quarta-feira, 31 de outubro de 2012


COMO EXTRAIR PRAZER DE UMA NOITE DE INSÔNIA


Um acontecimento imprevisto e desagradável (nada que não possa ser rapidamente superado), roubou-me o sono, tirando-me da cama às duas horas da madrugada. E, como sempre faço nessas ocasiões, refugiei-me na leitura, que me conduz a mundos distantes do problema, que me atormenta. Vinha eu da frustração intelectual dos “Cinqüenta Tons de Cinza”, badalado livro, que já vendeu cerca de dois milhões de exemplares, malgrado sua insuportável mediocridade, sobre a qual já falei aqui. Grande sucesso, mas enorme porcaria. Relembro Nelson Rodrigues: “A unanimidade é sempre burra.” Mas hoje, após a madrugada não dormida, quero falar de um livro que, por sorte, ganhei ontem do próprio autor e que me acompanhou até o romper do dia. Trata-se do “Anagrama” (editora Letras do Pensamento), de meu amigo, Desembargador Mario Antonio Silveira, para mim, muito mais importante como amigo do que como Desembargador, apesar de seu incontestável saber jurídico. Ele e eu sabemos separar os dois mundos, tanto assim é que, relatando um processo meu, não se constrangeu não se dando por impedido, do mesmo modo em que não se constrangeu em julgar contra meus interesses.
Mas, falo do livro “Anagrama”: para começar, é prefaciado pelo poeta Paulo Bomfim, o que não é para qualquer um. Se quiserem, pode ser uma ou várias histórias de amor, vividos e perdidos. Mas, se também quiserem, é a história de lutas internas e externas, que começa no interior da França, ao eclodir da segunda guerra mundial, passa pelo Rio de Janeiro e termina, quarenta anos depois, em um parque de Paris, num encontro, que poderia ser um reencontro, mas que o autor prefere perpetuar em lembranças físicas. Mario Antonio percorre lugares mágicos, no Rio dos anos 40 e até nos indica bons vinhos. Mais, não digo, para não tirar o prazer da leitura de um bom livro, “avis rara”, em tempo de tantos medíocres tons de cinza.

COMO EXTRAIR PRAQZER DE UMA NOITE DE INSÔNIA


Um acontecimento imprevisto e desagradável (nada que não possa ser rapidamente superado), roubou-me o sono, tirando-me da cama às duas horas da madrugada. E, como sempre faço nessas ocasiões, refugiei-me na leitura, que me conduz a mundos distantes do problema, que me atormenta. Vinha eu da frustração intelectual dos “Cinqüenta Tons de Cinza”, badalado livro, que já vendeu cerca de dois milhões de exemplares, malgrado sua insuportável mediocridade, sobre a qual já falei aqui. Grande sucesso, mas enorme porcaria. Relembro Nelson Rodrigues: “A unanimidade é sempre burra.” Mas hoje, após a madrugada não dormida, quero falar de um livro que, por sorte, ganhei ontem do próprio autor e que me acompanhou até o romper do dia. Trata-se do “Anagrama” (editora Letras do Pensamento), de meu amigo, Desembargador Mario Antonio Silveira, para mim, muito mais importante como amigo do que como Desembargador, apesar de seu incontestável saber jurídico. Ele e eu sabemos separar os dois mundos, tanto assim é que, relatando um processo meu, não se constrangeu não se dando por impedido, do mesmo modo em que não se constrangeu em julgar contra meus interesses.
Mas, falo do livro “Anagrama”: para começar, é prefaciado pelo poeta Paulo Bomfim, o que não é para qualquer um. Se quiserem, pode ser uma ou várias histórias de amor, vividos e perdidos. Mas, se também quiserem, é a história de lutas internas e externas, que começa no interior da França, ao eclodir da segunda guerra mundial, passa pelo Rio de Janeiro e termina, quarenta anos depois, em um parque de Paris, num encontro, que poderia ser um reencontro, mas que o autor prefere perpetuar em lembranças físicas. Mario Antonio percorre lugares mágicos, no Rio dos anos 40 e até nos indica bons vinhos. Mais, não digo, para não tirar o prazer da leitura de um bom livro, “avis rara”, em tempo de tantos medíocres tons de cinza.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012


