sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Uma sexta feira para recordar.

Ainda que vivesse mil anos, ele não esqueceria aquele fim de tarde de sexta feira. O dia quente de verão empurrava as pessoas para os bares, com cadeiras na calçada, a atravancarem o ir e vir. Por algum motivo não identificado, a não ser o hábito de só chegar em casa com a noite, seguia, preguiçosamente, em direção oposta a do seu estacionamento, onde deixava seu carro. De repente, como se saísse do chão, ela surgiu a sua frente, falando alto, com aquela inconfundível voz rouca, que lhe fizera subir o sangue. Apesar do tempo implacável, ainda era uma mulher bonita e atraente, a quem os quilos a mais fizeram-lhe muito bem. Mentalmente, fez as contas e concluiu ter ela chegado aos 45, ou quase. Conhecera-a há exatos 20 anos, na praia do Arpoador. O mesmo falar alto, o mesmo porte elegante. Ficou fascinado pelas suas coxas (sempre fora obcecado por coxas) e pelo seu ar despreocupado de puxar o biquíni. De repente, seus olhos de cruzaram e os poucos segundos em que se fixaram deram-lhe coragem para se aproximar dela, quando se encaminhava para o mar. Foram dois anos de paixão intensa, que se desfez sem causa, nem magoa. Mesmo morando na mesma cidade, trabalhando à curta distancia, nunca mais a vira. É certo que mudara de praia: preferia a do Leme, mais calma, sem o borburinho dos surfistas. Além do mais, o bairro tinha o ar interiorano com o qual guardava mais identidade, questão de raízes. Vinte anos depois, ali estava ela e alguma coisa mexeu com seu intimo. Como não o vira, ele a seguiu, a curta distancia, ouvindo a sua voz, mas sem identificar o conteúdo da conversa, que matinha com as suas companheiras. De repente, ela entrou na galeria que ligava a Avenida Rio Branco à Rua do Ouvidor e buscou uma loja de sapatos. Era a oportunidade de simular um encontro imprevisto. Pela vitrine, viu-a experimentar vários deles, escolher um, ir até o caixa, pagar e se dirigir à saída. Foi quando ele procurou a mesma porta, quase provocando uma “colisão”. Sentiu-a estupefacta, respiração presa. Passado o susto, falaram-se aquele “olá, como vai,” de sempre. Dispensadas as amigas, seguiram os dois caminhando até a Cinelândia. Poderia tê-la convidado para um chopp, ou até mesmo oferecido uma carona. Mas os três quarteirões percorridos foram suficientes para que ambos soubessem que o passado era um morto, definitivamente enterrado. 

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Surpresas e Previsões.
Liga-me, enfurecido, um cliente, mais amigo do que cliente: “Você viu a pesquisa? Sua maldita previsão está se concretizando. Vamos almoçar, que preciso falar com você.” e desligou, melhor, bateu o telefone. Encontrei-o no restaurante de sempre, agitando o gelo no copo com uísque. Estranhei, não era seu habito beber durante o dia. Dei boa tarde e logo pressenti o que esperava: “boa tarde, o cacete. Marina já ganhou e como vamos conviver com essa mulher que representa o passado? Fecho minha empresa e me mudo para Miami. E tem mais: você é o culpado.” Esperei-o dar um demorado gole e comecei me desculpando, afinal não era quem pilotava o avião que vitimou Eduardo Campos. Depois – disse-lhe – a pesquisa foi realizada ainda no “quente” dessa morte. Vamos esperar o fato esfriar, os debates e nova pesquisa, no decorrer de setembro, poderá mostrar quadro diferente. De qualquer maneira, se se confirmar a vitoria de Marina, ela, que nenhuma identidade tem com o PSB (aliás, no Brasil, os partidos políticos carecem de qualquer identidade), terá que compor, à direita e à esquerda ou não conseguirá governar. Meu amigo, olhar perdido, olhava-me sem ver e sem escutar, mergulhado em seus pensamentos. Tentei mudar de assunto, falando do cachorro novo – o oitavo – que chegara a minha casa. Irritado, ele me interrompeu: “cachorro, que cachorro, isto é hora de falar em cachorro? Os negócios estão parados, a inflação se desamarrando e você vem me falar em cachorro? O mundo, que nunca nos levou a sério, deve estar rindo de nós, com essa opção maluca, Dilma ou Marina”. Procurei acalmá-lo, mostrando o lado bom da vitoria da “sertaneja”: os carros serão banidos e, em seu lugar, carruagens puxadas por eqüinos (os mais ricos terão tílburi), desfilarão pela Avenida Paulista. Os shoppings centers, estes templos malditos do consumismo, serão transformados em “centros de escambo”.  Aos sábados, os homens trocarão seus produtos: um par de sapatos, fabricado artesanalmente, valerá por exemplo, 20 quilos de arroz e 20 de feijão. A região de Itaquera, outrora aldeamento indígena, será devolvida a seus antigos donos e o “Itaquerão” será utilizado para torneios e danças dos índios, inclusive “para chamarem chuva”, que bem estamos precisando. Voltaremos à caça, à pesca, ao cultivo familiar. Vida simples, sem este estresse hodierno, que nos retém nos engarrafamentos. À noite, sob a luz dos lampiões de gás, colocaremos cadeiras à porta e recitaremos versos, enquanto as crianças – suprimidos os infames games e celulares – brincarão de roda ou pega-pega. Aos domingos, com nossa melhor roupa, iremos ao culto e depois, enquanto as mulheres preparam a macarronada, nós, os homens, nos reuniremos para comentar as ultimas da Corte e bebericar licor de genipapo. Enfim – arremato – Marina vai nos conduzir, com competência, arrojo e celeridade ao século dezenove.
Meu amigo, que me ouvia estático, deu o último gole de uísque e, sem dizer palavra, saiu, deixando-me a conta por pagar.


sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Amenidades de uma ensolarada sexta feira de inverno.

Dude olhou-o nos olhos e sorriu-lhe, com aquele sorriso largo e absurdamente alvo, que o embriagara, desde a primeira vez que a vira. Vestia um conjunto azul marinho, cuja saia, ao sentar revelou um pedaço de coxa. Instintivamente ele olhou (ah, o magnetismo das coxas!) e ela, mais uma vez sorriu. As faces dele devem ter esfogueado, porque ela, de modo sutil como quem realiza passo de balé, alargou o cruzar de pernas, oferecendo-lhe mais coxas para serem contempladas. Ele elogiou as pernas e fez pequena – e tão inteligente quanto possível – dissertação sobre corpo de mulher e, em especial, sobre seu secular fascínio por coxas. Ela estendeu o braço, encurtando a distancia que os separava e, como quem sabe tudo, envolveu suas mãos nas dele e o convidou para um vinho, no cair da noite. A tarde transcorreu arrastada e uma ansiedade de adolescente o envolveu. O que conversar com mulher de quem não se conhece o gosto e os hábitos? Para começar: onde levá-la? Ausente da noite, só se lembrava dos lugares óbvios, fechados ou solitários à hora marcada. Ela resolveu sua inquietude. O celular tocou. Era ela: “que tal às 19 horas, no “Estalagem”, no largo de Moema? Para ele, era ótimo: não muito caro e relativamente perto. Meia hora antes, outra vez barbeado, outra vez perfumado, lá estava ele, olhos atentos a quem entrava porta adentro. De repente, ela surgiu, linda, mais alta pelo salto que usava. Ele levantou para recebê-la e ela, sempre com o mesmo sorriso, beijou-lhe levemente os lábios e, antes que ele se recuperasse do impacto, sentou-se e começou a falar de pessoas e lugares, de forma iluminada, o que o impedia de prestar-lhe atenção. Sabia – ele sabia – que estava começando a viver um perigo e, se quisesse se livrar dele, deveria, sem hesitar, sair correndo. Mas não queria. Estava vagabundo de carinho desde que Maria Clara o deixara, com ou sem motivos. Precisava sentir-se ainda vivo, capaz de despertar interesse em uma mulher como Dude, com a classe de Dude, com o sorriso de Dude e, principalmente, com as coxas de Dude. Por isso era importante fazer a perigosa pergunta: “por que você quis estar aqui comigo?”ela sorriu mais uma vez e começou a falar dela, dos seus desencontros sentimentais, de sua solidão cansada, de sua busca por um homem em que valesse a pena investir, malgrado todos os riscos. Era obvio que ela não poderia estar falando dele: ele, definitivamente velho, já chegando aos 60; pouco disponível; instável financeiramente. Mas, para o bem ou para o mal, ele se equivocara. Ela sabia tudo dele, inclusive – segredo escondido – a idade, quase suficiente para ser pai dela. Disse-lhe isto e ela deu uma gargalhada que fez as mesas em torno voltarem as cabeças. Depois, lentamente, tomou-lhe as mãos e beijou-as, repetidas vezes. Depois, puxou-o, suavemente, pelo pescoço e as bocas se uniram, o tempo para fazer nascer uma súbita paixão.   

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Turismo: outra goleada sofrida.

