segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Considerações sobre a estratégia da defesa de Lula

Ao longo de quase meio século de exercício da advocacia, principalmente criminal, o maior desafio, que encontro, ao defender um cliente, é fazê-lo entender que, diante das modernas técnicas de investigação, construir uma mentira, para justificar conduta delituosa, é terreno pantanoso que, quase sempre, leva a resultado desastroso. Como é de larga sabença, a missão do advogado não é transformar o criminoso em inocente, mas, através de argumentos sólidos, justificar sua conduta, levando-o à absolvição ou a uma pena mitigada. Faço esta introdução, pela leitura – e apenas pela leitura – do noticiário, sobre o intrincado caminho, adotado na defesa do ex-presidente Lula, nos rumorosos casos do triplex do Guarujá e do sítio de Atibaia. Em um primeiro momento, optou-se pelo total não envolvimento do ex-presidente nos fatos. À medida que essa negativa se desfazia, diante de eloqüentes indícios contrários, foi-se tentando ‘’consertar’’ a estratégia inicial, inclusive propondo medidas judiciais, que impedissem o depoimento do ex-presidente e sua esposa. Sem me imiscuir na estratégia de seus ilustres e competentes patronos, mas, a meu exclusivo juízo, tais medidas, quando rejeitadas, transformam-se em verdadeiro ‘’tiro no pé’’. Leio que Lula, que negava qualquer relação com o sítio de Atibaia, agora afirma que a reforma do mesmo foi, a seu pedido, pago por seu amigo Bumlai, preso na ‘’lava jato’’. Se a intenção era afastar Lula de Sergio Moro,nunca ambos estiveram tão próximos. Outro equivoco é a noticia – e só a noticia – de que Lula está reunindo os melhores criminalistas do País, para defendê-lo. Egos à arte, como harmonizar defesa consistente, com várias cabeças pensantes? O Direito não é ciência exata, o que permite ver a questão, a ser enfrentada, de ângulos diferentes. Os advogados, cujos nomes estão divulgados na mídia, são, cada qual, de incontestável competência, em condições, pois, de produzir excelente trabalho. Agora, sempre a meu juízo, juntar vários criminalistas, em torno do mesmo tema, pode ‘’salgar’’ a comida, por si já difícil de temperar. 

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Tempo de Quaresma



Vivemos tempo de quaresma, a exigir reflexão e jejum. Todavia, é tempo vivido por minoria, mesmo de cristãos, mergulhados em seus afazeres cotidianos, porque a barra tá pesada pra todo mundo, mas que, na minha gasta memória, remete-me a minha infância. Encerrado o carnaval, ingênuo, à época, em cidade do interior, começava a quaresma, com todo o seu ritual. Nas Igrejas, as imagens dos santos eram cobertas com panos roxos e as rádios apenas tocavam músicas sacras. Às 18 horas, o serviço de alto falante, instalado na praça principal, tocava a “Ave Maria’’ e, a seguir, o locutor – Lourival Pechir era seu nome – lia uma mensagem, alusiva à data. O único cinema da cidade exibia, durante todo o período quaresmal, o mesmo filme, sobre a ‘’paixão de Cristo’’, com lotação completa todos os dias, com as pessoas saindo, olhos vermelhos do pranto derramado, durante a exibição. Durante a semana santa, propriamente dita, o ritual seguia regras mais rígidas: não se podia falar alto, palavrão, então, nem pensar, a carne era banida e os bares fechavam suas portas, ao anoitecer. Mulheres, sobriamente vestidas e véu, cobrindo-lhes a cabeça, organizavam grupos de oração, que percorriam as residências, rezando o terço. Na sexta-feira, chamada ‘’da paixão’’, nada funcionava, inclusive as casas, que não eram arrumadas e o jejum era completo, quebrado, apenas, após a  procissão do ‘’Senhor Morto’’. Às 15 horas – horário que se presume Cristo ter expirado -, em frente à Igreja Matriz, encenava-se a ‘’paixão de Cristo’’, que ia da ‘’última ceia’’, até o momento que Ele é descido da cruz e depositado nos braços da mãe. Daí, seguia-se a procissão, acompanhada por quase toda a população. Imagens gravadas tão fortes em mim que, meio século depois, modificam meu comportamento, neste período, como me abster das comidas e bebidas, que me dão prazer, mesmo sabendo que isto é de pouca valia, porque não mitiga os pecados cometidos, durante o ano. Acho cada vez mais difícil amar o próximo, principalmente quando ele não está tão próximo assim e, muito mais principalmente, quando esse próximo está lá em Brasília, desgraçando nosso País. O ser humano, ao contrário do que pretendia Jesus, é movido pelo ressentimento, que parece brotar do inconsciente. De qualquer maneira, é tempo de quaresma, de lembrar o sacrifício que Cristo fez por nós. Tempo de exercitarmos a caridade, seja estendo nossa mão ao desvalido, que repousa, abatido, física ou moralmente, à beira da calçada, seja levando um átimo de afeto a quem sofre. 

