quarta-feira, 29 de maio de 2013

CORPUS CHRISTI, HOJE E ONTEM


Amanhã, 30 de maio, estaremos comemorando a festa do corpo e sangue de Cristo, que se popularizou pela expressão latina “Corpus Christi”. É festa de ação de graças, pois a vida entregue do Senhor, seu corpo e sangue, é nosso verdadeiro alimento e sustento. O Papa Bento XVI, em sua obra “Sacramentum Caritatis” (Paulinas, 2007) destacou a importância da Eucaristia, com o momento em que “o Senhor vem ao encontro do homem, criado à imagem e semelhança de Deus, fazendo-se seu companheiro de viagem.” Naquela obra, o então Sumo Pontífice destaca a importância da liturgia eucarística, a ser exercida por todos, clero e fiéis, com a devida responsabilidade que a magnitude do ato exige. Em síntese: estar preparado para ministrare receber a comunhão. E essa magnitude transferiu-se para a festa popular, onde as ruas são enfeitadas com tapetes multicoloridos para a passagem do Santíssimo. Viajo a minha remotíssima infância e arranco da memória as madrugadas indormidas em que, irmanados na fé, com minha tinta e pó de serra, construíamos os tapetes que, até o momento solene da passagem do Sacerdote, conduzindo o ostensório, deveriam permanecer intocáveis. A meio ao tapete, que ocupava a parte central da rua, desenhos os mais variados eram elaborados, com destaque para a pomba branca, que simbolizava o Espírito Santo. Na minha ignorância, eu não sabia que vivia um momento mágico, o do meu encontro com Cristo, amparo e guia de minha vida.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

A escolha do Dr. Luiz Roberto Barroso, como novo Ministro do Supremo Tribunal Federal, volta a ser objeto de celeuma, na mídia e nas hastes políticas. Não tanto pela competência do escolhido, emérito advogado e jurista que o é, mas pelas suas posições ideológicas (favorável ao aborto, ao casamento gay, etc.) e até por ter sido advogado das Organizações Globo.
Sem entrar no mérito dessas controvertidas questões e muito menos sem ter a pretensão de deslustrar o ilustre advogado, destaco que a verdadeira essência da controvérsia decorre do critério de escolha de Ministro da Corte Suprema. Como se sabe, o Poder Judiciário tem organização piramidal: o bacharel em Direito ingressa na carreira, mediante concurso público, galga vários degraus e, encerrada essa etapa, pode ser alçado à condição de Desembargador do Tribunal de Justiça de seu Estado, onde encerra sua carreira ou pode ser levado à condição de Ministro do Superior Tribunal de Justiça, onde chega, no mínimo, com 25 anos de judicatura e com mais de 50 anos de idade. Por raciocínio lógico, o candidato a Ministro do Supremo deveria ser escolhido entre os integrantes daquele Superior Tribunal, cujo “notório saber jurídico e ilibada reputação” (exigências da Carta Constitucional) já estariam sobejamente provados e consagrados. E mais exato seria que a escolha se desse mediante eleição, cujos eleitores fossem, exclusivamente, os membros do Superior Tribunal de Justiça. Se os poderes são autônomos, como estabelece a Constituição, não faz sentido que a escolha seja privilégio do Presidente da República, já que o referendo do Congresso é mero ato formal, ratificador da escolha presidencial.

Realizada a escolha, conforme nossa proposta, teríamos uma Corte Suprema, tecnicamente mais homogênea e menos suscetível a injunções políticas e interesses não condizentes com a relevante missão de fazer valer o direito, alicerce maior da Democracia.

