sexta-feira, 28 de setembro de 2012


PRIMAVERA

Nem mesmo foi preciso abrir os olhos para saber que era tempo de primavera. O estridente gorjear do sabiá e o adocicado cheiro de alecrim invadiram o quarto, anunciando que o inverno se fora, levando consigo a tristeza dos frios dias cinzentos e das mulheres, coxas escondidas por calças compridas e botas até o joelho. Sempre detestara o inverno, a não ser quando fazia amor com V., ela, lindíssima, completamente nua, calçando apenas longas botas e desfilando para ele, com aquele sorriso exagerado, que nunca mais esqueceu. A primavera, além de festa multicolorida, era o preâmbulo do verão, essa sim, sua estação do ano preferida, a exuberância das mulheres douradas, a exibirem seus corpos pouco vestidos. Por isso, naquela manhã, seguindo o canto dos pássaros e o perfume das flores, acordou cantarolando, aprontando-se, com esmero, até exagerado, para mais um simples dia de trabalho. Olhou-se no espelho e não pode conter uma ponta de vaidade: apesar de já ter chegado aos 50 – odiava falar de sua idade – ainda se considerava um homem atraente, apesar de alguns quilos acumulados nos últimos anos. O casamento desfeito, depois de mais de 25 anos de boa convivência com Maria Clara, deixara um certo desencanto com as mulheres, o que serviu para firmar sua convicção de permanecer sozinho, apesar de, pela sua cama, ter passado dezenas delas, sem preconceito de cor ou de raça.
Depois de cumprimentar o porteiro, com a gozação de sempre – “o Flamengo vai acabar, seu Antonio” – apanhou seu carro e seguiu em direção ao escritório, na Praia do Flamengo. Como a manhã surgira esplendorosa, preferiu margear a praia, até entrar na Princesa Izabel. O trânsito, como sempre, era intenso, mas “Chopin”, deslizando, suave, no som e a vista deslumbrante do mar, salpicado de barcos, tornavam o trajeto agradável passeio. O dia transcorrera sem pressa e sobressaltos e o esmorecer do sol, anunciou que era hora do tradicional uísque “boca de noite”, no elegante bar do Hotel Glória. Fora o primeiro a chegar. Sentou-se, como fazia, já lá iam cinco anos, na mesma mesa de sempre, foi atendido pelo garçom de sempre e tomava o Buchanna’s de sempre, quando seus olhos pararam em duas coxas, absolutamente perfeitas, cruzadas à sua frente. Vagarosamente, como quem desfruta prazer raro – e desfrutava – subiu os olhos, até encontrar a dona daquele monumento de pernas: loura, olhos azuis, quase um metro e oitenta, a descontar a altura do salto, por volta de 35 anos, vestido azul escuro, exibindo, além das citadas coxas, a entrada de seios rígidos, cujos bicos apontavam para o norte. Frequentador assíduo, sabia que o bar não admitia prostitutas à caça de clientes. Além do mais, a elegância espontânea, com que levava a taça aos lábios, demonstrava que se tratava de mulher de fino trato. Não soube por quanto tempo ficou em tais divagações, contemplando aquele conjunto harmonioso e, tão absorvido estava, que se assustou quando, daquela boca, recebeu um sorriso suave e encorajador. Empunhou seu corpo e, como quem se dirige a lugar sagrado, caminhou até a mesa da mulher e sentou-se a seu lado. Sabia que, como quem mergulha em mar revolto, estava correndo um grande perigo, mas, como dizia Pessoa, “navegar é preciso, viver não é preciso”. Falaram de coisas e de lugares. Ela viera de Curitiba, para um congresso - era consultora de economia – e, sem conhecer ninguém no Rio, preparava-se para jantar, ali mesmo no Hotel e, depois iria subir para o quarto. Ele, aproveitando a deixa, convidou-a para conhecer a noite do Rio. A princípio ela vacilou, mas ele sabia manipular situações: o “não” vacilante é vizinho do “sim”, era como funcionava a cabeça das mulheres. Em lugar de um formal restaurante de hotel, propôs um, na Lagoa, onde, inclusive, poderiam ouvir boa música. A noite estrelada e a lua desmaiando sobre o mar formavam o cenário perfeito para aquele inesperado encontro. Primeiro, levou-a ao “Vinicius”, seu reduto, onde, Bira, ao piano, recepcionou-o com o hino do Botafogo, seguido das melhores canções do poetinha. Saltava aos olhos que ela estava impressionada:
- “Você deve ser o maior boêmio da cidade” – disse-lhe ela.
- “Não, apenas sou fiel ao lugar que frequento, como sou fiel às pessoas, com quem convivo” – respondeu ele.
Com certeza, tocou em ferida não cicatrizada, pois, sem intervalo, ela começou a falar de um grande amor, perdido pela traição. Sentindo que a conversa poderia descambar para a tristeza, ele pediu a conta e seguiram para o “Mistura Fina”, já borbulhando de gente. O conjunto de Fred tocava “Moonlight Serenade”, que Fernanda cantava divinamente. Alguns velhos conhecidos cumprimentaram-se com um aceno de mão e Beth, a “promoter” da casa, levou-os até uma mesa, onde podiam conversar, sem suas vozes sempre abafadas pela música. A beleza da casa, a alegria das pessoas, Sinatra no ar, devolveu-a à satisfação de estar no Rio, na magia do Rio. Aquela era a cidade, que sonhara conhecer e, tinha de admitir, aquele era o homem certo: bonito, elegante, educado e que sabia tratar as mulheres. Beberam, conversaram, riram muito e ele, além de tomar-lhe as mãos, nem por um segundo, falou-lhe em sexo.
- “Você deve estar cansada, quando quiser, podemos ir, porque, por mim, amanheço o dia com você” – disse-lhe ele.
Ela sorriu, pensando no duplo sentido de “amanheço o dia”. Por que não? Desde seu rompimento amoroso, quase um ano passado, não ficara com ninguém e, nos últimos tempos, acordava, no meio da noite, suando, com o corpo em brasa. Bem sabia porque e aquele ambiente, o vinho, a música acenderam uma fogueira dentro dela. Ele, como se lesse seus pensamentos, puxou-a junto a si e beijou-a, intensa, mas suavemente, enquanto, como quem percorre joia rara, deslizou sua mão esquerda sobre as coxas, até alcançar a calcinha, que sentiu umedecida. Como em ritual, pagou a conta, tomou-a pela mão e, como quem transporta louça frágil, levou-a para o carro, dirigindo com o seu braço esquerdo, envolvendo-a com o outro, ela aconchegada a seu ombro, beijando-lhe, com a ponta dos lábios o pescoço.
Quando acordou, depois de frenética noite de amor, ela se fora, deixando apenas um bilhete saudoso, mas sem telefone. Se quisesse, poderia localizá-la pelo Hotel, mas preferiu imaginar que vivera um sonho, sonho de noite de primavera. 