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Tempos idos e atuais

Velho gosta de invocar ‘’seu tempo’’, como tendo sido o melhor e realmente o foi, pelo menos para ele, pela singela razão que, no ‘’seu tempo’’, ele era jovem ou, pelo menos, ainda não ingressara na ‘’pior idade’’, para usar expressão cunhada pelo queridíssimo amigo, Oswaldo Jurema. Temos memória seletiva, o que nos faz deletar momentos desagradáveis, como se nossa vida, tivesse sido um constante navegar em águas calmas. É indiscutível que, no plano objetivo, tudo melhorou e com espantosa velocidade. Para não me estender em exemplos, fico no campo da medicina, onde a pluralidade de exames laboratoriais e por imagens, permite que o médico diagnostique e trate da doença que atormenta o paciente, com mais precisão e rapidez. A duração da vida provável já ultrapassou os 70 anos e, segundo dados estatísticos, em menos de 10 anos, cerca de 30% da população brasileira terá mais de 60 anos. Todavia, como não há bônus sem ônus, este avanço cientifico e tecnológico tem trazido problemas, de difícil solução. O aumento da expectativa de vida, além de comprometer os recursos da previdência social, exige uma saúde pública, muito aquém do orçamento do governo. Os chamados planos de saúde, com raríssimas exceções, vivem em estado de insolvência, apesar de remunerarem mal os médicos e hospitais e cobrarem preço elevado de seus associados. Como resolver tão complexa equação? No campo da educação, a situação não é melhor. Apesar de toda a tecnologia, colocada à disposição de professor e aluno, esse último chega ao final do segundo grau, sem a preparação adequada e a maioria nem mesmo é capaz de identificar a profissão, para a qual se sente vocacionado. A multiplicidade de cursos superiores, as mais das vezes, sem correlação com o mercado de trabalho, transforma-se em frustração, quando, ao receber seu diploma, o formando não identifica o que fazer com ele. Exemplifico  dolorosa experiência que vivo, neste momento: postei, na internet, anúncio, contratando advogado, recém-formado, mas já inscrito na Ordem, para trabalhar, em meio expediente. Pois, em menos de 24 horas, já tinha recebido cerca de 50 currículos, alguns, cujos candidatos têm 10 ou mais anos de formados. Por que isto acontece? Merece observar que só o Estado de São Paulo possui número maior de Faculdades de Direito do que todos os países do mundo, reunidos. Por óbvio, tantos profissionais, de duvidosa formação, não conseguem ser absorvidos pelo mercado de trabalho, daí resultando o aviltamento da profissão. E, infelizmente, este espantoso dado estende-se para outros cursos superiores, inclusive para a medicina, com escolas autorizadas a funcionar, até em recônditas cidades do interior, onde não há, nem mesmo, hospital, devidamente equipado, para estágio e residência médica. Ninguém pode ser contra a democratização do ensino superior, mas todos não queremos profissionais, precariamente formados, a colocarem em risco nossas vidas e nossos interesses. Assim, vamos vivendo a perplexidade de uma vida que poderia ser mais fácil, mas que, malgrado todo o avanço tecnológico e cientifico, torna-se cada vez mais difícil. Esta é a razão pela qual o velho, com mais freqüência, ao contemplar as dificuldades dos jovens, apenas murmura, ‘’no meu tempo...’’

