quarta-feira, 1 de novembro de 2017

A lava-jato paga seu preço




Quando se analisa os resultados da lava-jato, forçoso é concluir que a sabedoria (para não dizer esperteza) do Juiz Sergio Moro e da Polícia Federal foi trazer a mídia, como sua aliada. Com essa robusta “parceria”, foi possível praticar o arbítrio, afrontar a legislação, inclusive a Constituição, obtendo, até, o aplauso da população, que enxergava, apenas, os resultados. A indignação, muda, diga-se de passagem, ficou restrita ao mundo jurídico, vez que o arbítrio “legalizado” sempre compromete o Estado de Direito. Prisões temporárias e conduções coercitivas foram decretadas, com o objetivo específico de obter delações, com excessivos “premios”, concedidos aos delatores. Em um primeiro momento, o escopo era chegar a Lula, nomeado o chefe da organização criminosa. Todavia, por algum motivo – receio, talvez -, sua prisão não foi decretada, apesar de ele, com frequência, desafiar Moro e, às escâncaras, obstruir as investigações. Entretanto, o fruto mais espúrio da relação “Curitiba/mídia”, a meu modesto juízo, foram os vazamentos de gravações, inclusive de investigados com foro privilegiado. Todas estas arbitrariedades cometidas, estavam justificadas pelos resultados. Em magnífico artigo, publicado em “O Globo”, do último domingo, 29, sob o título “Advocacia em Tempo de Cólera” o ilustre advogado criminalista, Técio Lins, conhecido pela defesa de presos políticos, à época do regime militar, observa que “hoje, enfrentamos as arbitrariedades decorrentes do Direito Penal do inimigo, que suprime garantias processuais, antecipa a punição e impõe penas desproporcionais”. E, com rara felicidade, afirma que: “é inacreditável a alegação, falsa, de que o necessário combate à criminalidade, especialmente a que assalta os cofres públicos, exige a flexibilização de direitos”. O artigo do ilustre advogado deveria ser lido, em todas as faculdades de Direito, para que seus estudantes compreendessem a importância da advocacia ser exercida, com altivez, principalmente “em tempos de cólera”.
Na mesma edição de “O Globo”, o competente jornalista, Elio Gaspari, afirma que “o sistema está embaralhando a lava-jato”. Na verdade, a lava-jato, impulsionada pela mídia, embaralhou-se a si mesma, quando, “flexibilizou” normas jurídicas, que  estruturam o Estado de Direito. Agora, passados os momentos de glória e ufanismo, é hora de recompor o lesionado ordenamento jurídico, missão a ser cumprida pelos Tribunais Superiores. A Constituição estabelece, como cláusula pétrea, o princípio da presunção da inocência, daí decorrendo que o acusado somente será declarado culpado, após o trânsito, em julgado, da sentença condenatória, isto é, quando, contra essa, não mais couber recurso. Em momento de euforia, o Supremo Tribunal Federal, rompendo com a tradição do direito brasileiro e, apagando aquela norma constitucional, entendeu que o condenado, em segunda instância, deveria ser recolhido à prisão. Agora, o mesmo Supremo já admite rever sua posição e restaurar a sistemática, até então vigente. Argumentam os contrários, que a prisão em segunda instância vigora, nos países desenvolvidos. Não refuto a tese, mas, para vigorar, no Brasil, mister que se emende a Constituição, competência exclusiva do Poder Legislativo.
Outra ilicitude, praticada pela “operação” foram vazamentos de depoimentos, comprometendo pessoas, com foro privilegiado. Como qualquer pessoa lúcida,  também abomino o foro privilegiado, todavia, enquanto estiver ele esculpido em nossa Carta Constitucional, terá que ser respeitado e, à luz do bom direito, tais vazamentos, com todas as repercussões deles advindas, comprometem aqueles depoimentos, gerando nulidade dos mesmos e jogando por terra toda a investigação realizada.
De se concluir, pois, que a lava-jato, ao “flexibilizar” as normas jurídicas, molhou-se, a si mesma.

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