quarta-feira, 3 de abril de 2013


Liga-me amigo querido, convidando-me para um uisque, na boca da noite. Precisa conversa comigo. De trabalho, não é, já que ele, antigo conhecedor de meus hábitos, sabe que só trato do tema, em local e horários apropriados, razão que me leva a recusar almoços com clientes, sobre pretextos, falsos ou verdadeiros. Ando, até, irritado com meu filho que, nesses eventuais encontros, fica bolinando o celular, a cata de informações chegadas pela internet. Mas, aceito o convite e chego ao local marcado à hora marcada. Lá está ele, a um canto, mal vestido, barba por fazer, com aquele jeito de que muita coisa ia mal. E ia mesmo. Não queria conversar, queria apenas falar... e falou da tristeza e da melancolia, pela mulher que, simplesmente, juntou seus pertences, bateu a porta e foi para nunca mais. Vinha ele de um casamento de pouca duração que, à exceção da filha amantíssima, só deixou rancores irreparáveis, de ambos os lados.
Depois de muitos anos de solidão, - apenas mulheres sem nome e sem espírito – apareceu uma, vinte anos mais nova, em quem investiu toda sua carência afetiva. Eu a conheci: bicho do mato (veio de distante periferia), não se dava bem com ninguém ligado a ele. A diferença de idade dificultava o diálogo, mas, segundo ele, o sexo era ótimo e isso, quando ainda não se chegou aos 50, conta muito. Por várias vezes, ela foi embora... e voltou. A meu juízo, (contaminado pela péssima avaliação que faço do ser humano), voltou pelas mordomias recebidas: bom apartamento, o uísque de 12 anos, que ela sorvia, em abundância, os bons restaurantes, essas pequenas coisas que tornam a vida mais prazerosa. Mas, agora, ela fora, de vez, com o celular sempre na caixa postal e as loucuras de amor, mandadas pela internet, deixadas sem resposta. E ali estava ele, na minha frente, falando e eu, em estudada mudez, apenas escutando. Até que, lá pelo terceiro uísque, ele, mesmo sabedor de minha rígida formação religiosa, bateu forte:
- “Acho que Deus não quer que mulher alguma goste de mim.”
Aí eu não me contive:
- “Fulano, deixe Deus fora disto. Se ele não se imiscuiu no triângulo amoroso “Adão, Eva, cobra”, seres que ele criou diretamente, você não acha muita pretensão sua que ele saia de seus divinos afazeres para influir em seus amores e desamores? E tem outra coisa, que você, na sua idade, já que está invocando Deus, devia saber: não dá para levar mulher muito a sério, tantas são suas imperfeições. Com elas, o amor, a dedicação só vai até o ferimento leve. Vá até o “Livro do Genesis”. Deus criou a luz, no primeiro dia; no segundo, o céu e a terra; no terceiro, separou a terra das águas e ainda plantou as florestas, de diferentes tamanhos; no quarto, fez o sol e a lua; no quinto, fez todos os seres vivos; no sexto dia, provavelmente cansado com tanto trabalho, que tivera, aí ele fez o homem. Veja que, inicialmente, não planejara fazer a mulher, ideia que só concebeu no último minuto do segundo tempo. Conta-se que, como matéria-prima, utilizou “uma costela de Adão”. Poderia ter utilizado a parte do pulmão, que nos permite respirar, mas, talvez por querer preservar a integridade do aparelho respiratório de Adão, optou pela costela. Poderia ter utilizado parte do coração, órgão propulsor do sangue para todo o corpo humano, mas pelo mesmo motivo anterior, optou pela costela. Poderia ter escolhido parte do cérebro, órgão que comanda todo o corpo, mas, idem, desistiu. E por que assim agiu Sua Divindade? A mulher já nos tira o fôlego, a falar desbragadamente, sem lógica, nem nexo, impondo suas opiniões e julgamentos, que os tem como definitivos. Se assim já o é, imagine como seria, se nós, homens, só tivéssemos um  pulmão? E, suprimida parte de nosso coração, em que estratosfera iria estacionar nossa pressão arterial, nos momentos em que a mulher agisse como acabei de mencionar? Quanto a invadir o cérebro do homem, nem pensar. A mulher já é astuta demais, maquiavélica demais, manipuladora demais, como iríamos enfrenta-la, ela com um cérebro maior, exatamente o pedaço do nosso? Porisso, o Todo-Poderoso optou pela costela, apenas uma delas, parte insignificante do nosso corpo. Agiu assim para, emblematicamente, mostrar-nos como deveríamos lidar com esse ser estranho, imponderável, inconstante e, acima de tudo, incompreensível. Apenas uma costela, por cuja falta não podemos nos deixar abater, transformar, sucumbir. Já que estamos a invocar o “Livro Sagrado” convido você a viajar comigo até o “Êxodo”, onde se localiza o “Decálogo”, vulgarmente conhecido como os “Dez mandamentos”, dentre os quais figura um, onde se determina: “não cobiçarás a casa do teu próximo, não desejarás a sua (dele) mulher, nem o seu servo, nem o seu boi, nem seu jumento, nem coisa alguma que pertença a teu próximo”. Notou a sutileza? Deus que é Deus, onisciente e onipresente, incluiu a mulher entre as “coisas” do homem (boi, jumento, etc) e nós homens podemos lamentar e até chorar – choro contido, mas passageiro – a perda de uma “coisa”, mas que a substituímos logo. Quantos cachorros eu tive – e você conheceu todos eles – que morreram, sofri na hora e, depois, eu os repus, deles guardando apenas agradáveis recordações. Com mulher, tem que ser assim também, cara. Foi embora, por este ou aquele motivo, você sofre, purga, na hora e depois repõe. Se eu nunca estive apaixonado, destas paixões que dilaceram, alegria e sofrimento se revezando? Claro, tive e tenho. Pelo Botafogo, paixão que nasceu comigo e vai morrer comigo, porque, compromisso assumido pelos meus filhos, serei enterrado com a camisa do “Glorioso”. Agora, mulher, mesmo, “sic transit gloria mundi”. Ou, como diz o para-choque do caminhão “amor, só de mãe”.
Secamos, eu e meu amigo, a garrafa de uísque e nos despedimos, fraternalmente. Espero que nosso encontro tenha trazido algum benefício para ele. 

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