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

A ditadura da toga ataca outra vez

Leio, com indizível terror jurídico, que o Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, decidiu que réu condenado em segunda instancia (Tribunais Estaduais e Regionais) já deva começar a cumprir a pena, independentemente dos recursos impetrados junto ao Superior Tribunal de Justiça e ao próprio Supremo. Não vou deitar falação jurídica, mas falar do devido processo legal que tem por escopo principal assegurar o primado da justiça e do Direito. Apenas lembro que o réu, primário, com endereço certo, tem o direito de recorrer em liberdade, segundo norma expressa do Código de Processo Penal e, muito mais, nossa Constituição Federal assevera que qualquer cidadão somente será considerado culpado, após a sentença condenatória ‘’transitar em julgado’’, isto é, quando aquela sentença não mais for suscetível a qualquer recurso. A esdrúxula decisão do Supremo demonstra que a ‘’ditadura da toga’’ volta a funcionar com inusitada virulência, não identificada nem mesmo nos mais duros dias do regime militar. O Poder Judiciário não legisla, não cria leis, atribuição exclusiva do Poder Legislativo. Assim, jogando, na lata do lixo jurídico, sua missão de ‘’guardião da Constituição’’, o Supremo invade seara própria do Legislativo, suprimindo norma explicita do Código de Processo Penal e, o que é pior, da própria Carta Magna. A presunção de inocência, prevista em nosso ornamento jurídico, é garantia de liberdade individual, que deve ser preservado, até que se exaure, por completo, o direito de defesa do réu. A justificativa de que a existência de múltiplos recursos pode inviabilizar a prisão do réu, é abjeto sofisma. Os recursos foram criados exatamente para dar segurança jurídica ao cidadão. Se os há em demasia, que os reduzam, através de modificação na legislação, o que só pode ser efetivado pelo Poder Legislativo. Não fora assim, qual o sentido da existência do Superior Tribunal de Justiça e do próprio Supremo? Imaginemos a seguinte hipótese, absolutamente plausível, a partir desta aberração jurídica, agora instalada: determinado réu, condenado em segunda instância (pelos Tribunais Estaduais), é preso e recolhido a uma destas masmorras, que são as prisões brasileiras. Todavia, contra tal condenação recorre ao Superior Tribunal de Justiça. Depois de lapso de tempo não inferior a 02 anos, o STJ julga o recurso e absolve o réu. Quem recomporá o dano sofrido pelos 02 anos de sua prisão? Qual o preço da liberdade, das seqüelas deixadas por uma prisão injusta e indevida? Anoto que o juiz Sergio Moro manifestou-se, com eloqüência, a favor da decisão do Supremo. Não podia ser diferente, já que ele é, hoje, o maior representante desta ‘’ditadura da toga’’, que vai colocando o sistema judicial brasileiro ao lado do sistema nazista e do stalinista. Como advogado, vejo a lei ser esfacelada. Como cidadão, constato que a liberdade ficou comprometida. Espero que a Ordem dos Advogados não se omita, diante de tamanho descalabro! 

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Investigação não é sinônimo de condenação




O PT e, agora a própria presidente, tem procurado blindar Lula, afirmando serem injustas as investigações, envolvendo o triplex do Guarujá e o sitio de Atibaia. Convém esclarecer que a investigação policial é mero procedimento administrativo, onde se coletam provas e, uma vez concluído tal procedimento, é ele enviado ao Ministério Público que tem as seguintes alternativas: a) devolve o procedimento (que recebe o nome de Inquérito Policial) à autoridade policial para complementação da prova; b) requer ao juiz o arquivamento do Inquérito, por considerar insubsistentes as provas produzidas; c) oferece denuncia contra o averiguado, por considerar que há, pelo menos indícios da prática de crime. Por óbvio, qualquer cidadão está sujeito a ser investigado, independentemente de sua condição socioeconômica. Para tanto, basta que haja ‘’indícios’’ da existência do ilícito. ‘’Indícios’’, em bom vernáculo, significa ‘’vestígios’’, ‘’rastros’’ da prática delitiva. Ora, no caso do ex-presidente Lula, os rastros deixados, quer no triplex do Guarujá, quer no sítio de Atibaia, permitem, melhor, exigem a instauração de procedimento investigativo, que, como já salientamos, é fase preparatória para instauração ou não do processo penal. Se esses ‘’rastros’’ não chegaram a Lula ou não indicarem a prática de ilícito penal, o inquérito será arquivado. O procedimento investigativo é ato discricionário da autoridade policial, cujos limites são rigidamente fixados pela lei. No caso de Lula, seus excelentes advogados estarão atentos para que a discrição não se transforme em arbítrio, que é a deturpação do poder discricionário. Lula, como homem público que, inclusive, acena com a possibilidade de voltar a disputar a presidência da República, deve ser o mais interessado na apuração dos fatos. Concluindo-se pela inexistência de conduta ilícita – como ele e o PT sustentam – receberá verdadeira ‘’certidão de honestidade’’, este desusado atributo, que ele alega ter recebido, como única herança, de sua mãe ‘’analfabeta’’. Agora, o ‘’jus esperniandi’’, conduta adotada pelo ex-presidente e seus ‘’companheiros’’, pretendendo dinamitar as investigações como, por exemplo, ao promover manifestações de rua e chegar ao extremo de propor medida judicial para não depor sobre eventuais irregularidades, na compra e reforma do triplex do Guarujá, só faz reforçar as suspeitas de que ‘’há algo de podre no reino da Dinamarca’’.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Começar de novo...

