Chego em casa, ontem à noite e Rodolfo, meu politizado pastor
alemão, que sempre me recebe, festivamente, estava amuado, a um canto e lá
quedou-se. Sinto-o, assim desde domingo, quando fomos passear: nenhum sinal de
alegria ou entusiasmo, chegando a olhar, displicentemente, para um gato, que
cruzara nossa frente. Com certeza, aquele não era o Rodolfo, que eu conhecia,
de temperamento exuberante e personalidade forte. Recusou-se a me acompanhar na
subida da escada, o que foi feito apenas por Nara, a vira-lata gigante que o
iniciara na arte de atacar os pretensos invasores e demonstrar definitiva
antipatia por carteiros, motoqueiros e quetais, mas também a ser extremamente
carinhoso com os de casa. Pois foi Nara que me confidenciou os motivos do amuo
de Rodolfo: o primeiro: chegara-lhe aos ouvidos que, no sábado, eu fora visto,
no parque, em animada conversa com um rapaz que trazia, na cabeça, um boné do ‘’MST’’; o segundo: quando saí, pela
manhã, ouviu-me dizer a alguém, pelo celular, que não assistiria ao debate
Trump x Hillary, que ele, Rodolfo, aguardara, com ansiedade. Pedi desculpas a
Nara, que, naquela noite, sairíamos apenas eu e Rodolfo, para conversa pessoal,
de pai para filho. E assim fizemos! Já na esquina, ele me questionou, como um
homem, com minhas convicções, andou ‘’com
essa gentalha arruaceira do MST’’. Expliquei-lhe que, no caso, era um rapaz
de fino trato, culto, que eu conhecia de larga data e que me privilegiava com
sua amizade e que, em segundo lugar, se quiséssemos que nossas ideias fossem
respeitadas, deveríamos respeitar as ideias opostas às nossas. A isto se dá o
nome de diálogo. Aproveitei a oportunidade para falar-lhe da necessidade de ele
recompor o relacionamento dele com Olavo e Romeu, seus iguais, que protegem os
fundos da casa, o que lhe provocou imediata irritação – ‘’meus iguais, não! Olha minha origem e a duvidosa origem deles’’, -
retrucou ele. Adverti-o que este negócio de raça pura, além de preconceito
idiota, já deu margem a muitas desavenças. – ‘’Tudo bem – conciliou ele – não os ataco, mas não divido meu espaço com
eles. Quanto a sairmos juntos, vou pensar no assunto.’’ Já no parque, ele
me interpelou sobre o debate: - ‘’Você me
obrigou a assistir àquele medíocre espetáculo com os candidatos a Prefeito de
São Paulo e, agora, recusa-se ao mais importante debate do mundo, tem sentido
isto?’’ Rebato: ‘’você tem certeza
que Trump e Hillary têm inteligência suficiente para fazerem o mais importante debate
do mundo, como diz você?’’ Ele não deixou barato: ‘’os personagens não importam,
pois o que está em jogo é o destino do maior País do mundo, que nos dirige a
todos’’. Penso em contraditar, dizendo que não é bem assim, mas, como sou
conciliador e preservo a quem amo, revejo minha posição e convido Rodolfo para,
juntos, assistirmos ao confronto entre os dois candidatos norte-americanos. A tradução
simultânea, fora do ‘’tempo da bola’’,
atrapalhou o entendimento, mas questões cruciais, como emprego, política externa
marcaram a nítida posição de cada um. Rodolfo achou que Hillary jogou sujo,
quando acusou Trump de racista e sexista, no que eu observei que político é
igual, em qualquer lugar do mundo e se utiliza de todos os meios para ganhar
eleição. O importante é que, ao final do debate, eu e Rodolfo saímos
reconciliados e ele, como generosa lambida, demonstrou que a paz voltara a
reinar entre nós. Ele me fez um último pedido – ‘’quando você for andar com seu amigo, peça-lhe para tirar o boné do MST.’’
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