terça-feira, 21 de maio de 2013


Liga-me aquele amigo-cliente, auto-exilado, no seu firme propósito de só retornar ao Brasil depois que o País tiver um mínimo de coerência. Está na Holanda, apaixonado que é por tulipas, irradiantes na primavera européia. Quer saber das novidades e eu trato de desanimá-lo. Lá pelos anos setenta, íamos, juntos ao Maracanã. Ele, torcedor do Fluminense e eu, botafoguense desvairado. Naquela época, o “maior estádio do mundo” tinha capacidade para 200 mil espectadores. Acabaram de fazer uma reforma (a segunda em menos de 10 anos), gastaram mais de um bilhão de reais e, agora, o estádio teve sua capacidade reduzida para cerca de 75 mil torcedores. Conto isto a meu amigo e ele, histérico, diz que não pode ser verdade. Mas avanço em meu pífio noticiário: o histriônico Ministro Joaquim ataca outra vez, chamando-nos a nós, advogados, de preguiçosos, já que só saímos da cama às onze horas e olha que lhe escrevo às oito da matina. E, após muita negociação, o Congresso aprovou a privatização dos portos. O interessante é que o PSDB, que privatizou tudo que podia privatizar, era contra... e não me pergunte porque. Não sei se já lhe falei: os Ministérios, que eram 15, no Regime Militar, passaram a 22 no governo Collor, pularam para 24, com Fernando Henrique e agora, são 39, sob a batuta da dona Dilma que teve que fazer um “puxadinho”, em sua mesa de reunião, para caber todos, sendo que a maioria nem ela conhece. Por falar em dona Dilma, noticia-se que, em sua viagem ao Japão, ela a vai dar uma esticada ao Vietnã, para cumprimentar um general, que derrotou os americanos. Como se sabe, o Vietnã é grande parceiro comercial do Brasil, enquanto os Estados Unidos... deixa prá lá. Êta gente que gosta de desenterrar o passado e, por falar nisto, vão exumar o cadáver do Jango, morto em 1976, para saber se ele morreu de causa natural ou se foi envenenado. Sua esposa, dona Maria Tereza, afirma que estava sozinha com ele, no dia de sua morte. Por que não deixam os mortos em paz? E, para encerrar, o Conselho Nacional de Justiça ameaça de punição os Cartórios que se negarem a realizar casamentos homoafetivos, apesar de nossa Carta Magna (que já não é tão magna assim), ao dispor em seu Capítulo VII sobre a família como “base da sociedade” (art. 226), refere-se, sempre, a homem e mulher. Você, que é solteiro, que se cuide, já que, pelo andar da carruagem, até você voltar só será válida a união homossexual.

sexta-feira, 17 de maio de 2013


A PÁTRIA SEM CHUTEIRAS

A frase, cunhada por Nelson Rodrigues, que dizia ser “A seleção (ele dizia escrete) é a pátria de chuteiras” caiu, definitivamente, em desuso. A seleção brasileira é, hoje, essencialmente, movida por interesses econômico financeiros. Por que digo isso? Basta examinar a última convocação que deixou de fora jogadores da expressão de Alexandre Pato, Kaká e Ronaldinho Gaúcho, este último, de longe, o melhor jogador brasileiro da atualidade. Em lugar desses, teremos a mediocridade de Hulk, Damião e outros desconhecidos, além de Neymar, estrela cujo brilho é produto exclusivo da mídia. Aliás, sobre Neymar, cuja qualidade (?) só emerge contra adversários medíocres, busco, na memória, remota expressão: “jabaculê” (espécie de gratificação que um cantor ou compositor distribuía para que as rádios tocassem suas músicas). Olho aquela figura tosca, em campo, com seus dribles inúteis, absolutamente dominado por marcadores medianamente capacitados, mas exaltado pela imprensa, até quando cobra um lateral. Fico a me perguntar se, por trás de tanta exaltação, não correm vários “jabaculês”.
Enfim, para voltarmos a Nelson Rodrigues, a pátria e a seleção, de largo tempo, perderam seu elo afetivo e, por certo, será ela vaiada todas as vezes que apresentar as medíocres atuações, como as vistas, nos últimos tempos.

quinta-feira, 16 de maio de 2013


É sempre oportuno lembrar-nos daqueles que, ao longo de nossas vidas, deixaram em nós, a marca de suas influências. É a maneira de mantê-los vivos, quase que conversando conosco, oferecendo-nos o doce gosto de suas personalidades marcantes. Porisso, falar sobre Carlos Lacerda, no mês em que se comemora o 36º ano de seu falecimento e minha fugaz convivência com ele é a oportunidade para reviver momentos importantes e inesquecíveis em minha vida.

