Não digo o nome do personagem, porque é advogado ilustre,
ainda militando em altas rodas. Só digo que foi meu colega de faculdade, vindo
de outro Estado, de família milionária. Vivíamos dias agitados, a política
universitária correndo solta, debates, assembleias
e, na ingenuidade da juventude, imaginávamos poder mudar a história. Menos ele:
era o que, à época, chamava-se “alienado”. Possuía carro, o que, naquele
remoto tempo, , já era significativo diferencial. Sempre com ternos bem
cortados, dava-se ao luxo de almoçar nos melhores restaurantes da cidade. Eis
que estoura – para meu regozijo e de meu grupo – a Revolução de 1964. A
faculdade pega fogo e os confrontos tornam-se diários e, de tão acalorados,
interrompem as aulas. Praticamente, todos se envolvem, menos, é claro, aquele
colega, para quem a Revolução nada significava, para o bem ou para o mal. Mais
importante, era o cardápio do dia. Até que, em ensolarada tarde, enquanto os
pobres mortais trabalhavam, meu recheado colega vivia intensos momentos de amor
com donzela, também de fino trato, no apartamento dela. Só que o local de algum
tempo, vinha sendo monitorado pelo então DOPS. Ali eram realizadas reuniões do
banido e execrado Partido Comunista, fato que meu colega, voltado para as boas
coisas mundanas, não tinha o menor conhecimento. Naqueles bons tempos, ser de
esquerda e contestar o regime militar, recém instalado, tinha charme e dava
prestígio e a tal donzela, para obtê-lo, emprestava seu confortável apartamento
para reuniões, onde se fantasiava a possibilidade de mandar os militares de
volta aos quartéis. O certo é que, estando o colega a meio de voluptosas
carícias, o “templo do amor” é
invadido por policiais do DOPS e os pombinhos conduzidos a local inserto e não
sabido. Nosso herói ficou vários dias, sem aparecer na Faculdade e, ao que
constou, foi solto graças à interferência de General, amigo da família que
explicou à autoridade competente que o detido era competente para declinar o
nome dos melhores restaurantes da cidade, mas, quanto aos “camaradas” perguntados, não tinha a menor ideia quem fossem.
Libertado, de volta à Faculdade, foi recebido como herói, pela “esquerda festiva” que, por óbvio,
desconhecia a versão verdadeira da prisão, contada, muito tempo depois, por
outro colega, também milionário e que, com ele, dividia as mesas caras de “comes e bebes”.
Não sei se o guapo rapaz recebeu daquelas indenizações que os governos petistas andaram distribuindo
aos “heróis da resistência”. Bem que o merecia, porque a interrupção do,
digamos, ato amoroso, poderia ter deixado profundas sequelas... se é que me
entendem! Outro dia, encontrei-o, no Tribunal. Cumprimentamo-nos, educadamente,
lembrei do fato, mas, como nunca fomos íntimos, não ousei perguntar sobre as
tais sequelas... se é que delas houve.
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