terça-feira, 28 de novembro de 2017

Rodolfo, eu e a “nossa República”

Eu já tinha avisado a Rodolfo, meu politizado pastor alemão, que, enquanto não concluísse meu livro, estaria de quarentena, em relação a outros assuntos. Todavia, ele é obcecado por acontecimentos político – policiais, e, à noite, mal abro o portão, chegante do escritório e lá vem ele, a falar dos presos do dia. Digo-lhe eu tais informações, tão banais se tornaram, que passam distante de meu interesse. E, para mostrar a concentração no livro, cujo final me desafia, disse-lhe que até mesmo o Botafogo, amor de  vida inteira, deixei de lado. Até nossos passeios ao parque andam silenciosos e foram encurtados, para felicidade de Nara, a repetir que ambos, eu e ela, já passamos da idade de subir e descer morro, em marcha acelerada.
- “Melhor andar devagar, apreciando a paisagem e marcar ponto, em um dos bancos, defronte ao lago, acompanhando o vai e vem dos gansos”, aconselhou-me ela, sábia velha senhora. Mas Rodolfo é intrépido e voluntarioso. Outro dia, saía para o trabalho e ele veio exibir-me, pendurado à boca, um saruê, partido ao meio, que ousara ultrapassar o portão, para surrupiar-lhe ração. Rodolfo é determinado e não desiste fácil. Não é que sábado, voltávamos do parque e, ao chegar em casa, ele me fechou, impedindo que eu subisse a escada:
- “chefe (odeio, quando ele, só para me amolecer, chama-me, assim) sei que sua cabeça está na obra inacabada (senti certa ironia nessa fala), mas precisamos conversar sobre coisa séria?”
- “E você acha que um  livro não é coisa séria?”
- “Aqui pra nós, chefe, não é um pouco de pretensão você achar que está escrevendo a obra do século?”
- “Livro, meu caro Rodolfo, é como filho, sempre é lindo e importante. Mas afinal, sobre o que você quer falar que, ao que tudo indica, mudará a história do mundo?”
- “Do mundo, não sei, mas do Brasil, com certeza. Você viu a última pesquisa, a indicar que a presidência está entre Luciano Huck, Lula e Bolsonaro? Quero saber em quem vamos votar e o que podemos esperar do eleito.”
- “Nós, quem Rodolfo? Vou lhe mostrar uma coisa, que é um projeto para 2018”.  (Entro em casa e volto, minutos, depois.) “Esta é uma área de terra, 2.000 m², para ser mais preciso, que comprei em Arraial D’Ajuda, lá no sul da Bahia. É minha visão mais próxima do paraíso. Vou construir uma casa pequena e o restante da área ficará para você, Nara, Olavo, Romeu, Clóvis e mais uns dois ou três, que chegarão. Lá será nossa “República”, que terá uma única lei: “todos são obrigados a viverem em harmonia e, se possível, com amor. “Lá, não será permitida a entrada de estranhos e conto com vocês, para  que se cumpra este objetivo. Lá, viveremos até o final de nossos tempos, contemplando o mar, sem compromissos e sem ordens. E, quando morrermos, as cinzas de cada qual serão espalhadas em um canto, próximo ao mar.”
- “E dona Renata irá conosco?”
- “Se ela quiser, é claro, mas duvido  que ela fique longe dos filhos e netos, mas, todos eles, e apenas eles, serão sempre bem-vindos, com direito a trazerem violeta, Indira e Gandi. Esta é a razão, meu caro, de não estar interessado no próximo presidente. Seja quem for, só espero que ele não comprometa “nossa República””.


