quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

A punição dos justos



Há alguns anos, ainda no primeiro mandato de Lula, na Presidência da República, colaborei com amigo, então Deputado Federal, na elaboração de projeto de lei, equiparando, em todos os níveis, o salário da Polícia Federal ao das Polícias Estaduais, inclusive Militares. Lula não só aprovou o projeto, mas também comprometeu-se  a suplementar  Estados que não tivessem recursos, para enfrentarem os conseqüentes aumentos. O projeto “morreu”, ante a resistência de importantes governadores, e  permanecendo a discrepância salarial, entre profissionais que executam tarefas similares. Apenas para se ter pálida idéia: enquanto um investigador da Polícia Federal percebe salário bruto mensal da ordem de 10 mil reais, o do investigador da Polícia Civil situa-se na faixa de 04 mil reais. Na Polícia Militar, o quadro é mais desalentador, pois há discrepâncias até entre as Unidades da Federação, com o Distrito Federal, por exemplo, pagando mais do dobro da remuneração concedida ao Policial Militar, do mesmo posto, por São Paulo e Espírito Santo. A greve, deflagrada no Espírito Santo, que se estende ao Estado do Rio e, como rastilho de pólvora, poderá atingir outros Estados, resulta do aviltamento das Policias Estaduais, sistematicamente massacradas pela mídia, a acusá-las de arbitrária e corrupta. Na 2ª feira, por exemplo, ouvi o Boechat, um dos mais importantes âncoras da televisão, manifestar-se contra a anistia aos policiais do Espírito Santo, responsabilizando-os pelas mortes ocorridas, durante o período de   paralisação. Mas, quem se responsabiliza pelos ínfimos salários dos policiais, mesmo assim pagos com atraso? Quem se responsabiliza pelas precárias condições de trabalho desses policiais, a enfrentarem a bandidagem, esta muito melhor equipada? É fácil insurgir-se contra a greve, sob o falacioso argumento que o policiamento é atividade essencial. É claro que é, por isso mesmo tem que ser tratado, pelo administrador público, pela população e pela mídia, com respeito, que começa por pagar salário digno e oferecer excelentes condições de trabalho. Ou viver com dignidade também não é “atividade essencial?”. Se o Estado, além de pagar salário vil, atrasa o pagamento, perde o direito de exigir do policial o pronto cumprimento de seu dever. A greve pode não ser legal, mas é justa e quem se coloca ao lado do justo, não pode ser punido. Há certas atividades cuja relevância só é destacada, quando não é executada  e o caos, gerado no Espírito Santo, demonstrou isto. Não foram, os policiais que mataram e saquearam. Foi o Estado que, com sua leniência,  levou famílias ao desespero, por nem mesmo poderem alimentar os filhos. As mulheres, que impediram seus maridos policiais de irem ao trabalho, são guerreiras, a merecerem nosso aplauso, pois sofrem a mesma angústia de imerecidas privações materiais e psicológicas. O Secretário de Segurança, com a empáfia própria dos que se julgam ungidos por Deus, falou em “punição exemplar aos insubordinados”, exigiu a retirada de esposas e filhos da frente dos quartéis, mas, em nenhum momento, assumiu o compromisso de, pelo menos, atualizar os pífios salários dos militares. Em sua “Crítica da Razão Pura”, Kelsen  distingue a “guerra justa” da “guerra injusta”, conceituando aquela como “de defesa necessária” e a segunda como de “agressão sem causa”. No caso, a greve da Polícia Militar, por defender, “in extremis”, direito legítimo – o da sobrevivência – foi justa, a não merecer punição. Na verdade, se há alguém a ser punido, são os administradores Públicos que, de larga data, assistem, mais, colaboram com o aviltamento do aparelho policial. O Brasil, a cada dia, parece beco sem saída.
Bruno, meu amado neto, arrume a mala, pois o aeroporto internacional é a única saída para quem tem uma vida pela frente.

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