De vez em quando, cada vez com mais freqüência, aquela
angústia apertava-lhe o peito, provocando-lhe intensa taquicardia. Não sabia
bem de onde ela vinha, se do cansaço do cotidiano, se da constatação óbvia de
que a idade fizera dele refugiado, em sua própria terra. O certo é que conviver
passou a ser verbo difícil de ser conjugado, principalmente no presente. E
tinha aquela viagem para fazer. Houve um tempo que elas, as viagens, faziam-no
sentir importante e sempre trazia a possibilidade de conhecer novas pessoas.
Agora, não mais suportava as confusões de aeroporto, pessoas atropelando
pessoas, vistorias constrangedoras, em nome da segurança. E, para piorar, não
conseguira lugar no corredor e seguiu, espremido na poltrona do meio, entre uma
jovem, que não despregava os olhos do ‘’lap top’’ e um senhor gordo que
insistia em dar ordens pelo celular. Depois de todas aquelas recomendações
inúteis, feitas por robótica comissária de bordo, o avião iniciou o
procedimento de decolagem. Rompendo hábito, adquirido desde que voara pela
primeira vez, não fez o ‘’nome do Pai’’. Esquecimento? Pensamento subjugado por
indefinidos pensares? Ou seria espécie de desafio ao Todo Poderoso? Afinal,
estava cansado de, sempre, ser o responsável pela vida de todos os passageiros,
salvando-os, com aquele simples gesto protetor, como, de resto, sentia-se
exaurido por ser, sempre, o provedor. Em seus devaneios, imaginava as delícias
de ser o provido, recebendo tudo de mão beijada, sem as preocupações de
‘’correr atrás’’. Há quanto tempo o telefone não tocava, alguém simplesmente
querendo saber dele, como ia... Sempre alguém pedindo, reivindicando,
cobrando-lhe soluções. Recusou o insípido e indigente serviço de bordo que, de
repente, foi suspenso, porque, como justificou o comandante, ‘’a aeronave
entrara em zona de intensa turbulência’’, que foi aumentando, gradativamente. A
jovem, ao lado, não disfarçava seu nervosismo e o homem, à janela, suava pelas
têmporas. Ele, como em situações análogas, simplesmente fechou os olhos e
procurou zerar seus pensamentos. Sabia que estavam na mão do imponderável e
eram impotentes para reverter qualquer situação contrária. O avião chacoalhava,
cada vez com mais intensidade e bolsas se desprenderam do bagageiro. As pessoas
já não disfarçavam seu quase pavor, quando o comandante, depois de várias explicações
inaudíveis, informou que fariam um pouso de emergência. Ele, em absoluto
silêncio, sem mover um músculo, sentiu-se culpado, pelo ‘’nome do Pai’’, não
feito, antes de o avião decolar. Fazê-lo agora, não seria ato de confiança, mas
de covardia. Estranhamente, mantinha-se calmo, alheio ao desespero coletivo e
assim se manteve, até a aeronave explodir no solo.
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