terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Rodolfo, eu, em domingo de leitura



Não é sempre que faculto a Rodolfo, meu politizado pastor alemão, a leitura das revistas semanais, principalmente quando essas trazem matéria, que podem dar margem à polêmica. Não por algum espírito de censura, mas porque Rodolfo, saído da adolescência, tem vivido seus conflitos existenciais, principalmente no campo político, minado até para quem, como eu, já chegou ao fim da estrada. Acontece que, no último domingo, voltávamos, ele, Nara e eu, de nosso matinal passeio, quando, passando pela banca de jornal, instalada na pracinha defronte, ele estancou diante das revistas e jornais, postos à venda. –“Você  já comprou aVeja”?”, quis saber ele e eu que, pelo menos para ele, não minto, respondi que sim. – “Então, quando acabar de ler, passe para mim”. Por certo, Rodolfo interessou-se sobre a matéria de capa, onde a expressão “lava-jato” está impressa com destaque. Aliás, a matéria, em si, é bem fraca e traz meras ilações sobre complô, armado pelos 3 Poderes, para sufocar a lava-jato. A  Veja”, vítima da decadência e do desinteresse pela mídia impressa, de modo geral, procura sobreviver, utilizando-se do “espetaculismo” de alguns assuntos, que são requentados, ou escritos sem qualquer responsabilidade profissional. Depois, quando são processados,  invocam a liberdade de imprensa, como manto protetor. De qualquer maneira, na segunda-feira, saindo para o trabalho, cumpri o exigido e entreguei a revista ao Rodolfo. À noite, em nosso habitual passeio, mal entramos no parque, ele perguntou:- “você acha mesmo que o Supremo, como insinuou o Ministro Gilmar Mendes, vai revogar as prisões preventivas, que ele chamou de intermináveis?” – “Deixe-me esclarecer um ponto, meu caro Rodolfo: o Supremo é órgão colegiado, decide por maioria de votos e cada Ministro tem posição independente. Gilmar Mendes fala por ele e apenas por ele, se bem que, na essência, ele tem razão, uma vez que não existe prisão preventiva por prazo indeterminado. Ela se justifica, quando o réu, em liberdade, oferece perigo à sociedade, ou pode influenciar a produção da prova, por exemplo, coagindo testemunhas, ou pode fugir. Veja o caso do Marcelo Odebrecht: foi processado, julgado e condenado. Cumpre os requisitos legais para recorrer em liberdade, mas continua preso. Por que? Porque exigem dele a delação, para ser colocado em liberdade, o que é verdadeiro estupro à lei. Se qualquer estudante de Direito sabe disso, o que se dirá dos Ministros do Supremo? A “Veja” também sabe disto, mas precisa vender exemplares e, para isto, vale tudo, principalmente torcer a verdade.” – “Mas, se você sabe que é assim, por que compra a revista?”, quis saber Rodolfo. –“Você conhece minha rotina dominical, meu querido! Percorro as Igrejas escolhidas, passeio com você e a Nara e, depois, solitariamente, aguardo o almoço, tomando vinho ou uísque. É o único dia que bebo. Aproveito, então, para ler alguma coisa superficial, de pouco ou nenhum valor e essas revistas semanais servem para isto, até porque, depois da quinta dose, nem bem mais lembro o que estou lendo.” – “Mas estou decepcionado com você – acrescenta Rodolfo - porque descobri que você levou uma grana da Odebrecht”. – “Eu, Rodolfo, de onde você tirou esta barbaridade?” – “Tá lá, um cara, com alcunha de “Botafogo”, levou 01 milhão. Não conheço outro Botafogo, senão você!” Você está redondamente equivocado, Rodolfo! Somos, segundo as últimas pesquisas, mais de 100 milhões de botafoguenses, só no Brasil. Além do mais, que importância tenho para receber propina de 01 milhão? As  que recebo são de natureza afetiva, chocolates, vinhos, doces, ofertados por clientes agradecidos. Além de tudo isto, para seu esclarecimento, na planilha de pagamentos das Construtoras, os “agraciados” estão identificados, como “italiano”, “boca mole” “todo feio” e “botafogo” etc.  e a lava-jato, por métodos não revelados, relaciona o codinome ao nome verdadeiro. Como prova, é fragilíssima, mas vivemos momentos ambíguos, em que se inverteu o ônus da prova e cabe, ao averiguado provar que o codinome não se refere a ele. O que espero é ver o Supremo, obedecendo ao princípio da legalidade, dizendo o Direito, sem se preocupar com o histerismo da mídia, é ver o Supremo legalista e não político, até porque foi desta maneira que sua história foi construída. Agora, Rodolfo, se você me permite uma sugestão, para que não fique esta imagem de que o Brasil sempre foi esta zona, que aí está, sugiro-lhe a leitura de dois livros, nesta ordem: “Madrugada sem Deus”, do Mario Donato, romance, que tem, como pano de fundo, a transformação sócio-econômica do País da fase agrícola, para a fase industrial, com todas as decorrentes implicações políticas e “Depoimento”, de Carlos Lacerda, que narra período de nossa história, onde os políticos, de ambos os lados, eram respeitáveis homens públicos, tratados com reverência pela população. E para que os detratores – sempre os há, entre nós – não digam que quero influenciá-lo, ideologicamente, quando eu acabar de ler, vou lhe emprestar “A biografia de Frei Betto”, sacerdote muito culto, que a Igreja perdeu para a subversão. Depois dessa leitura, eu e você teremos muito papo pela frente.

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