É tempo e hora de desejar feliz ano novo aos prezados amigos. Agora, que a ‘’grande ilusão do carnaval’’ evaporou-se, é hora de entrar, pra valer, na selva e... salve-se quem puder. Enquanto janeiro enchia as praias, nosso PIB continuava se afundando, a zika a ameaçava as olimpíadas e o Lula se afogava em vastas ondas de corrupção, que se espraiavam no Guarujá, chegando à Atibaia. Está mais do que provado que a campanha presidencial da dupla Dilma/Temer foi abastecida com recursos ilícitos, desviados da Petrobrás, o que obriga o TSE a mandar ambos para casa e realizar nova eleição. A origem da crise brasileira está na falta de confiabilidade neste (des) governo. Vejam o exemplo do Japão que instituiu juros negativos, como forma de compelir a população a consumir e investir. Medida tão radical só é possível, onde a administração pública goza da confiança e do respeito da população, substantivos pra lá de abstratos, em nosso amado ‘’bananil’’.  Meu cachorro lê, com absoluto tédio, a notícia, ditada pelo Ministro Jacques Wagner, segundo a qual o governo vai multar proprietários de imóveis fechados, onde possam ser detectados focos do ‘’aedes aegyti’’. Observou meu cachorro, com aquele ar superior de pastor alemão, que a grande maioria dos locais de reprodução do famigerado mosquito, situa-se onde não há rede de esgoto, que corre a céu aberto. Mais um gol contra. No ultimo final de semana, o glorioso exercito nacional foi à rua participar da campanha de combate ao mosquito. Em que consistiu tal participação? Na simplória distribuição de folhetos explicativos dos métodos preventivos, a serem utilizados. Melhor fora se nossos soldados visitassem as residências e os edifícios para identificarem focos de reprodução do mosquito, orientando os moradores. Desconfiamos – eu e meu cachorro – que o governo, quebrado, precisando arrancar ‘’algum’’, prefere a multa. Lemos – eu e meu cachorro – que a presidente, mal acordou e já ligou para Jaques Wagner querendo saber que proveito se poderia tirar da epidemia. A idéia da multa fez nossa dirigente dar pulos de alegria. E a multa tem que ser federal, para que os Estados e Municípios não queiram tirar proveito. No sentindo oposto, limpo e legitimo, a CNBB, seguindo as diretrizes traçadas pelo Papa Francisco, em sua encíclica ‘’Laudato Si’’ – sobre o cuidado da casa comum, sugere que o Executivo-federal, estadual e municipal – inclua ‘’saneamento’’ entre direitos fundamentais.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Mensagem de aniversário

Sem querer ser cabotino e mesmo sem consultar a autora, queridíssima amiga de mais de meio século, que lá no começo foi mais que amiga, retransmito, pela beleza, profundidade e reflexão exigida, os cumprimentos que me foram dirigidos quando do meu aniversário. Além de refrigério e demonstração de bem querer, foi lição de vida para quem, com inquietude e sem mais sonhos por sonhar, aprofundou-se mais na “pior idade”.
Saul querido,

