segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

“últimas páginas”

Com indisfarçável surpresa, constato que o ano chega a seu final e, em pleno 2017 ainda estou por aqui, tantos companheiros ficados pelo caminho. Não sou chegado a “balanços”, porque sempre há perdas e ganhos a considerar e temos a patológica tendência de “chorar o leite derramado”, esquecidos dos momentos de paz, o papo amigo, a cerveja gelada, sorvidas  nas tardes quentes ou os vinhos encorpados, a espantarem as noites frias. Acabei de completar meu ciclo de exames médicos e, afora pequenas dores musculares, ainda dou para o gasto, mesmo que esse gasto seja apenas o trabalhar diário e a vida familiar, aí incluindo meus cachorros, filhos queridos, uns, confesso, mais queridos, como a Nara e o Olavo e, é claro, Rodolfo, meu politizado pastor companheiro de tertúlias noturnas e de fins-de-semana, a falarmos deste Brasil sem jeito, atolado na incompetência e na improbidade dos homens públicos. E, como bem observou Rodolfo, o mundo, além fronteira, também não vai melhor, com Maduro, destruindo a Venezuela, o coreano maluco, soltando mísseis e Trump insuflando mais conflitos, entre israelenses e palestinos. Também, nada disto é novidade e, entra ano, sai ano, o ser humano injeta mais ódio, ressentimento e hipocrisia em seu cotidiano viver, que, ao contrário do que ele imagina, tem encontro marcado com a morte e, o que é pior, é ela, a morte, quem marca a hora e o local deste indesejável encontro. Mas, como temos a vocação para o erro, quanto mais conquistamos a liberdade, mais nos apressamos a suprimi-la, agora, em nome desta coisa imbecil, chamada “o politicamente correto”. Já não podemos dizer o que pensamos e o que sentimos, segundo ancestral costume, porque corremos o risco de ser apontados (e, até mesmo, processados) como racistas, homofóbicos e outros epítetos de rasteiro calão. A mulher que passa, cheia de graça, e que, de graça, recebe um elogio, mesmo sem graça, ao invés de inflar o ego, corre ao distrito policial mais próximo e registra boletim de ocorrência, contra quem a elogiou, no todo ou em partes (eu, como não canso de alardear, prefiro coxas). Há cerca de 30 anos, abasteço meu carro, no mesmo posto de gasolina e, com frequência sou atendido por uma frentista a quem, por motivos óbvios, chamo “negão” e ele se refere a mim como “bigode”. Apesar de não perceber nele qualquer sinal de constrangimento, como, de igual sorte, nem de longe, penso em lhe exigir que respeite minha “doutorice”,  resolvi omitir o codinome, para não incidir em injuria racial.
Ontem, quando projetava grafar estas toscas linhas, pedi ao Rodolfo, como sugestão, o que desejar aos que gastaram seus minutos, lendo meus textos. Ele foi rápido, como os cowboys, de minha infância, ao sacar o revólver: “saúde, o máximo de saúde possível e tranquilidade, o máximo de tranquilidade possível, porque 2018 não será fácil. Ainda teremos “lava jato”, levando impurezas, sob forma de corrupção e trazendo impurezas, sob forma de arbítrio. Teremos ilusões perdidas e sonhos realizados. Deslizaremos da alegria à tristeza e, graças a Deus, vice-versa. Todavia, além de tudo isto, teremos eleições e, com elas, o horário gratuito e o desfile de pretendentes a heróis da pátria mãe gentil, que também sou filho teu e quero me servir dessa gentileza”.
Então, estes são meus votos a meus acompanhantes, conhecidos e desconhecidos, que passaram a me conhecer: muita saúde e muita tranquilidade neste ano que bate à porta. E, por falar em Deus, por que não o colocar, sempre que possamos, em nossos corações e mentes e podermos dizer, como Maria, “a minha alma engrandece o Senhor e meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador.”


