O Ocaso da Megera
Fazia dois anos que “Mama
Doc” assumira a Presidência de Bananil e as coisas não podiam ir pior. A
inflação crescente, a falta de gêneros alimentícios, as denúncias, quase
diárias, de corrupção vinham provocando constantes manifestações de rua,
estimuladas pelos governos estaduais, quase todos de oposição a ela. Nem mesmo
contava com o apoio dos Sindicatos, incapazes de controlar a onda de
desemprego. Para tornar péssimo o que já estava ruim, o Ministério Público
descobrira contas no exterior e empresas fantasmas em nome de seus principais
auxiliares, inclusive de seu guru, o homem que a tirara do limbo e que morrera
um mês atrás, vítima de um câncer, que nunca conseguira extirpar. A conta
secreta veio à tona pela insatisfação de uma amante do falecido, excluída da
divisão do bolo. Logo ela, que correu mais riscos, arrecadando junto a
fornecedores do governo! Deitada, à beira da piscina, naquela ensolarada manhã
de domingo, Mama Doc lia a revista semanal, que trazia novas denúncias de
corrupção. Seu assessor de comunicação, Franco Escobar, já a avisara sobre as
denúncias e insistiu com a idéia de, antes da edição, ir para a rua, “empastelar” a editora. Ela não
autorizara, não queria a imprensa internacional caindo de pau sobre ela. Para
completar suas preocupações, ainda havia a história de traição de seu amante,
Dante Mercado. Seu serviço secreto lhe informara que ele estava tendo um caso
com uma jornalista que cobria o Palácio. Mostraram-lhe o retrato da moça, de
biquíni, em uma praia do nordeste. Morena, alta, coxas torneadas, seios
apontados para o alto. Instintivamente, passou a mão pela barriga proeminente, seios
quase encostados. Pensou em demitir Dante, que ele fosse curtir a amante jovem
às custas de outro, mas, pensando bem, ele era o único escudeiro fiel, que lhe
restara e os prazeres da cama, de larga data, não lhe despertavam mais
interesse. Na verdade, quase nenhum prazer lhe restava. Afora as vantagens do
poder, o salamaleque dos puxa-sacos, o tripudiar sobre os subalternos, não ter
que pagar contas, estava cansada de tudo. Das reuniões inúteis, dos ataques da
oposição, a exigir sua renúncia, o que não seria má idéia, largar aquela
chatice e terminar seus dias, naquela casa de praia, que ganhara daquela
construtora, amiga do Dante. Mas iria resistir, era mulher de luta, sempre
fora. Sozinha, naquele silencio sepulcral, já tendo bebido quase uma garrafa de
vinho, ela dormiu profundamente. De repente, acordou com falta de ar, braço
formigando e uma crescente dor que comprimia o peito. Quis gritar, mas a voz
calou-se na garganta. Uma hora depois foi encontrada morta, enquanto, no braço
da cadeira, um passarinho, da espécie “brasilis”,
gorjeava, alegremente.
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