AS ELEIÇÕES MUNICIPAIS

Antes do primeiro turno das eleições, para Prefeito da nossa Capital, inseri matéria neste blog, falando da conveniência de escolhermos um candidato que, dentre outros atributos, tivesse capacidade física de, “in locum”, conhecer os complexos problemas da cidade. Do plano administrativo, a descentralização é arma de dois gumes, pois, se o administrador se valer tão somente de informações de terceiros, pode ficar fora da realidade objetiva e, quando tomar conhecimento dela, o incêndio estará fora de controle. Constato, nesta segunda-feira, que prevaleceu o bom senso nesta eleição e, independentemente da questão partidária, São Paulo optou por eleger um Prefeito jovem, de excelente qualificação. Constato, com igual alegria, que a busca pelo novo, no duplo sentido do termo, foi a tônica nesta eleição. Assim é que os Prefeitos eleitos de Florianópolis, Fortaleza, Salvador, dentre outros, são jovens de menos de 40 anos, todos com alguma bagagem política, via de regra, no legislativo e que, agora, no executivo, terão a oportunidade de mostrarem, pelo entusiasmo da juventude, suas reais condições de construírem uma carreira pública, com propostas e ações adequadas aos tempos atuais. As velhas lideranças – como é o caso de Serra – gastaram-se, com os anos percorridos e, obrigatoriamente, tem que dar lugar aos jovens, que vem surgindo. É a lei da renovação natural que, queiramos ou não, vai se cumprir, esmagando os que não a respeitam.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012


