quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Por causa de José Dirceu

A meu juízo, não há bem maior do que a liberdade de ir e vir, no sentido mais largo do termo. Sentimos isto quando, em virtude de doença, ficamos retidos em uma cama. Pode ser o mais sofisticado hospital ou a mais confortável das casas, mas o simples fato de se ficar enclausurado, gera angustia e depressão. A vida passando lá fora e a pessoa, ali, inutilmente parada, sentindo-se excluída de um mundo, que apenas vê pela janela ou pela televisão. Estou a fazer tal obvia reflexão, quando leio a noticia que José Dirceu foi punido a ficar 20 dias sem receber visitas, porque, em sua cela, foram encontrados ‘’pen drive’’ e carregador de celular. Não nutro qualquer simpatia por José Dirceu, cérebro da organização criminosa que dilapidou o patrimônio público, nem pelo seu passado de terrorista. Todavia, incomoda-me que ele, como ser humano, privado, pelos crimes cometidos, deste bem maior, que é a liberdade, não possa ter um ‘’pen drive’’ ou, até mesmo um celular, que o ligará ao mundo. Ambas engenhocas podem ser monitoradas, evitando desvio de finalidade. José Dirceu não é traficante, a ordenar morte de seus adversários ou destruição de patrimônio alheio. Nosso sistema penitenciário – todos o sabem e todos o dizem – figura entre os mais execráveis do mundo. Dentre as várias finalidades da pena – punir, educar, servir de exemplo a terceiro – não figura a da vingança, que consiste em degradar, física e psicologicamente, a pessoa do preso. Por que se considera ser privilégio ter ele um vaso sanitário, isolado por uma cortina? Por que não pode ele ter uma geladeira, em sua cela? O argumento de que os demais presos não gozam desses ‘’confortos’’ deve ser jogado fora. Fala-se, com razão, que a prisão é ‘’escola de crime’’, exatamente porque o preso, ocioso, vê, progressivamente, sua dignidade escapar pelas grades. Em nosso sistema penitenciário o que deveria ser a regra, é tratado como privilégio e a própria sociedade é induzida a pensar assim. Atuando, há quase meio século na advocacia criminal e mesmo quando fui Diretor da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, sempre me senti diminuído, como ser humano, quando entrava em um presídio. É claro que ali não há santos, todavia, perdeu-se a consciência de que, por mais hediondos que tenham sido seus crimes, sobraram-lhes um mínimo de dignidade, que deve ser preservado. Todas as Convenções Internacionais, subscritas pelo Brasil, vedam qualquer tipo de tortura. Não seria forma de tortura obrigar um homem, septuagenário, que ocupou altos cargos no governo, a fazer suas necessidades físicas, em condições higiênicas deprimentes e à vista de outros detentos? O próprio Supremo Tribunal Federal tem tomada decisões facilitando a soltura de presos, seja por falta de vagas, nos presídios, seja pelas condições adversas dos mesmos. Não tenho qualquer simpatia por José Dirceu, abomino sua historia e seu partido, mas o respeito, como ser humano e não posso considerar ser privilegio indevido um mínimo de conforto que o Estado, que lhe tirou o máximo – a liberdade – tem a obrigação de fornecer. 

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