Em tempo: para que não me acusem de plágio, “últimas páginas” é o título de obra do magnífico Eça de Queiróz, editada, postumamente, e que reúne crônicas do imortal escritor português.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

O “Dia da Justiça”

Saindo de casa, nesta sexta-feira, Rodolfo aborda-me: “que é da gravata, do paletó, hoje não se trabalha?” Respondo-lhe que, como se comemora o “dia da justiça”, o forum não funcionará, o que dispensa o traje oficial. Rodolfo fixa os olhos em mim e, com ar socrático, indaga: “afinal, o que é justiça?” Respondo-lhe, sintetizando  definição que remonta ao Direito Romano: “ é dar a cada um o que lhe pertence.” “E sua profissão alcança esse objetivo?”, quer saber ele, ao que retruco: “quase nunca o Direito e a Justiça conseguem marcar um encontro. Aliás, até marcam, mas o Direito, via de regra, chega atrasado, tantos os obstáculos, que encontra pelo caminho. Vou lhe dar um único exemplo, porque tenho cliente com hora marcada: faz 03 anos que busco reparação para jovem mãe, cuja única filha nasceu morta, porque o hospital (“São Luiz”, hoje, pertencendo à “Rede D’or”) negou-lhe atendimento, a que tinha direito. A prova contra o hospital é contundente e, inclusive, na esfera penal, já houve condenação, por omissão de socorro, que, para variar, recaiu sobre o atendente da noite, até, porque, como dizia, com muita sabedoria, minha falecida mãe: “o pau enverga nas costas do rico, mas quebra mesmo é no cu do pobre”. O hospital contratou o maior escritório de advocacia do Rio (para você ter ideia, o mesmo que defende Eike Batista e onde trabalha a esposa do Ministro Gilmar Mendes) e o processo, por isto ou por aquilo, não sai do lugar. Outro exemplo, para encerrar o papo: sabe aquele processo, cujos honorários permitirão nossa mudança para Arraial D’ajuda e que começou em 1995? Já ganhei em todos os Tribunais e, mesmo assim, a parte contrária, sempre contando com aqueles obstáculos, impede-me de alcançar o objetivo final. Eu e milhares de advogados poderíamos dar-lhe infindáveis exemplos deste frustrante desencontro entre o Direito e a Justiça.” Rodolfo volta à carga: “mas você não desiste, né? Lembro-me da noite, em que você chegou, sorriso aberto, até cantando, porque conseguira liberdade provisória para sua empregada, de quem, aliás, nem cobrou honorários. ” Pois é, Rodolfo, muito de quando em vez, o Direito e a Justiça conseguem se encontrar, principalmente em favor dos humildes, e aí realiza-se verdadeiro casamento real, o que reacende nosso entusiasmo... até o próximo obstáculo”.

Feliz “dia da justiça”, a todos os colegas que, em nome dela, suportam o peso da sua cruz.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

A inatingível redução da taxa de juros

Vejo a euforia dos jornalistas televisivos, anunciando que a taxa oficial de juros – a selic – caiu para 7% ao ano, a menor de nossa história, dizem. Fica a pergunta: quando essas reduções chegarão ao consumidor, se meu banco cobra 13% ao mês, no cheque especial e o cartão de crédito 20%,  os maiores encargos financeiros do mundo? Tais taxas, absurdamente extorsivas, agridem o orçamento, principalmente do pequeno e médio assalariado, que utiliza o cheque especial e o cartão de crédito para “ajudá-lo” a chegar ao fim do mês. Se ele não consegue quitar, integralmente, o débito (e quase nunca o consegue), entrará numa roda viva, da qual dificilmente sairá. Os bancos e as operadoras de cartão de crédito são verdadeiras piranhas (no duplo sentido do termo), fornecendo cheques especiais e cartões, com expressivo  limite, a pessoas de baixa renda, provocando  injusta situação: eles, os bancos e operadoras de cartão, exibindo em seus balanços, lucros astronômicos e, de  outro lado, o desassistido correntista, via de regra, assalariado, sendo obrigado a exaurir seu 13º salário para pagar inexpugnáveis encargos financeiros.

Com incontestável razão, o ilustre advogado e jornalista Airton Soares, quem me honra com seu convívio, repete, como “mantra”, no “Jornal da Cultura” que, dentre todas as reformas, a do sistema financeiro talvez seja a mais importante. Descrente nos que governam, acho devaneio a proposta do ilustre companheiro, que, como poucos,  honrou o Poder Legislativo, como deputado federal.