O “Jornal da Cultura”, edição da última terça feira, noticiou que, segundo dados de entidade internacional, dentre os 25 países economicamente mais desenvolvidos, o Brasil ocupa o 24º lugar, em turismo, atrás, por exemplo, do Irã e da Argentina. Por que mais essa goleada? Afinal, temos um dos mais belos e extensos litorais do mundo; a Amazônia e o Pantanal Matogrossense constituem riquezas e belezas aos amantes da natureza selvagem; o Rio de Janeiro continua lindo, como lindas são outras cidades de nosso rincão. Somado a tudo isso, desconhecemos grandes cataclismas, como vulcões, terremotos, furacões, etc. Argumentam alguns que a causa determinante desse absenteísmo turístico é a insegurança pública. Não creio, pois no México há tanta violência quanto no Brasil e aquele País está bem mais bem colocado. E quanto ao Irã, no olho do furacão do Oriente Médio, sem comentários. Não sou especialista no assunto, apenas viajante contumaz, mais “estático”, ultimamente, porque a grana anda curta. Todavia, identifico duas causas determinantes, colocadas, não necessariamente em ordem de importância: a falta de infra estrutura e o excessivo preço de hospedagem e alimentação, em nossos principais pontos turísticos. Não podemos perder de vista que a grande massa de viajantes pertencem à classe média e que programam, financeiramente, suas viagens. Quanto à falta de infra estrutura, basta lembrar que, em trens luxuosos, cruza-se a Europa. No Brasil, o turista que, em estando em São Paulo quiser conhecer Fortaleza, somente poderá fazê-lo de avião, cujo preço da passagem supera a do trecho Rio – Buenos Aires ou São Paulo – Miami. De automóvel, a viagem torna-se inviável, não só pela distancia, mas também porque nossas estradas, fora do Estado de São Paulo, estão em estado deplorável e os hotéis, ao longo delas, são verdadeiras pocilgas. Quem já viajou pelo interior dos Estados Unidos, por certo, conheceu os motéis (que lá tem conotação diferente daqui), espalhados ao longo das rodovias, a oferecerem total conforto e segurança aos hospedes. Outro ponto negativo é o elevado preço de passagens, hotéis e restaurantes, que afugenta o turista. Apenas por curiosidade, passei ontem, por uma agencia da CVC, ao lado de meu escritório e constatei que fica mais barato ir a qualquer outro País da America do Sul, ao Caribe e mesmo a Miami ou Nova York do que ir a Manaus. Por 100 dólares (mais ou menos 220 reais) duas pessoas comem na melhor churrascaria de Buenos Aires, enquanto, em São Paulo, gastarão, no mínimo, o dobro. Por 200 euros (cerca de 500 reais) pode-se hospedar, com todo conforto, em um hotel muito bom, próximo ao Arco do Triunfo ou ao lado do Jardim de Luxemburgo e da Sorbonne, em Paris. Pelo mesmo preço, no Rio de Janeiro, o máximo que se consegue é um hotel “meia boca”, no fundo de Copacabana, encostado à favela do “Pavãozinho”. Por essa razão, no último ano, o brasileiro gastou quase 02 bilhões de dólares, em suas andanças pelo exterior, enquanto, no Brasil a conta turismo não alcançou a metade daquele valor. Fica a pergunta: para que servem o Ministério do Turismo e a Embratur?

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Quem vai espremer Marina Silva?

Passada a comoção da brutal morte de Eduardo Campos, a disputa presidencial volta à cena, agora com Marina Silva, entre os protagonistas. Confirmando o que eu escrevera dias atrás – até porque era o óbvio – a pesquisa DATAFOLHA concluiu pela realização de segundo turno e empate técnico entre Aécio e Marina. E mais: se essa for para o segundo turno com Dilma, vence com relativa folga. Passei o fim de semana ouvindo diversos “especialistas”, debatendo o “novo” quadro sucessório, em todas as suas nuances. Apenas não ouvi qualquer referencia à plataforma política de Marina. Seria, no mínimo, ingenuidade imaginar que ela vai seguir, “im totum”, o ideário de Eduardo Campos. Ela tem personalidade forte e chega a ser “xiita” em alguns pontos e não foi por outra razão que rompeu com o PT, não aceitou alianças com o PMDB, por considerá-lo fisiologista demais e pretendeu ter ser próprio partido, um, digamos, “PV” extremado. Marina eleita, esqueçam, por exemplo, a transposição do rio São Francisco e o agronegócio, responsável pelo mínimo do desenvolvimento do País, viverá tempos adversos. Marina, como evangélica convicta, repudia o aborto e a união homoafetiva, dentre outros temas polêmicos. Parece ser consenso que será ela poupada, com Dilma atirando em Aécio e vice versa, o que, a meu modestíssimo juízo, além de recíproco tiro no pé, é incomensurável desserviço ao País. “Tiro no pé”, porque será entregar a presidência, de bandeja, para Marina. E desserviço ao País, porque todos precisamos saber, com clareza, as suas propostas, inclusive seus pontos vulneráveis. Como já disse, linhas atrás, Marina e Eduardo Campos não se fundem, nem se confundem, no plano ideológico. Eduardo, apesar de jovem, tinha larga experiência política, inclusive como Governador de um dos mais importantes Estados da Federação. Para usar linguagem anacrônica, era ele homem de centro, adepto do pragmatismo para se governar. Marina, repito, tanto como Senadora, quanto como Ministra de Lula, foi xiita, o que nos permite situá-la, a depender do tema, na extrema direita ou na extrema esquerda. Sem medo de atingir a memória – ia dizendo fantasma – de Eduardo Campos, Marina precisa ser espremida, até a última gota, para se constatar se seu “sumo” será útil ao Brasil. Fico a imaginar o que será de nós, se amanhã chegarmos ao desvario de sentir saudades de Dilma e do PT.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Para Gostar de Ler, o Retorno
Durante cerca de 10 anos, lecionei Português e Literatura para o ensino secundário, em colégios particulares de classe media, media. Estava eu na Faculdade e tirava de meus minguados proventos de professor os meios necessários à sobrevivência... e só. Nada a reclamar! Quando se é jovem, com longa estrada a percorrer, as dificuldades materiais perdem dimensão. Mas não é sobre isto que quero falar. Naquela época (hoje, não sei como a coisa funciona), os professores recebiam o programa a ser observado, no ano letivo. E tome José Alencar, Machado de Assis, Camilo Castelo Branco e outros autores, absurdamente afastados dos hábitos e costumes daqueles jovens, na faixa de seus 15 anos. Nas reuniões pedagógicas, eu propunha que nós substituíssemos, como leitura obrigatória, os autores indicados pelo Ministério da Educação, por outros, modernos à época, como Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e mesmo anteriores a esses, como Jorge Amado, cujas histórias saborosas e linguagem fácil, iriam motivar os jovens estudantes à leitura. Mesmo tendo minha proposta recusada, eu agia de acordo com meu entendimento, porque tinha a convicção das dificuldades de se enfrentar, numa idade em que a leitura não figura na relação do lazer, a linguagem empolada do autor de “O Guarani”. O prazer de ler vem com o hábito e esse se adquire pela leitura amena, de fácil e contemporânea compreensão. Surpreendi-me, décadas depois, meus filhos sendo compelidos ao mesmo defeito pedagógico. Hoje, não sei como as coisas andam, afastado que estou, de larga data, do magistério e do convívio com a juventude. Todavia, vejo surgir grande oportunidade para estimular o adolescente à leitura, com novos autores, a usarem linguagem descontraída, sem as mesóclises e as ordens inversas de meu tempo de colegial. Cito, por exemplo, as obras de John Green, (“A Culpa é das Estrelas”, “Cidade de Papel”), autor preferido pelos jovens, cujas obras já se tornaram “best seller”. Mais tarde, com o tempo, adquirido, com prazer, o hábito de ler, o jovem alçará vôos mais altos, atingindo obras mais profundas, que contribuirão para sua formação intelectual. Ser do seu tempo, é lição definitiva de vida.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O Novo Quadro Sucessório

