sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Para, sem mágoas ou rancores, falar da velhice
Em um almoço, sem hora para terminar, eu e um companheiro de anciãs batalhas, ficamos a dissertar sobre as intempéries da idade. Eis um resumo de nosso papo: Ficar velho não é apenas viver do passado. É muito mais. É saber que os amigos estão morrendo e os que teimam em viver estão entrevados... ou quase. É sorrir, interminavelmente, não por necessidade interior, mas porque a boca não fecha ou a dentadura é maior que a arcada. É ainda ler jornal e, nele, ir primeiro ao obituário. É ficar pensando em como seria bom ter 30 anos ou, vá lá, 40, ou mesmo, ó Deus, 60. É ficar olhando as coxas torneadas, que passam, numa inútil esperança. É não querer, não querer, mas cada dia mais ficar mais necessitado que outrora. É, ao listar os pagamentos do mês, colocar, em absoluto primeiro lugar, o plano de saúde. É sentir plenamente que tudo que leu, aprendeu e viveu não serve absolutamente para nada. É chamar de “jovem” a quarentona e achar que Sophia Loren ainda é uma bela mulher. É reparar a decadência dos amigos, a pele que desidrata, a ausência de cabelos, as manchas senis, o andar lento e arqueado e ter o orgulho vão de ainda ter cabelos (poucos), não totalmente brancos e ser capaz de andar alguns míseros quilômetros, mesmo que isto lhe provoque dores insuportáveis. É se apegar, desesperadamente, aos filhos e netos, embora saiba que, para eles, visitá-lo, apenas aos domingos, já é grande sacrifício. É saber que já não há quem tenha prazer em lhe acarinhar a pele e já nem mesmo ter prazer em passar a mão na própria pele. É esquecer de coisas importantes e lembrar, sem saber porque, nomes, lugares há tempos esquecidos. É recitar, de um único fôlego, um soneto de Castro Alves ou a escalação da seleção de 70, mas ser incapaz de dizer o nome do lateral esquerdo da seleção do Dunga. É fazer um esforço mortal para aceitar o PT, mas no intimo, sonhar com um bom golpe militar.
Ficar velho, enfim, é sentir o isolamento e ficar amedrontado, imaginando que chegou sua vez e que não tem a menor idéia do que vem a ser a “vida eterna”.
Ficar velho, em resumo, é uma merda.
Obs. Com imprescindível auxilio de Millôr Fernandes e Oswaldo Jurema.


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