A Fuga Definitiva

Aquela não era apenas sua casa de campo, construída em um promontório, que se debruçava sobre uma pequena floresta, serpenteada por tímido rio. Era, na verdade, seu refúgio, onde vinha pensar suas feridas emocionais e elaborar seus projetos. Gostava de, sozinho, caminhar por entre as trilhas, escutando o gorjear dos pássaros e os galhos, caídos das árvores, estalarem sob seus pés. Andava sem rumo e, muitas vezes, perdera-se nestas andanças, sem medo, ao contrário, sentindo um prazer quase infantil, na descoberta do caminho de volta. Foi assim naquele dia. Na noite anterior tivera, por motivo pueril, desagradável e inútil discussão com sua mulher. Depois de tantos anos de casado, era assim. Filhos criados e afastados do ninho, ainda não tinham desvendados os segredos da solidão a dois, daí o enfretamento habitual, sobre coisas sem importância: a toalha jogada no chão; a mesa do café sem guardanapo; a televisão em volume alto etc. Mas, mesmo essas brigas sem motivo, desgastava-o, provocando noites mal dormidas, como a anterior. Chegara ao escritório, sentindo que seria um dia de problemas: apenas um elevador funcionava, o que o fez ser grosseiro com o porteiro, como fosse ele responsável pelo transtorno. Depois de eternos minutos de espera, chegou a seu andar e, ao abrir a porta, constatou que sua secretária ainda não chegara e o telefone tocava, de forma alucinada. Por certo, aquele não seria um bom dia! Foi pensando nessa possibilidade, quase certeza, que tomou a decisão de fugir para a casa de campo, cancelando todos os compromissos e só retornando quando a noite já estivesse definitivamente instalada. Duas horas depois, de tênis, bermuda e camiseta, estava sentado na espreguiçadeira, instalada no deque, de onde só se via o verde. E o único barulho era o do vento soprando a copa das árvores. Como a região possuía inúmeros pântanos, podia-se, ao longe, ouvir o coaxar dos sapos. Folheou, pela centésima vez as “Ficções do Interlúdio”, de Fernando Pessoa, ligou para a secretária: fora chamado, com urgência, a Brasília e só retornaria à noite, que avisasse em sua casa. Ligou o som, enquanto procurava alguma coisa para comer. Queijo e salame, aparentemente em bom estado e algumas garrafas de cerveja. Sobras do último fim de semana, que lá estivera. Sentia que começava a se desligar de seu cotidiano monótono, que ia o asfixiando, lentamente. Perdera o entusiasmo pelo trabalho e sua mulher, companheira de uma vida inteira, olhava-o com indiferença. Sem ódio, mas sem carinho. Provavelmente algum ressentimento armazenado. Os filhos, casados e distantes, habitavam seus próprios mundos, onde ele, por certo, não cabia. Lentamente, seus olhos foram ficando pesados e ele dormiu, embalado pela brisa, que, sem pedir licença, invadira a sala. Acordou, assustado, com um grito, vindo da varanda. Eram os sagüis, principais habitantes da região, que invadiam as casas, em busca de comida. Fechou as portas e saiu para sua habitual caminhada, sem rumo, blindando seus pensamentos contra o mundo, além daquele mínimo universo. Andava, vagarosamente, percorrendo alamedas naturais, sentindo o perfume das flores e identificando o canto dos pássaros. De repente, ao circundar o que imaginou ser um pequeno pântano, constatou, com indizível terror, que estava preso ao mais terrível dos meios, aquele em que o homem não pode mais caminhar, assim como o peixe não pode nadar. Estava prisioneiro da areia movediça. Em movimento rápido, tenta voltar à terra firme, o que o faz afundar mais um pouco. Em movimentos frenéticos de braços e pernas, busca a margem, que parece se distanciar, apesar de estar a pouco mais de um metro. Inútil! Agora, a areia cobre-lhe os joelhos. Agitando os braços, começa a gritar, primeiro em voz baixa (sempre fora avesso a gritos), depois, histericamente. Sua voz ecoa no vazio. Àquela hora, meio de semana, vizinhos distantes, ninguém atenderá a seus pedidos de socorro. A areia atingi-lhe a cintura. Ao longe, as primeiras luzes, a prenunciarem a noite, acendem-se e a mata, subitamente, mergulha na escuridão. A areia cobre-lhe os ombros. Agora, ele sabe que nada resta a fazer, senão esperar o fim, que vai se aproximando vagarosamente, com a
areia, gosto ardido, chegando-lhe à boca. Só, então, toma consciência que ninguém dará conta de sua morte e talvez seu corpo jamais será descoberto. Será um desaparecido, cujo rumo se perdeu em direção a um lugar desconhecido. O que dele pensarão a mulher, os filhos, os amigos, os clientes? Inútil pensar, porque a areia cobriu-lhe o nariz, deixando-lhe fugaz tempo de ver as luzes acesas, ao longe.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012


AVENIDA BRASIL X CAMPANHA POLÍTICA: QUEM GANHOU?

Sexta-feira última, às vinte e uma horas, entro em um restaurante, que costumo freqüentar com minha esposa e sempre cheio naquele dia e horário. Para meu espanto, apenas nós no local, com cerca de dez garçons perfilados. O que teria acontecido? A noite estava particularmente agradável, após uma forte chuva, que afastou o calor do dia, deixando que uma brisa suave envolvesse a cidade. Levei meu espanto ao garçom, que chegou a nossa mesa. Disse-me ele que todos os freqüentadores, com certeza, estavam a espera da descoberta do assassinato de Marx. Maior espanto foi o meu, porque até onde vai meu medíocre conhecimento, Karl Marx, o grande ideólogo do socialismo, morrera de morte natural, há mais de um século. Logo, o gentil garçom sanou meu espanto: na verdade, se tratava de Max, o vilão da novela das nove, na trama envolvendo Carminha e Nina. No dia seguinte, leio no jornal que o último capítulo da novela dera 80% de audiência, enquanto que, outro duelo, envolvendo os candidatos a Prefeito de São Paulo, não superara 4% de telespectadores, no debate promovido pela Bandeirantes. Ficam, assim, estabelecida a prioridade dos paulistanos: muito mais importante do que saber qual o candidato apresenta a melhor proposta, para administrar nossa cidade, nos próximos quatro anos, é conhecer o final da trama da citada novela. Não há críticas a fazer, afinal, Serra e Haddad não tem feito outra coisa, senão se ofenderem mutuamente, ou, quando muito, apresentarem propostas absolutamente inexeqüíveis. O povo, que não mais acredita em devaneios de políticos, prefere o devaneio, sabidamente real das novelas. Talvez, a partir de hoje, segunda-feira, sem Carminha, Nina, Tufão e companhia, comece realmente a campanha política.

