quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Biografia só com autorização

Toda esta celeuma, a respeito das “biografias não autorizadas”, não passa de mais um lance de hipocrisia, como, aliás, quase tudo que acontece neste pobre País. É óbvio que um dos mais importantes direitos, que a legislação pátria preserva, é o da privacidade. Ninguém – a não ser os movidos por interesses espúrios – pode aceitar que sua intimidade seja invadida, principalmente para tirar qualquer proveito. Via de conseqüência, qualquer biografia impõe a prévia autorização do biografado, não importando ser ele pessoa pública ou simples anônimo. Não tenho dúvida de que o projeto de lei, tramitando no Congresso, objetivando desproteger o direito à privacidade, se aprovado, sucumbirá no Supremo Tribunal Federal, guardião dos  direitos fundamentais, esculpidos em nossa Constituição. O artista não pode ser considerado um “homem público”, na acepção técnica do termo, pelo simples motivo de que não exerce ele uma “função pública”. A manifestação artística, subjetiva pela sua própria natureza, é colocada à disposição do público, que a aceita ou não. Chico Buarque, por exemplo, elaborou um conjunto de obras musicais. Há inúmeras pessoas – e eu me incluo dentre elas – que apreciam seu trabalho e muitos os há que não apreciam. Zezé de Camargo e Luciano elaboraram um conjunto de obras musicais. Há inúmeras pessoas que apreciam seus trabalhos e muitos os há – como eu – que não apreciam. Analisar, avaliar esses trabalhos é direito de qualquer um, mas apresentar a intimidade de seus autores, onde e como vivem, seus amores e desamores, suas finanças etc, só interessa a eles e, assim, tais informações para virem a público, há de depender sempre da autorização deles. Querer compará-los a um Deputado cuja intimidade deve ser devassada, já que são eles “representantes do povo” e esse tem o direito de conhecer, em toda sua plenitude, seus representantes.


quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Imaginava eu, mais de quatro décadas passadas de diuturno exercício profissional, tantas foram as aberrações jurídicas, com as quais me deparei, que perdera a capacidade de me indignar. Ledo engano, como dizia ancestral professor quando, em exame oral, dávamos equivocada resposta a uma pergunta. Não  é que ontem, 15, experimentei o amargo gosto da decepção por ver o Direito ser pisoteado e a Justiça ser objeto de escárnio. Mas vamos aos fatos: às 14:30h, participei, como advogado de defesa, de audiência, onde o Réu, primário, vale dizer, sem nunca ter sido processado ou condenado anteriormente, menor de 21 anos, com emprego e residência fixos, encontrava-se preso, desde o mês de janeiro, por tentativa de roubo, praticado por um colega... com o dedo. Reunia, assim, meu cliente, todos os requisitos para receber os benefícios da liberdade provisória e, nestas condições, continuar respondendo ao processo. A audiência foi adiada para final de novembro, porque a vítima, que reside em outra cidade, não compareceu. Formulei o pedido de concessão de liberdade provisória e a Juíza – simpática e educada – negou o pedido, simplesmente afirmando que melhor apreciaria o pedido na próxima audiência. Assim, aquele jovem, que, até então, nunca entrara numa Delegacia, vai continuar pelo menos por mais um mês, convivendo com perigosos marginais. Sai do fórum desolado, desolação desmedida, por ter de dar a notícia à mãe, que a recebeu em pranto convulso. Do fórum sigo para o Tribunal de Justiça, no centro velho da cidade, onde encontro um colega, de antigas lidas. A meio a cordial bate-papo, fico sabendo que o ex-Promotor, que assassinara a esposa grávida, agora, menos de 03 anos de sua condenação, fora agraciado com o benefício do regime semi-aberto, isto é, só vai (se é que vai) ao presídio para dormir. Aquela melancólica dicotomia, a solidificar o entendimento popular de que “cadeia é para os pobres”, carreguei-a como fardo insuportável, noite adentro, dando-me a quase convicção que está na hora de arrepiar carreira. É claro que buscarei no Tribunal a reparação da injustiça, perpetrada contra meu cliente. Mas, quem apagará dos meus ouvidos o choro convulso daquela mãe que, no próximo domingo, entrará na fila dos horrores, para visitar seu imberbe filho preso? Enquanto isso, com certeza, aquela juíza, educada, simpática, estará almoçando, em paz, com seus familiares. Mas, de onde tirei a idéia de que o Direito é meio para se fazer Justiça?