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Natal sem Jesus

Eis que, de repente, chega, dezembro, trazendo consigo o natal. Volto à infância e me vejo na excitação da espera do presente que, àquela época, era encontrado no sapato, ao pé da cama, na manhã do dia 25. Invariavelmente, era bola ou revolver de espoleta. A viagem dá um salto e chego ao natal de meus filhos, ainda pequenos, abrindo, quase com volúpia, os pacotes, para desvendarem seus segredos. Constato, sem esforço, que, nestas recordações, o “dono da festa” entra muito pouco. As árvores de natal, enfeitadas, com mais ou menos detalhes, tradição herdada dos europeus nórdicos, pois o evento religioso é verdadeiramente representado pelo presépio, que retrata o nascimento de Jesus. Porque e para que ele nasceu, todos o sabemos. A dúvida, que, desde remotos tempos, paira, em corações e mentes, é se esse nascimento, a trajetória e morte de Jesus, cumpriu o objetivo proposto: fazer com que a harmonia exista, entre os homens. Quando ele nasceu, o povo judeu estava subjugado pelo Império Romano e, desde lá, ininterruptamente, os homens, sem qualquer “boa vontade”, vêm se matando, numa desmedida luta pelo poder. “vanitas, vanitates”, tudo é vaidade e, em nome  dela, todos os dias, buscamos esta coisa intangível, chamada felicidade, mesmo que, para alcançá-la, tenhamos que tripudiar sobre terceiros, que jamais consideramos nossos “próximos” ou “semelhantes”.  É como se Jesus, depois feito Cristo, sentisse amargo gosto na boca, pelo vazio em que caiu seus ensinamentos. Talvez seja por isto que, cada ano, goste menos do natal, onde emerge a hipocrisia – sempre ela – de desejarmos “feliz natal”, sem nem mesmo sabermos o que estamos dizendo. Por isso, nesta quadra do ano, refugio-me na memória de tempos idos e vividos, quando era hipócrita, sem saber que o era e achava que o Menino Jesus estava entre os presentes, recebidos  e distribuídos. Tenho convicção que, nesta época, Jesus, mais Cristo do que Jesus, olha-nos nos olhos e deixa cair furtiva lágrima, por constatar quão longe estamos dele.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

A moça e o aborto

A este ponto convém falar da senhora, estudante de direito, mãe de dois filhos, que serviu de “laranja” ao PSOL para levar ao Supremo Tribunal Federal o debate sobre a proposta de descriminalização do aborto voluntário. Alegou a senhora, para embasar seu pedido, que, já sendo mãe de dois filhos, não teria condições econômico-financeiras para sustentar um terceiro. A Ministra Rosa Weber negou a concessão de liminar – que, se concedida, autorizaria, de imediato, a realização do aborto – e remeteu a matéria ao Colegiado para apreciação. Quanto à indigitada senhora, cabe apenas uma observação: trata-se de pessoa de bom nível social, com vivência sexual suficiente para conhecer e se utilizar dos diversos anti-conceptivos existentes, alguns, até, distribuídos, gratuitamente, pelas unidades de saúde. Por outro lado, a causa, por ela alegada – futuras dificuldades para manter o nascituro – não se insere dentre as hipóteses, previstas em nosso Código Penal, quando não se pune o aborto, praticado por médico, com consentimento da gestante e que são: o aborto necessário, quando não há outro meio de salvar a vida da gestante, ou se a gravidez resulta de estupro. (Código Penal, art. 127, incisos I e II.)
Assim, por aplicação literal da legislação penal, acima citada, a pretensão da senhora deve ser rejeitada, por votação unânime da Corte, certo? Errado! De larga data, os atuais Ministros do Supremo, usurpando atribuições do Poder Legislativo, vêm criando ou modificando leis, como se legisladores fossem. No caso específico do aborto, aquela Corte ratificou o esdrúxulo entendimento do Ministro Barroso, segundo o qual o aborto só é considerado crime, quando a gravidez é interrompida após o terceiro mês de gestação. Qual a base científica, utilizada pelo sapientíssimo Ministro, para se chegar a esta conclusão? Porque, a acreditar no entendimento dos médicos, a vida se inicia no momento da fecundação e, na sistemática de nosso direito, penal e civil, a palavra nascituro  (ablativo absoluto do verbo” nascere”, que significa “aquele que vai nascer”) designa o embrião humano, desde o momento da concepção.
Segundo o Direito Canônico, a partir do momento da concepção já existe vida humana, que precisa de proteção jurídica e esse entendimento, que remonta ao final do século 18, foi adotado e mantido pelo nosso Código Civil, mesmo após a instalação do Estado laico. Assim, a interrupção da gravidez, sem justa causa, a partir da concepção, constitui o crime de aborto, previsto em nossa legislação penal substantiva. Para a gestante, que provocou o aborto ou consentiu que outrem lho provocassem, a questão é de pequena relevância, porque a pena prevista – detenção de 01 a 03 anos – resulta, no máximo, em prestação de serviços, não importando em prisão, a menos que a autora já tenha sido condenada, em definitivo, por outro crime. Para os que defendem a liberação do aborto, sua punição afronta a liberdade individual. Para os que a ele se contrapõem, se o feto é vida, não há que se falar em liberdade, vez que ninguém está autorizado a matar.