terça-feira, 16 de outubro de 2012


O ENGODO CHAMADO SEGUNDO TURNO

Começa, agora, a batalha do segundo turno, que eu prefiro chamar o turno da prostituição. É o momento das uniões espúrias, dos conchavos, das negociatas. É o “vale tudo” para ganhar as eleições. E o pior é que o eleitor é envolvido nesta promiscuidade, mesmo não o querendo ser. No primeiro turno, vota-se no candidato escolhido, por este ou aquele motivo. No segundo turno, vota-se por rejeição. Como se sabe, o segundo turno surgiu por causa de Paulo Maluf. Se olharmos para o passado político, em havendo apenas um turno, Maluf bateria Erundina na eleição municipal, como bateria Covas na eleição estadual. Foi exatamente para impedir tal fato que se engendrou um segundo turno, sob o pretexto de que o vencedor deveria ter 50% mais um dos votos. Tal exigência não existia na Constituição de 1946, tanto assim é que Juscelino se elegeu com cerca de 40% dos votos, na eleição de 1955. A Carta Magna de 1967, outorgada pelo regime militar, também não contemplava essa exigência, que seria modificada, em nome do casuismo, como, via de regra, acontece no Brasil. Para o eleitor fica a frustração de ser obrigado a votar em quem desprezou no primeiro turno, ou por não comungar com suas ideias, ou por divergir de seu comportamento. Resta a alternativa do voto em branco, que não é bom para a democracia e deixa, no eleitor, uma sensação de vazio. O noticiário dá-nos conta de que, tanto Serra, quanto Haddad correram atrás dos perdedores, buscando apoio. É de se perguntar: o que oferecerão em troca? Como explicar às pessoas, medianamente lúcidas, que o inimigo de ontem, o desonesto de ontem, o sem ideias de ontem, possa ser o aliado de hoje? É certo que política não se faz com o fígado, como já disse alguém, mas, mais certo ainda é que também não se faz com troca de favores, quase sempre execráveis.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012


A FÉ E A RAZÃO

De todos os pecados capitais, o único que jamais me atingiu foi o da inveja. O sucesso ou a riqueza de terceiros não me incomodam, talvez porisso possa conviver, harmonicamente, com amigos e clientes que trafegam em carros importados, a falarem de restaurantes em Paris, Roma, Londres, como falo da churrascaria da esquina. Por certo tempo, inquietou-me a fé inabalável das pessoas humildes, que choram comovidas, ao receberem a hóstia, ou à passagem do Santíssimo. Levei essa angústia a meu Padre confessor e ele a dissipou, lembrando-me de que a fé é a antítese da razão, o que significa ser ela mais forte nas pessoas de pouca ou nenhuma cultura, incapazes, portanto de maiores indagações. Ao contrário – observou ele – se você questiona os elementos que integram sua fé e, mesmo assim, a mantém, é porque ela é mais firme do que a daquelas pessoas que creem, sem contestar ou avaliar. Faço esta reflexão porque constato que são exatamente essas pessoas mais humildes, cuja fé se assenta na paixão, quando não tem suas preces, atendidas, migram para seitas religiosas, que prometem curas, para males físicos ou rápidos ganhos materiais. Com muita frequencia vacilo, porque também, em minhas preces, formulo pedidos, como a solução do processo que vai me render polpudos honorários, ou o cessar da dor no braço, que me tolhe o sono. Quando o cansaço parece abalar minha fé, lembro-me do pedido maior que faço, todos os domingos, durante a consagração: a paz e a saúde de minha família, pedido sempre atendido. Quando me sobe essa constatação, minha fé se restaura e não posso deixar de olhar, com tristeza, para as pessoas que se dizem descrentes. A quem ou a que recorrem elas, em seus momentos de aflição? Serão elas suficientemente fortes para, por si mesmas, superá-los, ou se transformam em neuróticos e deprimidos, a tatearem no escuro? Talvez seja porisso que se diz que o dom da fé não passa necessariamente pelo dom da razão.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012



