Liga-me cliente-amigo, empresário de boa cepa, que gasta seu
já escasso tempo, lendo minhas ‘’mal
traçadas’’ e me pergunta o que significa ‘’catilinaria’’, expressão desusada – como eu -, que empreguei
outro dia. Dei-lhe rápida explicação sobre seu sentido atual – não tão atual
assim -, como sendo ‘’discurso acusatório inflamado e contundente’’. Quer ele
saber mais: de onde tirei tal expressão. Falo, mui superficialmente, de Cícero,
o maior orador de seu tempo, que, em discurso inflamado, no Senado Romano,
desanca o também Senador Catilina, que tentara liderar um frustrado ‘’golpe de estado’’. O assunto mexeu com
meu ‘’baú de recordações’’, remetendo-me ao Liceu Pasteur, onde fiz o curso clássico,
que não mais existe (o curso, não o Liceu, que continua, impávido colosso) e,
em cujas aulas de latim, ministradas pelo exigente Helio Pimentel,
enfrentávamos Cícero, Ovídio e Virgilio. Lembro-me dos textos percorridos com
meu querido amigo, o hoje laureado jornalista, José Paulo de Andrade, então
residindo na Rua Santa Cruz e cuja mãe nos brindava com uma lasanha de comer
ajoelhado. ‘’As Catilinarias’’, até
onde me lembro, eram os discursos mais fáceis de serem traduzidos. Barra pesada
mesmo, era o ‘’De Officiis’’, obra
filosófica e as ‘’Éclogas’’ de
Ovídio. Aí o jeito era consultar a ‘’burra’’,
livro proibido, que continha o texto, em latim e, ao lado, a versão, em
português. Em meu saudosismo, percorro meus livros, até localizar as ‘’Catilinarias’’, discurso pronunciado,
no senado romano, por Marcos Túlio Cícero, no ano 63 A. C. Releio-o, com o
auxilio de dicionário ‘’latim-português’’,
já que o tempo longevo obscureceu-me os neurônios. De qualquer maneira, adapto,
pela inequívoca co-relação, alguns trechos do discurso para os dias atuais,
substituindo Catilina por Dilma:
‘’Afinal, até quando, ó Dilma, abusarás de nossa paciência?
Por quanto tempo ainda estas tuas mentiras irão nos enganar? Qual a finalidade
desta desmesurada sede de poder? Como é possível que nenhum receio ou apreensão
te cansem, nem os que clamam contra ti, nem a união dos bons cidadãos, nem a
indignação, que se vê estampada no rosto de todos que, nas praças publicas,
exigem tua renuncia? Não percebes que teus intentos são manifestos? Pensas que
alguém, dentre nós, ignora o que articulastes ou onde estivestes ou com quem te
reunistes ou o que planejaste? Ó tempos! Ó costumes! Tais coisas o Congresso
sabe, a oposição vê e, no entanto essa mulher sobrevive! Só sobrevive? Muito
mais do que isso. Ela articula com a Câmara e o Senado, participa de reuniões
ministeriais, observa e designa um e outro para cargos... Ó Dilma, que coisa
ainda existe neste País para deleite teu? Aqui, além de tua turma, integrada
por indivíduos corruptos, ninguém há que não te despreze ou odeie... Ora, se
este Congresso resolver que é do agrado dele sua demissão, declara então que
vai obedecê-lo e livra a República do medo de tua administração’’...
E, em outro trecho,
Cícero parece antecipar o Juiz Sergio Moro falando para Lula: ‘’Se agora, ó Lula, eu te mandasse prender,
penso que todos os cidadãos honestos diriam ter eu agido tardiamente do que
praticado qualquer ilegalidade.’’
Obs: Marco Túlio Cícero nasceu em janeiro de 108 a.C e morreu
em maio de 45 a.C. Foi filósofo, político, mas, acima de tudo, o mais
importante advogado da Roma antiga.
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