quinta-feira, 27 de setembro de 2012


REPORTAGEM EQUIVOCADA

Ontem, assistindo ao "Jornal da Cultura", um de seus integrantes, carcomido representante de uma esquerda já morta e enterrada, responsabilizou o regime militar pelo estado falimentar, em que se encontra a pesquisa, no Brasil. A bem da verdade, o regime militar, inaugurado em 31 de dezembro de 1964, findou-se em 1980, já que o "Governo Figueiredo", que perdurou até 1984, completou a distensão, promovida por Geisel e, em sua vigência, as liberdades já estavam sendo exercitadas em sua plenitude. Para quem não viveu aquele período, isso está em qualquer livro de história. Mas, mesmo que tomemos o ano de 1984 como a retomada da plenitude democrática, constatamos que, neste lapso de tempo, decorreram 28 anos, tempo mais do que suficiente para que qualquer trabalho científico, em qualquer segmento, pudesse iniciar e se completar. Com efeito, imaginemos um jovem, que tivesse ingressado em uma faculdade em 1984, nela se graduando em 1989. Teria ele 23 anos para realizar todos os cursos de pós graduação, debruçar-se sobre qualquer campo de pesquisa e produzir os resultados almejados. Recente matéria jornalística, veiculada pelo "Fantástico", mostrou que os brasileiros pesquisadores, residindo e desenvolvendo seus trabalhos no exterior, tem 50 anos, ou menos, o que vale dizer que, em 1984, ainda estavam na faculdade. Já passou o tempo de responsabilizar os Governos Militares pelas mazelas do País. A absurda multiplicação dos cursos superiores de péssima qualidade, o ensino fundamental incipiente são, fruto da irresponsabilidade e do clientelismo político, que contaminou a educação no Brasil, principalmente a partir da devolução do Poder aos civis. Os Governos Militares podem ter tido comprometimento na área dos direitos humanos, mas é inegável a contribuição dada no campo sócio-econômico. Basta lembrar que, em 1973, ao final do duro Governo Médici, o salário mínimo correspondia a US$ 300,00 (trezentos dólares), marca só atingida, neste ano, com o real super valorizado. Basta lembrar, aliás, como o próprio Lula o fez, que, naquele período, a oferta de emprego era de tal ordem que empresas "roubavam" trabalhadores de outras empresas. Infelizmente, há pessoas, como o integrante daquele programa que, por ignorância ou má-fé, buscam no passado a responsabilidade pelo fracasso do presente.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012