Lindo dia ensolarado com um belo céu azul. À beira da piscina, água fria,  tomando uma cervejinha gelada, olhando os passarinhos brincando no jardim. Meu  panorama do dia de seu aniversário.
Pensei em como lhe cumprimentar pela melhor idade.  Mas que bobagem essa de melhor idade. Não posso ser falsa, não existe isso. Dentro do contexto poderemos até dizer isso, mas seco assim, fica brega e surreal.
Melhor idade foi quando você brincava na rua, sem preocupações em sua Teófilo Otoni, talvez empinando pipa, talvez correndo, talvez.... Voltava depois para sua casa onde a família o esperava. Boa época.
Melhor idade foi quando seu peito ficou arfando de susto de vir para uma cidade grande, num lugar desconhecido, para encontrar pessoas desconhecidas. Que susto! Mas veio, viu e venceu. Venceu e fez amigos, se destacou, fez parte de um grupo especial. Melhor idade era poder ir em grupo tomar café na Padaria.
Melhor idade foi nos conhecermos, termos nossos  amigos, nossos bailinhos, nossos professores que nos enalteciam. Que época saudosa e linda. Época em que éramos o máximo.
Melhor idade foi quando você foi pai e depois pode criar seus filhos e torná-los gente de bem que também hoje  já constituíram  família. Melhor idade foi você ir com a Aline para a Disney brincar com ela e a sua criança interna.
 Melhor idade é quando você olha para trás e percebe que você cumpriu a sua parte da melhor forma possível.
Melhor idade é você ter uma profissão em que também se destacou e entre acertos e erros, estão todos salvos.
Melhor idade é você, mais sossegado, poder escrever seus livros, suas crônicas. Aí sim posso dizer que esta á a melhor idade, até por que tanto quanto se sabe é a única época  em que estamos vivendo.
Com todo o meu carinho desejo a você uma saudável melhor idade. Que os ventos sejam suaves, a chuva fresca, céu ensolarado e noite estrelada.
Com carinho

Sônia
P.S. como não posso deixar de ser prosaica, não enviei esta “missiva” a tempo por que meu computador faleceu na sexta feira e só  foi consertado hoje. A carta estava escrita na minha cabeça.


sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Um aniversário qualquer




Depois de uma noite agitada por ininterruptos pesadelos, Luiz Claudio acordou, com estranha sensação, no corpo e na alma. Era dia de seu aniversário, data que preferia esquecer. Na solidão do apartamento, roupa espalhada pelo chão, restos de comida no prato e na panela, seu primeiro pensamento foi para Maria Clara. Logo, logo ela telefonaria, desejando-lhe felicidades, como se ela nada tivesse a ver com aquele estado de desapego, em que se encontrava. Um dia, ela simplesmente jogou as roupas dentro da mala, roçou-lhe o rosto com os lábios e saiu para nunca mais. Quase 5 anos depois, voltou a ligar-lhe, apenas no dia do aniversário, para dizer aquelas baboseiras de sempre, como se eles não tivessem vivido tórrida historia de amor, que ela insistia em dizer que, para ele, era apenas sexo, como se as duas coisas, amor e sexo, não se fundissem. Resolveu que hoje não falaria com ninguém, principalmente com Maria Clara, porisso tirou o telefone da tomada e desligou o celular. Resolveu que passaria o dia na praia, não na sua praia, porque não queria encontrar conhecido, mas na mais distante possível. Todavia, ao abrir a cortina, chovia e o céu estava coberto de pesadas nuvens cinzentas, como sua alma. No banheiro, olhou-se no espelho e teve um susto: a imagem refletida era a dele menino, cabeça raspada, menos no topete. Menino sem passado ou futuro, apenas o presente, com o futebol de rua, o banho no rio e a matiné do domingo. Voltou para a cama atordoado. Talvez não acordara e o pesadelo se transformara em sonho. Fechou os olhos, mas o barulho da chuva, agora mais intensa, trazia a realidade para dentro do quarto. Voltou ao espelho, que agora refletia a imagem de um rapaz, com seus vinte e poucos anos, recebendo seu diploma de faculdade e, de cujos olhos emergia um misto de medo e esperança. Mais perplexo ainda, andou pela sala, foi até a cozinha, bebeu um resto de café adormecido e sentou defronte à janela, olhando a chuva molhar a rua, quase deserta, naquela inútil manhã de domingo. Pensou em sua vida, seus ganhos e perdas, principalmente em Maria Clara, que perdera, pela sua incapacidade de demonstrar que era muito mais do que sexo. Quase em pânico, voltou ao espelho. Agora, a imagem refletida era de um velho, absurdamente velho, olhos embaçados, pálpebras arqueadas e ralos fios de cabelos brancos, em desalinho. Numa fração de segundos, as três imagens, do menino, do jovem e do velho se superpuseram, dando-lhe a exata dimensão do tempo, de todos os tempos, como a dizer-lhe, sem palavras, só com imagens, que seu tempo acabara. Calmamente, como se cumprisse um ritual ensaiado, Luiz Claudio trocou de roupa, tomou o elevador, deu bom-dia ao porteiro, atravessou a rua e, serenamente, caminhou em direção ao mar. 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Diálogos pra lá de prováveis

