A festa cristã de amanhã, 15, “Corpus Christi”, remete-me à infância, na cidade do interior, de
onde vim. Praticamente não dormíamos de 14 para 15 de junho. O pó-de-serra e as
tintas, colocadas ao pé da escada, eram os “insumos”,
a serem utilizados no trabalho, a ser iniciado, tão logo encerrasse o jantar.
Nossa rua estava incluída, no roteiro, por onde passaria a procissão do “Corpo e Sangue” de Cristo, formada por
duas alas de fiéis e, ao meio, apenas o sacerdote e seu acólito, o primeiro,
conduzindo o cálice e o segundo, a patena. Eram os únicos que podiam caminhar
sobre o tapete, que se iniciava na porta da Catedral e percorria as principais
ruas da região central da cidade, entre elas, a minha. Pois o pó-de-serra e
tintas eram, exatamente, para comporem o tapete. Cada casa se incumbia de fazer
o seu, que consistia, primeiro, em
compactar o pó-de-serra, no espaço, pré-marcado com giz, pintá-lo e,
finalmente, desenhar motivo, alusivo ao evento, tarefa que, a depender desse
desenho, podia atravessar a madrugada. Deles havia que eram verdadeiras obras
de arte, Jesus dando a comunhão, enormes “sagrados
corações”, ou simples pombas brancas, como, por falta de engenho e arte,
era o que pintávamos à porta de nossa casa. Terminada a procissão, cultivava-se
o estranho hábito de passear, de carro, sobre o tapete, provocando nuvens de
pó-de-serra coloridas. Em minha ignorância, era apenas festa religiosa, cuja essência e relevância só descobri, adulto e
voltado à religiosidade. “Eu sou o pão
vivo que desceu do céu. Quem come deste pão viverá eternamente. E o pão que eu
darei é a minha carne, entregue pela vida do mundo”. (João,6,51-58) Jesus,
quando celebrou a Ceia com seus discípulos, instituiu o Sacramento da
Eucaristia. Para mim, é o momento mais emocionante da missa, porque ao se
transformar em “pão vivo”, eu sinto
que tenho um encontro físico, com Jesus e eu o recebo, mesmo não “sendo digno” de fazê-lo. Se reconheço
esta indignidade, por que, assim mesmo, eu o acolho, dentro de mim? Antes de receber
a comunhão, dentre tantas coisas, peço que Ele me dê forças para superar
ressentimentos, preconceitos, injustiças, atos que sei praticar e que me tornam
indigno de tê-lo em “minha morada”, mas, a hóstia consagrada reforça a
esperança que alcançarei meu objetivo. Também é o momento especial de
agradecer, por tudo que conquistei,
principalmente o privilégio incomensurável de ainda estar por aqui, vivendo a
alegria de filhos e netos. A solenidade do “Corpo
e Sangue de Cristo” é aquela mesma festa de, eu criança, enfeitando a rua,
para que Jesus passasse. Com certeza, foi ali, a minha porta, que, ao passar,
Ele me abençoou, abrindo a estrada, que percorri.
Jesus! Como não amá-lo?
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