Um dia para esquecer (ou não)
Naquela manhã, a Presidente acordara mais mal humorada do que
de costume. Reclamou que o pão estava frio e o café fraco demais. Não conseguia
construir, no cabelo, o ninho habitual. Decididamente precisava mudar de
cabeleireiro. Como comera muita porcaria, durante a campanha (como pobre gosta
de fritura, falou consigo mesma!) engordara e estava difícil entrar na calça
comprida, que lhe comprimia o estômago, resolveu pelo conjunto verde, cor de
cocô de recém nascido. Ou fazia um regime ou reformava o guarda roupa, como já
lhe sugerira sua assessora para assuntos de moda, a Eulália, DAS 6. Passou os
olhos nos jornais do dia. Lá vinha o Obama, com aquela conversa que o Brasil
era parceiro importante. Não estava nem aí para os Estados Unidos, sua paixão
era mesmo Cuba, do velho Fidel e a Venezuela, daquele imbecil do Maduro. Não
conseguia entender como o Chavez, tão esperto, não foi capaz de escolher um
sucessor à altura. Devia ter se mirado no exemplo de Lula, modéstia a parte.
Mas a irritação maior era o fato de ter que voar 03 horas, atravessar a selva
amazônica, ir até Manaus para ouvir uma orquestra de índios, regida pelo João
Carlos Martins, executar peças de Bach. Odiava música clássica, tinha antipatia
pelo maestro, malufista histórico e não tinha a menor paciência com índio, esse
bando de gente inútil que só sabia pedir. Tremenda roubada em que o Gilbertinho
lhe enfiara, que não gostou, quando ela disse que ele iria também. Inventou mil
desculpas, reunião com metalúrgico, etc, mas ela bateu o pau, desculpe, a mão
na mesa e disse, você vai e pronto, não se fala mais nisto, quem manda é ela e
o Lula, que nem estava no Brasil, estava fazendo uma palestra, na Alemanha, com
direito a cachê de 100 mil euros, mais despesas pagas. Precisava assistir a uma
dessas palestras, para ouvir o que o Lula tinha a dizer, que valia 100 mil
euros. No Planalto, recebeu deputados, (querendo cargos, é claro), empresários
(querendo dinheiro, é claro). Dispensou o José Eduardo, porque sabia que ele
vinha falar naquela chatice de delação premiada. Almoçou uma salada e um bife
esturricado. Na volta, ia mandar trocar o cozinheiro e escolher logo o Ministro
da Fazenda, para dar uma acalmada no mercado. Falaram muito bem desse tal de
Trabuco. Gostei do nome, me lembra os tempos de guerrilheira. Gostaria mesmo
que fosse o Delfim, que sabe das coisas e até votou em mim. Mas já imaginou os
xiitas do partido?, que ele era da época da ditadura militar, gente ignorante,
que vive do passado. Às 03 da tarde, ela e alguns assessores embarcaram no avião
presidencial, com destino a Manaus. Avisou que não queria ninguém com ela, na
primeira classe. Bando de puxa sacos que só quer falar em problemas, é
Petrobrás pra lá é Petrobrás pra cá. Ia dormir e ler o livro da Fernanda
Torres, como escreve bem essa menina. Também filha de quem é! Será que ela não
aceitaria escrever meus discursos, que andam tão sem sal e sem açúcar?
Porcaria, o avião começou a balançar, odeio isto. A comissária (muito bonita,
vou mandar trocar por uma feia) informa que estamos sobrevoando a selva
amazônica, região de grandes tempestades. Penso no Alckmin e dou risada, ele se
ferrando por falta de chuva. De repente, a comissária sai da cabine de comando
e, muito nervosa, senta a meu lado: o avião está com problemas, vamos fazer um
pouso forçado em uma clareira que o comandante avistou...
Bonner, senho franzido, aparece na tela da TV: “atenção, atenção, o Jornal Nacional informa:
o avião, conduzindo a Presidente da República e comitiva desapareceu, às 17
horas, na selva amazônica. Jatos e helicópteros da Força Aérea Brasileira dão buscas no possível local, onde desapareceu a aeronave presidencial. Maiores
detalhes, a qualquer momento, no Jornal Nacional.”
Naquele mesmo instante, Michel Temer, levanta-se da poltrona,
de onde assistia ao noticiário, dirige-se ao frigobar e de lá retira uma “Moet et Chandon”, liga para sua linda
esposa e exclama: “agora, é nóis, amor, é
nois”.
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