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Nossa Senhora Aparecida

Amanhã, 12, dia em que se reverencia Nossa Senhora Aparecida, propõe-se especial reflexão sobre a mãe de Jesus, simbolizando todas as mães. Tocada pelo anjo Gabriel, que a convocou a ser a mãe do filho de Deus, Maria trocou a tranqüilidade de uma vida simples, por tribulações constantes, que culminaria no calvário. Abdicou da convivência cotidiana daquele filho, por saber que ele vinha em missão especial e perigosa. E ela nada poderia fazer para tolher a missão ou evitar os perigos. Dedicação sem medida e desprendimento sem recompensa, essências que fazem do amor de mãe o único, por inteiro, verdadeiro. Quanta angústia, quanta dúvida deve ter atormentado o coração de Maria, a acompanhar, primeiro, a quase nunca compreendida missão evangelizadora do filho e depois, com o coração estraçalhado pela dor, ver o filho torturado e morto e morte de cruz, suprema humilhação para o homem judeu. O que teria passado pela cabeça de Maria, ao ver o filho agonizar, morrer e, morto, recebê-lo nos braços? Que mãe sem revolta, desespero, quase demência, reagiria em semelhantes circunstâncias? Por isso, Maria, mãe acima de todas as mães, é a Nossa Senhora, que reverenciamos neste 12 de Outubro. A ela pedimos uma migalha de seu incomparável amor, de sua inquebrantável força, que nos permita envolver nossos filhos nos braços e dizer-lhes “eu o amo”, como Maria amou seu santo filho. Nossa Senhora Aparecida, rogai por nós, para que sejamos dignos e capazes de receber e transmitir uma fagulha de seu amor.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

A volta dos que insistem em não ir

O matusalém político José Serra, perdedor de todas as contendas presidenciais, voltou à cena com pretensões a ser candidato de seu partido à Presidência da República. Mesmo com Aécio Neves, bem mais jovem e que desfruta da simpatia da grande maioria dos mineiros (o que não é o caso de Serra, em relação aos paulistas), pelo menos por enquanto, parece missão impossível apear Dilma do poder. A união de Marina com Eduardo Campos provoca barulho... e nada mais. Sabemos que a eleição presidencial se decide no eixo São Paulo – Minas – Rio de Janeiro e, mesmo no nordeste, o “bolsa família” converge o eleitorado para o PT. Ora, se com Aécio a morte do PSDB é quase certa, com Serra já se pode encomendar o caixão. Aliás, raciocinem comigo: o Presidente da República, o Governador de Estado, o Prefeito não exercem um cargo político, tal qual um Oficial das Forças Armadas, um Juiz, inclusive os Ministros do Supremo Tribunal Federal? Por que esses, ao completarem 70 anos são compelidos a “vestir o pijama” e irem para casa, enquanto os primeiros, os políticos, já em idade decrépita, como Serra, podem permanecer na ativa, disputando eleições? Já passou da hora de a Justiça Eleitoral, até mesmo em nome do “princípio da isonomia”, esculpido em nossa Carta Magna, fixar em 70 anos o prazo final para exercício de qualquer cargo eletivo. Se a regra é “oxigenar” a administração pública, que seja tal regra aplicada aos três Poderes. Serra, disfarça e vá cultivar flores !