Cena 01 (28.01.2016)
Dilma: ‘’Lula, meu querido, estou sem rumo. Logo, logo o Congresso volta, vai ser chumbo pra todo lado e, sem o ajuste fiscal acabo sendo despejada.”’
Lula: ‘’calma, minha flor, o problema é que você é muito turrona, não ouve ninguém, quer resolver tudo sozinha, acha que sabe tudo. Por que você não se aconselha com o Delfim, que sabe tudo de economia, tem a confiança do empresariado e, apesar do peso, tem tremendo jogo de cintura?’’
Dilma: ‘’mas será que ele me atende, ele, que trabalhou nos governos militares e eu, do outro lado, lutando para derrubá-los?’’
Lula:’é claro que ele atende, não está preso ao passado. Até me disse, uma vez que era socialista Fabiano. Não sei bem quem é esse tal de Fabiano, pelo jeito deve ter sido professor do homem e meio chegado a comunista. O Delfim é gente boa e muito me orientou, quando assumi o governo. Ele me ensinou, por exemplo, que comercio exterior não é a venda dos produtos por ambulantes, fora das lojas, como eu pensava. O pessoal ia lá no meu gabinete e falava em ‘commodities’’ e ‘’produtos primários’’ e eu achava que estavam falando de pessoas acomodadas que só fizeram o curso primário. Eu até ficava meio na bronca, eu que mal completei o curso primário, mas nunca fui acomodado. Aí, o Delfim me explicou e, na época, eu entendi, mas já me esqueci, só sei que tem a ver com negociação de produtos agropecuários, minérios e outras coisas. Outra vez, vieram me falar que os juros dependiam de uma reunião do Copom. Fiquei apavorado, achando que tinha a ver com o DOPS. Liguei pro Tuma, que ainda tava vivo e, como não o encontrei, liguei pro Delfim. Dei um suspiro de alivio, quando ele me explicou que é um órgão do Banco Central que define a política da taxa de juros. Gente fina o Delfim. Se hoje posso cobrar 200 mil dólares por palestra, devo muito a ele. Querida, liga, pode usar meu nome, que ele vai ajudar você a sair dessa roubada.’’
Cena 02 (29.01.2016)

Dilma:’Gostaria de falar com o Ministro Delfim Netto?’’
Secretária do Delfim (com voz de ‘’poucos amigos’’): ‘’quem quer falar com ele? Ele está ocupado, não sei se vai poder atender!’’
Dilma: ‘’Diga que é a Dilma!’’
Secretária (já perdendo a pouca paciência): ‘’Dilma de onde, minha senhora? Você é jornalista, vendedora?’’
Dilma:’Eu sou a Dilma, presidente da República.’’
Secretária: ‘’Ah bem, mas a senhora liga daqui a meia hora, porque, agora, ele está falando com o José Paulo, da rádio Bandeirantes e, quando fala com esse jornalista, não atende nem o Papa’’.
Dilma (meia hora depois):’Será que agora dá pra falar com o Ministro?’’
Secretária: ‘’Vou passar a ligação, mas vê se não demora, porque ele vai provar ternos e o alfaiate já está esperando.’’
Dilma: ‘’Ministro, obrigada por me atender, mas estou confusa, o Nelson é fraquinho e o Lula sugeriu que eu consultasse o senhor’’.
Delfim: ‘’Estou às ordens, presidente. Pra começar, a senhora deve comparecer à sessão do Congresso, fazer as reverencias de praxe e, com humildade, conclamar deputados e senadores a fazerem parceria com o governo, para superar a crise. Sobre as questões pontuais, quando a senhora vier a São Paulo, passe aqui, no Pacaembu (não, não é no estádio, é no meu escritório), que eu lhe dou o caminho das pedras.’’
Dilma: ‘’Obrigada, Ministro e desculpe pelo passado.’’
Delfim: ‘’Não tem de que, presidente, afinal, à época a senhora era muito jovem e jovem é inconseqüente mesmo.’’

Pano Rápido: Dilma, na sessão solene do Congresso Nacional: ‘’Senhores e Senhoras Senadores e Deputados: Conclamo V Excias. a formarem parceria com o governo, objetivando superarmos a crise econômica que nos assola.’’ 

