quarta-feira, 4 de maio de 2016

A charge e o voto



O cartunista Chico Caruso fez uma charge, publicada no jornal ‘’O Globo’’, vilipendiando a classe dos advogados, retratada como ‘’pior do que bandido’’, como diz o texto do desenho. A Ordem dos Advogados não se pronunciou, em defesa da classe, mas três profissionais do Direito, sentindo-se atingidos em sua honra e dignidade, estão movendo ações indenizatórias contra o cartunista, o qual, em sua defesa, invoca a liberdade de expressão, amparada por mandamento constitucional. A mim, advogado de pouco lustro, mas larga jornada, a charge, que considero coisa chata, sem graça, despida de qualquer valor artístico, não trouxe qualquer desconforto subjetivo. Todavia, sair dando tiros verbais e por escrito e, depois, buscar proteção na ‘’liberdade de expressão’’ é interpretar a ordem constitucional de modo equivocado. A ‘’liberdade’’ não tem valor absoluto, limita-se pela liberdade do outro e quem ultrapassa esse limite, deve responder pelo excesso. Assim o é em todos os países civilizados. Vejam a diferença de tratamento, no caso do deputado Jair Bolsonaro que, em seu voto pelo impeachment, rendeu homenagens a um oficial do Exercito, já falecido e tido como torturador, à época do regime militar. É claro que Bolsonaro pode invocar, em seu beneficio, o disposto no artigo 53 de nossa Lei Maior, que estabelece: ‘’os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos.’’ Observo, na esteira dos ensinamentos do eminente constitucionalista, José Afonso da Silva, que ‘’o STF firmou entendimento no sentido de que qualquer declaração feita nas dependências do Congresso Nacional, seja na Tribuna ou nas Comissões, é objeto de inviolabilidade parlamentar, não sendo necessário analisar se existe ou não nexo causal entre as afirmações e o exercício do cargo para se aplicar a inviolabilidade.’’ (Inq. 655, Relator, Ministro Nelson Jobim). Como nos lembra o insigne jurista, a inviolabilidade constitui, material e formalmente, verdadeira excludente penal. Ora, a matéria é de conhecimento primário, para qualquer advogado, mas, mesmo assim, noticia-se que a Ordem dos Advogados, que nem mesmo demonstrou desagrado pela charge, estampada em um dos mais importantes jornais do País, ingressou com representação, pugnando pela cassação do Deputado, pela sua inoportuna declaração de voto. Vivemos tempo de cizânias, reconheço, mas, pelo menos os operadores do Direito devem observar as leis, antes de saírem atirando, como se amadores fossem.

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