quarta-feira, 18 de maio de 2016

A Violência, hoje e ontem



Pela internet chega-me a noticia de jovem assaltante, preso em flagrante por populares, que o amarraram a um poste e o surraram, até a chegada de uma viatura policial que, a tempo, impediu-lhe a morte. Já na semana passada, em jogo de futebol, torcedores de um clube agrediram, com incomum agressividade, um único simpatizante do time adversário, desferindo-lhe socos, pontapés e até pauladas, tendo o rapaz agredido sido removido, inconsciente, em maca. Provavelmente a Psicologia explique porque pessoas, isoladamente pacíficas, quando reunidas, sejam capazes de praticar atos de barbárie. Os fatos acima remetem-me a minha interiorana cidade, eu com meus 10 anos. Uma jovem da sociedade local fora estuprada morta e abandonada, em terreno baldio, localizado na periferia da cidade. O crime provocou enorme comoção popular, não só pela sua inusitada natureza, mas também por envolver moça de uma das mais proeminentes famílias de uma cidade que, à época, não teria mais do que 30 mil habitantes e onde todos se conheciam e mantinham estreitas e afetuosas relações, freqüentando o mesmo clube, indo ao único cinema e aos poucos – dois ou três – restaurantes e sorveterias. É claro que, quando falo ‘’todos’’, refiro-me àquela minoria privilegiada, que constituía a ‘’nata’’ da população. O certo, porém, é que, identificado o assassino, dias após o sepultamento da vítima, seus familiares e amigos realizaram verdadeira caçada para localizá-lo. Encontraram-no, dormindo, em modestíssima casa, em um bairro pobre, distante, cerca de um quilometro do centro da cidade. Era um mulato forte, de uns 30 anos, que não esboçou qualquer reação ao ser amarrado e arrastado, sob pancadas, até a praça principal, onde foi linchado por dezenas de pessoas, algumas, até, que nem mesmo conheciam a vítima. Eu, sentado em uma mureta defronte, a tudo assisti e, mais de meio século depois, ainda vejo o semblante horrorizado do criminoso – Haroldo, era seu nome – que se deixou imolar, sem qualquer gesto de defesa. Muitos de seus agressores – comerciantes, profissionais liberais – eu os conhecia, cumprimentava-os, no dia a dia, e sabia serem pessoas pacatas que, inclusive, freqüentavam a missa dominical. Fico a me perguntar que vírus da fúria incontrolada é neles inoculado para que, quando reunidos em grupo, sejam transformados em bestas-feras. O linchamento de Haroldo, ocorrido há mais de 50 anos, em uma pequena cidade do interior, repete-se, com a mesma fúria, por motivos de menor relevância, na maior cidade do Brasil. Até quando o homem continuará a ser o lobo do homem?

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