Nada a acrescentar a tudo que se lamentou sobre a prematura morte de Eduardo Campos, jovem, mas já experiente político. Agora, é avaliar o quadro sucessório, em seu novo desenho. Marina Silva, que já possuía eleitorado próprio, verá a ela se agregar, diante do forte impacto emocional da morte de Eduardo, expressivo contingente eleitoral do falecido. A meu juízo, com o doloroso fato, perdem Dilma (mais) e Aécio (menos). Perde Dilma, porque tornou-se certa a realização de 2º turno. E perde Aécio, porque fica a dúvida se ele não será superado por Marina, aliás o que pode acontecer com a própria Dilma. A pergunta que emerge hoje é: quem irá para o segundo turno? O que me parece certo é que, caso seja Marina, sua eleição para Presidente estará garantida, pois, por óbvio, nem Dilma apoiará Aécio, nem Aécio apoiará Dilma. Está na hora de os analistas – principalmente os da área econômica – avaliarem as conseqüências nacionais e internacionais de termos Marina Silva na Presidência da República.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Para gostar de ler
Tenho ancestral hábito de percorrer livrarias – tão poucas elas são em nossa Capital -, em busca de novidades. Aquele ritual de circular pelos corredores, pegar um ou outro livro, ler as “orelhas”, para ter a síntese da história e a sucinta biografia do autor. Muita coisa nova de muitos autores quase ou nada conhecidos, alguns a gerarem encalhes. Fico a imaginar a frustração dos escritores, cujos livros repousam, inertes, nas estantes das livrarias. Esta foi a razão pela qual preferi distribuir meus modestos trabalhos entre amigos e clientes. Mesmo que não sejam lidos, não os verei abandonados. No próximo mês, se minhas combalidas finanças permitirem, estarei lançando, em grande estilo, com direito a cocktail, meu terceiro livro, misto de ficção e realidade, que trata da sucessão do Papa Francisco. Mas não estou a escrever para falar de mim. Na verdade, pretensiosamente, quero recomendar, a quem tenha o desusado hábito da leitura, um romance, onde o autor, com saborosa inteligência, mistura historia e ficção, tendo como pano de fundo os últimos dias que antecederam a queda de Salvador Allende, o Presidente do Chile, apeado do poder pelo golpe militar, comandado por Augusto Pinochet. Trata-se de “O Ultimo Tango de Salvador Allende”, cujo autor é o escritor chileno, Roberto Ampuero. Diálogos entre Allende e um padeiro, amigo seu de infância, regado a uísque e tango, além de divertidos, relatam as absurdas dificuldades vividas pelo povo chileno, naquela quadra da historia e que foram a causa determinante da queda do Presidente. Allende nos é apresentado como um idealista que, até o ultimo instante, acreditou ser possível reverter o negativo quadro econômico, reinante no País e implantar uma República Socialista no Chile. Tangenciando, correm as aventuras de um pai, americano, ex agente da CIA à época do golpe, que busca encontrar e entender a relação da filha falecida com aquele País andino, nos anos 70. Tal o engenho e arte do escritor que, ao final, eu já estava achando Allende simpático... mas passou logo.