terça-feira, 8 de outubro de 2013

A demagogia camuflando a incompetência

A Prefeitura estendeu, por toda São Paulo, faixas, induzindo a população a optar entre uma cidade, onde a circulação de veículos seja proibida, ou onde seja proibida a circulação de pedestres. Demagogia barata de quem, sem qualquer qualificação, chegou ao governo e, agora, sucumbe ante os desafios. Pedestres e veículos não são incompatíveis, basta que se estabeleçam regras claras para uns e outros. Numa cidade em que o transporte coletivo, além de escasso é de péssima qualidade, o automóvel, de larga data, é de uso essencial para quem trabalha. Desconhecer tal fato, por si só, já é prova de incompetência administrativa. Como advogado, desloco-me, diariamente, de meu escritório, no bairro da Aclimação para a Praça João Mendes, percurso de, no máximo, um quilômetro, que, todavia, demanda nunca menos de meia hora. Na ida, cumpre vencer a “Bueno de Andrade” e, na volta, a “Conselheiro Furtado”, estreitas ruas que a sanha arrecadadora da municipalidade autoriza o estacionamento dos dois lados da via pública. E não é só: com  cotidiana freqüência, a qualquer horário, deparamo-nos (melhor fora dizer “paramos”), com  caminhões descarregando mercadoria, ou efetuando coleta de lixo. E, para completar, paquidérmicos e inúteis ônibus elétricos, conduzindo no máximo 10 pessoas e que, com regularidade, param, seja porque se lhes caíram os “chifres”, seja porque se lhes acabou a força. E acrescento: os primeiros pingos de chuva já são suficientes para apagarem os semáforos, que assim permanecem por vários dias, transformando em mais caótico – se é possível – o trânsito da cidade. E, como é mais fácil buscar culpado do que resolver problemas, a Prefeitura transfere a responsabilidade para o automóvel. E, em nome do interesse público, criam-se as malfadadas faixas exclusivas de ônibus... até mesmo onde ônibus não passam. Por que não efetuar a coleta de lixo entre 22hs e 6hs, estabelecendo o mesmo horário para carga e descarga de mercadoria? Por que não desativar a onerosa frota de ônibus elétricos que, pelos congestionamentos que provocam, geram mais poluição do que a evitam? Por que não proibir o estacionamento duplo, principalmente nas ruas de grande movimento, com as, no início citadas? Por que não modernizar os semáforos, minimizando suas constantes avarias? Álias, alguém sabe informar em que dia assumirá seu posto o novo Prefeito de São Paulo?

terça-feira, 1 de outubro de 2013

O dia do idoso
Pelo “Google notícias” chega-me a informação de que hoje, 1º/10, comemora-se o “dia do idoso”, isto é, daqueles que chegaram aos 60 anos. Há os que falam em “melhor idade” e há os que, mais pé no chão, falam em “pior idade”, por todos os males físicos que o tempo, este carrasco sem piedade, vai depositando. Prefiro chamar de “última idade”, porque, a partir dos 60 anos, podemos, a qualquer momento, ser convocados pelo Todo Poderoso. Eu, cá de mim, muito além de 60, tive o privilégio de viver o surgimento da bossa nova, Vinicius, Jobim, depois Toquinho e Chico. No teatro, emocionei-me com Cacilda, em “A volta ao lar”, com Maria Fernanda em “Um bonde chamado desejo”, com Tônia em “As pequenas raposas”, com Fernanda Montenegro em “O homem do princípio ao fim” e quase tudo que ela fez. No futebol, vi a incomparável seleção de 70 e o Botafogo de Jairzinho, Gerson, Paulo Cesar Caju, Marinho Chagas, todos no mesmo tempo. Vivi, na faculdade, o pré e o pós 64 e as agitadas “assembléias”, onde decidíamos o destino do Brasil e do mundo. Vi - amando ou odiando – a atuação de políticos de verdade, Juscelino, Lacerda, Brizola, Adauto Lucio Cardoso, Afonso Arinos.

O “Google” informa que o dia de hoje é “um marco importante na garantia de direitos dessa faixa etária”. Rasa e inútil mentira. Depois dos 60 – no mínimo – vamos sendo, progressivamente, expulsos da sociedade, tanto que os Magistrados, mesmo estando no melhor de sua intelectualidade, são aposentados, compulsoriamente. Não sei se é certo ou errado, mas é a inexorável lei da vida: os mais velhos cedendo espaço aos mais jovens. O que alguns idosos têm a comemorar neste dia – e eu me incluo – é o simples fato de ainda estarmos vivos, razoavelmente saudáveis, continuando a trabalhar e contemplando esta radiosa manhã de primavera.