Deus, imerso na solidão do “eu sozinho”, não podia escapar de alguns equívocos cometidos, na “semana da criação”. E, aqui pra nós,
mesmo para Deus, 06 dias é muito pouco tempo, para tanto fazer. Por certo, cada
um de nós, se lá estivesse, teria várias sugestões a dar, de modo a melhorar a
composição estética do universo ou mesmo seu funcionamento. De minha parte não
tenho nenhuma restrição mais relevante a fazer: encanta-me as nuances do verde,
o ritmo das ondas e a beleza estonteante do por-do-sol, principalmente quando
acontece, lá longe, onde o mar acaba. O que realmente me incomoda, é o processo
de degradação física e mental que, muita vez, retira a dignidade do ser humano,
antes da partida definitiva. Já vi este melancólico fenômeno atingir várias
pessoas, inclusive da minha família. Em revista semanal recente, lá estava
Pelé, magro, olhar vazio, apoiado em “andador”.
Lembrei-me de que cheguei a São Paulo, no início dos anos 60 e ir ao Pacaembu,
ver Pelé jogar, era quase ritual. Podia-se ser torcedor de qualquer time, mas o
Santos de Pelé era de todos, acima do bem e do mal. O tempo passou, levando
todas as minhas idades. Tudo bem, afinal, entre perdas e ganhos, estou no
lucro. Mas, destroçar Pelé, a ponto de receber um beijo de misericórdia do
Maradona, é humilhação a que não merecia
ele ser exposto. A mesma coisa digo em relação a João Gilberto, absolutamente
senil, vivendo em penúria moral e material, inerte ante à ação destruidora de
seus próprios filhos. João Gilberto “mudou”
o gosto musical de várias gerações e eu estava lá, naquele barzinho do “beco das garrafas”, onde ele mostrava
sua “batida diferente”, para gente
que ainda lhe torcia o nariz, porque preferia os dramalhões de Lupicínio
Rodrigues e Antonio Maria, nas vozes de Maísa e Dolores Duram. João Gilberto
correu mundo, gravou com Stan Getz e Sinatra e não merecia acabar, em tosco e
mal cheiroso apartamento alugado.
É aqui que meto o meu bedelho! Se tivesse ao lado do Pai
Eterno, no formidável momento da criação, sugeriria que ele poupasse os gênios da
senilidade. Que eles fossem, de repente, não mais que de repente, de
preferência ao romper de sol de verão.
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