Para quem se interessar, o livro citado pode ser encontrado na livraria Martins Fontes, quase na esquina da Avenida Paulista com a Brigadeiro Luiz Antonio.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Uma aventura aérea
Mal decolara do Santos Dumont, o avião mergulhara em densas nuvens escuras, sem lhe dar tempo de saborear a visão do “Leme”, bairro que fora sua terra encantada por tantos anos. Pela centésima ou mais vezes fazia o percurso Rio - São Paulo e, apesar de um certo desconforto, o tempo chuvoso não lhe trazia temores. Partia do principio lógico de que, se o piloto colocava a aeronave no ar, era porque não havia risco a se considerar. Seguindo velho hábito, foi um dos primeiros a embarcar e, cinto afivelado, abriu o jornal, não prestando a menor atenção nos demais passageiros que faziam enorme tumulto com suas bagagens de mão. Viu, apenas de relance, que, na poltrona do corredor, deixando vaga a do meio, sentara-se uma mulher, sem se deter nos detalhes. Até ultrapassar as nuvens espessas, o avião parecia dentro de um liquidificador, sensação inúmeras vezes experimentada por ele, o que, fora o desconforto, não o intensificava, até porque sabia que logo estaria em céu azul. A viagem prosseguiu tranquila até se aproximar de São Paulo, quando nuvens, ainda mais espessas e negras jogaram o avião para baixo e para o lado. De repente, ele notou a mulher a seu lado, com indisfarçável pavor, suando no rosto, quase a gritar por socorro. Teria, quando muito, uns 40 anos, bastante bonita e seu pânico a impedia de constatar que sua saia subira, deixando à mostra exuberante par de coxas. Ela o fitou angustiada e ele, quase mecanicamente, tomou-lhe as mãos, que ela apertou agradecida. O aviso de “afivelar cintos” deixou-a mais aflita e ele, meigamente, procurou acalmá-la, que era assim mesmo e que em alguns minutos estariam pousando em Congonhas. A seu pedido, a comissária trouxe um copo d’água que, metade, ela derramou na saia. O gesto de enxugar as coxas, com as mãos deixou-o excitado, o que era impróprio para as circunstâncias. Mas ele era obcecado por coxas, fora por elas que se apaixonara por Maria Clara e depois por Priscila. Finalmente, após meia hora de solavancos, os prédios da cidade apareceram e, cortando o resto de nuvens, o avião pousou, deslizando suave pela pista. Ela se despediu dele com tímido sorriso e saiu, ou melhor, fugiu entre os apressados de sempre. Foram se reencontrar na esteira de bagagens e ela tomou a iniciativa de se aproximar dele, desculpando-se pelo incomodo causado e ele, por mero galanteio, disse-lhe que gostaria que todas as viagens fossem como aquela. A chuva caia torrencialmente e a fila do táxi era interminável. Ele a convidou para um uísque, até o tempo e o movimento diminuírem, o que ela aceitou, de pronto. Chamava-se Andréia e era executiva de uma empresa de informática, que tinha filial no Rio. Separada – o único filho morava com o pai – vivia exclusivamente para o trabalho. Ele, habilmente, conduziu a conversa para o lado da solidão, que o amor, apesar dos dissabores, era essencial à vida e, para impressionar, recitou um trecho de poema de Camões, que fala do tema. Ela riu mais solta – estavam na segunda dose – e, meigamente, segurou suas mãos.

 Dois anos se passaram de sexo e encantamento. Andréia era, na cama, um vulcão em ebulição. Ele, entrando nos 60, parecia ter recuperado a juventude. Uma manhã, após noite frenética, ela, debruçada em seu ombro, falou em casamento. Foi a última vez que se viram e ali, naquele mesmo bar do aeroporto, ele, agora sozinho, esperava outra chuva passar.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

