Final do dia, chego em casa, calor aquecendo o corpo e a alma
e, já no portão, encontro Rodolfo, meu politizado pastor alemão, agitadíssimo:
“você não imagina quem me ligou”,
disse-me ele, o que, por certo, eu não podia imaginar, já que nos víramos,
apenas às 8 da matina, com o habitual afago de “bom dia”. Ante meu ar de surpresa, ele atacou: “a Ângela, você conhece?” continuei sem
entender, tantas Angelas conheci e conheço, razão pela qual pedi que ele fosse
mais específico, até porque queria trocar o terno por bermuda e mergulhar na
cerveja gelada de cada dia. Rodolfo atendeu meu pedido: “a Ângela Merkel, primeira Ministra da Alemanha, amiga da minha família,
criou meu pai e mantém relações sentimentais conosco. Está preocupada com a
reeleição dela, principalmente agora, com os ventos soprando a favor da
“direita”, Trump tomando posse no próximo dia 20, a senhora Marine Le Pen favorita
na França e declarando cair fora da União Européia. Você acha que Ângela está em
perigo?” – “Sei não Rodolfo, mas ela,
como se diz no vulgar, “enfiou o pé na jaca”, quando abraçou a causa dos
imigrantes. Tudo bem que ela agiu sob violenta emoção, o impacto do momento, os
retirantes morrendo afogados, mas, depois, vieram os atentados terroristas, na
Inglaterra, na França, na Turquia e na própria Alemanha. E se o Estado Islâmico
tiver membros infiltrados entre os imigrantes? O povo alemão está desconfiado,
inseguro e pode sobrar para sua amiga. Quanto à União Européia, na verdade
nunca foi muito unida assim e quem sempre segurou o barco, prá mim, foi a
Alemanha, o país mais rico e organizado do Europa. Quando a Inglaterra caiu
fora, abriu porteira e, se dona Merkel continuar defendendo o grupo, será outro
gol contra. Para completar o astral negativo de sua “premiere”, vem a apressada
posição, assumida por ela, a favor de Hilary. Teria sido melhor ficar na
encolha e esperar os acontecimentos. A Imprensa, inclusive a cabocla, desancou
Trump, chamando-o de imbecil, desvairado e outros adjetivos pouco nobres.
Agora, começa a engolir seco: foi só ele avisar que taxará os carros
norte-americanos, fabricados no exterior e a Ford anunciar o cancelamento de
sua transferência para o México e novos
investimentos, nos Estados Unidos, da ordem de cerca de 01 bilhão de dólares, gerando
centenas de novos empregos. Ele não estava certo? De qualquer maneira, meu caro
Rodolfo, sua amiga Ângela, por quem, aliás, tenho grande admiração, está sendo
atropelada pelos acontecimentos. Veja bem, nos últimos dois anos, mais de 01
milhão de refugiados entraram na Alemanha, entre sírios, afegãos, iraquianos,
africanos e, em percentagem menor, turcos e latino-americanos, com impacto
econômico e social que trará reflexo nas próximas eleições, E, para completar,
agora surgiu a história do alemão seqüestrado pelo Estado Islâmico, que pede
resgate milionário do governo alemão, para libertá-lo. Sabe aquele antigo
ditado “se ficar o bicho pega, se correr o bicho come?”. Pois é essa a
encruzilhada: se pagar o resgate, submete-se à chantagem, se não pagar e o
seqüestrado morrer, gerando indignação geral. Para encerrar nosso papo: sua
amiga vive verdadeiro inferno astral político que, para ser superado, exige que
ela reveja algumas posições, o que não combina com o estilo durão dela.”
Cabisbaixo, Rodolfo dirige-se lentamente ao lado oposto em que nos encontrávamos. Enquanto subo a escada,
vejo-o digitar o celular e o escuto perguntar a alguém: “posso falar com a primeira ministra?”
Nenhum comentário:
Postar um comentário