Carlos Lacerda foi, e talvez continue sendo, a maior influência ideológica que minha juventude absorveu e que iria marcar, para sempre, minhas convicções políticas. A memória mais remota remete-me lá pelos 12 anos de idade, ouvidos colados à Rádio Mairinque Veiga, Lacerda a desancar Juscelino e sua maior megalomania, chamada Brasília. O tempo provou que Lacerda estava certo: Brasília, nem de longe, cumpriu seu objetivo, que seria a interiorização do progresso. O jornalista de “A Folha”, Fernando Rodrigues, em magnífico artigo, quando do último aniversário daquela cidade, demonstrou o retumbante fracasso social e econômico em que ela se tornou, por nada ter acrescentado à região. Além do mais, Brasília “isolou” o poder das injunções populares, possibilitando que grandes falcatruas fossem e continuem a serem perpetradas. Lacerda tinha essa capacidade de premonição, apanágio apenas dos gênios. Entretanto, só vim a conhecer Lacerda, pessoalmente, em 1963. Ele acabara de ser indicado candidato à Presidência da República, pela UDN, no pleito, que se realizaria em 1965 e já percorria o País em pré-campanha. Foi ele fazer uma palestra na Faculdade de Direito da PUC-SP, onde eu estudava. Lá, tínhamos um partido – o “PIU – Partido Idealista Universitário” – que nós, seus filiados, tínhamos a risível pretensão de ser a “UDN acadêmica”. Batíamos de frente com a “JUC – Juventude Universitária Católica”, cujo mentor era o Padre Enzo, Diretor da Faculdade de Filosofia da mesma Universidade, que nós, “udenistas”, execrávamos, por considera-lo “comunista de batina”. Apesar de todas as manifestações contrárias, Lacerda foi fazer sua palestra e eu, que era o orador do partido, fui escalado para saudá-lo. Fiquei uma semana escrevendo e ensaiando meu discurso e, na hora, suava e tremia, tal o nervosismo. Acabada a palestra, Lacerda, sempre atencioso e gentil, abraçou-me e me convidou para conhecer algumas obras importantes, que estava realizando na então Guanabara, da qual era Governador. A falta d’água era problema crônico naquela cidade. Havia, até, uma música de carnaval dos anos 50, cujo refrão dizia: “Rio de Janeiro, cidade que nos seduz, de dia falta água, de noite falta luz...” Pois Lacerda, mesmo com o boicote financeiro do Poder Central (primeiro Jango depois o próprio Castello Branco) estava construindo a “Adutora do Guandu”, que iria resolver, definitivamente, o problema de falta d’água na cidade. Outra obra importante era o “Túnel Rebouças”, que ligaria a zona norte à zona sul, em poucos minutos. Até então, o único elo entre as duas regiões era a Avenida Brasil, o que, além de alongar a distância, provocava, já naquela época, enormes engarrafamentos. A “esquerda festiva” era contra o túnel porque – alegavam – infestaria de “suburbanos” as praias do Leblon e de Ipanema. Era uma época incrivelmente contraditória: a esquerda, que suspirava e revirava os olhos por Cuba, era tremendamente elitista e homens, realizadores de obras populares, como Lacerda, eram tidos como reacionários. Mas o certo é que, um dia, recebi um telefonema em casa, da secretária do Lacerda, cujo nome não me recordo, formalizando o convite para a tal visita. No dia e hora marcados, apresentei-me no Palácio Guanabara e com mais outras mais pessoas percorremos inúmeras obras, inclusive a “Vila Kennedy” para onde estavam sendo transferidas as pessoas, retiradas da “Favela do Pasmado”. Ao invés de casas improvisadas com tapume, Lacerda mandara construir moradias descentes, com água, luz e esgoto, o que era um luxo, naquela época. A “Rodoviária Novo Rio” foi considerada pela oposição rancorosa, obra faraônica, pelo seu tamanho. Menos de 20 anos após sua inauguração, já se mostrava pequena. Eu e os outros visitantes, ficamos hospedados no “Hotel Novo Mundo”, ali na Praia do Flamengo, onde estava sendo construída a maior obra urbanística do mundo, o aterro do mesmo nome e que é um dos mais belos cartões postais do Rio. À noite, depois da visita, Lacerda nos ofereceu um jantar, quando nos apresentou uma extensa relação de suas obras, o que nos deixou a todos simplesmente maravilhados. Incrível a capacidade de trabalho daquele homem que ainda encontrava tempo, madrugada adentro, para dar “incertas” em hospitais e delegacias, a fim de constatar se tudo estava funcionando a contento. De volta a São Paulo, e como sempre tive mania de escrever, mandei-lhe algumas cartas, que ele jamais deixou sem resposta, chamando-me “meu jovem causídico”. Mesmo sabendo, é claro, que as respostas vinham de algum “ghost writer”, era sempre uma deferência, que me encantava. Voltei a me encontrar com Lacerda, no dia 31 de março de 1964, que, se não me falhe a memória, coincidiu ser um domingo. Naquela época, eu, habitualmente, passava o fim de semana no Rio. Ia de carona com meu cunhado ou algum amigo dele, todos pilotos da Varig, que tinha acabado de comprar a “Real Aerovias”. Saía de São Paulo em um dos voos noturnos da 6ª feira e voltava do Rio à noite do domingo. Ficava hospedado na casa de minha irmã, que morava na Rua Paissandu, bem perto do Palácio Guanabara. Meu roteiro era, de dia, praia e, à noite, o “Beco das Garrafas”, então o templo da bossa nova. Passava todo o tempo saboreando uma única cerveja – o dinheiro pouco não suportava mais do que isso – enquanto via e ouvia Vinicius, Tom, Claudete