COMEMORAÇÃO DO CINQUENTENÁRIO DO CONCILIO VATICANO II

Completa-se, hoje, 11 de outubro, meio século que o Papa João XXIII abriu o “Concilio Vaticano II”, que tinha como objetivo promover a modernização da Igreja de São Pedro. Apenas a título de exemplo, convém lembrar que a missa era, até então, rezada em latim e, a partir do Concílio, passou a sê-lo nos idiomas dos respectivos países. Naquele conclave, duas correntes se confrontaram: a tradicionalista, que não concordava com as mudanças, e a renovadora, que as entendia como absolutamente necessárias. O atual Papa, Bento XVI, uma das maiores inteligências e culturas produzidas pela Igreja, integrava a ala que pugnava pela modernização e que terminou tendo suas idéias prevalentes, abrindo espaço para seguidos aperfeiçoamentos. Vivia-se um período de grandes agitações políticas. A guerra fria atingia seu ponto mais crítico, com a tentativa dos Estados Unidos de desestabilizarem o Governo Fidel Castro, no episódio que ficou conhecido como “Baía dos Porcos”. No Oriente Médio, as relações de Israel com o mundo árabe começava a se deteriorar, degenerando, poucos anos depois, em conflitos, que perduram até nossos dias. Na América do Sul, a crescente ameaça comunista trazia inquietação e insegurança, o que faria com que países como Brasil, Argentina, Chile e Uruguai descambassem para regimes autoritários, com supressão das liberdades individuais. Por certo, a Igreja não podia ficar alheia a tais acontecimentos, voltada, exclusivamente, para sua missão espiritual. A evangelização deveria ter conceito mais abrangente, principalmente abraçando a necessidade de discutir e participar, de forma efetiva, das necessidades sociais dos menos favorecidos. Talvez tenha sido essa a principal vitória dos que, no Concílio, pregavam a modernização da Igreja. Não se tratava, é claro, de se imiscuir nas questões de Estado, mas, sim, tomar posição clara e firme naquelas, em que estava em jogo o exercício de uma vida digna, no conceito Tomista do termo. Deus não quer o ser humano vilipendiado, física e moralmente e esta lição foi expressamente ministrada por Cristo. Assim, a partir do Concílio, a Igreja “foi para as ruas”, em defesa da dignidade humana. Como não poderia deixar de ser, essa nova postura trouxe extremos. Iria surgir, por exemplo, uma “Igreja Progressista”, que chegou ao exagero de pregar um Cristo socialista, revolucionário armado. Como sói acontecer, com o tempo, principalmente sob o pontificado de João Paulo II, esses exageros foram extirpados e os que professaram visão tão equivocada, ou se voltaram para a verdadeira doutrina da fé, ou abandonaram o clero. O Sumo Pontífice, Bento XVI, com a autoridade de quem se filiou à ala modernizadora, vem, com extrema competência, recompondo os verdadeiros valores da Igreja Católica, demonstrando a necessidade de se valorizar a liturgia sem, no entanto, perder a percepção de que não podemos fechar os olhos para os necessidades de nossos semelhantes. A este ponto, convém trazer à colação a seguinte lição formulada por Bento XVI, em sua exortação apostólica “Sacramentum Caritatis”: “com efeito, quem participa na Eucaristia  deve empenhar-se na edificação da paz neste nosso mundo marcado por muitas violências e guerras e, hoje de modo particular, pelo terrorismo, pela corrupção que estão em contraste com a dignidade do homem, pelo qual Cristo derramou seu sangue, afirmando assim o valor de cada pessoa.” Felizmente, para nós, católicos, Bento XVI, passados 50 anos, persevera em sua vontade de modernizar a Igreja e, neste pastoreio, espera e exige nossa colaboração.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012