A meu modesto juízo, nossa legislação, sobre o tema, apesar de vetusta, é precisa e não exige maiores modificações, vez que, de forma indireta, autoriza o aborto, desde que praticado por médico, e se resultou de estupro ou se a gravidez colocar em risco a vida da gestante. Talvez pequeno acréscimo mereça ser feito, admitindo as hipóteses de a criança poder nascer sem vida ou vir a ser portadora de doença ou deficiência irreversível. Aliás, este “acréscimo” já vem sendo consolidado pela jurisprudência que admite o aborto, quando se detecta no feto tais anomalias. A ciência médica evoluiu, a ponto de identificar, no curso da gestação, essas anomalias irreversíveis, como, por exemplo, no caso da anencefalia. Todavia, a liberação, pura e simples, do aborto, caracteriza indiscutível crime contra a vida e, o que é mais grave, contra uma vida sem qualquer possibilidade de se  defender.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Do sonho à realidade



Não sou versado em interpretação de sonhos, se é que possam eles ser interpretados, como querem os psicólogos. Tenho um amigo, que se distanciou, (até porque sou péssimo em manter amizade) que, certa feita, contou-me sintomático caso, a comprovar que os sonhos nada significam: durante noites seguidas sonhou com seis números, gravados em uma parede. Na manhã, posterior à última noite, em que tivera o mesmo sonho, mal estacionou seu carro, ao lado do fórum, foi abordado por um vendedor de bilhetes de loteria e afins, que lhe ofereceu uma mega sena, contendo exatamente os 06 números sonhados. O sorteio –vários  milhões acumulados – ocorreria na mesma noite e, cabeça a mil, passou o dia projetando como gastaria a grana, tal a certeza de que ganharia. Para sua decepção, não acertou um único número. Tenho alguns sonhos recorrentes, aos quais não atribuo qualquer valor, mas, na última madrugada, tive verdadeira revelação: já expus, aqui, meu desassossego quanto ao final de meu livro, entre matar ou manter viva a “mocinha”. Tinha decidido matá-la, a ela e aos pais, por coerência à história. Salvá-la seria dar prevalência ao romantismo, o que é utópico, mas sempre lava a alma. Escrevi os dois finais, para me decidir com o texto pronto. Eis que, na última madrugada, “vivi” um terceiro final, praticamente simbiose dos dois pensados. Achei ótimo e, no  final de semana, ponho a mão na massa.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Rodolfo, eu e a “nossa República”