Soares, Lucio Alves e outros bambas da MPB. Também frequentava o “Cine Paissandu”, templo do cinema novo, onde se fazia pose de intelectual e se assistia a filmes chatíssimos. Pois no dia 31 de março, estoura a Revolução e, pelo rádio, fico sabendo que o Almirante Aragão dirige-se ao Palácio Guanabara, para prender Lacerda. Eu, que estava a menos de 500 metros de lá, saí correndo em direção ao Palácio, para me juntar a tantos outros que lá estavam para defender nosso líder. Defender, eu não sabia como, já que nunca atirara nem mesmo com espingarda de chumbinho. Mas sabia que a história estava acontecendo e queria participar dela. O Palácio estava protegido por caminhões de lixo que eram, por assim dizer, a divisão “panzer” do Lacerda. Já dentro do Palácio, após dar meu nome a um soldado, creio que da Aeronáutica, subi a escadaria central, que desembocava em um enorme salão, àquela hora apinhado de gente. A um canto, falando ao telefone e, com a outra mão, empunhando uma metralhadora, estava Lacerda. Encerrada a ligação, dirigi-me para cumprimenta-lo e ele, para meu espanto, abraçou-me calorosamente. Lembro-me, vagamente, de que fui encaminhado ao Coronel Gustavo Borges, então Secretário de Segurança, que estava distribuindo as armas para defesa do Palácio. Dele recebi um fuzil que segurei com extremo cuidado, já que, desajeitado como sou, tinha medo que disparasse. Felizmente o ataque não veio e Lacerda, em inflamado discurso, saudou a Revolução e convocou uma reunião de seu Secretariado. Voltei para São Paulo e, à distância, fui assistindo ao esgarçamento das relações de Lacerda com o Governo Castello Branco. Lacerda tinha um grande projeto, o de ascender à Presidência da República. Pertencia ele a uma geração – que infelizmente desapareceu – em que se almejava chegar ao Poder para realizar um trabalho, em favor da população, o fazer pelo prazer de fazer e não, como agora, que se quer chegar ao Poder, por puro interesse pessoal. Foi com essa filosofia de atender ao interesse popular que Lacerda governou a Guanabara: construiu a Adutora do Guandu; construiu 500 quilômetros de esgoto; o Túnel Rebouças; o Emissário Submarino; o Aterro do Flamengo; a Rodoviária Novo Rio; cerca de 200 escolas de ensino fundamental; promoveu a desfavelização do Pasmado; integrou a Barra, que nem telefone tinha, à cidade; além de vários viadutos. Quando olhamos para trás e contemplamos esse magnífico conjunto de realizações, temos que nos perguntar como tudo isso foi possível, malgrado a odiosa perseguição do Poder Central, principalmente do Presidente Castello Branco, que quis seduzi-lo, oferecendo-lhe uma Embaixada em Paris, que ele recusou, porque julgava ter o direito de disputar a Presidência da República. Tinha se preparado, a vida inteira, para isso, e não aceitaria, passivamente, que esse direito lhe fosse usurpado. Castello, apunhalando-o pelas costas, urdiu a candidatura Negrão de Lima, prorrogou seu próprio mandato e passou a tratar Lacerda como inimigo, chegando a articular com a oposição a rejeição das contas do Governador. Missão impossível. Nenhum homem público teve sua vida pessoal e sua administração tão revolvida quanto Lacerda. Não encontraram qualquer irregularidade, qualquer desvio de conduta. Da mesma forma que era um trabalhador compulsivo, entendia que a honestidade, mais que uma virtude, era uma obrigação, principalmente do homem público. Quando, em 1966, Castello deixou claro que não haveria perspectiva de devolver o Governo aos civis, Lacerda, de forma alucinada, engendrou a frente ampla, juntando-se a Juscelino e Jango. Naquela oportunidade, tive a ousadia de escrever-lhe uma carta, acusando-o de destruir sua majestosa história, aliando-se a quem mais combatera, tendo-nos como fiéis escudeiros. Era como se nosso Comandante-em-Chefe passasse para o lado do inimigo. Foi assim que me senti. Não entendi, nem aceitei, apesar da resposta, que ele me enviou, falando em salvar a democracia, em superiores interesses da pátria e etc. Não dava para engolir Juscelino e Jango. Era, “mutatis mutandi” deixar de torcer pelo Botafogo e passar a torcer pelo Flamengo que, diga-se de passagem, era o time dele. Eu era – olha a imodéstia outra vez – “revolucionário” até a raiz do cabelo e também achava prematuro o retorno dos civis ao Poder. Somente vim a ter contato com Lacerda, outra vez, quando, após sua cassação, foi ele preso e consegui visita-lo, graças à interferência de um General, que fora amigo de meu pai. Lacerda, em que pese a inteligência, a conversa fácil, perdera o entusiasmo e, desta vez, falava, para valer, em sair da vida pública e fazer o que nunca pudera, isto é, dedicar-se à família. Após esse episódio, não mais o vi, até o lançamento de seus “Discursos Parlamentares”. Noite de autógrafo em sua “Nova Fronteira”, editora que fundara com seus filhos, Sérgio e Sebastião. Quando cheguei à mesa, ele se levantou e me deu um forte abraço. No livro, apôs uma dedicatória entusiasmada, como ele: “Ao jovem causídico, transfiro meu entusiasmo pelo Brasil.” Eu, já morando no Rio, de vez em quando ia visita-lo na Editora, sempre ao final da tarde. Falávamos exclusivamente em literatura, já que ele proibia que se falasse em política, se bem que, de forma irônica, criticava-me por “servir à ditadura de Médici e Geisel”.

