quarta-feira, 26 de abril de 2017

A falta que ele faz



Conheci-o, lá pelo final dos anos 70, a ele apresentado pelo amigo comum, Valdir Trancoso Peres, um dos mais brilhantes advogados de júri, com quem tive o privilégio de conviver. Ainda não tinha ele, o apresentado, o prestigio grangeado, dentro e fora do mundo jurídico, mas, entre nós, principalmente os que militavam na área criminal, sua competência faiscava. Foi quase “amor a primeira vista”: tornamo-nos amigos! Geralmente às sextas-feiras, boca da noite, íamos tomar aperitivo, em bar, que não mais existe, ao lado do “Rubayat”, ao final da Faria Lima “velha”, que, ao depois, seria prolongada, na administração Paulo Maluf. Falávamos, quase nada, de assuntos ligados a nossa profissão e, com muito prazer e intensidade de literatura, ele, dos autores franceses – que lia no original – e eu, dos ingleses, recepcionados por bons tradutores. Só concordávamos, em poesia, já que ambos comungávamos ser Baudelaire o maior de todos e cujas “Oeuvres Complètes” ele me presenteou. Considerava-se um “social democrata” o que, convenhamos, não quer dizer muita coisa e, quando eu fazia tal observação, ele sorria, afirmando que, nós, advogados, não podemos adotar posições radicais ou imutáveis, porque “não sabemos o cliente que nos espera”. Perdemos o contato freqüente, primeiro, porque, com a transferência de meu escritório para a Aclimação, nosso aperitivo de 6ª feira ficou prejudicado; segundo, porque sua fulminante ascensão profissional exigia que eu me mantivesse à distância. De quando em vez, falávamos, por telefone e era só. Corria o ano 2.000, ele já influente, até no meio político, “fazendo” Ministros e Desembargadores e eu, em meu canto, tocando meu modesto escritório. Eis que sou contratado para defender empresário do mercado financeiro, “apanhado” na “operação Satiagraha”, com expressiva conta em paraíso fiscal, sem conhecimento das autoridades brasileiras. Sabedor ser ele advogado dos envolvidos mais importantes, liguei para combinarmos estratégia uniforme de defesa. Debatemos o assunto e, ao final, disse-me que a “operação” morreria, antes de chegar à praia, tantos os equívocos legais perpetrados. E morreu, graças aos erros e à ação decisiva dele, já, àquela altura, conhecido, em nosso meio, pelo codinome de “Deus”, tal seu poder de resolver questões, aparentemente insolúveis. Foi Ministro da Justiça de Lula e, graças a seu engenho e arte, manteve o ex Presidente  fora do alcance das garras do “mensalão”.
Marcio Thomaz Bastos, “Deus”, para os íntimos, morreu em pleno governo Dilma e, se vivo ainda fosse, teria transformado a “lava-jato” em inexpressivo esguicho.

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