O PONTO E O CONTRAPONTO DE UM JULGAMENTO

Quando a história contar o episódio "mensalão", por certo destacará a serenidade com a qual o Presidente de nossa Corte Suprema dirigiu o julgamento, tornando-o infenso às influencias externas e, agindo como moderador, impediu a exacerbação de ânimos, entre Juízes e Advogados. Registrará, também, a isenção do Relator, Ministro Joaquim Barbosa que, mesmo sendo admirador e eleitor de Lula e Dilma, como, expressamente, declarou em entrevista dada, colocou sua missão de Magistrado acima de suas preferências políticas e julgou submisso apenas às provas dos autos. Registrará, com certeza, o enorme esforço do Ministro Lewandowski de, agindo como verdadeiro advogado de defesa, pinçar argumentos que justificassem a absolvição de José Genoino. Esforço que trará alguns frutos, como o retardamento na execução da sentença, vez que seu voto divergente propiciará a propositura de novos recursos. As razões que levaram S. Excelência a construir seu entendimento permitem ilações, mas é de se preferir respeitar tais razões, porque juridicamente bem fundamentadas. Mas, com muito mais certeza, a história registrará a sombria participação de um senhor, que nem mesmo poderia integrar aquele Colegiado, por lhe faltar requisito essencial, qual seja o “notório saber jurídico”, exigência de nossa Constituição. Dele se sabe ter sido reprovado, pelo seu pouco saber, em sua tentativa de ingressar na Magistratura Paulista. Pois esse senhor – Toffoli é o sobrenome – foi, por largo tempo, advogado do PT e, até ser alçado ao Supremo, assessor ligado ao réu, José Dirceu. Quisesse ele resguardar sua dignidade e até granjear o respeito de seus pares e de quem milita no ramo do Direito, deveria ter se dado por suspeito, abstendo-se de votar no julgamento de seu padrinho e no do então Presidente do partido político do qual foi advogado, vez que indiscutível sua vinculação subjetiva com um e com outro. Desprezando o juízo que se pudesse fazer dele, empurrando, para o lado a moral, como não fosse ela elemento essencial da justiça, o senhor Toffoli, com a voz trêmula – o que é próprio dos que parecem não saber o que dizem – executou sua lamentável função de escudeiro e absolveu os dois José. “Vassalou-se”, como se diria no popular e manchou, com sua vassalagem, episódio tão marcante. Felizmente, como a história não abre espaço para pequenos atores, ficará o registro maior da coragem do Ministro Joaquim Barbosa, que nos remeteu aos mais ilustres membros pretéritos do Supremo Tribunal Federal.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012


O Prazer de Ouvir Drausio Varela


Com imensa satisfação, assisti, ontem, 02/10, à entrevista do Dr. Drausio Varela, no "Programa do Jô". De larga data, sou admirador daquele médico que, ao lado de sua incontestável competência profissional, desenvolve múltiplos trabalhos na área de pesquisa e na social, sem abdicar de seu lado intelectual, na acepção  ampla do termo. E impressiona a simplicidade com a qual ele expõe seus pontos de vista, sem se deixar contagiar pelo estrelismo, marca registrada de alguns profissionais da área, que estão quilômetros atrás do Dr. Drausio. Gostaria de abordar um tema daquela entrevista: o entrevistado declarou-se ateu, manifestando, todavia, com a fidalguia, que lhe é própria, o maior respeito pelos que professam qualquer religião. Afirmou ele não ter maiores preocupações quanto à existência ou não de uma outra vida, acima do plano material. Como católico, apostólico, romano, dou inteira razão ao Dr. Drausio. Pessoas, como ele, que vivem a vida, em toda a sua plenitude, voltada para o próximo, nada tem a temer. Não basta ser religioso, ir à Igreja ou a um templo, fazer orações e levar uma vida de costas para o seu semelhante. Lembro, a este próposito, trecho de uma das "Cartas" de São Thiago: “Mostre-me tua fé, sem as suas obras, que eu te mostrarei minha fé, através de minhas obras.” Por certo, o Dr. Drausio Varela, quando chegar ao céu (e espero, pelo bem de todos, que demore mais um século), será recebido por uma legião de anjos, que o levarão para um dos lugares mais nobres.

