A respeito das pichações que têm atormentado o Prefeito João
Doria, em seu afã de transformar nossa Capital em cidade, visualmente decente,
tenho historia para contar. Faz uns três anos, Haddad era prefeito, fui
procurado por um senhor, residente no “Jardim
Lusitânia”, que fica nas imediações do Parque do Ibirapuera, e onde
predominam casas de alto padrão. Local de “caixa
alta”. Ele já era cliente antigo, proprietário, junto com o irmão, de uma
das mais badaladas franquias de pizzarias do Estado que, inclusive leva seu
carinhoso chamamento de infância. Pessoa alegre, de bem com a vida, bebedor e
conhecedor de vinho, quando me procurava, sempre trazia uma garrafa de bom
italiano, sobre cujas qualidades dissertava. Naquele dia, chegou de mãos vazias
e com olhar sombrio. Com voz tremula e olhos marejados já chegou contando que
matara um homem, fato inconcebível para mim, que convivia com sua doçura.
Depois da água e do café, pouco mais calmo, contou-me o sucedido: como era
noite de pôquer entre amigos, chegou em casa, madrugada avançada, rua deserta e
em semi escuridão. Quando virou a esquina, meio quarteirão de sua casa, viu um
homem, escalando o muro, quase do lado de dentro. Lembrou da esposa e filho,
provavelmente dormindo, em hora tão tardia. Não pensou duas vezes: apanhou o
revolver que, no transito, sempre deixava ao alcance da mão, e disparou, meio
às cegas, contra o invasor que, com o impacto da bala, caiu na rua. Carregava,
consigo, pequeno balde com piche, que se misturou ao sangue. Não carregava qualquer
arma e, por certo, seu único objetivo era sujar o imaculado muro amarelo que
fronteava a casa. Apavorado, ligou para um Delegado, amigo de longa data, que o
orientou a sair do local, imediatamente. Dali para frente, ele, Delegado,
assumia o problema. Foi para a casa do irmão, na região de Santo Amaro, onde
chegou em pranto convulso. Coisa de italiano! Ali ficou por 02 dias, até ser
orientado, pelo amigo Delegado, a se apresentar, no Distrito Policial do
bairro, mas que o fizesse acompanhado de advogado. E para isto estava em meu
escritório. Liguei para a Delegacia, combinando o horário da apresentação, sem
imprensa para fazer sensacionalismo. Estabelecemos a óbvia linha de suas
declarações; ele tinha todo o direito de imaginar que sua casa estava na iminência
de ser invadida, colocando em risco seus familiares. Ao atirar, exerceu o que,
em direito, chama-se “legítima defesa putativa”,
aquela em que, por razões objetivas, é licito imaginar-se na iminência de
sofrer injusta agressão. Alias, “putativa”
vem do verbo latino “putare”, que
significa, exatamente, julgar-se, imaginar-se. O inquérito foi instaurado,
virou processo, mas meu cliente amigo nem foi a júri, absolvido, ainda, na
primeira fase. O Promotor ainda recorreu, mas o Tribunal confirmou a absolvição,
que recebe o nome técnico de “impronuncia”.
Meu amigo, todavia, calabrês efervescente, precisou de varias sessões de
terapia, para apascentar a culpa, que não teve. Não se acalmou enquanto não
descobriu os pais da vítima, a quem, anonimamente, enviou gorda mala de
dinheiro. Se não podia devolver-lhe o filho, pelo menos supriu suas
necessidades.
Vivemos tempos cada vez mais perigosos e o estimulo a
pichadores pode trazer consequências danosas, como a aqui narrada: pais, que
perderam o filho e um homem bom e justo, que passou a viver com a alma
atormentada. Por isso, saúdo o Prefeito João Doria!
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