segunda-feira, 27 de novembro de 2017

A dúvida não pode levar à condenação

Meu queridíssimo amigo, Oswaldo Jurema, jornalista de longo curso, envia-me artigo – transcrevo, abaixo -, formulando severas observações a respeito das declarações do novo Diretor Geral da Polícia Federal, que considerou  poucos os indícios coletados pela Procuradoria Geral da República, para incriminar o Presidente Michel Temer. Oswaldo, que escreve no “Correio da Paraíba”, seguiu a linha da mídia em geral, mas, na investigação policial e no direito penal, a banda toca em ritmo diferente. O ex Procurador Janot, cujo candidato preferido para sucedê-lo, foi preterido por Temer, transformou seu gabinete, em verdadeiro quartel general, com o objetivo – que virou obsessão – de derrubar Temer: armou, com o pulha da “JBS”, a famigerada gravação e, como recompensa, concedeu àquele pulha e seus comparsas liberdade plena, inclusive de se transferir para Nova York. A afirmação do novo Diretor Geral da Polícia Federal, de que uma única mala de dinheiro não constitui prova suficiente do envolvimento do Presidente, não pode ser extraída do contexto da fala do Dr. Segovia. O que quis ele dizer – e disse – é que o episódio deveria ter sido investigado, em todas as suas nuances, e não ser transformado em pinimba pessoal, como o fez Janot. Quando se investiga um Presidente da República, ultrapassa-se sua pessoa, adentra-se à instituição e se coloca em risco, inclusive, os interesses nacionais. Porisso tal investigação deve ser exaustiva e sigilosa, só vindo a público, quando contundentes forem as evidências. A meu juízo, o novo Diretor Geral da Polícia Federal, em harmonia com a nova Procuradora Geral da República, quer ações menos histriônicas, sem a “Globo” por perto, ações estas que conduzam a resultados concretos e, sempre, sob a égide do ordenamento jurídico do País. Assistimos à  decretação, sem medida, de prisões preventivas que têm, como único escopo, compelir o detido a optar pela delação premiada. A mídia exulta, porque tem mais matéria a divulgar. A população exulta, porque fica com a sensação  de que o País está “sendo passado a limpo.” Todavia, os que militam na advocacia – mesmo não tendo clientes na “lava jato” – vivem tempos de insegurança jurídica -, porque o açodamento na colheita da prova é o caminho mais rápido para o arbítrio. Quem, por exemplo, vai reparar a memória e os  familiares do Reitor da Universidade de Santa Catarina que se matou, ao ser acusado de corrupção, acusação essa, agora, tida como infundada, quando as provas restaram  estruturadas? A Polícia Federal, que “concluiu”, antes de provar? A mídia, que se lambusou com a notícia do falso desvio?
O que me parece sadio e louvável, no discurso de posse do Dr. Fernando Segovia é que quer ele uma Polícia Federal, implacável, no combate à corrupção, ao tráfico de armas e de entorpecentes, mas agindo dentro dos limites da lei. Afinal de contas o arbítrio, cometido em desfavor de nosso adversário, amanhã, pode ser cometido contra nós.

Síndrome da dúvida
Oswaldo Jurema

            Durante entrevista coletiva logo após ser empossado diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia surpreendeu a todos ao criticar a ação da Procuradoria- Geral da República no caso JBS. Considerou a investigação incorretamente célere para incriminar um Chefe de Governo, sob suspeita de corrupção passiva e comprometimento em outros delitos, em decorrência da delação de um duvidoso empresário. E arrematou imperativo:
            “Se fosse sob a égide da Polícia Federal, essa investigação teria de durar mais tempo, porque uma única mala (sic) talvez não desse toda a materialidade criminosa para resolver se havia ou não crime, quem seriam partícipes e se haveria ou não corrupção.” E o conteúdo da mala? E o filme do resgate? E o grampo da delação? E a devolução do valor faltante?
            Todavia, o novo mandante da Federal revelou-se acometido, também, da síndrome da dúvida, chaga que atormenta os responsáveis em desvendar os enigmas da vida pública, mesmo quando a clarividência revela a verdade dos fatos. Onde a maior certeza é a dúvida.
            Aos exemplos, portanto: O prefeito de Santo André (SP), Celso Daniel –o homem que sabia demais- foi assassinado em tocaia por seis bandidos que lhe sequestraram, torturaram e mataram.  E ainda assim se tem ‘dúvida’ até hoje: se foi assalto(!) ou queima de arquivo; o candidato à presidência, Eduardo Campos, que após longa investigação concluiu-se que estava seriamente implicado em esquemas escusos, o que não foi suficiente para dirimir a dúvida: se foi pane aérea ou pânico de figurões comprometidos; Teori Zavaski, o relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal foi outra vítima de um desastre aéreo; dias antes anunciara o término de vários processos. E pouco tempo depois o delegado que investigou o acidente, foi morto num tiroteio massacrante. Nada a ver, talvez, mas, paira a dúvida.

            Diante de obscuras controvérsias o ex-procurador-geral, Rodrigo Janot- também no rol dos dúbios- proferiu sentença fulminante: “A pergunta que não quer calar é: Segovia se inteirou disso ou ele está falando por ordem de alguém?” Ou ‘talvez fosse necessário’ ter um cadáver sob a dinheirama da mala para então se configurar crime.  Duvido que haja dúvida!”

