sexta-feira, 24 de julho de 2015

Mensagem a um amigo que partiu


Olho, na parede ao lado, o quadro de nosso time de futebol, na faculdade e constato que você é o primeiro, em pé. O ano, 1965 e, modéstia à parte, éramos imbatíveis, você, zagueiro, à antiga, passava a bola, não o jogador. E fomos amigos fraternos, no sentido mais literal do termo. Dividíamos o estudo e, depois de formados, as vicissitudes e alegrias, pessoais e da profissão. Quando meu primeiro filho pulou para a vida, eu, já morando no Rio, você enfrentou nuvens traiçoeiras e foi batizá-lo. Honra e prazer que se concedem a poucos. Quando eu adoeci, você, carregando ‘’nosso pai-de-santo’’, novamente cortou os ares e foi assistir e curar meu mal. Depois fomos todos, inclusive Renata, companheira de vida inteira, comemorarmos, naquele ‘’inferninho’’ da Rua Prado Jr. E foram tantas historias, vividas em meio século de convivência, sem o menor desentendimento. Senti, com indescritível tristeza e angústia, a partida de sua filha, ainda adolescente e, naquele trágico momento, o brilho de seus olhos começou a se apagar e parte de você se foi com ela, deixando-o, coração permanente sangrando. Vi-o, pela penúltima vez, na porta do fórum, esquálido, cabeça baixa, como se estivesse envergonhado de estar por aqui. Falamo-nos, rapidamente, apenas aquele frio ‘’olá, como vai’’ e ficou a ausência do abraço não dado, que, ainda agora, aperta-me o peito. E o vi, pela última vez, no leito do hospital, você, na sua inconsciência, buscando respirar um ar que seus pulmões teimavam em não receber. Quando saí, já tinha a convicção que você se fora, que, naquele quarto, ficara apenas um espectro do homem, que caminhara comigo, por tantos caminhos, desde o campo da PUC que vejo, no retrato ao lado, até aquele lúgubre encontro, na porta do fórum. Hoje, completa-se um mês, que você partiu, deixando o abraço, que não dei, a palavra de afeto, que eu não disse. Demorei 30 dias para escrever-lhe, porque, tão grande tem sido a emoção, que a caneta teimava em deixar branco o papel. Agora, eu olho o quadro na parede ao lado e tenho a dolorida certeza que você se foi, desfalcando nosso time. Fica a lembrança de tantas andanças e de uma amizade que, sem máculas, atravessou o tempo.

Adeus, amigo. Qualquer dia a gente se vê, seja onde for, para falar de coisas e de gentes, daqui e daí.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário