Surpresas e Previsões.
Liga-me, enfurecido, um cliente, mais amigo do que cliente: “Você viu a pesquisa? Sua maldita previsão
está se concretizando. Vamos almoçar, que preciso falar com você.” e
desligou, melhor, bateu o telefone. Encontrei-o no restaurante de sempre,
agitando o gelo no copo com uísque. Estranhei, não era seu habito beber durante
o dia. Dei boa tarde e logo pressenti o que esperava: “boa tarde, o cacete. Marina já ganhou e como vamos conviver com essa
mulher que representa o passado? Fecho minha empresa e me mudo para Miami. E
tem mais: você é o culpado.” Esperei-o dar um demorado gole e comecei me
desculpando, afinal não era quem pilotava o avião que vitimou Eduardo Campos.
Depois – disse-lhe – a pesquisa foi realizada ainda no “quente” dessa morte. Vamos esperar o fato esfriar, os debates e
nova pesquisa, no decorrer de setembro, poderá mostrar quadro diferente. De
qualquer maneira, se se confirmar a vitoria de Marina, ela, que nenhuma
identidade tem com o PSB (aliás, no Brasil, os partidos políticos carecem de
qualquer identidade), terá que compor, à direita e à esquerda ou não conseguirá
governar. Meu amigo, olhar perdido, olhava-me sem ver e sem escutar, mergulhado
em seus pensamentos. Tentei mudar de assunto, falando do cachorro novo – o
oitavo – que chegara a minha casa. Irritado, ele me interrompeu: “cachorro, que cachorro, isto é hora de falar
em cachorro? Os negócios estão parados, a inflação se desamarrando e você vem
me falar em cachorro? O mundo, que nunca nos levou a sério, deve estar rindo de
nós, com essa opção maluca, Dilma ou Marina”. Procurei acalmá-lo, mostrando
o lado bom da vitoria da “sertaneja”:
os carros serão banidos e, em seu lugar, carruagens puxadas por eqüinos (os
mais ricos terão tílburi), desfilarão pela Avenida Paulista. Os shoppings
centers, estes templos malditos do consumismo, serão transformados em “centros de escambo”. Aos sábados, os homens trocarão seus
produtos: um par de sapatos, fabricado artesanalmente, valerá por exemplo, 20
quilos de arroz e 20 de feijão. A região de Itaquera, outrora aldeamento
indígena, será devolvida a seus antigos donos e o “Itaquerão” será utilizado para torneios e danças dos índios,
inclusive “para chamarem chuva”, que
bem estamos precisando. Voltaremos à caça, à pesca, ao cultivo familiar. Vida
simples, sem este estresse hodierno, que nos retém nos engarrafamentos. À
noite, sob a luz dos lampiões de gás, colocaremos cadeiras à porta e
recitaremos versos, enquanto as crianças – suprimidos os infames games e
celulares – brincarão de roda ou pega-pega. Aos domingos, com nossa melhor
roupa, iremos ao culto e depois, enquanto as mulheres preparam a macarronada,
nós, os homens, nos reuniremos para comentar as ultimas da Corte e bebericar
licor de genipapo. Enfim – arremato – Marina vai nos conduzir, com competência,
arrojo e celeridade ao século dezenove.
Meu amigo, que me ouvia estático, deu o último gole de uísque
e, sem dizer palavra, saiu, deixando-me a conta por pagar.
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