Era um sábado chuvoso, sem qualquer perspectiva de praia. Sobrava esperar pela tarde e ir torcer pelo Botafogo. Toca o telefone, era o Almirante Meziano, meu companheiro de Ministério da Fazenda e Lacerdista empedernido, como eu. “Desculpe ligar, mas o Lacerda morreu, está sendo velado no São João Batista, e o enterro será às cinco da tarde.” Atirei-me ao sofá, entre estupefato e absurdamente triste, porque nem mesmo sabia que ele estava doente. Troquei de roupa e lá fui para a Rua Real Grandeza. O velório cheio, mas não tanto quanto ele merecia. A Revolução e os covardes de sempre temiam o Lacerda, mesmo morto. Fiquei até umas três horas da tarde e corri para o Maracanã. O Botafogo perdeu e eu aproveitei para chorar duas grandes paixões de minha vida.a

Na parede, à direita de minha mesa de trabalho, contemplo o quadro do meu time de futebol, à época da faculdade. Lá estou eu, goleiro (30 quilos mais magro) posição que ocupei ao longo de toda a vida, por campos e praias sem fim, até que, faz uns cinco anos, encerrei a carreira, compelido pelos anos acumulados. A cabeça dizia: “vai”, e o corpo respondia “não vou”. Mas ficou minha solidariedade aos goleiros, todos eles, principalmente aos momentos de infortúnio, como o vivido por Bruno, do Palmeiras. Mesmo não sendo torcedor do “Alviverde Imponente”, tive ímpeto de atravessar a televisão e consolar o jovem goleiro. Que não o imolem pelo erro cometido, rogo, em nome de todos os que, movidos por tenebrosas forças, escolheram aquela posição.

