triplex está registrado em nome da Construtora OAS, como o sítio o está em nome de dois amigos. Claro que é suspeito, mas é pouco, ou nada, para permitir condenação. O espetáculo de ontem, com direito a ilustrações, gráficos etc, era descabido e desnecessário, até porque o Ministério Público, como titular da ação penal, reporta-se ao Juiz do processo e não aos telespectadores. Por mais nefasta que seja a figura do investigado – e o é – trata-se de um ex-Presidente da República, que tem sua importância histórica e a ‘’coletiva’’ da Procuradoria teve repercussão internacional, diminuindo-nos no concerto das nações, podendo, até comprometer nossos interesses econômicos internacionais. A operação ‘’lava-jato’’ vem trazendo incomensuráveis benefícios ao País, mas seria conveniente que seus condutores não queiram se transformar em ‘’prima donna’’ de um espetáculo, que nos envergonha a todos. Lula deve ser punido, mas não porque o repudiemos, mas, porque existam (coloco o verbo no subjuntivo, que o modo da ação hipotética) provas concretas contra ele. Assim funciona no Estado de Direito, garantia da liberdade de todos, dos que amamos e dos que repudiamos. 

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