À exceção de ínfima minoria, que pode prescindir dos planos de saúde e, nem de longe sujeitam-se ao SUS, a verdade é que os serviços de saúde no Brasil vão se tornando cada vez mais precários. Dou um exemplo pessoal: de longa data mantenho, para mim e minha esposa, um plano de saúde, pelo qual pago mensalidade entorno de R$ 1.800,00. Com a idade cobrando seu preço, fui acometido de crise de coluna. Atendido, em um primeiro momento, num pronto-socorro, foi-me recomendado que procurasse uma clínica especializada Consultado, o próprio plano indicou-me uma, situada na Avenida Ibirapuera, o que, pela localização, presumia-se, fosse unidade médica de bom padrão. Ledo engano. O prédio sujo, o atendimento, pior ainda. A consulta fora marcada, por telefone, britanicamente, para as 16h15, com um determinado médico. Cheguei com 15 minutos de antecedência e tive a primeira surpresa: o médico não era o indicado no agendamento, mas outro. Com a educação de quem estudara relações públicas na Suíça, a recepcionista informou-me que, ou era aquele ou que eu voltasse a ligar outro dia, para fazer novo agendamento. Como não conhecia nenhum dos dois (fora, literalmente, no "escuro"), concordei com a mudança, preenchi e assinei a respectiva ficha e, pacientemente, sentei-me, lendo uma revista antiga, enquanto aguardava minha vez. 45 minutos depois, como não fora atendido e nem recebera qualquer justificativa para tal atraso (parece que os médicos atrasam por puro marketing), dirigi-me à mesma recepcionista dizendo que, face à demora e outros compromissos, eu iria embora. O que era de se esperar? Que ela dissesse: "Tenha um pouco mais de paciência, o senhor já vai ser atendido; o doutor fulano está atendendo uma emergência”, ou qualquer outra desculpa, destas a que estamos acostumados a ouvir, em casos semelhantes. Mas, lembrem-se, a recepcionista tinha estudado na Suíça e, em silêncio, limitou-se a rasgar a ficha que eu assinara e só não a atirou em minha cara, porque estava eu a uma protegida distância. Antes desses fatos, a mesma recepcionista, quase agredira um senhor, mais idoso do que eu, amparado em uma muleta, que procurava atendimento, portando o cartão de seu plano de saúde que a recepcionista, sem qualquer educação, dizia não ser coberto por aquela Clínica. O estado de humilhação, a que foi ele submetido, deixou-nos a todos nós, sentados nos toscos bancos da sala de espera, tão constrangidos que cada qual procurou disfarçar a seu jeito, uns fingindo ler, outros olhando para o teto ou para o chão. Saí daquele local com grande alívio. Se na recepção, o paciente-cliente é tratado com tamanho descaso, pode-se presumir como os médicos prestam seus serviços. Antes que me esqueça: a quem interessar possa, a malfadada Clínica chama-se "ALPHA CENTER ORTOPEDIA” e, por cidadania, representarei contra ela no Conselho Regional de Medicina.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A ALEMANHA, UMA LIÇÃO PARA SE APRENDER