Eu já tinha avisado a Rodolfo, meu politizado pastor alemão, que, enquanto não concluísse meu livro, estaria de quarentena, em relação a outros assuntos. Todavia, ele é obcecado por acontecimentos político – policiais, e, à noite, mal abro o portão, chegante do escritório e lá vem ele, a falar dos presos do dia. Digo-lhe eu tais informações, tão banais se tornaram, que passam distante de meu interesse. E, para mostrar a concentração no livro, cujo final me desafia, disse-lhe que até mesmo o Botafogo, amor de  vida inteira, deixei de lado. Até nossos passeios ao parque andam silenciosos e foram encurtados, para felicidade de Nara, a repetir que ambos, eu e ela, já passamos da idade de subir e descer morro, em marcha acelerada.
- “Melhor andar devagar, apreciando a paisagem e marcar ponto, em um dos bancos, defronte ao lago, acompanhando o vai e vem dos gansos”, aconselhou-me ela, sábia velha senhora. Mas Rodolfo é intrépido e voluntarioso. Outro dia, saía para o trabalho e ele veio exibir-me, pendurado à boca, um saruê, partido ao meio, que ousara ultrapassar o portão, para surrupiar-lhe ração. Rodolfo é determinado e não desiste fácil. Não é que sábado, voltávamos do parque e, ao chegar em casa, ele me fechou, impedindo que eu subisse a escada:
- “chefe (odeio, quando ele, só para me amolecer, chama-me, assim) sei que sua cabeça está na obra inacabada (senti certa ironia nessa fala), mas precisamos conversar sobre coisa séria?”
- “E você acha que um  livro não é coisa séria?”
- “Aqui pra nós, chefe, não é um pouco de pretensão você achar que está escrevendo a obra do século?”
- “Livro, meu caro Rodolfo, é como filho, sempre é lindo e importante. Mas afinal, sobre o que você quer falar que, ao que tudo indica, mudará a história do mundo?”
- “Do mundo, não sei, mas do Brasil, com certeza. Você viu a última pesquisa, a indicar que a presidência está entre Luciano Huck, Lula e Bolsonaro? Quero saber em quem vamos votar e o que podemos esperar do eleito.”
- “Nós, quem Rodolfo? Vou lhe mostrar uma coisa, que é um projeto para 2018”.  (Entro em casa e volto, minutos, depois.) “Esta é uma área de terra, 2.000 m², para ser mais preciso, que comprei em Arraial D’Ajuda, lá no sul da Bahia. É minha visão mais próxima do paraíso. Vou construir uma casa pequena e o restante da área ficará para você, Nara, Olavo, Romeu, Clóvis e mais uns dois ou três, que chegarão. Lá será nossa “República”, que terá uma única lei: “todos são obrigados a viverem em harmonia e, se possível, com amor. “Lá, não será permitida a entrada de estranhos e conto com vocês, para  que se cumpra este objetivo. Lá, viveremos até o final de nossos tempos, contemplando o mar, sem compromissos e sem ordens. E, quando morrermos, as cinzas de cada qual serão espalhadas em um canto, próximo ao mar.”
- “E dona Renata irá conosco?”
- “Se ela quiser, é claro, mas duvido  que ela fique longe dos filhos e netos, mas, todos eles, e apenas eles, serão sempre bem-vindos, com direito a trazerem violeta, Indira e Gandi. Esta é a razão, meu caro, de não estar interessado no próximo presidente. Seja quem for, só espero que ele não comprometa “nossa República””.


segunda-feira, 27 de novembro de 2017

A dúvida não pode levar à condenação

Meu queridíssimo amigo, Oswaldo Jurema, jornalista de longo curso, envia-me artigo – transcrevo, abaixo -, formulando severas observações a respeito das declarações do novo Diretor Geral da Polícia Federal, que considerou  poucos os indícios coletados pela Procuradoria Geral da República, para incriminar o Presidente Michel Temer. Oswaldo, que escreve no “Correio da Paraíba”, seguiu a linha da mídia em geral, mas, na investigação policial e no direito penal, a banda toca em ritmo diferente. O ex Procurador Janot, cujo candidato preferido para sucedê-lo, foi preterido por Temer, transformou seu gabinete, em verdadeiro quartel general, com o objetivo – que virou obsessão – de derrubar Temer: armou, com o pulha da “JBS”, a famigerada gravação e, como recompensa, concedeu àquele pulha e seus comparsas liberdade plena, inclusive de se transferir para Nova York. A afirmação do novo Diretor Geral da Polícia Federal, de que uma única mala de dinheiro não constitui prova suficiente do envolvimento do Presidente, não pode ser extraída do contexto da fala do Dr. Segovia. O que quis ele dizer – e disse – é que o episódio deveria ter sido investigado, em todas as suas nuances, e não ser transformado em pinimba pessoal, como o fez Janot. Quando se investiga um Presidente da República, ultrapassa-se sua pessoa, adentra-se à instituição e se coloca em risco, inclusive, os interesses nacionais. Porisso tal investigação deve ser exaustiva e sigilosa, só vindo a público, quando contundentes forem as evidências. A meu juízo, o novo Diretor Geral da Polícia Federal, em harmonia com a nova Procuradora Geral da República, quer ações menos histriônicas, sem a “Globo” por perto, ações estas que conduzam a resultados concretos e, sempre, sob a égide do ordenamento jurídico do País. Assistimos à  decretação, sem medida, de prisões preventivas que têm, como único escopo, compelir o detido a optar pela delação premiada. A mídia exulta, porque tem mais matéria a divulgar. A população exulta, porque fica com a sensação  de que o País está “sendo passado a limpo.” Todavia, os que militam na advocacia – mesmo não tendo clientes na “lava jato” – vivem tempos de insegurança jurídica -, porque o açodamento na colheita da prova é o caminho mais rápido para o arbítrio. Quem, por exemplo, vai reparar a memória e os  familiares do Reitor da Universidade de Santa Catarina que se matou, ao ser acusado de corrupção, acusação essa, agora, tida como infundada, quando as provas restaram  estruturadas? A Polícia Federal, que “concluiu”, antes de provar? A mídia, que se lambusou com a notícia do falso desvio?
O que me parece sadio e louvável, no discurso de posse do Dr. Fernando Segovia é que quer ele uma Polícia Federal, implacável, no combate à corrupção, ao tráfico de armas e de entorpecentes, mas agindo dentro dos limites da lei. Afinal de contas o arbítrio, cometido em desfavor de nosso adversário, amanhã, pode ser cometido contra nós.

