Chego em casa, domingo à noite e sou abordado por Rodolfo,
meu politizado pastor alemão, dizendo-me que compreendia minha correria, mas
precisava falar comigo. Enquanto trocava de roupa, tentei imaginar o assunto.
Sobre a conquista do Palmeiras, por certo não seria. Adepto do ‘’Bayern’’ de
Munique, torce o nariz, ou melhor, o focinho para o futebol, abaixo do Equador.
Ainda traz vivo, na memória, os 7x1 da última copa. Roupa trocada, chamo-o à
sala, o que lhe traz indisfarçável descontentamento, pois indica que não haverá
passeio no parque. Ele se posta a meu lado e vai direto ao assunto:
- ‘’este tal de Fidel
Castro, que acabou de morrer, foi mesmo tudo isto que a mídia está falando?
Nestes quase 5 anos que estamos juntos, você faz referencia aos Estados Unidos,
aos países da Europa, mete o pau na Venezuela, mas de Cuba, nenhum comentário.
Por que?’’
E o pior é que o Rodolfo tinha razão nas duas coisas: a
imprensa massacrou-nos com notícias sobre Fidel, como se fosse ele o mais
importante líder político do mundo e, por outro lado, tinha razão, porque Cuba
jamais esteve inserida em minhas preocupações. É desses países, como a Albânia:
sabemos que existe, mas não têm qualquer relevância. Entretanto, Rodolfo, com
indisfarçável ansiedade, aguardava minhas explicações.
- ‘’meu amado Rodolfo,
Fidel Castro foi o estadista do atraso. Estive em Cuba, no inicio dos anos 90
e, além de uma repressão, que constrangia até os turistas, a pobreza estava
disseminada. Conversei com alguns jovens e todos alimentavam plano de irem para
os Estados Unidos. O tão decantado avanço, no campo educacional, é pura
falácia, pois o acesso à Universidade é privativa dos membros do partido, isto
sem contar que, pela ausência de desenvolvimento, não há mercado de trabalho para
os egressos das Universidades. A mesma falácia constituiu-se no campo da saúde
pública. À exceção da medicina tropical, Cuba é zero nos demais ramos, até
porque o médico, lá formado, é proibido de sair do País, para cursos de
especializações e, quando sai, é para integrar programas geridos pelo governo,
como esse + Médicos. Cuba sobreviveu, economicamente, até o final dos anos 80,
enquanto durou a União Soviética, que a subsidiava, enfiando cerca de 01 bilhão
de dólares por ano, naquele País, apenas por questões estratégicas, em relação
aos Estados Unidos. Com o fim da União Soviética, a ‘’mesada’’ foi cortada e o
que já era ruim ficou péssimo. O cubano é simpático, generoso, o País tem
praias lindíssimas, mas, além da repressão política, o povo, sofre, até mesmo
repressão alimentícia, porque não é tudo que pode comer. Fidel foi ditador
sanguinário, que mandou matar mais de 20 mil oponentes políticos e provocou a
fuga de cerca de 100 mil cubanos, especialmente para Miami, onde comemoraram,
como se estivessem em carnaval, a morte do dito cujo. E, para completar,
propagou sua anacrônica ideologia, especialmente para a América Latina, gerando
‘’filhotes’’, como Lula, Morales e Hugo Chávez. Em resumo: Fidel foi cancro,
que levou Cuba para o século 19, fazendo
o País ter saudades do corrupto governo de Fulgêncio Batista, que ele derrubou.
Como me disse um velho cubano: ‘’pelo menos, no tempo de Batista, nos tínhamos
empregos, nos cassinos e nas casas noturnas’’. É isto aí, meu caro Rodolfo, se
posso interpretar o sentimento cubano, diria: Fidel, você já foi tarde!’’
Imaginava eu ter encerrado a conversa e já me levantava para
ir embora, quando Rodolfo imobilizou-me com as patas, dizendo:
- ‘’espera um pouco. E
agora, como fica Cuba com a morte de Fidel?’’
- ‘’ainda não dá para
ter idéia precisa. Cuba é dirigida por Raul, irmão de Fidel, que está tentando
reaproximação com os Estados Unidos, mas, agora, com a eleição de Trump, essa
reaproximação vai esfriar, já que o novo Presidente norte-americano fará duras
exigências para manter o apalavrado por Obama. Na verdade, em termos
comerciais, Cuba nada tem a oferecer aos Estados Unidos, em particular, e ao
mundo, em geral. Sua vocação é, predominante, turística, todavia os
norte-americanos só investirão lá, se tiverem absoluta segurança, política e
financeira desses investimentos’’.
Rodolfo deu-se por satisfeito, saiu porta a fora, desceu as
escadas e, como de hábito, recolheu-se, sob a caixa de correspondência, para
refletir.
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