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

A eleição norte-americana

Quando olhamos o cenário político norte-americano, chegamos a nos conformar com a mediocridade do nosso. Pelo Partido Republicano, disputam a indicação o mega empresário Donald Trump e o Senador Ted Cruz. O primeiro é um megalomaníaco bilionário, cuja maior proposta é construir um magnífico muro, em torno da fronteira com o México, a fim de evitar a entrada ilegal de imigrantes. Mais, propõe expulsar 06 milhões desses, que existem no País. E, para proteger a indústria nacional, pretende aumentar, significadamente, impostos sobre produtos vindos da China. O Senador Ted Cruz, representante do Estado do Texas, integra a ala mais conservadora do partido, o ‘’tea party’’. Propõe bombardear o Estado Islâmico e, internamente, acabar com os subsídios aos planos de saúde, dura conquista de Obama. Pelo lado democrata, disputam a indicação Hilary Clinton, ex-primeira dama e corna, mundialmente reconhecida como tal, com um discurso intervencionista do estado nas relações privadas, como, por exemplo, restringir a venda e uso de armas de fogo. O seu oponente, Senador Bernie Sanders, identifica-se como socialista, o que chega a ser excrescência, no País mais capitalista do mundo. Pretende controlar bancos e universalizar o sistema de saúde, o que aumentaria em muitos bilhões de dólares a dívida interna do País. A se confirmarem as pesquisas, o páreo eleitoral ficará entre Ted Cruz e Hilary Clinton, com mais chances de vitoria para a segunda, que tem a máquina do governo, a seu lado. Como, nos Estados Unidos, o voto não é obrigatório, estima-se que apenas 40% dois cidadãos irão às urnas, o que significa que o presidente eleito, quem quer que seja, governará com o beneplácito da minoria da população. Como pode o mais importante País do mundo funcionar com Presidente tão medíocre, qualquer dos quatro que for eleito? Em primeiro lugar, porque o Congresso movimenta-se, sem cambalachos com o Executivo. A existência de apenas dois partidos, com linha ideológica bem definida, faz com que o jogo seja mais limpo. Em segundo lugar e principalmente, porque é a iniciativa privada quem comanda o espetáculo, sem que o poder público e a burocracia entravem o desenvolvimento econômico. E, em terceiro lugar, porque a lei é para valer, tanto para o rico, quanto para o pobre. Lá, realmente, ‘’todos são iguais perante a lei’’. 

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

‘’Começar de novo’’



Hoje, 02 de fevereiro, dia em que se homenageia Iemanjá e abre, oficialmente, o carnaval da Bahia (sim, porque o carnaval baiano, na verdade, dura o ano inteiro), as instituições – o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional- voltam a funcionar. Durante as férias de janeiro, o Ministério da Saúde declarou-se derrotado pelo Zika Vírus, Lula enrolou-se, ainda mais com seu triplex, no Guarujá e seu sítio, em Atibaia, novas contas de Eduardo Cunha, no exterior, foram descobertas e Dilma e seus asseclas articularam para boicotar o impeachment. Quem pode fugir para as praias ou esquiar no Colorado ou na Suíça, afastou-se deste mau cheiro que continuou exalando de Brasília. Quem – como este que vos fala – precisou continuar matando um leão por dia, obrigou-se a respirar este ar nauseabundo de um País que teima em regredir em tudo, menos em corrupção, onde avançamos 05 casas. Pessoalmente, acho que o impeachment  ‘’gorou’’, primeiro, porque foi capitaneado pelas imundas mãos do Presidente da Câmara; segundo, porque temos uma oposição pífia, sem um líder de expressão nacional; terceiro, porque o Planalto, hábil na arte de corromper, abriu a ‘’burra’, distribuindo cargos e vantagens aos adversários que não perderam tempo e mudaram de barco. Não duvido que todas as mediadas impopulares – como a ressurreição da CPMF – sejam aprovadas. Este Congresso é o mais corrupto de nossa história e, a esta altura, seu abjeto Presidente, Renan Calheiros, já deve ter negociado sua exclusão da ‘’lava jato’’, em troca de apoio incondicional ao Planalto. É a velha e conhecida política do ‘’é dando que se recebe’’, que gerou e continuará gerando tantos malefícios ao Brasil. E a crise econômica, a inflação e o desemprego crescentes, como ficam? Ficam do jeito que está, com tendência a piorar, já que o cenário internacional também não nos ajuda. Brasília está distante do Brasil e a rela extensão de nossos problemas chega lá distorcida, ao sabor dos interesses do Governo. Brasília, digo e repito, não tem povo, ou, se tem, este não conta, pois quem conta são os que estão no poder ou gravitam entorno dele. Quem conta, quem decide, habita o ‘’Plano Piloto’’, com suas mansões, à beira do ‘’Paranoá’’, ou seus apartamentos de luxo. A plebe ignara foi escorraçada para as cidades-satélites, versão um pouco melhorada das favelas cariocas e paulistas e distantes, hora ou mais, do centro das decisões. A própria operação ‘’lava jato’’ vai perdendo força e, sem esforço, prevejo que se transformará em pálido esguicho, quando chegar nas Tribunais Superiores. Aposto um doce que não terão coragem de colocar a mão em Lula e não me surpreenderei se ele ainda sair dessa como herói, em condições de disputar e ganhar as eleições presidenciais de 2018. Afinal, quem nasce para Venezuela jamais será uma Alemanha. De minha parte, chego ao final da estrada, sem nutrir qualquer expectativa de ver o Brasil sair deste medíocre terceiromundismo, lamentando pelos filhos e netos que aqui continuarão vivendo tendo que, cumprindo a maldição bíblica, ganhar o pão com o suor do próprio rosto. Mas, logo mais, é carnaval, tempo de vivermos a efêmera mentira da felicidade. 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Cumprimentos e lembranças



