A meu juízo, não há bem maior do que a liberdade de ir e vir,
no sentido mais largo do termo. Sentimos isto quando, em virtude de doença,
ficamos retidos em uma cama. Pode ser o mais sofisticado hospital ou a mais
confortável das casas, mas o simples fato de se ficar enclausurado, gera
angustia e depressão. A vida passando lá fora e a pessoa, ali, inutilmente
parada, sentindo-se excluída de um mundo, que apenas vê pela janela ou pela
televisão. Estou a fazer tal obvia reflexão, quando leio a noticia que José
Dirceu foi punido a ficar 20 dias sem receber visitas, porque, em sua cela,
foram encontrados ‘’pen drive’’ e carregador de celular. Não nutro qualquer
simpatia por José Dirceu, cérebro da organização criminosa que dilapidou o patrimônio
público, nem pelo seu passado de terrorista. Todavia, incomoda-me que ele, como
ser humano, privado, pelos crimes cometidos, deste bem maior, que é a
liberdade, não possa ter um ‘’pen drive’’ ou, até mesmo um celular, que o
ligará ao mundo. Ambas engenhocas podem ser monitoradas, evitando desvio de
finalidade. José Dirceu não é traficante, a ordenar morte de seus adversários
ou destruição de patrimônio alheio. Nosso sistema penitenciário – todos o sabem
e todos o dizem – figura entre os mais execráveis do mundo. Dentre as várias
finalidades da pena – punir, educar, servir de exemplo a terceiro – não figura
a da vingança, que consiste em degradar, física e psicologicamente, a pessoa do
preso. Por que se considera ser privilégio ter ele um vaso sanitário, isolado
por uma cortina? Por que não pode ele ter uma geladeira, em sua cela? O
argumento de que os demais presos não gozam desses ‘’confortos’’ deve ser
jogado fora. Fala-se, com razão, que a prisão é ‘’escola de crime’’, exatamente
porque o preso, ocioso, vê, progressivamente, sua dignidade escapar pelas
grades. Em nosso sistema penitenciário o que deveria ser a regra, é tratado
como privilégio e a própria sociedade é induzida a pensar assim. Atuando, há
quase meio século na advocacia criminal e mesmo quando fui Diretor da
Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, sempre me senti diminuído,
como ser humano, quando entrava em um presídio. É claro que ali não há santos,
todavia, perdeu-se a consciência de que, por mais hediondos que tenham sido
seus crimes, sobraram-lhes um mínimo de dignidade, que deve ser preservado.
Todas as Convenções Internacionais, subscritas pelo Brasil, vedam qualquer tipo
de tortura. Não seria forma de tortura obrigar um homem, septuagenário, que
ocupou altos cargos no governo, a fazer suas necessidades físicas, em condições
higiênicas deprimentes e à vista de outros detentos? O próprio Supremo Tribunal
Federal tem tomada decisões facilitando a soltura de presos, seja por falta de
vagas, nos presídios, seja pelas condições adversas dos mesmos. Não tenho
qualquer simpatia por José Dirceu, abomino sua historia e seu partido, mas o
respeito, como ser humano e não posso considerar ser privilegio indevido um
mínimo de conforto que o Estado, que lhe tirou o máximo – a liberdade – tem a
obrigação de fornecer.
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