O noticiário internacional nos dá conta de que a Alemanha, hoje considerada maior potência da Europa, vai comandar a recuperação econômica daquele continente, debelando a crise financeira que parecia levar o euro ao sepultamento. Para tal recuperação, a Alemanha vai injetar cerca de 200 bilhões de euros para ajudar a solucionar os problemas dos países, mergulhados na crise. Como viciado em história, não pude deixar de fazer uma reflexão sobre o País, gerido com extrema competência pela Ministra Angela Merkel. Ensinam-nos os historiadores que a Alemanha saiu destroçada da Primeira Guerra Mundial: o Tratado de Versailes, assinado com os vencedores daquele conflito – Inglaterra e França à frente – retiraram da Alemanha um terço de seu território e de sua respectiva população, exatamente a região onde florescia o parque industrial. Por volta de 1930, a inflação chegou a tal patamar estratosférico que era necessário um bilhão de marcos para se comprar um único dólar. Pois não é que, seis anos depois, a economia da Alemanha se recuperava, o que permitiu a Hitler deflagrar uma guerra, contra praticamente todos os países desenvolvidos, guerra da qual somente não saiu vitorioso, primeiro, pela equivocada e desastrosa decisão de invadir a União Soviética, depois pela entrada dos Estados Unidos no conflito. Terminado esse, em 1945, a Alemanha estava, novamente, arrasada: seu território, dividido; sua independência, comprometida; sua economia, em escombros. Pois não é que, menos de 30 anos após essa segunda hecatombe, a Alemanha se reerguia e já se tornava um dos mais importantes países do mundo? Com a queda do "Muro de Berlim", em 1989, esperava-se que aquele País sofreria
com o impacto do atraso da Alemanha Oriental, a contaminar o progresso da Alemanha Ocidental. Superadas, com rapidez, as diferenças, o País voltou a crescer e, em menos de duas décadas passava a liderar a Europa, a ponto de, hoje, salvar o continente de uma crise, de consequências imprevisíveis. Acho que os governantes, notadamente os sulamericanos, muito teriam a ganhar se, antes de assumirem seus cargos, fizessem um "estágio probatório" naquele País, para aprenderem como se administra a coisa pública.

terça-feira, 18 de setembro de 2012


O Equívoco do Cardeal


Aqueles que me conhecem sabem que sou católico, apostólico romano praticante, tendo a firme convicção de ser essa religião a única verdadeira, porque fundada pelo próprio Cristo. Em minha fase "xiita", insurgia-me, com ferocidade até, contra os que não professavam minha fé e abominava a chamada "Igreja neo-pentecostal", por ver em seus líderes os falsos pastores, a que Cristo se referia como Satanás, a serem evitados. Hoje, mais centrado, mesmo passando ao largo de tais religiões, concluo que algo de útil trazem a seus adeptos: a esperança para superação de seus males. Faço esta necessária introdução, para que os que me lêem entendam a crítica que vou fazer, não à minha Igreja, mas ao Cardeal Dom Odilo que, em má hora, e numa visão equivocada de seu pastoreio, abraçou a candidatura Serra, insurgindo-se, abertamente, contra Celso Russomanno, por ver nele candidato do Bispo Edir Macedo e que, assim, se eleito for, privilegiará os interesses da "Universal", em detrimento aos interesses da Igreja Católica. A fala do Cardeal foi amplamente divulgada na imprensa e trouxe desconforto, a nós, católicos. Particularmente, não vejo como Russomanno, em sendo eleito, poderá favorecer ou prejudicar este ou aquele segmento religioso. Nossa cidade é um brutal emaranhado de colossais problemas, cujas soluções passam longe dos embates religiosos e, ao contrário, necessita da união de todos. No Evangelho de
Marcos, encontramos uma passagem (7,31-37), relatando que Jesus se dirige aos povos gentílicos, repudiados pelo judaísmo, levando sua palavra de amor e libertação a todos, abolindo a distinção entre povos impuros – os gentios – e o povo puro – os judeus. Portanto, esta distinção, principalmente vinda de um Cardeal, é absolutamente descabida. O segundo ponto, que quero destacar, é o grande risco de a Igreja, contrariando sua tradição, engajar-se, nominalmente, em uma candidatura. E se esse candidato for derrotado, exatamente pelo candidato dos "impuros"? Dir-se-á, por certo, que nossa Igreja foi derrotada pela Universal, o que, além de não corresponder à verdade, irá comprometer a autoridade do próprio Cardeal. O candidato a Prefeito de nossa cidade deve ser avaliado por todos, católicos e não católicos, pela sua capacidade de gerir a coisa pública, de maneira a mais eficiente possível. O candidato Serra abandonou a prefeitura para ser Governador e, na seqüência, abandonou o governo do Estado para se lançar candidato a Presidente da República. Talvez seja esse uso do Poder como trampolim, que esteja pesando contra ele, segundo as pesquisas qualitativas, que o dão como o mais rejeitado, dentre todos os candidatos. Mas este seguramente não é debate para ser trazido para dentro da Igreja, não da "nossa" Igreja, que deve se manter apartidária, voltada para sua missão maior de propagar a fé, a esperança e a caridade.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012


