sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Uma jornada de sexta feira

Na verdade, tinha preparado um texto, falando do 11 de setembro de 2011 e suas atuais conseqüências, mas hoje é sexta feira, dia “sem gravata”, principalmente nestes tempos de inverno, que me remetem a minha cidade do interior, onde, quando a temperatura chegava aos 20 graus, as mulheres colocavam um casaco enorme, chamado “mantô” (escreve-se manteou) e os mais velhos diziam que era sinal que o mundo estava por acabar. Quando vim para São Paulo – lá se vai meio século- tive enorme dificuldade para me adaptar ao frio, que me deprime e me tira o ânimo para trabalhar. Frio –penso eu- é para ficar entre cobertores, tomando chocolate e comendo pão frito na manteiga. Tenho uma teoria que, sem convencer, levei a alguns médicos: se a temperatura interna do corpo gira em torno dos 35 graus, a externa, sob pena de choque térmico, não pode ser inferior. O que importa, para mim, é que sou bicho verão, partidário do “quanto mais quente, melhor”. As pessoas saltam para as ruas, os bares se engravidam de barulho e as coxas exibem sua beleza ou decadência. Não me importo com o suor, que empapa a camisa e escorre pelo rosto. Também não se pode querer tudo! Em que pese a secura do tempo, estes dias têm sido lindos. Vejo o amanhecer róseo da janela da sala e participo da noite chegante, andando pelo parque, grudado a minha casa. Ontem, calmamente saí do fórum, na Praça João Mendes e fui jogar conversa fora no escritório de um amigo, lá no final da Rua Boavista, quase no Largo São Bento. Caminhada de um quilômetro, passando pela Praça da Sé, infestada de “sem nada” e pregadores, bíblia na mão, louvando a Deus e maldizendo os homens. Fui pela XV de Novembro, que me traz algumas recordações. Outrora centro financeiro, lá tive meu primeiro escritório e lá ficava a “Freitas Bastos”, a melhor livraria de livros jurídicos da época. Tinha eu –que chique- o meu “livreiro”, que me anunciava o último lançamento e até fazia rápido resumo da biografia do autor, quando eu, ainda dando os primeiros passos na profissão, não o conhecia. Hoje, a figura do livreiro desapareceu substituída que foi pelo vendedor, que se vale do computador para acessar o livro procurado. A “Freitas Bastos” também não mais existe e, em seu lugar, funciona dessas lanchonetes, que também fornecem o “prato do dia”. A própria XV de Novembro não guarda qualquer parecença com a daquela época. Os bancos migraram para a Juscelino e Faria Lima, em busca de melhores ares, sem o cheiro de urina, que nos tira o fôlego. O calçamento destruído demonstra que, de larga data, o poder público a despreza. Os homens engravatados e as mulheres de salto alto foram substituídos por vendedores ambulantes –de qualquer coisa- e por mágicos, sem magia. Faz-se uma roda em torno de um homem –idade indefinida- que explora uma criança – não mais que 10 anos -, fazendo-a saltar dentro de um círculo, cuja borda está em chamas. Percorro essa moderna e decadente XV de Novembro, olhando-a, não com os olhos, mas com o coração, (como recomenda Santo Tomás de Aquino), que me remete ao tempo de meu escritório, situado no número 200, à “Freitas Bastos”, à cafeteria, onde lanchava às 05 da tarde. Afinal, é quase verão – primavera, o sol brilha, as coxas passam e, ainda por cima, é sexta feira, dia sem terno e gravata.  

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