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

A nova moeda chamada “Bitcoin”

Se você navega na internet  com certa frequência ou é interessado por temas ligados ao universo digital, já deve ter ouvido falar em Bitcoin, uma espécie de moeda digital. Esse novo dinheiro virtual é gerenciado pelos próprios usuários, sem a necessidade de haver intermediação de um banco.
Liberdade no pagamento, taxas baixas e segurança em relação a informações pessoais dos usuários são as vantagens da utilização da moeda, já em contrapartida, o grau de aceitação e a volatilidade em relação ao número de transações, que poderia ser bem maior do que é e acaba influenciando nos preços, são algumas desvantagens.
É possível adquirir a moeda de várias maneiras, seja por meio de pagamento por bens e serviços oferecidos, compras no Bitcoin câmbio, trocando com alguém ou ganhando por meio de mineração competitiva – atividade na qual novos “bitcoins” são gerados através de um processo competitivo e descentralizado que consiste na recompensa dada aos usuários pelos seus serviços. Os “mineiros” de Bitcoin estão processando transações e fazendo a rede segura usando hardware especializado e coletando novos “bitcoins” em troca.
Um número crescente de empresas como escritórios de advocacia, restaurantes, apartamentos e outros serviços do segmento on-line está adotando o novo modelo de pagamento por “bitcoins”, que tem movimentado anualmente mais de um milhão de dólares por dia. A atividade é legal em muitos países, mas em algumas jurisdições como Argentina e Rússia, por exemplo, esse tipo de moeda foi banido, porque, pelo menos por enquanto, parece não ter surgido mecanismo suficientemente preciso, que impeça o uso dessa moeda virtual para sonegação fiscal e lavagem de dinheiro.


quinta-feira, 23 de novembro de 2017

A escolha do caminho



Este blog tem tido suas matérias interrompidas – e outras interrupções haverá -, por conta de obstáculo a ser vencido e que anda asfixiando os poucos neurônios, que ainda me restam ativos. Estou chegando ao ponto crucial do livro, que escrevo, há quase um ano e que, apesar de ficção, tem relevante conteúdo histórico, que exigiu pesquisa. O livro tem, como título provisório, “Amor em tempo de ódio” e  conta a história de dois pré-adolescentes apaixonados que, em determinado momento de suas vidas, seguem rumos diferentes, ela, alemã, mas filha de judeus alemães, ele, alemão puro, que ingressa na juventude nazista e faz carreira no exército alemão. Em 1.944, ela e os pais são enviados a um campo de concentração, onde ele, por ironia do destino, é o comandante. Hitler já tinha desencadeado a “solução final”, que consistia no extermínio, em massa, de todos os judeus aprisionados. E, agora, ei-lo dividido entre o amor revisitado e o cumprimento do dever de soldado. Estou há mais de uma semana, procurando a melhor alternativa: o amor ou o ódio? Nos livros anteriores, não vacilei em matar os personagens principais, pois, se não o fizesse, o enredo se quebraria. Todavia, agora, os dois caminhos surgem possíveis, harmônicos com toda a trama. É claro que a morte é mais condizente com os fatos históricos. Além do mais, salvar a heroína e seus pais exigirá estratégia que ainda não construí. Soma-se tudo isto ao estresse de final de  ano. Mato, ponho ponto final e encerro o livro. Por outro lado, por que não um pouco de poesia, sobrepondo o amor ao ódio? Afinal, o ano se aproxima de seu poente, trazendo, com o Menino Jesus, a esperança de um novo tempo, onde ressentimento ceda lugar à harmonia, à esperança de vivermos juntos, sem que, para sermos felizes, não precisemos provocar a infelicidade de nosso semelhante. Por outro lado, naqueles tempos, incompreensíveis tempos, quando a barbárie tomou assento, a única esperança estava em amanhecer, no dia seguinte. Persisto, na dúvida do caminho a escolher. Enquanto rascunho caminhos opostos, o ”blog” vai ficando de lado.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Para falar de chatos, ressentidos e hipócritas