Cheio de empáfia e aproveitando alguns segundos de fama, o Presidente do Tribunal Superior do Trabalho veio à televisão anunciar as novas regras, emanadas daquela Corte, ampliando direitos dos trabalhadores. Tais modificações demonstram que o Poder Judiciário Trabalhista caminha em sentido contrário ao dos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Enquanto esses procuram flexibilizar as relações de trabalho, objetivando a criação de maior número de empregos, aquele vai, mediante interpretações estapafúrdias da legislação vigente, criando ônus para o empregador, o que, sem dúvida, reduzirá a oferta de emprego e estimulará a informalidade. Para não nos estendermos em matéria tão árida, tomemos uma única hipótese, das assinaladas pelo Presidente do TST: a partir de agora, as trabalhadoras temporárias, que se engravidarem, no curso do contrato de trabalho temporário, não mais poderão ser dispensadas ao final da vigência do mesmo e terão direito a cinco meses de licença. Trata-se, na verdade, de excrescência jurídica. O trabalho temporário, regido pela lei 6019/74, somente é admitido em duas hipóteses: ou para substituir empregado efetivo (por exemplo, em substituição à secretária, que saiu de férias), ou em razão de acréscimo extraordinário de serviço (por exemplo, pessoas contratadas pelas lojas, por ocasião do natal). Nos exatos termos da citada lei, o contrato de trabalho temporário não pode ter prazo de duração superior a 90 dias, admitindo-se uma única prorrogação por igual período, sendo certo que tal prorrogação depende, exclusivamente, das partes, vale dizer, não é compulsória para nenhuma delas. Fica evidenciada a equivocada interpretação do Tribunal, ao garantir estabilidade de cinco meses à temporária grávida. Denunciada a gravidez e concedida a licença, por certo, o prazo da lei será ultrapassado e o empregador ficará com o ônus de pagar por um serviço, que não lhe será prestado. Para se ter uma pálida idéia das conseqüências, que advirão desta nova orientação do TST, importante assinalar que, somente em nossa Capital, são gerados cerca de dez mil empregos temporários, por ocasião das festas natalinas, durante as quais o comercio contrata, na maioria jovens, para atender à demanda do acréscimo extraordinário de compras, efetuadas, entre novembro e dezembro. Pela nova sistemática, se uma trabalhadora, contratada em novembro, denunciar sua gravidez ao início de dezembro, o empregador deverá mantê-la contratada até maio do ano subseqüente. A solução para não se sujeitar a situação, financeiramente tão desfavorável, parece-nos óbvia: ou o trabalhador será contratado informalmente, ou haverá brutal discriminação em relação às mulheres. A Justiça do Trabalho, retrógrada de longa data, precisa entrar em sintonia com os países que souberam enfrentar a questão trabalhista, priorizando a geração de emprego e trabalho. No Brasil, em razão desta mentalidade protecionista, segundo a qual, em princípio, o empregador é escravocrata e o empregado sua vítima, o "custo trabalhista" passou a ser um dos insumos mais expressivos, inibindo, via de conseqüência, a regular geração de emprego. E, o que é mais lamentável, essas mudanças, ao arrepio da lei, feitas por quem não tem competência legal para fazê-las (já que, por óbvio, o Poder Judiciário não legisla) são ultimadas à revelia dos representantes da classe trabalhadora e da classe empresarial.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012


Poderá a bicicleta ser meio de transporte?