Síndrome da dúvida
Oswaldo Jurema

            Durante entrevista coletiva logo após ser empossado diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia surpreendeu a todos ao criticar a ação da Procuradoria- Geral da República no caso JBS. Considerou a investigação incorretamente célere para incriminar um Chefe de Governo, sob suspeita de corrupção passiva e comprometimento em outros delitos, em decorrência da delação de um duvidoso empresário. E arrematou imperativo:
            “Se fosse sob a égide da Polícia Federal, essa investigação teria de durar mais tempo, porque uma única mala (sic) talvez não desse toda a materialidade criminosa para resolver se havia ou não crime, quem seriam partícipes e se haveria ou não corrupção.” E o conteúdo da mala? E o filme do resgate? E o grampo da delação? E a devolução do valor faltante?
            Todavia, o novo mandante da Federal revelou-se acometido, também, da síndrome da dúvida, chaga que atormenta os responsáveis em desvendar os enigmas da vida pública, mesmo quando a clarividência revela a verdade dos fatos. Onde a maior certeza é a dúvida.
            Aos exemplos, portanto: O prefeito de Santo André (SP), Celso Daniel –o homem que sabia demais- foi assassinado em tocaia por seis bandidos que lhe sequestraram, torturaram e mataram.  E ainda assim se tem ‘dúvida’ até hoje: se foi assalto(!) ou queima de arquivo; o candidato à presidência, Eduardo Campos, que após longa investigação concluiu-se que estava seriamente implicado em esquemas escusos, o que não foi suficiente para dirimir a dúvida: se foi pane aérea ou pânico de figurões comprometidos; Teori Zavaski, o relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal foi outra vítima de um desastre aéreo; dias antes anunciara o término de vários processos. E pouco tempo depois o delegado que investigou o acidente, foi morto num tiroteio massacrante. Nada a ver, talvez, mas, paira a dúvida.

            Diante de obscuras controvérsias o ex-procurador-geral, Rodrigo Janot- também no rol dos dúbios- proferiu sentença fulminante: “A pergunta que não quer calar é: Segovia se inteirou disso ou ele está falando por ordem de alguém?” Ou ‘talvez fosse necessário’ ter um cadáver sob a dinheirama da mala para então se configurar crime.  Duvido que haja dúvida!”

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

A nova moeda chamada “Bitcoin”

Se você navega na internet  com certa frequência ou é interessado por temas ligados ao universo digital, já deve ter ouvido falar em Bitcoin, uma espécie de moeda digital. Esse novo dinheiro virtual é gerenciado pelos próprios usuários, sem a necessidade de haver intermediação de um banco.
Liberdade no pagamento, taxas baixas e segurança em relação a informações pessoais dos usuários são as vantagens da utilização da moeda, já em contrapartida, o grau de aceitação e a volatilidade em relação ao número de transações, que poderia ser bem maior do que é e acaba influenciando nos preços, são algumas desvantagens.
É possível adquirir a moeda de várias maneiras, seja por meio de pagamento por bens e serviços oferecidos, compras no Bitcoin câmbio, trocando com alguém ou ganhando por meio de mineração competitiva – atividade na qual novos “bitcoins” são gerados através de um processo competitivo e descentralizado que consiste na recompensa dada aos usuários pelos seus serviços. Os “mineiros” de Bitcoin estão processando transações e fazendo a rede segura usando hardware especializado e coletando novos “bitcoins” em troca.
Um número crescente de empresas como escritórios de advocacia, restaurantes, apartamentos e outros serviços do segmento on-line está adotando o novo modelo de pagamento por “bitcoins”, que tem movimentado anualmente mais de um milhão de dólares por dia. A atividade é legal em muitos países, mas em algumas jurisdições como Argentina e Rússia, por exemplo, esse tipo de moeda foi banido, porque, pelo menos por enquanto, parece não ter surgido mecanismo suficientemente preciso, que impeça o uso dessa moeda virtual para sonegação fiscal e lavagem de dinheiro.


