Na calma da manhã de domingo, lia eu ‘’O Globo’’, tendo ao
lado Rodolfo, meu politizado pastor alemão, a quem repassava as páginas lidas.
Em determinado momento, ele, bem a seu estilo, ergueu-se, abruptamente e foi
logo me questionando: - ‘’você, que morou tanto tempo no Rio, que tem amor até
exagerado pelo Rio, dá para me explicar a origem da alma rebelde do carioca,
meio na base ‘’si hay gobierno, soy contra? Veja você: o Eduardo Paes
revolucionou a cidade, fez uma Olimpíada de deixar o mundo de boca aberta e o
candidato dele a Prefeito fica em terceiro lugar, e a eleição vai ser disputada
entre um evangélico, ligado ao Edir Macedo e um deputado estadual do PSOL, o
partido que quer o Estado mandando em tudo.’’ Recosto no sofá, reforço o
uísque, para buscar inspiração e explico, ou melhor, justifico, da melhor
maneira possível: - ‘’o carioca é assim mesmo, tem a alma boemia e, como todo
boêmio, é contraditório – ama e odeia, com facilidade – e irreverente: diverge,
apenas pelo pretexto do boteco. E não é de hoje este comportamento. Vou lhe dar
apenas dois exemplos: quando ainda se chamava ‘’Estado da Guanabara’’, o Rio
foi administrado por Carlos Lacerda, o político mais competente e sério que
este País já produziu. Lacerda trouxe o Rio do século 19 para a modernidade,
tantas as obras realizadas e que privilegiaram, essencialmente, a classe mais
pobre. Pois, quando da escolha de seu sucessor, o povo escolheu Negrão de Lima,
um embaixador já caquético, que usava chapéu ‘’gelô’’, (depois explico), achava
que o Rio começava no Leblon, onde morava e terminava no ‘’Copacabana Palace’’,
onde almoçava. E nem carioca era. Era mineiro.’’ Outro exemplo: ao final do
regime militar e o retorno dos exilados, realizaram-se as primeiras eleições
para governadores. Quem ganha no Rio? Brizola, que era gaúcho e que, para se
eleger, fez acordo com os traficantes, de modo que a Polícia Militar não
subisse aos morros, para reprimir o tráfico. Posso falar isto de cadeira,
porque, no governo anterior, eu era Diretor da Secretaria de Segurança Pública
e, com muito empenho, fôramos implacáveis no combate à criminalidade, que
reduzimos, de modo substancial. Aí veio o Brizola com seu populismo de beira de
esquina, e destruiu todo o nosso trabalho. Deu no que deu e a bandidagem, bem
postada nos morros, domina a cidade. Veja você, amado Rodolfo, que o reduto
eleitoral do candidato do PSOL é exatamente a zona Sul, onde Eduardo Paes
introduziu os mais importantes melhoramentos. Todavia, o Rio, pela proteção do
Cristo Redentor, resiste a todas as maluquices do carioca, e, como diz Gilberto
Gil, ‘’continua lindo.’’
Rodolfo olhou-me com um ar de ‘’não sei, não’’ e foi ao
‘’caderno de esportes’’, procurar notícias do Botafogo, que era nossa maior
preocupação do dia.
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