O trânsito, já habitualmente lento, na grande e importante avenida da região dos "Jardins", parara, de vez, contrariando, até, a etimologia da palavra, vez que "transitar" e "parar" constituem, na verdade, antônimos. Alguns motoristas buzinavam, freneticamente, como se o próprio som da buzina tivesse a magia de abrir caminho. Outros falavam ao celular, provavelmente adiando compromissos ou comunicando inevitáveis atrasos. O da fila ao lado da minha pergunta-me o que
acontecera, esquecendo-se de que, ali, assim como ele, também nada sabia. De repente, os carros começam a se movimentarem, lentamente, "se arrastando que nem cobra pelo chão", como, um dia, cantou Gilberto Gil. Alguns metros adiante, estava a causa do congestionamento: encostado, ocupando uma faixa de rolamento, a ambulância do resgate socorria uma pessoa, já colocada na maca e, sobre o canteiro, que divide os dois lados da avenida, via-se uma bicicleta, absurdamente retorcida. De notar que, na faixa, onde estacionara a ambulância, estava pintado, no chão "ciclofaixa", o que permite deduzir que a vítima, ciclista, por ali trafegava, imaginando-se seguro, apesar do grande fluxo de veículo no início de uma tarde de quarta-feira. E,na sua ingênua segurança, foi atropelado. Segui adiante, conjecturando sobre a causa primeira de tão lamentável acidente, qual seja a utilização de bicicleta, como meio de transporte... Na verdade, o grande apelo do momento, no gênero "politicamente correto" é abdicar do carro, como meio de transporte e utilizar a bicicleta. Delas as há de todo tipo e preço, para atender a todos os segmentos da sociedade. A idéia não é de todo péssima, se não vivêssemos em uma cidade de 12 milhões de habitantes com 06 milhões de veículos circulando, dia e noite, por entre ruas e avenidas. Isto sem falar que São Paulo, por ter experimentado crescimento desordenado (o que não tem mais volta), talvez seja a mais acidentada, topograficamente falando, das  grandes cidades do País. Não vejo como alguém, por exemplo, morando na Aclimação, possa chegar à Avenida Paulista, dirigindo uma bicicleta. Da mesma forma, não vislumbro a possibilidade de um trabalhador, residente da zona leste e exercendo sua atividade na região de Santo Amaro, poder, de bicicleta, cobrir tamanha distância. Por certo, se conseguir fazê-lo, chegará tão extenuado, que seu rendimento será nenhum. O Prefeito Kassab, como engenheiro que o é, com certeza, pode dimensionar as citadas dificuldades, mas, exatamente em nome do
malfadado "politicamente correto", está espalhando ciclofaixas pela cidade, colocando em risco a vida dos próprios ciclistas, como no caso real, acima narrado. Rindo ou chorando, a cidade pertence aos automóveis e esses têm que ter a preferência em qualquer planejamento de trânsito. Que fiquem as bicicletas para o lazer, para os passeios de domingo, com alegria e segurança, pelas ruas desertas ou pelos inúmeros parques, que enfeitam nossa cinzenta Capital.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012


A Ignorancia ao Alcance de Todos

Recebo a informação (espero não ser verdadeira) de que o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, é Relator de mandado de segurança, impetrado por uma dessas organizações de coisa nenhuma, pleiteando a proibição de novas edições da obra de Monteiro Lobato, por considerar o autor racista e preconceituoso. Seria cômico, se não revelasse o radicalismo imbecil do que se de convencionou denominar "politicamente correto". Monteiro Lobato é um dos mais importantes autores da literatura brasileira e várias gerações adquiriram em suas obras o gosto pela leitura. Durante anos a Rede Globo exibiu o "Sitio do Pica-Pau Amarelo", delícia para adultos e crianças. Tenho certeza que o Ministro Fux, com sua inteligência jurídica e cultura invulgar vai negar provimento, que a tão estapafúrdio mandado de segurança. É de se sugerir aos impetrantes que aproveitem a mentalidade tacanha e
peçam a proibição das obras de Jorge Amado,inclusive da novela "Gabriela", por nos apresentar a mulher como ser submisso ao homem. E, dentro da mesma ridícula linha de raciocínio, por que não proibir a Bíblia, onde a mulher é tratada como personagem de segunda classe? Bem que o filósofo Descartes afirmava, quase quatro séculos atrás, que o bom senso é o bem mais mal distribuído, no mundo. Esses idiotas, autores do malfadado mandado de segurança, deveriam ser condenados às penalidades decorrentes da litigância de má fé. Provavelmente sejam os mesmos que pretendem mudar as letras das cantigas de infância, por entenderem, hipocritamente, que deturpa a formação da criança, por exemplo, falar que "atirei o pau no gato...". Quantos milhões de brasileiros cresceram "atirando o pau no gato", vendo o “lobo mau comer a vovozinha" e nem por isso se transformaram em marginais? Só resta invocar Shakespeare, falando pela boca de Marco Antonio: "Ó razão,onde estás tu, razão. Refugiaste-te nas brutas feras e os homens ficaram sem ti."