Há décadas atrás – creio ter sido no governo Collor - , Rubens Ricúpero, uma das maiores inteligências que passou pela diplomacia brasileira, então ocupando importante Ministério, foi apunhalado pelas costas, por ter dito, em off, que “o que é bom a gente mostra, o ruim, a gente esconde.” A frase apanhada fora do contexto da conversa reservada que Ricúpero mantinha com o jornalista  (da Globo), foi interpretada como ato de esperteza e  a própria emissora tratou de demonizar Ricúpero. A frase fazia todo sentido, para o momento de instabilidade econômica, vivida pelo País: o “bom” acalmava o mercado; o “ruim”, aumentava a instabilidade. Agora, o fato se repete, na mesma emissora, envolvendo seu mais ilustre jornalista, William Waack que, às escondidas, como convém aos canalhas, foi apanhado, sussurrando frase de conteúdo racista. Em pouco tempo, a emissora colocou no ar, através de jornalista, que se prestou a esse papel de capacho, matéria, execrando William Waack e se dizendo repudiar qualquer forma de discriminação. Logo o “Globo” que, até bem pouco tempo, onde negro só fazia papel de empregada doméstica. Waack representa (ou representava) o que havia de melhor na “Globonews”, onde, em seu “Painel”, debatia, com intelectuais de diferentes ideologias, os macro problemas do País. Fica, em seu lugar, o ridículo jornal, com seus enfadonhos repórteres, reproduzindo a “voz do dono”. Um jornalista, com a história e o estofo moral e intelectual de William Waack não pode ser jogado às feras, por causa de infeliz frase, sussurrada, no particular. Todavia, essa desfaçatez da  “Globo” não causa surpresa. Cresceu e se agigantou graças às benesses, concedidas pelo regime militar, mas, esgotado aquele período, passou a ele se referir como “sombrios anos da ditadura”.  Entretanto, como dizia minha falecida mãe, “nada como um dia após o outro.” Não é que, em delação premiada, perante a Corte de Nova York, a “Globo” é  acusada de pagar propina à FIFA, para ganhar concorrência dos direitos de transmissão de torneios internacionais? A emissora, tal qual o fazem todos os envolvidos na “lava jato”, jurou inocência, negou “veementemente” seu envolvimento na falcatrua e acrescentou que “após rigorosa investigação interna, não se apurou a prática de qualquer ilicitude.” Perguntei ao Rodolfo o que ele achava da “rigorosa investigação interna.” Ele me olhou com desprezo e, lembrando o eterno Millôr Fernandes, fez, apenas, “há! há! há!.”
Em magnífico artigo, publicado na edição da semana passada de “Veja”, sob o título “Um País de Chatos”, o sempre preciso e brilhante J. R. Guzzo fulmina: ”vai se inventado, de cima para baixo, uma sociedade mal-humorada, neurastêmica e hostil à liberdade de expressão.” Um País de chatos, diz ele; de ressentidos, diria o filósofo Luiz Felipe Pondé, de hipócritas, digo eu, aqui, do andar de baixo.

terça-feira, 14 de novembro de 2017

O feijão e o sonho



A edição do mês de outubro, da “Revista do Advogado” foi, inteiramente, dedicada à reforma política, com acurada análise de ilustres juristas, dentre esses, dois ex Ministros do Supremo Tribunal Federal, Eros Grau e Nelson Jobim, esse com longa passagem pelo Legislativo, a saber, pois, como funciona, na prática, o processo legislativo. Os temas desenvolvidos, com extrema cultura, na “Revista”, todavia, passam, ao largo da questão essencial: como efetivar a necessária reforma. Todos sabemos ser ela imprescindível à consolidação de nossa sempre tênue democracia. Quando se desce da teoria à prática, esbarra-se nos liliputianos interesses dos políticos e dos respectivos partidos. O Poder Executivo, para minimamente funcionar, aprovar projetos de lei, vê-se obrigado a, no rés do chão, barganhar com os famigerados “representantes do povo”. É até risível imaginar que esses senhores e senhoras irão abrir mão de seus privilégios, para pensarem no interesse do País. São partidos políticos, a defenderem, com unhas e dentes, seus pedaços do bolo, cujos ingredientes são cargos e dinheiro. Basta dar rápida passeada pela história, para se constatar que as grandes reformas surgiram, durante os períodos ditatoriais. A legislação trabalhista, os Códigos, Penal, Processo Penal e Processo Civil surgiram na fase mais dura – entre 1937 e 1945 – da ditadura Vargas. A criação do  BNH, do BNDES, o surgimento do FGTS, em substituição à estabilidade, após 10 anos de trabalho contínuo, aconteceram durante o regime militar, instalado em 1964. Vivemos dias de fragmentação das instituições e, de todas, apenas as Forças Armadas merecem o respeito da população que saiu às ruas para derrubar Dilma e o lulopetismo, mas a elas não retornará, porque ninguém quer ser identificado com qualquer grupo político. É deslavada mentira afirmar que os  políticos precisam “ouvir a voz das ruas”. Essas, pelo desencanto, ficaram mudas e as reformas, que tramitam, se saírem, sairão trôpegas, como a reforma trabalhista, que já nasceu moribunda, porque os próprios juízes já disseram que não vão cumpri-la. O Ministro Meirelles afirma que, se a reforma previdenciária não for aprovada, a Previdência quebra, no máximo, em 05 anos. O Presidente Temer jogou a toalha: se tal reforma não for aprovada, tudo bem, ele, pelo menos, tentou.
O Brasil segue, à deriva, cada dia se afastando mais do mundo civilizado. Quem colocará no rumo certo, consertando as instituições rachadas e promovendo as reformas, que sabemos urgentes e necessárias? A história nos fornece a resposta.