A campanha real e a ideal

A campanha eleitoral chegou às ruas, através de cartazes espalhados nos canteiros e às casas, através da televisão. Tornou-se, digamos, mais higiênica, sem muros pichados e sem papeis de candidatos sugando as vias publicas. Ainda se ouvem carros de som, em decibéis acima do permitido por lei, a gritarem loas a esse ou aquele candidato. Todavia, por outro lado, a campanha vai sinalizando para duas melancólicas direções: os cargos legislativos não despertam qualquer interesse dos eleitores, apesar de sua relevância. Afinal, é de lá que saem as leis, que vão reger nosso cotidiano. A verdade é que a leniência e a corrupção do Poder Legislativo geraram o descrédito e desse decorreu o desinteresse. A conclusão óbvia é que, como sempre, serão eleitos os candidatos proprietários de “currais” eleitorais, chamados, eufemisticamente de “bases eleitorais”. Esses eleitores, com larga antecedência, são agraciados com mimos, como churrascos regados a cerveja e, assim, vão estabelecendo vinculo “filosófico” com o candidato, daí, quando chega o dia da eleição, é voto certo. Não vou invocar os grandes lideres políticos do passado, os que não cambiavam seus ideais e princípios por cargos e negociatas. Sem saudosismo, apenas constato que a representação política mudou... para pior, daí o desinteresse popular. Quanto à eleição majoritária, Presidente e Governador, prenuncia-se o emprego de moderníssimos métodos, não para exibir a plataforma de governo, mas para vilipendiar o adversário. Forma-se verdadeiro exercito de internautas, encarregado de deturpar opinião de jornalistas e do adversário. Recentemente, veiculação análoga saiu dos computadores do Palácio do Planalto e a Presidente Dilma, seguindo exemplo de seu antecessor, afirma que nada sabia e vai promover “rigorosa investigação”. (?) Adversários do Governador Alckmin, seguindo velho principio de que “quanto pior, melhor”, torcem para que a seca se prolongue, obrigando a um racionamento generalizado, o que – esperam – desgaste a candidatura do mesmo. Não mais o embate de idéias, mas a “casca de banana”, colocada, subrepticiamente, à frente. Como ainda temos 2 meses de campanha pela frente, fica a esperança de que os candidatos ouçam menos seus marqueteiros e se voltem para os reais anseios da população.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Na paralegalidade o Senado cria os “paralegais”
O Senado Federal, em má hora, aprova projeto de lei, criando a figura dos “paralegais”, aquele contingente de bacharéis em Direito que, apesar de estarem diplomados, não podem exercer a profissão, porque, por não terem sido aprovados no exame de eficiência, realizado pela Ordem dos Advogados, não lograram obter inscrição nessa Entidade. O referido exame tem por objetivo aferir se o bacharel reúne o mínimo de condições intelectuais para o exercício da profissão, não se exigindo profundos conhecimentos doutrinários e jurisprudenciais. O índice de reprovação tem sido de 70%, o que demonstra o deficiente preparo dos reprovados, exatamente os abrigados pelo projeto de lei do Senado. As causas dessa deficiência podem ser debatidas em local e momento oportunos, tantas elas são. Todavia, fixo-me em uma: a proliferação das Faculdades de Direito, onde, para se ingressar, basta não “zerar”, a resposta das questões. O resultado é que estudantes, carregando deficiências do ensino médio, transportam-nas para o curso universitário e concluem esse, sem condições intelectuais para o bom exercício da profissão. O noticiário informa que o governo Federal autorizou o funcionamento de 600 Faculdades de Medicina, em todo o País, a grande maioria em cidades do interior, onde, por certo, não haverá professores habilitados, em numero suficiente, para suprir as necessidades docentes. Como, por certo, não haverá equipamentos suficientes para atender à demanda dos estudantes. Como, por certo, não haverá hospitais suficientes para estagio. O Conselho Federal de Medicina, preocupado com a deficiência dos médicos, recém formados, já pensa em realizar um exame de avaliação profissional, como condição de ingresso na profissão, tal qual já o faz a Ordem dos Advogados. Nas ultimas décadas, o Governo permitiu e até estimulou a proliferação dos cursos superiores, em nome da democratização do ensino superior. Pura, incomoda e irresponsável demagogia. Ao candidato, hoje, são dadas todas as facilidades para ingressar e cursar uma Faculdade. O resultado óbvio é o ingresso – quando ingressam – no mercado de trabalho, de jovens, tecnicamente despreparados, com visível prejuízo social. Por isso o Brasil não existe, como centro de pesquisa universitária e, no “ranking” internacional, colocamo-nos nos últimos lugares.

Voltando aos “paralegais”: o projeto aprovado autoriza que os mesmos exerçam a advocacia, desde que supervisionados por advogado, regularmente inscrito na Ordem. Ora, para isso, já existe a figura legal do “estagiário”, que adquire essa condição, ao ingressar no 4º ano da Faculdade de Direito. Na verdade, ao criar os “Paralegais”, o Senado fez emergir um profissional de segunda categoria, o que é um demérito para o próprio e para a classe. Pergunto e a resposta é óbvia: entre contratar um “paralegal” e um “estagiário”, qual será a preferência de um escritório de advocacia? Aguardemos o pronunciamento da Ordem dos Advogados do Brasil.  

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Por causa da força da natureza
Um samba, composto e cantado em minha longínqua juventude, tinha o seguinte refrão “maior é Deus do céu e nada mais...”. Lembrei dele, quando, lendo o noticiário, constato a situação caótica de nosso Estado, pela falta de chuvas. Aliás, as intempéries, provocadas pela natureza, em diferentes rincões da terra, comprovam que, por maior que tenha sido o desenvolvimento tecnológico experimentado pela humanidade, ainda não conseguimos domar as forças da natureza que se caracterizam por serem extremamente igualitárias: atuam em qualquer lugar, sem distinção entre ricos e pobres. Por certo, o crescimento desordenado das cidades e as queimadas, no campo, ajudam a agravar essas hecatombes, mas nada indica que, mesmo sem essa mãozinha nefasta do ser humano, esses desastres não aconteceriam. Assim, como estou convicto que “maior é Deus do céu e nada mais”, por que não ressuscitarmos antigo hábito (predominante, principalmente no nordeste) de sairmos em procissão, clamando por água? A verdade é que, cada vez mais voltados para nosso umbigo, esquecemos que Deus, apesar de nos ter (em má hora, ouso dizer) concedido o livre arbítrio, continua a ser nosso amparo e, se recorrermos a Ele, com fé, com certeza seremos atendidos. Enquanto não tomamos essa iniciativa – buscarmos o socorro supremo – é tratar de economizar água e nos preparar para o aumento (20%) no preço da energia elétrica, anunciado pelo governo federal.


quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Eça de Queiroz, presença constante
Meu pai, homem de poucas palavras, mas muitas leituras, exigia, como ritual ininterrupto, que, todas as noites, antes de ganhar a rua, eu lesse para ele, por meia ou uma hora. Os autores, ele os escolhia, despoticamente e, às vezes, num raro rompante de democracia, perguntava-me o que eu estava achando do livro. Esse ritual começou lá pelos meus 12 anos e continuou, mesmo já morando em São Paulo, quando ia a férias. Graças a ele, conheci Charles Morgan, A. J. Cronin, as peripécias jamesbondianas de Sherlock Holmes, Machado de Assis e, é claro, Eça de Queiroz, paixão dele, transmitida a mim. Quando ele morreu, minha mãe entregou-me, como relíquia preciosa, a coleção editada em 1945, alusiva ao centenário de nascimento do escritor, em capa de couro azul, com monograma em ouro. Foi nela que percorri, com meu pai, o mundo encantado, às vezes irônico, às vezes caústico, às vezes melancólico desse maravilhoso autor português, que ouso colocar ao lado de Zola e Vitor Hugo, como a trindade maior do realismo mundial. Por aqui, o realismo ficou por conta de Aluisio de Azevedo, apesar de sua obra monocárdica, sempre a repisar na questão social. Mas fico a falar de Eça, homem do mundo, que saiu de sua Povoa do Vazim e, depois de viver no Egito, de percorrer as Índias e a Inglaterra, foi morrer em Paris, onde era Embaixador. Começou a escrever aos 18 anos e parou, melhor, foi parado com a morte, deixando inacabada sua “A cidade e a Serra” de conteúdo bucólico, contrastando com o citadino, marca registrada de sua obra. De todos os lugares, por onde passou, Eça registrou fatos, formou personagens reais, tão reais que, com outras roupas, nós os encontramos, em nosso cotidiano. Como os miseráveis, que habitavam o “pátio dos milagres” de Vitor Hugo, ou como os mineiros contaminados e explorados de Zola.

Lá pelo final dos anos 80, resolvi fazer uma viagem a Portugal, uma viagem dedicada a Eça de Queiroz... e a meu pai. Para espanto do motorista guia que insistia em me levar a Estoril, com seu cassino e suas mulheres disponíveis, eu quis visitar os locais, descritos por Eça, como se isso me transformasse em personagem seu. Percorri o Roscio (onde Luiza suspirou seu amor proibido); percorri a “Estrada de Sintra”, palco do famoso crime, fantasiado por ele e seu amigo, Ramalho Ortigão; fui a Leiria, onde Jacinto bebia seu licor de damasco; estalei os lábios, comendo com ele, no Porto, um bacalhau à moda; reverenciei Coimbra, onde, “os vencidos da vida” envolviam as mulheres com suas capas pretas; e terminei em Povoa do Vazim, em cujo cemitério depositei jasmim – sua flor preferida – sobre seu tumulo despojado, onde se lê apenas, reproduzindo sua letra miúda, “eu sou apenas um pobre homem de Povoa de Vazim”. Lembro-me de que uma lágrima desprevenida percorreu meu rosto e empapou meu bigode. Senti que, ali, naquele momento, meu pai estava ao meu lado. Havíamos cumprido uma missão que, em silencio, combináramos. 

terça-feira, 5 de agosto de 2014

O relógio parado do Prefeito

Alguns meses atrás, forte chuva de granizo transformou a região em torno do Parque da Aclimação, em inusitado “campo de neve”. Espetáculo raro, que tirou os moradores de casa – eu, inclusive – para contemplá-lo. Mas, também, advieram os dissabores, principalmente a interdição da Rua Pedra Azul, uma das mais importantes artérias do bairro. Todavia, falo de avaria menor: o grande relógio digital, instalado no interior do Parque, desde aquela chuva parou de funcionar... e assim permanece até hoje. Inércia, a ser debitada à incompetência da administração Haddad. Parece-me lógico que um advogado, que não sabe fazer uma simples petição de juntada de documento, não conseguirá redigir um mandado de segurança. De igual sorte, médico incapaz de realizar modesta sutura, estará incapacitado para uma cirurgia de abdômen. Em síntese: uma administração pública que, em 05 meses não conserta humilde relógio, longe está de equacionar os macro problemas de saúde, educação, moradia. Se, como ensina o brocardo, “é pelo dedo que se conhece o gigante”, também por ele que se conhece o anão. Agora vou fazer uma comparação que,por certo, provocará indignações: o maior conjunto de realizações, em nossa Capital, ocorreu na administração Paulo Maluf. As empresas, que se instalaram nos imponentes edifícios, erigidos ao longo do prolongamento da Faria Lima, de larga data, pagaram, com os respectivos tributos municipais recolhidos, as obras públicas realizadas na região. É voz corrente – e não me considero habilitado para confirmar ou desmentir – que a administração Maluf ficou marcada pela corrupção. Apenas convido todos à seguinte reflexão: hoje, o endividamento da Prefeitura aumentou, a arrecadação aumentou, pelo menos, 20 vezes. Então, fica a pergunta: se a administração Haddad é um cemitério de realizações, para onde vai todo o dinheiro arrecadado?