terça-feira, 11 de setembro de 2012


Confesso que não nutro muita (para não dizer nenhuma) simpatia pela Presidente Dilma Roussef. Mas isso não tem relevância, até porque não criei este blog para expor simpatias e antipatias pessoais. Minha opinião, para merecer credibilidade, tem de vir escorada em fatos objetivos, que possam ser contestados por quem me conceder a honra de me visitar. Porisso, em nome da verdade objetiva e da isenção, quero parabenizar a Presidente pela indicação do nome do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Teori Albino Zavascki, em substituição ao brilhante Cezar Peluso, que deixou o SupremoTribunal Federal, por força da expulsoria. O Ministro indicado é do ramo. Juiz de carreira, foi Desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e, atualmente, além de Ministro do STJ, é Professor da Universidade de Brasília, com mestrado e doutorado em Processo Civil, seguindo assim, o caminho intelectual-jurídico de Peluso. Honrará, como o fez seu antecessor, nossa Corte Suprema com seu "notório saber jurídico". Entre a escolha política, que levou semi-analfabetos àquela Casa, a Presidente Dilma premiou a dignidade e o conhecimento técnico. Em novembro, sairá o Ministro Ayres Brito e a comunidade jurídica espera que a Presidente mantenha sua coerência, à revelia dos interesses menores de seu Partido.

Por outro lado, é de se lamentar as declarações do novo Corregedor do Conselho Nacional de Justiça. Parece que o histrionismo é doença contagiosa, deixada na cadeira pela antecessora. Não é que S. Ex.a mal chegou e já foi falando em "expulsar da carreira os Juízes vagabundos"? Em primeiro lugar, o CNJ que, pelo menos para mim, não disse ao que veio, não tem competência para "expulsar" Juizes, que ingressam na carreira por concurso público de prova e títulos, sendo irremovíveis, passiveis de demissão por crime ou falta grave, mediante decisão do Tribunal, a que pertençam. Em segundo lugar, como caracterizar e onde estão os "Juízes vagabundos"? Pelo menos pelas bandas paulistas, não os conhecemos. Vejo-os trabalhando 12 ou mais horas por dia, inclusive nos finais de semana, para atenderem a absurda e crescente demanda de processos. O infeliz e desinformado Corregedor melhor faria se buscasse junto aos Governadores e junto à Presidente, maiores verbas para melhor remunerar os serventuários da Justiça e agilizar a informatização de nossos Tribunais. Não sei se o novo      Corregedor tem competência para tanto, ou se é mais um falastrão a busca de seus 15 minutos de fama.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012


