quarta-feira, 14 de junho de 2017

A festa de amanhã



A festa cristã de amanhã, 15, “Corpus Christi”, remete-me à infância, na cidade do interior, de onde vim. Praticamente não dormíamos de 14 para 15 de junho. O pó-de-serra e as tintas, colocadas ao pé da escada, eram os “insumos”, a serem utilizados no trabalho, a ser iniciado, tão logo encerrasse o jantar. Nossa rua estava incluída, no roteiro, por onde passaria a procissão do “Corpo e Sangue” de Cristo, formada por duas alas de fiéis e, ao meio, apenas o sacerdote e seu acólito, o primeiro, conduzindo o cálice e o segundo, a patena. Eram os únicos que podiam caminhar sobre o tapete, que se iniciava na porta da Catedral e percorria as principais ruas da região central da cidade, entre elas, a minha. Pois o pó-de-serra e tintas eram, exatamente, para comporem o tapete. Cada casa se incumbia de fazer o seu,  que consistia, primeiro, em compactar o pó-de-serra, no espaço, pré-marcado com giz, pintá-lo e, finalmente, desenhar motivo, alusivo ao evento, tarefa que, a depender desse desenho, podia atravessar a madrugada. Deles havia que eram verdadeiras obras de arte, Jesus dando a comunhão, enormes “sagrados corações”, ou simples pombas brancas, como, por falta de engenho e arte, era o que pintávamos à porta de nossa casa. Terminada a procissão, cultivava-se o estranho hábito de passear, de carro, sobre o tapete, provocando nuvens de pó-de-serra coloridas. Em minha ignorância, era apenas festa religiosa, cuja  essência e relevância só descobri, adulto e voltado à religiosidade. “Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem come deste pão viverá eternamente. E o pão que eu darei é a minha carne, entregue pela vida do mundo”. (João,6,51-58) Jesus, quando celebrou a Ceia com seus discípulos, instituiu o Sacramento da Eucaristia. Para mim, é o momento mais emocionante da missa, porque ao se transformar em “pão vivo”, eu sinto que tenho um encontro físico, com Jesus e eu o recebo, mesmo não “sendo digno” de fazê-lo. Se reconheço esta indignidade, por que, assim mesmo, eu o acolho, dentro de mim? Antes de receber a comunhão, dentre tantas coisas, peço que Ele me dê forças para superar ressentimentos, preconceitos, injustiças, atos que sei praticar e que me tornam indigno de tê-lo em “minha morada”, mas, a hóstia consagrada reforça a esperança que alcançarei meu objetivo. Também é o momento especial de agradecer, por tudo que  conquistei, principalmente o privilégio incomensurável de ainda estar por aqui, vivendo a alegria de filhos e netos. A solenidade do “Corpo e Sangue de Cristo” é aquela mesma festa de, eu criança, enfeitando a rua, para que Jesus passasse. Com certeza, foi ali, a minha porta, que, ao passar, Ele me abençoou, abrindo a estrada, que percorri.
Jesus! Como não amá-lo?

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