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

O Botafogo e Shakespeare

Júlio Cesar tomba morto, assassinado a punhais que foi pelos seus algozes, aos pés da estatua de Pompeu. Brutus, seu filho adotivo e um dos assassinos, fala ao povo, justificando a morte do Imperador. Aplaudido, retira-se, acompanhado de seus comparsas, deixando Marco Antonio, sobrinho de Cesar, com a incumbência de fazer o elogio fúnebre. E começa, compungido, voz embargada: “Romanos, compatriotas, prestai-me atenção: “se tendes lágrimas, preparai-vos para derramá-las...” E o discurso segue em um crescendo, até “virar o jogo”, com a multidão saindo em perseguição aos assassinos. Lembro-me sempre deste começo do “Júlio Cesar”, de Shakespeare, quando me deparo com noticia – qualquer uma – que pode me levar às lágrimas. Um esclarecimento relevantíssimo: sou torcedor do Botafogo desde a mais tenra idade. E só do Botafogo, acima, até da seleção brasileira. Nos 10 anos que morei no Rio, ouso dizer que assisti a, pelo menos, 90% dos jogos do Botafogo. Vi Garrincha, Didi, Gerson, Jairzinho, Nilton Santos, Manga, Paulo César Caju e dezenas de outros craques de verdade. Suspenses, alegrias e tristezas eu vivi, como aquele campeonato de 1971, perdido por culpa do juiz José Marçal Filho, (jamais esquecerei o nome daquele gatuno) e de minha mulher. Sobre esta explico: passei todo o campeonato indo ao jogo com a mesma roupa, incluindo a mesma cueca e o mesmo par de meias, sem lavar, tudo guardado em uma sacola. Exatamente no dia da decisão ela mandara lavar minhas meias e a cueca. Não sou supersticioso, mas tivesse eu com aquelas peças (que não estavam tão mal cheirosas, como alegado por ela), o Fluminense não teria feito aquele irregular gol da vitória aos 41 minutos do 2º tempo. Apesar de ser emocionalmente equilibrado, chorei, descabelei-me (naquela época eu os tinha em abundancia) e fui o último a sair do Maracanã, já às escuras. Mas, o que me fez relembrar Shakespeare, relacionando-o ao Botafogo, tanto tempo depois? É que me deparo com a seguinte manchete no “Google noticias”: “Mancini admite receio de debandada no Botafogo”. E, a matéria disserta sobre a possibilidade de vários jogadores abandonarem o clube, pelo atraso no pagamento dos salários. Li e me preparei para derramar lágrimas de tristeza e humilhação. Viver é ir morrendo aos poucos, ensina o poeta e, por conseqüência, quanto mais se vive, mais se morre. Como ainda tenho lágrimas, deixo-as cair sobre o papel e morro um pouco mais. 

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

A Santa Inveja

Leio, com indisfarçável inveja, que o Produto Interno Americano, o famoso “PIB”, cresceu 4% no ultimo trimestre. Lembro-me de que, pouco tempo atrás, quando estourou a bolha imobiliária, alguns economistas de plantão, talvez ainda saudosos da falida União Soviética, afirmavam que os Estados Unidos, em definitivo, desciam a ladeira do desenvolvimento e talvez o próprio dólar desaparecesse como moeda internacional. Era, segundo diziam, a hora e a vez da China. Pois não foram necessários mais do que cinco anos para que a economia norte-americana voltasse a crescer e o dólar, mais do que nunca, dominasse o cenário financeiro internacional. Enquanto isso, em nossas paragens, já nem se fala em PIB, o superávit tem o pior resultado em 14 anos, o nível de emprego continua desabando, prevê-se aumento nos alugueres, da energia elétrica e nossa (nossa? Deus me livre!) Presidente vai para inútil reunião na Venezuela, onde se encontrará com Maduros, que acaba de quebrar aquele País e com Cristina, que largou na mão de seu Ministro da Economia a quase impossível missão de livrar a Argentina da situação de “incumprimento”, designação elegante para “moratória”. Segundo os especialistas, essa inadimplência retira a Argentina do acesso ao mercado financeiro internacional, com danosas conseqüências internas. O peso deve sofrer forte desvalorização e o povo portenho viverá dias sombrios. Se vai “sobrar” para o Brasil, (o que é quase certo) só o tempo dirá. E Dª Cristina chama seus credores de “abutres”, só porque eles querem receber o que lhes é devido. Parece Dª Dilma mandando demitir o analista do Banco Santander, que concluiu ser a reeleição danosa para a economia brasileira. Coisas da América Latina!