Para, sem mágoas ou
rancores, falar da velhice
Em um almoço, sem hora para terminar, eu e um companheiro de
anciãs batalhas, ficamos a dissertar sobre as intempéries da idade. Eis um
resumo de nosso papo: Ficar velho não é apenas viver do passado. É muito mais.
É saber que os amigos estão morrendo e os que teimam em viver estão
entrevados... ou quase. É sorrir, interminavelmente, não por necessidade
interior, mas porque a boca não fecha ou a dentadura é maior que a arcada. É
ainda ler jornal e, nele, ir primeiro ao obituário. É ficar pensando em como seria
bom ter 30 anos ou, vá lá, 40, ou mesmo, ó Deus, 60. É ficar olhando as coxas
torneadas, que passam, numa inútil esperança. É não querer, não querer, mas
cada dia mais ficar mais necessitado que outrora. É, ao listar os pagamentos do
mês, colocar, em absoluto primeiro lugar, o plano de saúde. É sentir plenamente
que tudo que leu, aprendeu e viveu não serve absolutamente para nada. É chamar
de “jovem” a quarentona e achar que
Sophia Loren ainda é uma bela mulher. É reparar a decadência dos amigos, a pele
que desidrata, a ausência de cabelos, as manchas senis, o andar lento e
arqueado e ter o orgulho vão de ainda ter cabelos (poucos), não totalmente
brancos e ser capaz de andar alguns míseros quilômetros, mesmo que isto lhe
provoque dores insuportáveis. É se apegar, desesperadamente, aos filhos e
netos, embora saiba que, para eles, visitá-lo, apenas aos domingos, já é grande
sacrifício. É saber que já não há quem tenha prazer em lhe acarinhar a pele e
já nem mesmo ter prazer em passar a mão na própria pele. É esquecer de coisas
importantes e lembrar, sem saber porque, nomes, lugares há tempos esquecidos. É
recitar, de um único fôlego, um soneto de Castro Alves ou a escalação da
seleção de 70, mas ser incapaz de dizer o nome do lateral esquerdo da seleção
do Dunga. É fazer um esforço mortal para aceitar o PT, mas no intimo, sonhar
com um bom golpe militar.
Ficar velho, enfim, é sentir o isolamento e ficar
amedrontado, imaginando que chegou sua vez e que não tem a menor idéia do que
vem a ser a “vida eterna”.
Ficar velho, em resumo, é uma merda.
Obs. Com imprescindível auxilio de
Millôr Fernandes e Oswaldo Jurema.
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