terça-feira, 14 de maio de 2013


OS COVEIROS ATACAM NOVAMENTE
A “Comissão da Verdade”, que insisto em chamar “Comissão da Mentira”, subiu nas tamancas e, depois de levar um “baile” do Coronel da Reserva, Carlos Alberto Brilhante Ustra, ameaça fazer um “relatório contundente”, inclusive nominando Magistrados e empresários, “que ainda estão por aí” e que teriam colaborado com os atos de tortura, nos chamados “anos de chumbo”, que se encerraram com o Governo Geisel, isto é, no longínquo 1975. Faço minhas contas e constato que, no mínimo, 38 anos se passaram e esses Magistrados e empresários, se vivos estiverem, terão mais de 80 anos. A “Comissão” diz que ouvirá muita gente. Ouvirá o Gabeira, que participou de seqüestro de Embaixador? Ouvirá Genoíno, acusado de matar jovens militares no Araguaia? Ouvirá José Dirceu que foi treinar guerrilha urbana, em Cuba, e depois voltou ao Brasil para aplicar seus ensinamentos? Ouvirá, por fim, a Presidente Dilma que, segundo relato de importante jornal paulistano, participou de assaltos a banco e tramou o seqüestro – não consumado – do ex Ministro, Delfim Netto?
Duas verdades incontestáveis: primeira: quem nasceu depois de 1950, vale dizer, cerca de 80% da população brasileira, sabe dos acontecimentos daquela época, apenas através dos compêndios de história, já que não os vivenciou; segunda: concordo com os que dizem que, em 31 de Março de 1964, não houve uma “revolução”, mas sim, “golpe militar”, até porque, se fosse uma revolução, como a cubana, por exemplo, as personalidades citadas não estariam por aqui, vivas, algumas delas, inclusive a “tungarem” os cofres públicos.
A lei da anistia, bilateral, diga-se de passagem, objetivou enterrar aquele passado, bilateralmente negro de nossa história. O Brasil precisa olhar para frente e deixar de lado esses coveiros desempregados que insistem em exumar o defunto.

terça-feira, 7 de maio de 2013


A FALAR OUTRA VEZ DA VELOCIDADE DO TEMPO
Outro dia, falei aqui, sobre o impacto que sofri ao saber que um colega de turma era o decano do Tribunal de Justiça, com os pés na expulsória. Não se passaram quinze dias e a realidade bateu diretamente no meu rosto: estava eu aguardando o julgamento de um recurso, no mesmo Tribunal, sabedor que não me liberaria em menos de duas horas, vez que, na frente do meu, havia cerca de dez outros para serem julgados. Após o julgamento do primeiro processo, sou surpreendido com a seguinte manifestação do Presidente da Turma Julgadora: “Considerando a presença do mais antigo número de inscrição de advogado na Ordem, vamos julgar o processo nº tal...” (que era o meu). Olhei em torno e constatei que, realmente, dentre cerca de 50 advogados presentes, inclusive um de barba branca, sentado a meu lado, eu era o mais velho. Recostei na vetusta poltrona e fiquei a rememorar quantas vezes estivera eu naquela e em outras salas do Tribunal. Quanto comecei a freqüentá-lo, dentre os Desembargadores muitos havia, que eram meus professores. O tempo passou e, com muita freqüência, identifico, a meio deles, colegas e contemporâneos de Faculdade. Não é que, outro dia, lá estava, solene em suas vestes, um Desembargador, que fora meu estagiário, lá pelos anos 70? Naquele dia, em que, pela antiguidade, tive preferência, saí do Tribunal com a estranha sensação que meu tempo passara, o que me deixou um pouco deprimido. Depois, com mais calma, entrei na Catedral, procurei um isolado banco vazio e, sem muita cerimônia, agradeci a Deus, por ainda estar por aqui, com capacidade física e mental para o corre corre cotidiano. Lembrei de alguns colegas, que já se foram e orei por eles. Viver é realmente magnífico espetáculo, que precisa ser contemplado com a maior intensidade possível.