quinta-feira, 23 de novembro de 2017

A escolha do caminho



Este blog tem tido suas matérias interrompidas – e outras interrupções haverá -, por conta de obstáculo a ser vencido e que anda asfixiando os poucos neurônios, que ainda me restam ativos. Estou chegando ao ponto crucial do livro, que escrevo, há quase um ano e que, apesar de ficção, tem relevante conteúdo histórico, que exigiu pesquisa. O livro tem, como título provisório, “Amor em tempo de ódio” e  conta a história de dois pré-adolescentes apaixonados que, em determinado momento de suas vidas, seguem rumos diferentes, ela, alemã, mas filha de judeus alemães, ele, alemão puro, que ingressa na juventude nazista e faz carreira no exército alemão. Em 1.944, ela e os pais são enviados a um campo de concentração, onde ele, por ironia do destino, é o comandante. Hitler já tinha desencadeado a “solução final”, que consistia no extermínio, em massa, de todos os judeus aprisionados. E, agora, ei-lo dividido entre o amor revisitado e o cumprimento do dever de soldado. Estou há mais de uma semana, procurando a melhor alternativa: o amor ou o ódio? Nos livros anteriores, não vacilei em matar os personagens principais, pois, se não o fizesse, o enredo se quebraria. Todavia, agora, os dois caminhos surgem possíveis, harmônicos com toda a trama. É claro que a morte é mais condizente com os fatos históricos. Além do mais, salvar a heroína e seus pais exigirá estratégia que ainda não construí. Soma-se tudo isto ao estresse de final de  ano. Mato, ponho ponto final e encerro o livro. Por outro lado, por que não um pouco de poesia, sobrepondo o amor ao ódio? Afinal, o ano se aproxima de seu poente, trazendo, com o Menino Jesus, a esperança de um novo tempo, onde ressentimento ceda lugar à harmonia, à esperança de vivermos juntos, sem que, para sermos felizes, não precisemos provocar a infelicidade de nosso semelhante. Por outro lado, naqueles tempos, incompreensíveis tempos, quando a barbárie tomou assento, a única esperança estava em amanhecer, no dia seguinte. Persisto, na dúvida do caminho a escolher. Enquanto rascunho caminhos opostos, o ”blog” vai ficando de lado.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Para falar de chatos, ressentidos e hipócritas