segunda-feira, 1 de outubro de 2012


EU, O MAR E OUTRAS COISAS

Sozinho, na praia deserta, nesta manhã de inverno-verão, olho para o infinito e, sob meus olhos, repousa, preguiçoso, o mar, velho e eterno companheiro, de quem o cotidiano, esta besta-fera, me afastara. Ao longe, quase na linha onde o oceano desaba, um ponto escuro se desloca, lentamente. Fixo-me nele, na ansia irracional de identificá-lo. O ponto cresce e se permite ser visto: um barco, vela içada, provavelmente retornando da lida. Percebo que outros barcos surgem, pelo mesmo caminho barra adentro, em direção ao cais, onde depositarão seus ganhos e suas perdas. Invejo-os, por não ter onde ancorar minhas angústias e minhas alegrias. Com o sentido marítimo deste momento mágico, só me interessa o mar e as coisas que estão em sua superfície, como enfeites. Que se ralem os barcos, se não trazem peixes. Para meus olhos, são apenas enfeites que adornam o dorso do mar. Alguém – um pescador? – passa por mim e diz "Bom dia". Odeio-o, porque me tirou da contemplação. Mas, assim mesmo, respondo "Bom dia", pouco me importando se ele terá um bom dia. Provavelmente, será um dia como tantos outros, indiferente ao barulho das ondas, tímidas a esta hora da manhã. Vem-me à lembrança outras praias, em outros tempos e lugares. O mistério de todas elas. A beleza de todas elas. A chegada e a partida: “Olá, mar, como vai você? Que saudade!” “Adeus, mar, quando será que volto a vê-lo?” A dolorosa instabilidade deste impossível universo, com suas horas marítimas, indo e vindo, gregos, rasgando as águas, vikings, rasgando as águas, piratas, roubando nas águas, ninfas camoneanas, banhando-se nas águas, navios guerreiros, ensanguentando as águas. Pois o mar, velho e eterno companheiro é isto: morte e vida, indo e vindo. Trágico pensar que vou embora e ele vai ficar, braços abertos a outros que, espero, saibam amá-lo, como eu, deixando-o molhar o corpo, como carícia suave ou com o ardor de amante ensandecido. “Olá, mar! Adeus,mar!” Alguém senta a uma pequena distância de mim. Incomoda-me aquela presença, porque me rouba a solidão e, porque, estupidamente, fecha os olhos. Se veio à praia, é por causa do sol, do mar, da praia e das coisas que há nela. Se fecha os olhos, apaga todas estas coisas. Dizer isso, pode soar ridículo aos ouvidos de quem, por não saber o que é olhar para as coisas, não compreende quem fala delas. Mas, se as coisas existem é para serem vistas, por que fechar os olhos para elas? Ser assim, é ser cego sem sê-lo. Se Deus está em todas as coisas (e eu creio nisto), Ele está nesta
praia, nas árvores, que a circundam, no mar que a banha, no sol que a aquece. Então, aquela pessoa estática, alheia a este balé fantástico, fecha os olhos para Deus. Por certo, deve ser um destes cretinos que dizem: “Não acredito em Deus!”, como se Deus precisasse que acreditem nele. Ele apenas existe e se mostra em todas essas coisas simples de se ver, como esta praia, este mar, este sol e estas árvores entorno. Não acreditam Nele? Pior para eles, porque são cretinos (embora
não se saibam cretinos). Segundo, porque, quando precisarem Dele, sentir-se-ão menores e piores. Mas, como não suporto cretinos e muito menos sou Deus, vou embora...