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Para colocar a verdade histórica em seu lugar



Em artigo publicado na edição de outubro da “Revista do Advogado”, sob o título “A difícil reforma política”,o ilustre advogado Eduardo Muylaert, notório membro da “esquerda caviar”, lá pelas tantas, afirma que “fator importante que pesou na derrocada do governo militar foi a péssima situação da economia no fim do regime autoritário”. O insigne advogado e este modesto escriba pertencem a mesma geração e, assim, viveram aqueles tempos. Muylaert, bem ao estilo da esquerda, não afirma, mas insinua que a crise econômica de 1981, que se abateu sobre o Brasil, foi provocada por incompetência do governo Figueiredo. Nada mais falso! A crise, na verdade, iniciou-se no governo Geisel e “estourou”, nas mãos de Figueiredo. Na época, 85% do petróleo, consumido no país, era importado e, de repente, o preço do barril pulou de 02 para 14 dólares. Quase ao mesmo tempo, a taxa de juros, nos Estados Unidos, teve um reajuste de 20%, com reflexos em nossa dívida externa. Foi, então, que Figueiredo dispensou Mario Henrique Simonsen, colocando, em seu lugar, Delfim Netto, que ocupava a Pasta de Agricultura. Delfim granjeara prestígio nacional e internacional, vez que, fora o “mago” da época mais  auspiciosa da economia brasileira – governo Medici -, quando crescemos à inimaginável taxa de 9% ao ano, sobravam empregos e o salário mínimo equivalia a 300 dólares, equivalência jamais encontrada nos períodos subsequentes. Delfim, graças a sua credibilidade, junto à comunidade econômica-financeira, nacional e internacional (Clube de Paris, Banco Mundial e FMI) reequilibrou nossas contas e, ao passar o governo, nossa economia estava estabilizada. Por outra banda, falar em “derrocada do governo militar”, como o faz ilustre advogado, é afastar-se da verdade histórica. O retorno do País à normalidade democrática já estava desenhada, desde o governo Geisel, que extinguiu o AI-5 e sancionou a Lei da Anistia, permitindo o retorno dos exilados. Figueiredo foi ungido – contra a vontade da “linha dura” – com o compromisso de devolver o governo ao poder civil. Quando Paulo Maluf derrotou Mario Andreazza, na Convenção da Arena, o próprio “sistema” começou a trabalhar pela vitória de Tancredo no Colégio Eleitoral: Delfim Netto foi interlocutor, junto à classe empresarial e o Ministro do Exército, General Leonidas Pires Gonçalves, aparou arestas existentes entre os militares. Tancredo era civil confiável, tanto assim que manteve o General Leonidas, no Ministério do Exército e, para a Pasta da Fazenda, foi Francisco Dornelles, que servira ao governo Médici, como Secretário da Receita e ao Governo Geisel, como Procurador Geral da Fazenda Nacional. Cumpriu-se assim, o programado: o retorno do governo ao poder civil se deu de modo gradual e seguro. Os principais líderes civis da época – Franco Montoro, Ulisses Guimarães e o próprio Tancredo – sabiam que a prudência mandava que, se quisessem o Poder de volta, deveriam seguir as regras do jogo, estabelecidas pelo “sistema militar”. Tanto assim é que, Tancredo agonizante, enquanto se  discutia  quem deveria assumir, quem decidiu pelo sucessor de Tancredo, foi o General Leonidas, representando a “voz dos quartéis”, decisão que recaiu sobre Sarney, que sempre pertenceu ao “sistema”, enquanto Ulisses era considerado “rebelde”.
Quem não foi testemunha ocular daqueles tempos, poderá, em livros isentos, confirmar que os fatos se passaram como aqui narrados. Falar em “derrocada do regime militar”, é contar bravata, o que é típico da “esquerda caviar”.