Sobre a obrigação de deixar morrer

O Conselho Federal de Medicina baixou Resolução obrigando os médicos a, nos casos em que não há mais perspectiva de cura, respeitar a vontade do paciente, e sem interferir no processo, deixá-lo morrer, desde que manifeste ele tal disposição de forma voluntária e consciente. Em que pesem os eufemismos empregados, objetivamente, trata-se de uma forma de eutanásia. A perpetuação de uma vida, onde vida já não há, é indiscutivelmente traumática, além dos desastrosos e inúteis gastos financeiros para a manutenção do nada. Todavia, duas questões devem ser levantadas, a indicarem não ser o tema tão pacífico assim. A primeira, é a questão religiosa. Para os verdadeiramente cristãos, na acepção ampla do termo, a vida pertence, exclusivamente, a Deus e só Ele tem o poder de fazer o ser humano exalar o último suspiro. Emerge, via de consequência, a pergunta: o médico, verdadeiramente cristão, estará obrigado a se submeter à Resolução do CFM? Não terá ele direito de invocar suas convicções religiosas e esperar que seja feita a vontade de Deus? A segunda questão é de ordem legal. Pelo menos até que se mude a legislação, o médico tem a obrigação de lutar pela manutenção da vida de seu paciente, sob pena de se caracterizar o crime de omissão de socorro, assim descrito no artigo 135 do Código Penal Brasileiro: “deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo, sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, no desamparo ou em grave e iminente perigo...”. Tal crime, nossa lei penal prevê pena privativa de liberdade que pode chegar a três anos, na hipótese específica, aqui tratada.
Li que, em algum País, cujo nome não me ocorre, a decisão sobre “deixar morrer” um paciente, cuja vida só permanece graças a mecanismos e tratamentos paliativos, é decisão confiada a um Conselho integrado pelo médico, responsável pelo tratamento, por um membro da família, previamente escolhido pelos iguais e por um religioso, na hipótese de o paciente professar qualquer credo. Esse Conselho recebe o nome de “Conselho Morituri”, palavra essa que, traduzida do latim, significa “aquele que vai (ou deve) morrer.” Se o Conselho decidir, por unanimidade, pelo passamento do doente – e todas as questões precisam ser discutidas, em todos os seus aspectos – tal decisão é submetida à aprovação de um Juiz togado e, nessa e apenas nessa hipótese, encerra-se todo o conjunto de tratamento, a que está sendo submetido o doente. Talvez seja essa uma alternativa de solução para problema tão complexo. Quanto à Resolução do Conselho Federal de Medicina, quer sobre o ângulo religioso e ético-profissional, quer à luz da legislação vigente, parece-me carecer ela de legitimidade e legalidade.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012


O Supremo Tribunal Federal, Órgão máximo do Poder Judiciário, vive, nesta 2ª feira, 03, momento de profunda melancolia. Sai de cena, pela aposentadoria compulsória, o insigne e brilhante Ministro, Cézar Peluso, que dignificou aquela Casa com sua inteligência e probidade e nela permanece a figura menor, tanto do ponto de vista moral, quanto do ponto de vista intelectual, o Ministro Dias Toffoli. Menor, do ponto de vista moral, porque tendo sido advogado do PT e de José Dirceu, descumpriu a lei e não se deu por impedido para participar do julgamento do mensalão; e menor, do ponto de vista intelectual, porque suas intervenções, naquela Corte, chegam a ser objeto de chacota de seus pares, o que não poderia ser diferente, vez que nem mesmo conseguiu ingressar na Magistratura Paulista, tendo sido reprovado nas duas vezes em que intentou tal mister.

Por outro lado, os jornais e revistas deste último fim de semana, já noticiam as “batalhas”, que estão sendo travadas nas hostes do PT para a indicação do nome que substituirá o Ministro Cezar Peluso, em nossa Suprema Corte. Dos ventilados pela imprensa, à exceção do Ministro José Eduardo Martins Cardoso, este sim, de induvidoso saber jurídico, ilustre Professor da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, todos os demais são de ilustres desconhecidos da comunidade jurídica. É de se perguntar: surgirá um novo Toffoli, para macular, ainda mais, aquela Corte?

É tempo de se estudar a modificação do critério de escolha de Ministro, para o Supremo Tribunal Federal. O bom senso manda que seja ele eleito dentre o s componentes do Superior Tribunal de Justiça, Juizes de larga experiência e de incontestáveis serviços prestados ao País. Se os Poderes são autônomos, como ensina nossa Carta Magna, nada justifica que o Ministro da Suprema Corte seja escolhido pelo Presidente da República, que utiliza exclusivamente critérios políticos. E nem se diga ser relevante o referendo do Congresso, pois sabemos que se trata de mero ato formal, até porque nossos Senadores não dispõem de competência técnica para avaliar um candidato do Supremo Tribunal Federal.

E para terminar: aqueles que estão soltando rojões pelas condenações, até agora perpetradas, estão sendo precipitados. Por enquanto, foram alcançados apenas os peixes miúdos. Aguardemos quando chegar a hora de José Dirceu e José Genuíno.