segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Tempo de Quaresma



Vivemos tempo de quaresma, a exigir reflexão e jejum. Todavia, é tempo vivido por minoria, mesmo de cristãos, mergulhados em seus afazeres cotidianos, porque a barra tá pesada pra todo mundo, mas que, na minha gasta memória, remete-me a minha infância. Encerrado o carnaval, ingênuo, à época, em cidade do interior, começava a quaresma, com todo o seu ritual. Nas Igrejas, as imagens dos santos eram cobertas com panos roxos e as rádios apenas tocavam músicas sacras. Às 18 horas, o serviço de alto falante, instalado na praça principal, tocava a “Ave Maria’’ e, a seguir, o locutor – Lourival Pechir era seu nome – lia uma mensagem, alusiva à data. O único cinema da cidade exibia, durante todo o período quaresmal, o mesmo filme, sobre a ‘’paixão de Cristo’’, com lotação completa todos os dias, com as pessoas saindo, olhos vermelhos do pranto derramado, durante a exibição. Durante a semana santa, propriamente dita, o ritual seguia regras mais rígidas: não se podia falar alto, palavrão, então, nem pensar, a carne era banida e os bares fechavam suas portas, ao anoitecer. Mulheres, sobriamente vestidas e véu, cobrindo-lhes a cabeça, organizavam grupos de oração, que percorriam as residências, rezando o terço. Na sexta-feira, chamada ‘’da paixão’’, nada funcionava, inclusive as casas, que não eram arrumadas e o jejum era completo, quebrado, apenas, após a  procissão do ‘’Senhor Morto’’. Às 15 horas – horário que se presume Cristo ter expirado -, em frente à Igreja Matriz, encenava-se a ‘’paixão de Cristo’’, que ia da ‘’última ceia’’, até o momento que Ele é descido da cruz e depositado nos braços da mãe. Daí, seguia-se a procissão, acompanhada por quase toda a população. Imagens gravadas tão fortes em mim que, meio século depois, modificam meu comportamento, neste período, como me abster das comidas e bebidas, que me dão prazer, mesmo sabendo que isto é de pouca valia, porque não mitiga os pecados cometidos, durante o ano. Acho cada vez mais difícil amar o próximo, principalmente quando ele não está tão próximo assim e, muito mais principalmente, quando esse próximo está lá em Brasília, desgraçando nosso País. O ser humano, ao contrário do que pretendia Jesus, é movido pelo ressentimento, que parece brotar do inconsciente. De qualquer maneira, é tempo de quaresma, de lembrar o sacrifício que Cristo fez por nós. Tempo de exercitarmos a caridade, seja estendo nossa mão ao desvalido, que repousa, abatido, física ou moralmente, à beira da calçada, seja levando um átimo de afeto a quem sofre. 

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