Há décadas atrás – creio ter sido no governo Collor - , Rubens Ricúpero, uma das maiores inteligências que passou pela diplomacia brasileira, então ocupando importante Ministério, foi apunhalado pelas costas, por ter dito, em off, que “o que é bom a gente mostra, o ruim, a gente esconde.” A frase apanhada fora do contexto da conversa reservada que Ricúpero mantinha com o jornalista  (da Globo), foi interpretada como ato de esperteza e  a própria emissora tratou de demonizar Ricúpero. A frase fazia todo sentido, para o momento de instabilidade econômica, vivida pelo País: o “bom” acalmava o mercado; o “ruim”, aumentava a instabilidade. Agora, o fato se repete, na mesma emissora, envolvendo seu mais ilustre jornalista, William Waack que, às escondidas, como convém aos canalhas, foi apanhado, sussurrando frase de conteúdo racista. Em pouco tempo, a emissora colocou no ar, através de jornalista, que se prestou a esse papel de capacho, matéria, execrando William Waack e se dizendo repudiar qualquer forma de discriminação. Logo o “Globo” que, até bem pouco tempo, onde negro só fazia papel de empregada doméstica. Waack representa (ou representava) o que havia de melhor na “Globonews”, onde, em seu “Painel”, debatia, com intelectuais de diferentes ideologias, os macro problemas do País. Fica, em seu lugar, o ridículo jornal, com seus enfadonhos repórteres, reproduzindo a “voz do dono”. Um jornalista, com a história e o estofo moral e intelectual de William Waack não pode ser jogado às feras, por causa de infeliz frase, sussurrada, no particular. Todavia, essa desfaçatez da  “Globo” não causa surpresa. Cresceu e se agigantou graças às benesses, concedidas pelo regime militar, mas, esgotado aquele período, passou a ele se referir como “sombrios anos da ditadura”.  Entretanto, como dizia minha falecida mãe, “nada como um dia após o outro.” Não é que, em delação premiada, perante a Corte de Nova York, a “Globo” é  acusada de pagar propina à FIFA, para ganhar concorrência dos direitos de transmissão de torneios internacionais? A emissora, tal qual o fazem todos os envolvidos na “lava jato”, jurou inocência, negou “veementemente” seu envolvimento na falcatrua e acrescentou que “após rigorosa investigação interna, não se apurou a prática de qualquer ilicitude.” Perguntei ao Rodolfo o que ele achava da “rigorosa investigação interna.” Ele me olhou com desprezo e, lembrando o eterno Millôr Fernandes, fez, apenas, “há! há! há!.”
Em magnífico artigo, publicado na edição da semana passada de “Veja”, sob o título “Um País de Chatos”, o sempre preciso e brilhante J. R. Guzzo fulmina: ”vai se inventado, de cima para baixo, uma sociedade mal-humorada, neurastêmica e hostil à liberdade de expressão.” Um País de chatos, diz ele; de ressentidos, diria o filósofo Luiz Felipe Pondé, de hipócritas, digo eu, aqui, do andar de baixo.

terça-feira, 14 de novembro de 2017

O feijão e o sonho



A edição do mês de outubro, da “Revista do Advogado” foi, inteiramente, dedicada à reforma política, com acurada análise de ilustres juristas, dentre esses, dois ex Ministros do Supremo Tribunal Federal, Eros Grau e Nelson Jobim, esse com longa passagem pelo Legislativo, a saber, pois, como funciona, na prática, o processo legislativo. Os temas desenvolvidos, com extrema cultura, na “Revista”, todavia, passam, ao largo da questão essencial: como efetivar a necessária reforma. Todos sabemos ser ela imprescindível à consolidação de nossa sempre tênue democracia. Quando se desce da teoria à prática, esbarra-se nos liliputianos interesses dos políticos e dos respectivos partidos. O Poder Executivo, para minimamente funcionar, aprovar projetos de lei, vê-se obrigado a, no rés do chão, barganhar com os famigerados “representantes do povo”. É até risível imaginar que esses senhores e senhoras irão abrir mão de seus privilégios, para pensarem no interesse do País. São partidos políticos, a defenderem, com unhas e dentes, seus pedaços do bolo, cujos ingredientes são cargos e dinheiro. Basta dar rápida passeada pela história, para se constatar que as grandes reformas surgiram, durante os períodos ditatoriais. A legislação trabalhista, os Códigos, Penal, Processo Penal e Processo Civil surgiram na fase mais dura – entre 1937 e 1945 – da ditadura Vargas. A criação do  BNH, do BNDES, o surgimento do FGTS, em substituição à estabilidade, após 10 anos de trabalho contínuo, aconteceram durante o regime militar, instalado em 1964. Vivemos dias de fragmentação das instituições e, de todas, apenas as Forças Armadas merecem o respeito da população que saiu às ruas para derrubar Dilma e o lulopetismo, mas a elas não retornará, porque ninguém quer ser identificado com qualquer grupo político. É deslavada mentira afirmar que os  políticos precisam “ouvir a voz das ruas”. Essas, pelo desencanto, ficaram mudas e as reformas, que tramitam, se saírem, sairão trôpegas, como a reforma trabalhista, que já nasceu moribunda, porque os próprios juízes já disseram que não vão cumpri-la. O Ministro Meirelles afirma que, se a reforma previdenciária não for aprovada, a Previdência quebra, no máximo, em 05 anos. O Presidente Temer jogou a toalha: se tal reforma não for aprovada, tudo bem, ele, pelo menos, tentou.
O Brasil segue, à deriva, cada dia se afastando mais do mundo civilizado. Quem colocará no rumo certo, consertando as instituições rachadas e promovendo as reformas, que sabemos urgentes e necessárias? A história nos fornece a resposta.