Ligo para meu “guru”
espiritual, Cônego em uma das mais
importantes Igrejas de nossa Capital, marcando horário para minha confissão
anual. Viajo para o tempo de eu menino, no grupo escolar, quando a confissão
era obrigatória e semanal. Os pecados eram sempre os mesmos: “matar” aula, fazer “aquilo” escondido (como se “aquilo”
– homenagem ao deus Onam – pudesse ser exibido em público). Em nossa pequena
Paróquia do interior, havia dois sacerdotes: Frei Antelmo, bravíssimo, que
gritava conosco, fazendo-nos, de pronto, sentir o fogo do inferno e nos impondo
duras penitências e Frei Braz, de idade avançada e que descobrimos ter a
audição comprometida. Por motivos óbvios, formávamos longa fila ao pé do
confessionário do segundo, a cujas missas ajudava, como “coroinha”, menos por convicção religiosa e, muitíssimo mais, pela
broa de milho com chocolate, servidos depois. Frei Braz, velhinho, foi
recolhido à “Casa dos Padres”,
espécie de asilo dos sacerdotes aposentados. Frei Antelmo, com toda sua braveza,
“largou a batina” – como se dizia, à
época -, e se “juntou” a uma das
beatas que, com assiduidade, freqüentava seu confessionário. Os dois
empreenderam inesperada fuga noturna, deixando acéfala a Paróquia, mas
fornecendo farto material de “fofoca”,
que dominou a cidade por muito tempo.
A confissão, em tempos modernos, pelo menos para mim, é
avaliação dos meus erros, angústias, omissões, incapacidade de perdoar, tudo
que, a meu sentir, torna-me menor aos olhos de Deus. Por outro lado, meu
confessor é sacerdote de longo curso, teólogo brilhante, que se tornou amigo e,
por isso mesmo, apascenta minha angústia e aplaca minhas culpas, tudo isto sem
me impor qualquer penitência. È muito mais conversa franca com amigo, a quem se
respeita e confia. Tenho especial motivação para me confessar, na semana-santa,
a meu juízo, o mais emblemático momento da cristandade. Cristo, cumprindo a
missão, determinada pelo Pai, ingressou, humildemente, em Jerusalém, para ser vilipendiado
e morto pelos seus algozes e, depois, em definitiva vitória, ressuscitar. Olho
para a cruz de Cristo, que a suportou, sem merecê-la e me pergunto porque,
malgrado tantos erros, conscientemente cometidos, reclamo do pequeno peso, do
ínfimo peso, da cruz que devo carregar. Busco, no exemplo de Cristo, humilhado,
ensangüentado, lenitivo para minhas poucas dores, causadas, em sua esmagadora
maioria, pelos meus preconceitos, pela minha incapacidade de entender a
essência de sua lição, que é o exercício do amor, este dar sem conta e sem
exigir reciprocidade. E, depois, procuro ver na ressurreição de Cristo, a
possibilidade de eu “ressurgir”,
menos indigno, mais em paz comigo mesmo. A semana-santa me torna introspectivo,
como quem, cheio de dúvidas, procura o caminho e o único caminho é o que leva a
Cristo. A pergunta, que sobra, sem resposta é:
serei digno de encontrar o caminho, que leva a Cristo? Ele, se o
quisesse, com um simples ato de vontade, poderia ter convocado uma “legião de anjos” que destruiria seus
inimigos, mas, porque tinha missão a cumprir, aceitou todos os ultrajes e, ao
final, a morte. Eu, no meu egoísmo, encho meu coração de ódio, ódio que se
exterioriza sob forma de preconceito e desprezo pelos que, apenas,
metaforicamente, chamo “meus semelhantes”.
Um dia, Jesus perguntou: “quem são meus
irmãos?” E ele mesmo nos deu dura
resposta: “aqueles que seguem as palavras
de meu Pai”. Eu, que não as sigo e, muita vez, nem entendo as palavras do
Pai, por mais que queira, não me sinto irmão de Cristo. Nesta semana-santa, repetindo
o caminhar de outros anos, vou juntar os pedaços, que ainda sobraram de mim
mesmo e vou buscar o caminho almejado.
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