Vou a uma Delegacia Especializada tratar de assunto do meu interesse. O Delegado Titular, que ocupou o cargo por vários anos, foi promovido graças a sua capacidade e honradez, acima de qualquer suspeita. Dignifica a Polícia Paulista e, dentre tantas operações realizadas, sem alarde e sem holofotes, desbaratou a máfia dos fiscais da Prefeitura e do ICMS. Guardem este nome: Luiz Storn. Tem tudo para ser Secretário de Segurança, se buscarem um homem probo e competente. Mas, chego na Delegacia e encontro outro Delegado sentado na cadeira, que se levanta, com um sorriso largo, quando entro na sala: é meu conhecido, de larga data. Jovem, dinâmico e competente... e santista roxo. Lembrei-me de que, em seu gabinete anterior, guardava um ‘’mini-museu’’ do Santos. Indaguei onde estava e ele me levou até a estante, onde, dentre várias peças preciosas, há um pequeno quadro daquele majestoso Santos, dos anos 60 que além de Gilmar, no gol e Zito, no meio-campo, tinha aquele ataque com Dorval, Mengalvio, Coutinho, Pelé e Pepe. O quadro contém o autógrafo de todos os jogadores e, ao que parece, foi herança do pai. Naquele momento, o Inquérito perdeu a importância e eu fiquei a contar ao Dr. Luiz Carlos (é o nome do Delegado) alguns fatos, envolvendo o Santos de seu coração, que eu presenciei, das arquibancadas do Maracanã ou do Pacaembu. Sou Botafogo fanático e também coleciono meus ‘’troféus’’, como a camisa do Jairzinho, ganha do próprio, em 1970 e que arderá comigo. Viajo ao Maracanã e me lembro – suprema humilhação – do ‘’chapéu’’ que Pelé deu em Manga, para, depois, marcar mais um gol, em uma partida que termináramos o primeiro tempo, ganhando de 2x0 que se encerrou 4x2 para o Santos. Dessas viradas fatídicas, recordei-lhe um Corinthians e Santos, no Pacaembu, onde fui, levado pelo saudoso Nelson, que nos deixou, no ano passado. Já fazia uma década que o Corinthians não vencia o Santos e meu amigo ‘’sentia’’ que aquele seria o domingo da virada. E parece que seria mesmo, porque o primeiro tempo terminara 3x0 para o Corinthians. A massa torcedora queria, mais, exigia goleada acachapante, que redimisse os 10 anos de humilhação. Acho que os gritos da torcida corintiana irritaram Pelé e companhia e, no segundo tempo, Heitor (acho que era este o nome do goleiro do time do ‘’Parque São Jorge’’) buscou a bola 8 vezes, no fundo das redes. O Dr. Luiz Carlos, nascido depois daquela época, fez um ar de tristeza por não ter visto aquele Santos e eu uma forte dor no peito, por me lembrar do Botafogo de então e este, de hoje.

Quanto ao Dr. Luiz Carlos, com o vigor de sua juventude, mas com experiência já acumulada, tenho convicção que executará  sólido trabalho, como novo titular da ‘’Delegacia de Lavagem de Dinheiro e Ocultação de Bens e Valores’’.