Terça-feira me lembrou
Elis e algumas andanças
Terça-feira última, se viva fosse, Elis Regina estaria
fazendo 70 anos. Conhecia-a (eu a ela e não ela a mim), ao raiar dos anos 60,
em casa noturna, (se minha memória não me falha), chamada ‘’Au Bon Gourmet’’, situada no Rio, ali pelas imediações da Prado
Junior. Cantava, como pano de fundo para conversas. Era o que se chamava ‘’crooner’’. Depois, virou ícone de toda
uma geração. E como Pelé, quem não a viu cantar, e agora, apenas, escuta
gravações, tem, apenas, vaga idéia de sua magnitude. Aliás, uma das coisas que
apascenta a amargura da velhice, é constatar que pertenci a uma geração
privilegiada, em todos os sentidos. Vi Garrincha, Pelé, Jairzinho e Zico, e
tantos outros, de igual cepa, que me perderia em enumerá-los. Balé fantástico,
a encantar o Maracanã e o Brasil, de todas as torcidas. Na música, assisti ao
nascimento e gloria da própria Elis, além de Gal, Caetano, Chico, para falar
apenas de alguns de meus favoritos. Tom e Vinicius já eram gigantes, apenas não
tinham seu ‘’gigantismo’’ reconhecido
e proclamado. A ‘’bossa nova’’
explodia, principalmente no eixo Rio – São Paulo e, por aqui, seus ‘’templos’’ eram o ‘’Estão Voltando as Flores’’, do Capinam, que ficava ali na Avanhadava,
o ‘’Ela, Cravo e Canela’’ e o ‘’João Sebastião Bar’’, na Major Sertório.
No teatro, pelo ‘’TBC’’ e pelo
‘’Maria Della Costa’’, vi passarem a própria, Cacilda Becker, Fernanda
Montenegro, Maria Fernanda (sublime, em ‘’Um
Bonde Chamado Desejo’’), Juca de Oliveira (magnífico, em ‘’A Cozinha’’) e outras ‘’feras’’ de igual expressão.
Surpreendo-me que, ainda na faculdade, com o habitual magérrimo salário de
Professor, pudesse percorrer as duas Capitais intelectuais – boemias do País.
E, para completar, vivi os agitados dias pré e pós 64, na militância
estudantil, do ‘’lado direito’’ do rio,
o que não me impedia de ter diletos amigos ‘’do outro lado’’ como o falecido
Ministro Paulo Renato, apenas para citar um dos mais ilustres. Era época de
divergências fraternas, onde os grandes debates ideológicos eram travados entre
uma cerveja e outra. Depois de 68, todos já formados, a prudência recomendava a
‘’encolha’’, vez que qualquer lado do
rio estava sujeito a alagamentos. Mas termino por onde comecei, por Elis
Regina, voz e interpretação inigualáveis, levada cedo pela incapacidade de
dourar seus próprios monstros. Como diria o poeta: ‘’meninos, eu vi’’.
P.S.: hoje, sexta-feira, dia de pura melancolia. O verão
fecha suas portas, guardando atrás de si, o suor, que purifica o corpo e, é
claro, o magnífico espetáculo das coxas torneadas. Delas haverá, por óbvio, mas
escondidas sob calças e saias compridas, o que será como se não existissem. O
outono é como a ausência de temperatura, de que nos fala a Bíblia: ‘’porque és morto, eu te vomitarei de minha
boca’’. Nem a exuberância do verão, nem o encolhimento do inverno. Mas,
outro verão virá (virá?) e eu, seu amigo fraterno, estarei (estarei?) aqui para
recebe-lo: ‘’entra, verão, a casa é
sempre e sempre será sua, ainda que eu não mais more nela’’.
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